Matemática: Ciência e Aplicações - Matemática (2025)

Outros

Janice Rubira Silva 11/10/2024

Matemática: Ciência e Aplicações - Matemática (3)

Matemática: Ciência e Aplicações - Matemática (4)Matemática: Ciência e Aplicações - Matemática (5)

Libere conteúdos
sem pagar

Ajude estudantes e ganhe conteúdos liberados!

Matemática: Ciência e Aplicações - Matemática (6)

Matemática: Ciência e Aplicações - Matemática (7)Matemática: Ciência e Aplicações - Matemática (8)

Acesse conteúdos dessa e de diversas outras disciplinas.

Libere conteúdos
sem pagar

Ajude estudantes e ganhe conteúdos liberados!

Matemática: Ciência e Aplicações - Matemática (9)

Matemática: Ciência e Aplicações - Matemática (10)Matemática: Ciência e Aplicações - Matemática (11)

Libere conteúdos
sem pagar

Ajude estudantes e ganhe conteúdos liberados!

Matemática: Ciência e Aplicações - Matemática (12)

Matemática: Ciência e Aplicações - Matemática (13)Matemática: Ciência e Aplicações - Matemática (14)

Acesse conteúdos dessa e de diversas outras disciplinas.

Libere conteúdos
sem pagar

Ajude estudantes e ganhe conteúdos liberados!

Matemática: Ciência e Aplicações - Matemática (15)

Matemática: Ciência e Aplicações - Matemática (16)Matemática: Ciência e Aplicações - Matemática (17)

Libere conteúdos
sem pagar

Ajude estudantes e ganhe conteúdos liberados!

Matemática: Ciência e Aplicações - Matemática (18)

Matemática: Ciência e Aplicações - Matemática (19)Matemática: Ciência e Aplicações - Matemática (20)

Acesse conteúdos dessa e de diversas outras disciplinas.

Libere conteúdos
sem pagar

Ajude estudantes e ganhe conteúdos liberados!

Matemática: Ciência e Aplicações - Matemática (21)

Matemática: Ciência e Aplicações - Matemática (22)Matemática: Ciência e Aplicações - Matemática (23)

Libere conteúdos
sem pagar

Ajude estudantes e ganhe conteúdos liberados!

Matemática: Ciência e Aplicações - Matemática (24)

Matemática: Ciência e Aplicações - Matemática (25)Matemática: Ciência e Aplicações - Matemática (26)

Acesse conteúdos dessa e de diversas outras disciplinas.

Libere conteúdos
sem pagar

Ajude estudantes e ganhe conteúdos liberados!

Matemática: Ciência e Aplicações - Matemática (27)

Matemática: Ciência e Aplicações - Matemática (28)Matemática: Ciência e Aplicações - Matemática (29)

Libere conteúdos
sem pagar

Ajude estudantes e ganhe conteúdos liberados!

Matemática: Ciência e Aplicações - Matemática (30)

Matemática: Ciência e Aplicações - Matemática (31)Matemática: Ciência e Aplicações - Matemática (32)

Acesse conteúdos dessa e de diversas outras disciplinas.

Libere conteúdos
sem pagar

Ajude estudantes e ganhe conteúdos liberados!

Prévia do material em texto

<p>Matemática: Ciência e Aplicações</p><p>Atena Editora</p><p>2019</p><p>Annaly Schewtschik</p><p>(Organizadora)</p><p>2019 by Atena Editora</p><p>Copyright da Atena Editora</p><p>Editora Chefe: Profª Drª Antonella Carvalho de Oliveira</p><p>Diagramação e Edição de Arte: Lorena Prestes e Geraldo Alves</p><p>Revisão: Os autores</p><p>Conselho Editorial</p><p>Prof. Dr. Alan Mario Zuffo – Universidade Federal de Mato Grosso do Sul</p><p>Prof. Dr. Álvaro Augusto de Borba Barreto – Universidade Federal de Pelotas</p><p>Prof. Dr. Antonio Carlos Frasson – Universidade Tecnológica Federal do Paraná</p><p>Prof. Dr. Antonio Isidro-Filho – Universidade de Brasília</p><p>Profª Drª Cristina Gaio – Universidade de Lisboa</p><p>Prof. Dr. Constantino Ribeiro de Oliveira Junior – Universidade Estadual de Ponta Grossa</p><p>Profª Drª Daiane Garabeli Trojan – Universidade Norte do Paraná</p><p>Prof. Dr. Darllan Collins da Cunha e Silva – Universidade Estadual Paulista</p><p>Profª Drª Deusilene Souza Vieira Dall’Acqua – Universidade Federal de Rondônia</p><p>Prof. Dr. Eloi Rufato Junior – Universidade Tecnológica Federal do Paraná</p><p>Prof. Dr. Fábio Steiner – Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul</p><p>Prof. Dr. Gianfábio Pimentel Franco – Universidade Federal de Santa Maria</p><p>Prof. Dr. Gilmei Fleck – Universidade Estadual do Oeste do Paraná</p><p>Profª Drª Girlene Santos de Souza – Universidade Federal do Recôncavo da Bahia</p><p>Profª Drª Ivone Goulart Lopes – Istituto Internazionele delle Figlie de Maria Ausiliatrice</p><p>Profª Drª Juliane Sant’Ana Bento – Universidade Federal do Rio Grande do Sul</p><p>Prof. Dr. Julio Candido de Meirelles Junior – Universidade Federal Fluminense</p><p>Prof. Dr. Jorge González Aguilera – Universidade Federal de Mato Grosso do Sul</p><p>Profª Drª Lina Maria Gonçalves – Universidade Federal do Tocantins</p><p>Profª Drª Natiéli Piovesan – Instituto Federal do Rio Grande do Norte</p><p>Profª Drª Paola Andressa Scortegagna – Universidade Estadual de Ponta Grossa</p><p>Profª Drª Raissa Rachel Salustriano da Silva Matos – Universidade Federal do Maranhão</p><p>Prof. Dr. Ronilson Freitas de Souza – Universidade do Estado do Pará</p><p>Prof. Dr. Takeshy Tachizawa – Faculdade de Campo Limpo Paulista</p><p>Prof. Dr. Urandi João Rodrigues Junior – Universidade Federal do Oeste do Pará</p><p>Prof. Dr. Valdemar Antonio Paffaro Junior – Universidade Federal de Alfenas</p><p>Profª Drª Vanessa Bordin Viera – Universidade Federal de Campina Grande</p><p>Profª Drª Vanessa Lima Gonçalves – Universidade Estadual de Ponta Grossa</p><p>Prof. Dr. Willian Douglas Guilherme – Universidade Federal do Tocantins</p><p>Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)</p><p>(eDOC BRASIL, Belo Horizonte/MG)</p><p>M376 Matemática: ciência e aplicações [recurso eletrônico] / Organizadora</p><p>Annaly Schewtschik. – Ponta Grossa (PR): Atena Editora, 2019.</p><p>– (Matemática: Ciência e Aplicações; v. 1)</p><p>Formato: PDF</p><p>Requisitos de sistema: Adobe Acrobat Reader</p><p>Modo de acesso: World Wide Web</p><p>Inclui bibliografia.</p><p>ISBN 978-85-7247-121-3</p><p>DOI 10.22533/at.ed.213191402</p><p>1. Matemática – Estudo e ensino. 2. Professores de matemática</p><p>– Prática de ensino. I. Schewtschik, Annaly. II. Série.</p><p>CDD 510.7</p><p>Elaborado por Maurício Amormino Júnior – CRB6/2422</p><p>O conteúdo dos artigos e seus dados em sua forma, correção e confiabilidade são de</p><p>responsabilidade exclusiva dos autores.</p><p>2019</p><p>Permitido o download da obra e o compartilhamento desde que sejam atribuídos créditos aos</p><p>autores, mas sem a possibilidade de alterá-la de nenhuma forma ou utilizá-la para fins comerciais.</p><p>www.atenaeditora.com.br</p><p>APRESENTAÇÃO</p><p>A obra “Matemática: ciências e aplicações” aborda uma série de livros de</p><p>publicação da Atena Editora publicado em três volumes. O Volume I em seus 37</p><p>capítulos apresenta resultados de pesquisas que trazem um pensamento reflexivo,</p><p>crítico e sistemático, articulando compreensões a partir de um diálogo filosófico entre</p><p>o pedagógico, a matemática e a educação matemática.</p><p>Os trabalhos evidenciam inferências frente a avaliação tanto em larga escala e</p><p>padronizadas, como a avaliação do processo escolar, aos processos curriculares em</p><p>suas produções e mudanças diante de novos desafios. Colocam em pauta a função</p><p>social da matemática em um aspecto de letramento e de emancipação, apontando</p><p>inclusive para aspectos históricos que influenciaram a produção do pensamento e do</p><p>conhecimento matemático e de recursos didáticos para seu ensino. Discute, também,</p><p>o processo de formação de professores no cenário brasileiro e suas influências no</p><p>fazer pedagógico.</p><p>A Matemática como Ciência é pensada nos trabalhos que enfocam os objetos</p><p>matemáticos no contexto de aprendizagem, e como aplicações nas reflexões acerca</p><p>do conhecimento matemático ligados as práticas da vida humana, como aquelas que</p><p>envolvem a educação financeira ou, ainda, o uso da matemática nas engenharias.</p><p>A Educação Matemática é revelada nas análises referente as práticas de sala</p><p>de aula – contanto com discussões inclusivas, nas tendências pedagógicas para seu</p><p>ensino, nas avaliações e no desenvolvimento profissional docente para o ensino de</p><p>matemática, tanto na Educação Básica como na Educação Superior.</p><p>Este volume é direcionado para todos os educadores que pensam, refletem</p><p>e analisam a matemática no âmbito da ciência, bem como no âmbito da educação</p><p>matemática.</p><p>Annaly Schewtschik</p><p>SUMÁRIO</p><p>CAPÍTULO 1 ................................................................................................................ 1</p><p>ESTRUTURAS DE AVALIAÇÃO ESCOLAR PARA MAPEAR HABILIDADES QUE TOMA COMO BASE</p><p>AS TAXONOMIAS DE BLOOM EM QUESTÕES DE MÚLTIPLA ESCOLHA</p><p>Henrique Araken Martins</p><p>DOI 10.22533/at.ed.2131914021</p><p>CAPÍTULO 2 .............................................................................................................. 16</p><p>AS AVALIAÇÕES EXTERNAS DE MATEMÁTICA NOS ANOS FINAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL:</p><p>OS RESULTADOS DAS ESCOLAS DA ZONA DA MATA MINEIRA</p><p>Matheus Enrique da Cunha Pimenta Brasiel</p><p>Cristiane Aparecida Baquim</p><p>DOI 10.22533/at.ed.2131914022</p><p>CAPÍTULO 3 .............................................................................................................. 28</p><p>ÍNDICE DE DESENVOLVIMENTO DA EDUCAÇÃO BÁSICA COMO POLÍTICA PÚBLICA: ESTUDO</p><p>CURRICULAR DE MATEMÁTICA</p><p>Ednéia Consolin Poli</p><p>DOI 10.22533/at.ed.2131914023</p><p>CAPÍTULO 4 .............................................................................................................. 38</p><p>O ENEM E SUAS REPERCUSSÕES NO DISCURSO PEDAGÓGICO DE PROFESSORES DE</p><p>MATEMÁTICA NO ENSINO MÉDIO</p><p>Célio de Mendonça Clemente</p><p>Denize da Silva Souza</p><p>DOI 10.22533/at.ed.2131914024</p><p>CAPÍTULO 5 .............................................................................................................. 47</p><p>A MATEMÁTICA ESCOLAR REDUZIDA A FAZER CONTAS: UMA REPRESENTAÇÃO DA</p><p>MATEMÁTICA ESCOLAR?</p><p>Maria Inmaculada Chao Cabanas</p><p>Tarso Bonilha Mazzotti</p><p>DOI 10.22533/at.ed.2131914025</p><p>CAPÍTULO 6 .............................................................................................................. 56</p><p>A APROPRIAÇÃO DO CONHECIMENTO MATEMÁTICO PELO ALUNO: UMA DISCUSSÃO SOBRE O</p><p>PROCESSO DE TRANSFERÊNCIA</p><p>Renato Francisco Merli</p><p>Leonardo Severo</p><p>DOI 10.22533/at.ed.2131914026</p><p>CAPÍTULO 7 .............................................................................................................. 70</p><p>A PRODUÇÃO DE SIGNIFICADOS MATEMÁTICOS EM PROCESSOS DE ENSINO E APRENDIZAGEM</p><p>NA CONSTRUÇÃO DOS NÚMEROS REAIS</p><p>Mariana dos Santos Cezar</p><p>Rodolfo Chaves</p><p>DOI 10.22533/at.ed.2131914027</p><p>CAPÍTULO 8 .............................................................................................................. 80</p><p>COMO O SUJEITO COM SÍNDROME DE DOWN APRENDE MATEMÁTICA?</p><p>Christiane Milagre da Silva Rodrigues</p><p>DOI 10.22533/at.ed.2131914028</p><p>CAPÍTULO 9 .............................................................................................................. 90</p><p>A MATEMÁTICA COMO INSTRUMENTO PARA O DESENVOLVIMENTO HUMANO E EMANCIPAÇÃO</p><p>SOCIAL</p><p>Rafael Machado da Silva</p><p>Daiane Aparecida Alves Gomes</p><p>Maria A. Lima Piai</p><p>DOI 10.22533/at.ed.2131914029</p><p>CAPÍTULO 10 ............................................................................................................</p><p>Fonte: Dados da pesquisa, 2015.</p><p>Essa redução se deve, principalmente, ao fato de que as escolas que ficaram</p><p>de fora da amostra não participaram da Prova Brasil, pois possuíam número de</p><p>alunos matriculados inferior à 20, critério estabelecido pelo INEP para a aplicação das</p><p>avaliações. Ao analisar esses dados do ponto de vista pedagógico, observa-se uma</p><p>situação um tanto quanto desfavorável, pois a não participação exclui as escolas do</p><p>propósito de melhoria da qualidade da educação vinculada às propostas das políticas</p><p>educacionais atuais, visto que, sem o resultado da Prova Brasil, essas escolas não</p><p>serão contempladas pelo Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB). Para</p><p>estas escolas que ficam “sem IDEB”, é levada em consideração para o planejamento</p><p>de políticas públicas educacionais e distribuição de recursos, somente a nota obtida</p><p>pela escola na avaliação do Proeb/SIMAVE.</p><p>Portanto, nessa pesquisa, o número de escolas observadas foi reduzido em</p><p>28,57% (12), totalizando uma amostra de 30 escolas, uma vez que apenas 71,42%</p><p>(30) das escolas da MRUbá participaram de todas as edições das duas avaliações</p><p>externas durante o período de análise. Ou seja, das 42 escolas previstas, inicialmente,</p><p>para participar da pesquisa, somente 30 participaram de todas as avaliações externas</p><p>nos anos analisados.</p><p>Na tabela a seguir, é possível observar os dados gerais obtidos, no 9º ano, nas</p><p>três edições analisadas da Prova Brasil no país, no estado de Minas Gerais e na</p><p>MRUbá.</p><p>Região 2007 2009 2011 Média</p><p>Brasil 240,56 240,29 243,2 241,35</p><p>MG 252,60 257,54 263,2 257,78</p><p>MRUbá 263,86 266,46 273,3 267,87</p><p>Tabela 3 – Dados de Proficiência nas avaliações de Matemática da Prova Brasil, no Brasil, em</p><p>Minas Gerais e na Microrregião de Ubá (MRUbá). Dados das edições de 2007, 2009 e 2011 no</p><p>9º Ano do Ensino Fundamental II</p><p>Fonte: Dados da pesquisa, 2015.</p><p>Na tabela 4 a seguir, apresenta-se os resultados referentes à avaliação do Proeb</p><p>no estado de Minas Gerais e na MRUbá, nos anos analisados na pesquisa.</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 2 24</p><p>Região 2010 2011 2012 Média</p><p>MG 264,35 260,45 267,3 264.03</p><p>MRUbá 274,33 275,76 274,50 274,87</p><p>Tabela 4 – Dados da Proficiência das avaliações de Matemática do Proeb para o 9º ano do</p><p>Ensino Fundamental II, em Minas Gerais e na Microrregião de Ubá. Dados das edições de</p><p>2010, 2011 e 2012</p><p>Fonte: Dados da pesquisa, 2015.</p><p>Observa-se, nas tabelas 3 e 4, que as proficiências obtidos por Minas Gerais e</p><p>pela MRUbá, em todas as edições da Prova Brasil, são superiores às médias do país.</p><p>Este fato é constantemente noticiado pelo governo do estado na mídia, sobretudo, em</p><p>épocas de campanhas eleitorais, relacionando-o às investidas do estado no campo</p><p>das políticas públicas implementadas na educação. Sendo assim, essa diferença entre</p><p>as proficiências do Brasil comparadas com o estado pode ser explicada pelo fato de o</p><p>estado de Minas Gerais ser um dos pioneiros na implantação de avaliações externas</p><p>de âmbito estadual, além de indicarem um reflexo dos programas implementados nas</p><p>escolas, como “Escola Referência” e o “14º Salário”.</p><p>Alguns dos efeitos dessas políticas podem ser observados no interior das escolas:</p><p>o acirramento da competição entre escolas e entre professores; a disputa por alunos</p><p>mais preparados para a realização das provas; a mudança na rotina das escolas</p><p>em função da aplicação de tantas avaliações; um currículo revisado para atender às</p><p>matrizes de referência; o treinamento de alunos para atender às exigências do modelo</p><p>de avaliação que é utilizado; o adoecimento docente em função da forte pressão por</p><p>resultados, dentre tantos outros.</p><p>O “prêmio produtividade” conhecido como “14º salário”, foi um incremento</p><p>remuneratório concedido apenas aos professores e servidores das escolas estaduais,</p><p>em função de seus resultados nas avaliações do Simave. Esse prêmio deixou de vigorar</p><p>a partir do ano de 2015, quando outro grupo gestor assumiu a Secretaria de Estado de</p><p>Eduação. Esse prêmio, era uma prática meritocrática oficialmente reconhecida como</p><p>fundamental para o cumprimento do Acordo de Resultados firmado entre as instituições</p><p>educacionais do governo de Minas, visando melhorar os índices do sistema de ensino.</p><p>Ou seja, a produtividade, entendida como os resultados positivos nas avaliações e o</p><p>alcance de metas objetivas, é fator condicionante para uma suposta valorização do</p><p>trabalho docente que, na realidade, deveria preceder essa lógica produtivista.</p><p>Quanto às “Escolas Referência”, estas destinam-se à promoção do</p><p>desenvolvimento profissional de educadores e à disseminação da cultura de trabalho</p><p>em grupo nas escolas estaduais que integram a Rede de Escolas-Referência. Ser</p><p>Escola Referência significa ser privilegiada em programas e ações de investimento</p><p>financeiro e técnico oriundos da Secretaria Estadual de Educação/MG, promovendo</p><p>especialmente melhorias na estrutura física do estabelecimento e cursos de formação</p><p>continuada para os profissionais da educação. Tais escolas, também, acabam por</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 2 25</p><p>tornar-se piloto nas iniciativas governamentais de implantação de novos projetos,</p><p>antes de serem ampliados para todas as escolas da rede.</p><p>Observa-se também, a partir da tabela 4, que a MRUbá, na avaliação do Proeb,</p><p>também apresenta resultados superiores aos do estado mineiro. Esses dados são</p><p>significativos, pois esta microrregião tem sido um espaço de confluência de ações</p><p>direcionadas para o cumprimento das metas que lhes são atribuídas. Ou seja, há uma</p><p>completa adequação da dinâmica das escolas à perspectiva avaliadora e comparativa</p><p>posta pelo Estado avaliador.</p><p>Nesse estudo, notou-se que a MRUbá, no 9º Ano, concentra a maioria de suas</p><p>escolas (97%%) no Padrão de Desempenho Intermediário, ou seja, 29 escolas,</p><p>analisadas neste estudo, estão neste padrão de desempenho. Apenas uma escola</p><p>se encontra no padrão de desempenho Recomendado, representando um percentual</p><p>de 3%. Constata-se, ainda, que nenhuma das escolas que investigamos apresentou</p><p>um Padrão de Desempenho Baixo, indicando que esta região preza pela qualidade</p><p>da educação e/ou pela adequação ao padrão avaliativo que lhe é imposto, pois estes</p><p>resultados refletem que os alunos avaliados, além de apresentarem as habilidades</p><p>esperadas, possuem maiores possibilidades de cumprir, com sucesso, a trajetória</p><p>escolar e determinam, para todo o sistema, a grande meta de qualidade a ser</p><p>perseguida.</p><p>Com esta pesquisa foi possível verificar que professores e gestores das escolas</p><p>são submetidos a pressões relativas às metas e resultados a serem alcançados via</p><p>avaliações externas, resultados estes que estão ligados aos investimentos recebidos</p><p>pelas escolas e abonos salariais. Muito além de serem utilizadas para nortear as</p><p>políticas educacionais, criando políticas capazes de melhorar o ensino oferecido aos</p><p>alunos, as avaliações têm se constituído em um aparato de regulação social, passando</p><p>a controlar não apenas o currículo formal, mas a autonomia do professor em relação</p><p>ao conteúdo que está sendo ensinado.</p><p>5 | CONSIDERAÇÕES FINAIS</p><p>Uma questão relevante debatida nesse trabalho, é que a prática avaliativa</p><p>centralizada tem alterado os rumos da prática pedagógica nas salas de aula, pois os</p><p>professores adaptaram o seu trabalho (currículo, métodos, didática, avaliação interna,</p><p>etc.) visando atender aos objetivos das avaliações externas, quer seja por causa</p><p>da pontuação, que faz um ranking entre as escolas, quer seja por causa do Prêmio</p><p>Produtividade, oferecido pelo Estado de Minas Gerais, no período que esta pesquisa foi</p><p>realizada. Além disso, as opções político-administrativas adotadas acabam por acirrar</p><p>a disputa por alunos com maior potencial de realizarem as provas com eficiência,</p><p>excluindo os alunos com maiores dificuldades cognitivas e aqueles que apresentam</p><p>alguma deficiência e que buscam, na escola, um caminho para a sua inclusão na</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 2 26</p><p>sociedade do conhecimento.</p><p>Com relação aos resultados alcançados nas avaliações comparadas, tendo</p><p>em vista que a microrregião alcançou resultados superiores aos do Estado de Minas</p><p>Gerais e aos do Brasil no ciclo analisado, verificou-se que houve uma adequação,</p><p>mesmo que com medidas artificiais, como veremos a seguir, aos propósitos desse</p><p>modelo de política. Tais medidas artificiais podem estar relacionadas a rotineiros</p><p>“treinamentos” referentes ao tipo de prova que realizarão (preenchimento de gabarito,</p><p>exercícios de reforço, provas similares e até mesmo reprodução de provas aplicadas</p><p>em anos anteriores, limite de tempo, etc.), enfocando mais os conteúdos de Português</p><p>e Matemática, já que serão esses os domínios a serem avaliados. Apesar de a MRUbá</p><p>apresentar resultados positivos, ainda há muito o que se avançar, visto que das 30</p><p>escolas estudadas, apenas uma apresenta resultados no padrão recomendado.</p><p>Então, ainda é preciso que a grande maioria das escolas desta microrregião promova</p><p>ações e estimule novas práticas pedagógicas para que seus alunos desenvolvam</p><p>habilidades que os impulsionem do padrão intermediário para o tão esperado padrão</p><p>recomendado.</p><p>Fatores internos à escola – como formação docente, formas alternativas de</p><p>organização, planejamento de ações, análises qualitativas dos relatórios, treinamento</p><p>para a realização das provas, dentre outros – são importantes nos resultados finais</p><p>alcançados. Mas cabe ressaltar que, além dos esforços institucionais de adequação</p><p>ao modelo avaliador implementado, outras ações relacionadas à população</p><p>historicamente excluída da escola, e que hoje se encontra excluída “dentro” das</p><p>escolas, são fundamentais para a melhoria da qualidade da educação.</p><p>Por fim, observou-se que as avaliações externas podem ser capazes de ajudar</p><p>a escola a olhar para si mesma, reconhecendo os pontos fortes e as fragilidades em</p><p>suas práticas, sendo um instrumento de complementação das avaliações internas das</p><p>unidades escolares, e também servir como instrumento de melhoria da educação e</p><p>aperfeiçoamento da prática escolar. Porém, para que isto de fato ocorra, é necessário</p><p>que os modelos de avaliações em larga escala existentes atualmente sejam revistos.</p><p>Somente penalizar quem apresenta resultados ruins e gratificar quem apresenta bons</p><p>resultados, pouco contribui para o avanço da nossa educação, pois da forma como</p><p>as metas são impostas pelo Estado, bem como os resultados obtidos nas avaliações</p><p>externas, “pressionam” as escolas, que, muitas vezes, optam por um simples</p><p>treinamento dos alunos para a realização das avaliações ao invés de se valorizar o</p><p>desenvolvimento crítico da aprendizagem dos estudantes.</p><p>6 | AGRADECIMENTOS</p><p>Agradeço primeiramente a Deus, por ter iluminado minha mente neste trabalho.</p><p>À minha orientadora de Iniciação Científica e coorientadora de mestrado, Prof.ª Dra.</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 2 27</p><p>Cristiane Aparecida Baquim, do Departamento de Educação da Universidade Federal</p><p>de Viçosa. À Fundação de Amparo a Pesquisa do estado de Minas Gerais (FAPEMIG),</p><p>pela concessão de bolsas e financiamento do projeto de Iniciação Científica, sem as quais</p><p>não seria possível a realização desse trabalho. À Coordenação de Aperfeiçoamento de</p><p>Pessoal de Nível Superior (CAPES), por me conceder bolsa de mestrado no Programa</p><p>de Pós-graduação em Educação da Universidade Federal de Viçosa, onde eu pude</p><p>prosseguir meus estudos e minha formação. À Universidade Federal de Viçosa e ao</p><p>Departamento de Educação, por ceder o espaço para a realização da pesquisa. E</p><p>obrigado a todas as outras pessoas que me ajudaram nesta pesquisa, mas que não</p><p>citei neste espaço.</p><p>REFERÊNCIAS</p><p>AFONSO, A.J. (2009). Nem tudo o que conta é mensurável ou comparável: crítica à accountability</p><p>baseada em testes estandardizados e rankings escolares. In: Revista Lusófona de Educação, Lisboa,</p><p>n. 13, 13-29.</p><p>______(2010). Avaliação Educacional. Disponível em .</p><p>BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado</p><p>Federal: Centro Gráfico.</p><p>CAEd/UFJF. Matriz de referência para avaliação: SIMAVE - Matemática. Juiz de Fora: CAEd, 2009.</p><p>CRESPO, A. A. Estatística fácil. 13. ed. São Paulo: Saraiva: 1995.</p><p>D’AMBROSIO, U. Prefácio. In: BORBA, M. C.; ARAUJO, J. L. (Org). Pesquisa qualitativa em</p><p>educação matemática. Belo Horizonte: Autêntica, 2006.</p><p>FREITAS, K. S. (2009). Progestão: como articular a gestão pedagógica da escola com as políticas</p><p>públicas da educação para a melhoria do desempenho escolar?. Módulo X. Brasília: CONSED.</p><p>INEP (2015). Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira. SAEB.</p><p>Disponível em http://portal.inep.gov.br/web/saeb/aneb-e-anresc.</p><p>MEDEIROS, Carlos Augusto de. Estatística aplicada à educação. Brasília: Universidade de Brasília,</p><p>2007.</p><p>OLIVEIRA, A. P. de M. (2011). A Prova Brasil como política de regulação da rede pública do Distrito</p><p>Federal. Dissertação de Mestrado. Brasília: Universidade de Brasília.</p><p>SEVERINO, Antônio Joaquim. Metodologia do trabalho científico. 23. ed. rev. e atual. São Paulo:</p><p>Cortez, 2007.</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 3 28</p><p>CAPÍTULO 3</p><p>ÍNDICE DE DESENVOLVIMENTO DA EDUCAÇÃO</p><p>BÁSICA COMO POLÍTICA PÚBLICA: ESTUDO</p><p>CURRICULAR DE MATEMÁTICA</p><p>Ednéia Consolin Poli</p><p>Universidade Estadual de Londrina</p><p>Londrina - Paraná</p><p>RESUMO: Este estudo tem como objetivo</p><p>analisar os dados que compõem o</p><p>Índice de Desenvolvimento da Educação</p><p>Básica/2013, sendo um deles o currículo</p><p>a partir da proficiência de Matemática. Os</p><p>procedimentos metodológicos nessa pesquisa</p><p>são quantitativos, qualitativos e de análise</p><p>documental. Discute-se os resultados do</p><p>IDEB de cinco escolas estaduais incluídas no</p><p>projeto OBEDUC nas questões curriculares. Os</p><p>pressupostos teóricos que embasam a pesquisa</p><p>são: Freitas (1995), Charlot (2000), entre</p><p>outros. As análises deste estudo subsidiam as</p><p>propostas de intervenção desenvolvidas nas</p><p>escolas. Como resultados, constata-se que nas</p><p>escolas analisadas nem sempre um aumento</p><p>de aprovação foi acompanhado por um maior</p><p>domínio de conhecimento na área em questão.</p><p>Avaliações em larga escala contribuem também</p><p>para uma visualização dos resultados de</p><p>políticas públicas implementadas nas escolas e</p><p>na busca de caminhos para minimizar os efeitos</p><p>das diferenças culturais, sociais e educacionais</p><p>do país.</p><p>PALAVRAS-CHAVE: Currículo; Matemática;</p><p>Avaliação em Larga Escala; IDEB; Políticas</p><p>Públicas.</p><p>1 | INTRODUÇÃO</p><p>As avaliações em larga escala tornaram-se</p><p>ponto comum de discussão no âmbito escolar a</p><p>partir do final do século XX e tomaram impulso no</p><p>século XXI. Os resultados divulgados permitem</p><p>nos meios escolares muitas interpretações;</p><p>no entanto, entre professores as discussões</p><p>e ações realizadas a partir desses dados têm</p><p>sido pouco utilizadas para balizar mudanças ou</p><p>replanejamento de ações no ambiente escolar.</p><p>A questão curricular tem sido objeto de</p><p>pesquisas da autora que visa a uma leitura</p><p>dos dados a partir do IDEB e da proficiência</p><p>de Matemática. Esses dados abrem a</p><p>possibilidade de outros olhares, outros</p><p>caminhos interpretativos para ler a escola, no</p><p>sentido de que não somente professores, mas</p><p>toda a comunidade escolar possa interpretar</p><p>esses resultados e pensar a sua escola.</p><p>Outros autores têm trabalhado esses dados</p><p>com diferentes possibilidades interpretativas</p><p>(ALVES; SOARES; XAVIER, 2014; ZAMPIRI;</p><p>SOUZA, 2014; SOARES; ANDRADE, 2006).</p><p>Este estudo tem como objetivo analisar os</p><p>dados que compõem o IDEB/2013 por meio das</p><p>avaliações em larga escala, sendo um deles a</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 3 29</p><p>análise curricular da proficiência de Matemática. Isso inclui os descritores, os índices</p><p>e os dados de aprovação dos alunos das cinco escolas participantes do projeto de</p><p>pesquisa desenvolvido na Universidade Estadual de Londrina. As análises e resultados</p><p>deste estudo têm por objetivo subsidiar e contribuir com as propostas de intervenção</p><p>a serem desenvolvidas pelo</p><p>OBEDUC (Observatório da Educação) desenvolvido por</p><p>esta Instituição e financiado pelo MEC (Ministério da Educação), por meio da CAPES</p><p>(Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior).</p><p>Para a escolha das escolas que fazem parte da pesquisa, levou-se em</p><p>consideração um estudo preliminar dos resultados do IDEB desde os primeiros índices</p><p>publicados. Para esse estudo, realizou-se uma análise da proficiência indicada pela</p><p>escola em cada ano-base dos resultados.</p><p>O IDEB, criado em 2007, é considerado o indicador capaz de aferir os resultados</p><p>educacionais dos estados, municípios, redes de ensino e escolas brasileiras. Tem-se</p><p>constituído, por seu caráter abrangente, em um instrumento de prestação de contas</p><p>por meio das políticas públicas acerca da qualidade da educação no País.</p><p>Têm-se, neste estudo, para a análise dos dados, dois momentos importantes.</p><p>Primeiro, a decisão da direção a tomar para fazer a análise quantitativa dos resultados</p><p>dos testes e, segundo, a opção por realizar uma análise qualitativa e documental dos</p><p>resultados dos testes com os descritores, os índices e os dados de aprovação dos</p><p>alunos para a análise curricular de matemática.</p><p>2 | A MATEMÁTICA COMO PONTE PARA A LEITURA CURRICULAR</p><p>O ensino de Matemática nas escolas tem enfrentado questões internas que são</p><p>inerentes à sociedade na qual vivemos. O conhecimento é um bem social do qual nem</p><p>sempre o aluno se apropria.</p><p>Conforme argumenta Freitas (1995), discutindo a relação escola e sociedade:</p><p>Na escola capitalista, os alunos encontram-se expropriados do processo do</p><p>trabalho pedagógico e o produto do trabalho não chega a ser apropriado por boa</p><p>parte dos mesmos, e ainda que, em alguns casos, fique em seu poder, carece</p><p>de sentido para eles. O aluno é alienado do processo e como tal é alienado do</p><p>significado de seu trabalho, do significado do conhecimento que produz – quando</p><p>produz (FREITAS, 1995, p. 230).</p><p>O conhecimento, por ser um bem posto na sociedade, pode levar a uma visão</p><p>ingênua: “só não aprende quem não quer”. A relação entre escola e sociedade culpa,</p><p>dessa forma, os alunos pela não apropriação do conhecimento, quando o problema</p><p>reside não no conhecimento, mas em como fazer com que as diferentes linguagens</p><p>sejam democratizadas para todas as classes sociais. A discussão diz respeito ao</p><p>saber do aluno, à utilização do referencial construído pelo aluno e que ele utiliza para</p><p>resolver os itens nas avaliações em larga escala.</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 3 30</p><p>Charlot (2000), ao discutir o saber, apresenta a distinção que faz Monteil (1985)</p><p>entre informação, conhecimento e saber:</p><p>Informação é um dado exterior ao sujeito;</p><p>Conhecimento é o resultado de uma experiência pessoal, ligada às atividades do</p><p>sujeito, é intransmissível e carregado de subjetividade;</p><p>Saber é informação de que o sujeito se apropria; é, também, conhecimento; porém,</p><p>desvinculado da subjetividade, é um produto comunicável (CHARLOT, 2000, p.</p><p>61).</p><p>A informação pode ser guardada, armazenada num banco de dados e é</p><p>recebida pelo sujeito através de pessoas, mídia ou outro meio de comunicação,</p><p>sendo considerada numa relação de objetividade. O conhecimento, considerado</p><p>numa relação de subjetividade, opera-se quando se apreende o resultado de uma</p><p>experiência pessoal, sendo então considerado intransmissível. O saber é uma relação</p><p>de objetividade; no entanto, o sujeito se apropria dele e pode comunicá-lo. O aluno</p><p>mobiliza diferentes saberes, ao responder às questões, e estes saberes vêm inter-</p><p>relacionados a outros fatores, sejam eles culturais ou sociais.</p><p>Pires (2003) realizou um estudo a partir de questões de Matemática resolvidas</p><p>pelos alunos de um curso de licenciatura em Matemática. Na discussão sobre o saber</p><p>destes alunos ressalta um fator que deve ser pensado e levado em consideração para</p><p>avaliar o saber matemático, as instituições a que os alunos pertenceram ao longo da</p><p>vida, entre as quais a escola como uma das instâncias onde o saber matemático é</p><p>trabalhado de maneira sistemática:</p><p>um indivíduo pertence a várias instituições, como a família e a escola, cujas relações</p><p>com esse ou aquele saber podem ser diferentes. A questão da relação com o</p><p>saber é também aquela das formas de existência do saber nas instituições e dos</p><p>efeitos que essas implicam. Isso quer dizer que a escola não é apenas um lugar</p><p>que recebe alunos dotados destas ou daquelas relações com os saberes, mas é,</p><p>também, um lugar que induz às relações com os saberes (PIRES, 2003, p. 17).</p><p>Este é outro ponto que define o saber do aluno, que faz a sua relação com o</p><p>mundo e no mundo, enquanto ser social. Define Charlot (2000, p. 63): não há sujeito</p><p>do saber e não há saber senão em uma certa relação com o mundo, que vem a ser,</p><p>ao mesmo tempo e por isso mesmo, uma relação com o saber. Essa relação com o</p><p>mundo é também relação consigo mesmo e relação com os outros. Implica uma forma</p><p>de atividade e, acrescentarei, uma relação com a linguagem e uma relação com o</p><p>tempo.</p><p>Os autores, discutindo sobre o saber do aluno, colocam este como um ser que,</p><p>incluído no mundo, também modifica seus lugares pelo saber e constrói relações no</p><p>tempo e fora do espaço escolar.</p><p>Neste estudo, o resultado que o aluno comunica através de suas respostas nos</p><p>testes será conceituado como saber, segundo Charlot (2000). Segundo D’Ambrosio</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 3 31</p><p>(2004), esse movimento na sociedade gera uma cultura escolar que precisa ser lida e</p><p>interpretada, neste caso específico o conhecimento fora e dentro do contexto escolar,</p><p>comunicado por ações que caracterizam uma cultura.</p><p>Na visão de Ponte (1992), o conhecimento matemático tem quatro características</p><p>fundamentais:</p><p>Formalização segundo uma lógica bem definida;</p><p>Verificabilidade, que permite estabelecer consensos acerca da validade de cada</p><p>resultado;</p><p>Universalidade, isto é, o seu caráter transcultural e a possibilidade de serem</p><p>aplicados aos mais diversos fenômenos e situações;</p><p>Generabilidade, ou seja, a possibilidade de levar à descoberta de coisas novas</p><p>(PONTE, 1992, p. 199).</p><p>O conhecimento caracteriza-se por ser uma construção humana, sujeita às</p><p>mudanças e desenvolvimentos talvez infindáveis (PONTE, 1992, p. 199); mesmo</p><p>assim, não tem sido trabalhado com vistas a uma preocupação social mais ampla e</p><p>nem sempre atende às expectativas dos professores, alunos e da sociedade em geral.</p><p>Ter uma visão coerente do que significa ser hoje em dia um “sujeito letrado” na nossa</p><p>realidade e criar oportunidades de inclusão social deveriam ser atualmente nossos</p><p>maiores objetivos como educadores.</p><p>Estes conhecimentos matemáticos, que por vezes são construídos também na</p><p>sala de aula, têm suscitado debates com relação ao papel do professor, do aluno e da</p><p>sociedade na construção do mesmo.</p><p>Ponte (1992, p. 202), ao discutir os elementos constitutivos do saber</p><p>matemático, com relação à formalização, distingue quatro níveis de competências no</p><p>saber matemático, de acordo com sua função e nível de complexidade. São eles:</p><p>competências elementares, intermediárias, avançadas (ou de ordem superior) e de</p><p>ordem geral.</p><p>São competências elementares “processos de simples memorização e execução”.</p><p>Competências intermediárias são aquelas que “implicam processos com certo grau de</p><p>complexidade, mas não exigem muita criatividade”.</p><p>Competências complexas exigem do aluno “uma capacidade significativa de lidar</p><p>com situações novas”. Os saberes de ordem geral “incluem os meta-saberes, ou seja,</p><p>saberes com influência nos próprios saberes”.</p><p>Conforme o Quadro 1, Ponte (1992, p. 204) relata os elementos constitutivos do</p><p>saber matemático:</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 3 32</p><p>Competências Elementares</p><p>Conhecimento de factos específicos e terminologia</p><p>Identificação e compreensão de conceitos</p><p>Capacidade de execução de "procedimentos"</p><p>Domínio de processos de cálculo</p><p>Capacidade de "leitura" de textos matemáticos simples</p><p>Competências Intermediárias</p><p>Compreensão de relações matemáticas</p><p>(teoremas, proposições)</p><p>Compreensão duma argumentação matemática</p><p>Resolução de problemas (nem triviais, nem muito complexos)</p><p>Aplicação a situações simples</p><p>Competências Avançadas (ou de Ordem Superior)</p><p>Exploração/investigação de situações: formulação e testagem de conjecturas</p><p>Formulação de problemas</p><p>Resolução de problemas complexos</p><p>Realização e crítica de demonstrações</p><p>Análise crítica de teorias matemáticas</p><p>Aplicação a situações complexas/modelação</p><p>Saberes de ordem geral</p><p>Conhecimento dos grandes domínios da Matemática e das suas inter-relações</p><p>Conhecimento de aspectos da história da Matemática e das suas relações com as ciências</p><p>e a cultura em geral</p><p>Conhecimento de momentos determinantes do desenvolvimento da Matemática (grandes</p><p>problemas, crises, grandes viagens)</p><p>QUADRO 1 - Elementos constitutivos do saber matemático</p><p>Fonte: BROWN et al. (1992)</p><p>Estas competências postuladas são colocadas em níveis, mas em nenhum</p><p>momento o autor argumenta que eles têm de ser alcançados um a um ou primeiro um</p><p>depois o outro; a posição é muito clara quanto ao formalismo.</p><p>As relações entre os níveis devem existir; dão-se pela “experiência estendida</p><p>no tempo e conduzida com certa continuidade e profundidade”. O conhecimento ou o</p><p>saber, o autor os utiliza como sinônimos, não acontecem em forma de degraus, que</p><p>devem ser alcançados um após o outro, e sim na forma de complexidade e aquisição</p><p>de saberes a partir de momentos fundamentais que são a ação e a reflexão.</p><p>Ponte (1992, p. 203) afirma que na Matemática é muito importante a “interação</p><p>entre diversas formas de representação, sendo as mais fundamentais (pelo menos no</p><p>ensino básico) as representações numérica, gráfica e algébrica”. Além da interação</p><p>nas diversas formas de representação, o autor propõe que outros espaços, além dos</p><p>escolares, componham o cenário do saber do aluno, concorrendo para isso novas</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 3 33</p><p>formas de saberes e de envolvimento do aluno com a realidade.</p><p>Argumenta Ponte (1992) que o envolvimento individual não é o único componente</p><p>que concorre para o saber matemático; há outros elementos: fatores culturais, sociais</p><p>(classe social, família, microgrupo), de ordem institucional (escola e outros espaços de</p><p>aprendizagem matemática) e também a capacidade de ordem individual.</p><p>A relação entre saber, professor e aluno tem sido discutida em vários enfoques,</p><p>quais sejam: pedagógico, político e cultural. Essa relação é tão íntima que, para dar</p><p>conta de explicar a aprendizagem que se espera que o aluno tenha adquirido ao final</p><p>de certo tempo de escolaridade, diferentes abordagens são indicadas.</p><p>3 | UMA ANÁLISE CURRICULAR</p><p>Nessa perspectiva as análises a seguir abrem várias frentes e olhares sobre a</p><p>aprendizagem em matemática na escola pública.</p><p>A análise dos conteúdos acertados pelos alunos se fez através das Matrizes de</p><p>Referência (MR), e o desempenho na Prova Brasil foi apresentado em uma escala de</p><p>desempenho por disciplina composta por níveis.</p><p>Na escala de proficiência existem 10 níveis para explicar o desempenho dos</p><p>alunos: 125, 150, 175 e assim sucessivamente até o nível 375, sendo que os níveis</p><p>variam de 25 em 25 pontos. Os resultados da Prova Brasil, que se discute a seguir,</p><p>referem-se às cinco escolas que participam da pesquisa. Na escala, no ano de 2013,</p><p>a proficiência em Matemática das escolas varia de 221 a 262, sendo que a média das</p><p>proficiências dos estados do Brasil é de 224,61 e no Paraná é de 215,36. Assim, fez-se</p><p>uma única análise dos conteúdos presentes na escala. Para referenciar a metodologia</p><p>da pesquisa neste artigo, apresentam-se os dados da escala de proficiência de</p><p>Matemática de 2013. Como os níveis indicam apenas uma posição na escala, fez-se</p><p>uma interpretação pedagógica dos resultados, descrevendo no nível indicado o grupo</p><p>de conhecimento ou “saber” que os alunos demonstraram ter desenvolvido do 5º ao 9º</p><p>ano do ensino fundamental.</p><p>Cada nível é constituído pelas habilidades neles descritas, somadas às</p><p>habilidades constantes nos níveis anteriores; consequentemente, os níveis finais da</p><p>escala são compostos pelas mais altas habilidades previstas nas matrizes e que os</p><p>alunos conseguem apresentar ao responder às provas. Pela localização numérica do</p><p>desempenho da escala, é possível saber quais habilidades os alunos já construíram,</p><p>quais estão desenvolvendo e aquelas a serem alcançadas. Entretanto, é necessário</p><p>ressaltar que não é esperado dos alunos do 9º ano o alcance dos níveis finais da</p><p>escala, pois estes representam as habilidades desenvolvidas ao longo de todo o</p><p>percurso do ensino fundamental.</p><p>É apresentada para as escolas, juntamente com o relatório de desempenho de</p><p>cada uma, a média dos resultados em escalas nacionais, estaduais e municipais.</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 3 34</p><p>Analisando do macro para o micro, o Brasil (PROVA BRASIL, 2013) teve as seguintes</p><p>médias de desempenho, com relação à Matemática nas escolas estaduais: 5º ano,</p><p>com 215,36 pontos; 9º ano, com 251,93 pontos. O Estado do Paraná, por sua vez,</p><p>obteve uma média de 189,56 pontos entre as escolas estaduais.</p><p>Os resultados do IDEB são baseados na taxa de aprovação dos alunos e no</p><p>desempenho dos estudantes nas avaliações em larga escala do INEP, o SAEB para</p><p>unidades da federação e país e a Prova Brasil para os municípios. Seu objetivo principal</p><p>é identificar as escolas com baixo rendimento e baixa proficiência e acompanhar o</p><p>desempenho dos alunos dessas escolas. A partir do IDEB, o Ministério da Educação</p><p>estipulou que todas as escolas, seja da rede municipal, estadual ou federal, alcancem a</p><p>nota 6 até o ano 2022, a fim de que o Brasil alcance a média dos países desenvolvidos.</p><p>As escolas em questão, em 2013, tiveram o IDEB variando de 2,7 a 4,3, sendo</p><p>que a projeção para 2021 varia de 4,1 a 5,3 por escola. O IDEB das escolas estaduais,</p><p>em 2013, no 5º ano foi de 5,2 e do 9º ano foi 4,0. A taxa de aprovação, em 2013, das</p><p>escolas pesquisadas, variou de 58,6% a 89,6%. A análise foi realizada levando em</p><p>consideração três documentos: as Matrizes de Referência, a proposta curricular do</p><p>estado e o resultado da Prova Brasil.</p><p>Com a variação dos níveis de desempenho dos alunos de Matemática, têm-se o</p><p>que os alunos das escolas pesquisadas conseguem fazer nesse nível e exemplos de</p><p>competências. A Prova Brasil não utilizou itens que avaliam as habilidades abaixo do</p><p>nível 125. Os alunos localizados abaixo desse nível requerem atenção especial, pois</p><p>ainda não demonstraram ter desenvolvido as habilidades mais simples apresentadas</p><p>para os alunos do 5º ano, como por exemplo: somar e subtrair números decimais; fazer</p><p>adição com reserva; multiplicar e dividir com dois algarismos; trabalhar com frações.</p><p>No nível 1 – 125 a 150 –, os alunos do 5º e do 9º anos resolvem problemas de</p><p>cálculo de área com base na contagem das unidades de uma malha quadriculada e,</p><p>apoiados em representações gráficas, reconhecem a quarta parte de um todo.</p><p>No nível 2 – 150 a 175 –, além das habilidades demonstradas no nível anterior, os</p><p>alunos do 5º e 9º anos são capazes de: reconhecer o valor posicional dos algarismos</p><p>em números naturais; ler informações e dados apresentados em gráfico de coluna;</p><p>interpretar mapa que representa um itinerário.</p><p>No nível 3 – 175 a 200 –, além das habilidades demonstradas nos níveis</p><p>anteriores, os alunos do 5º e 9º anos: calculam resultado de uma adição com números</p><p>de três algarismos, com apoio de material dourado planificado; localizam informação</p><p>em mapas desenhados em malha quadriculada; reconhecem a escrita por extenso</p><p>de números naturais e a sua composição e decomposição em dezenas e unidades,</p><p>considerando o seu valor posicional na base decimal; resolvem problemas relacionando</p><p>diferentes unidades de uma mesma medida para cálculo de intervalos (dias, semanas,</p><p>horas e minutos).</p><p>No nível 4 – 200 a 225 –, além das habilidades descritas anteriormente, os alunos</p><p>do 5º e 9º anos: leem informações e dados apresentados em tabela; reconhecem</p><p>a</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 3 35</p><p>regra de formação de uma sequência numérica e dão continuidade a ela; resolvem</p><p>problemas envolvendo subtração, estabelecendo relação entre diferentes unidades</p><p>monetárias; resolvem situação-problema envolvendo a ideia de porcentagem,</p><p>diferentes significados da adição e subtração, adição de números racionais na forma</p><p>decimal; identificam propriedades comuns e diferenças entre poliedros e corpos</p><p>redondos, relacionando figuras tridimensionais com suas planificações.</p><p>No nível 5 – 225 a 250 –, os alunos do 5º e 9º anos, além das habilidades já</p><p>descritas: identificam a localização/movimentação de objeto em mapas, desenhando</p><p>em malha quadriculada; reconhecem e utilizam as regras do sistema de numeração</p><p>decimal, tais como agrupamentos e trocas na base 10 e o princípio do valor posicional;</p><p>calculam o resultado de uma adição por meio de uma técnica operatória; leem</p><p>informações e dados apresentados em tabelas; resolvem problema envolvendo o</p><p>cálculo do perímetro de figuras planas, desenhadas em malhas quadriculadas; resolvem</p><p>problemas utilizando a escrita decimal de cédulas e moedas do sistema monetário</p><p>brasileiro, estabelecendo trocas entre cédulas e moedas desse mesmo sistema, em</p><p>função dos seus valores, bem como utilizando números racionais expressos na forma</p><p>decimal, envolvendo diferentes significados da adição ou subtração; reconhecem a</p><p>composição e decomposição de números naturais, na forma polinomial; identificam</p><p>a divisão como a operação que resolve uma dada situação-problema; identificam a</p><p>localização de números racionais na reta numérica.</p><p>No nível 6 – 250 a 275 –, os alunos do 5º e 9º anos: identificam planificações de</p><p>uma figura tridimensional; resolvem problemas estabelecendo trocas entre cédulas</p><p>e moedas do sistema monetário brasileiro, em função de seus valores, envolvendo</p><p>diferentes significados da adição e subtração, e envolvendo o cálculo de área de</p><p>figura plana, desenhada em malha quadriculada; reconhecem a decomposição de</p><p>números naturais nas diversas ordens; identificam a localização de números racionais</p><p>representados na forma decimal na reta numérica; estabelecem relação entre unidades</p><p>de medida de tempo; leem tabelas comparando medidas de grandezas; identificam</p><p>propriedades comuns e diferenças entre figuras bidimensionais pelo número de lados</p><p>e pelos tipos de ângulos; reconhecem a composição de números naturais em sua</p><p>forma polinomial.</p><p>Através desse estudo com os dados da proficiência, pode-se fazer uma</p><p>aproximação curricular da disciplina de matemática quanto ao conteúdo proposto pelo</p><p>currículo escolar e pelos dados da proficiência. Tem-se nesses resultados que alguns</p><p>elementos importantes do currículo de matemática não estão presentes nos saberes</p><p>dos alunos, tais como: o cálculo de operações de números decimais, noções de</p><p>geometria espacial e plana, resolução de problemas mais complexos e pensamento</p><p>algébrico. Aos professores se faz necessário que, ao perceberem o não saber de certos</p><p>conteúdos, consiga organizar um trabalho pedagógico compatível com o nível dos</p><p>alunos para que estes possam ter a oportunidade de acesso a esses conhecimentos.</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 3 36</p><p>4 | CONSIDERAÇÕES FINAIS</p><p>Com este estudo, propôs-se que se captassem os fatores, as regularidades e</p><p>as singularidades dos resultados das proficiências e do IDEB numa análise curricular,</p><p>direcionando-se para a análise quantitativa e qualitativa. Foi priorizada a discussão</p><p>dos resultados do IDEB, particularmente com relação à proficiência, que permitem</p><p>visualizar questões curriculares presentes nestes resultados, auxiliando o trabalho</p><p>de implantação e discussão do currículo escolar e o captado pelos resultados das</p><p>proficiências.</p><p>A questão da avaliação em larga escala deve influenciar as políticas públicas,</p><p>buscando a solução para os problemas da educação no Brasil, por meio da garantia</p><p>indiscriminada à educação a todos os cidadãos. Entretanto, a avaliação sozinha não</p><p>fará a “diferença”, se não agir em conjunto com a gestão e com a comunidade, e</p><p>serão as análises sobre os resultados que direcionarão para a melhoria do ensino,</p><p>transformando a educação.</p><p>Contudo, não podemos deixar de considerar que todos esses resultados apontados</p><p>mostram apenas a taxa de aprovação e o fator cognitivo dos alunos (IDEB), porém se</p><p>fossem levados em consideração outros fatores, como o nível socioeconômico dos</p><p>alunos, formação dos professores, condições de trabalho e infraestrutura das escolas,</p><p>por exemplo, os resultados com certeza não seriam os mesmos, pois teríamos uma</p><p>visão mais ampla em relação à medição da qualidade do ensino.</p><p>Esta pesquisa buscou conhecer a realidade de uma dada população no que diz</p><p>respeito ao rendimento dos alunos; sendo assim, a avaliação não deve ser encarada</p><p>como uma operação essencialmente teórica na busca de resultados de consenso</p><p>para informações por meio de índices estatísticos. Ela deve prover a sociedade</p><p>de informações úteis nos seus mais variados segmentos, sejam eles alunos, pais,</p><p>professores ou sistemas educacionais. O desafio para educadores e público em geral</p><p>é a leitura e interpretação dessas avaliações, quer pontuais, quer de processo, quer</p><p>em larga escala. O processo avaliativo não termina com a entrega dos resultados; a</p><p>avaliação continua no momento em que interpretamos os resultados e/ou “saberes”</p><p>adquiridos na ação cognitiva do sujeito histórico.</p><p>AGRADECIMENTOS</p><p>Agradeço ao Observatório da Educação (OBEDUC) desenvolvido na Universidade</p><p>Estadual de Londrina e financiado pelo Ministério da Educação (MEC), por meio da</p><p>Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES).</p><p>REFERÊNCIAS</p><p>ALVES, M. T. G.; SOARES, J. F.; XAVIER, F. P. Índice socioeconômico das escolas de educação</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 3 37</p><p>básica brasileiras. Ensaio: Avaliação e Políticas Públicas, Rio de Janeiro, v. 22, n. 84, p. 671-704,</p><p>2014.</p><p>BROWN, M. Educação Matemática. Lisboa: Instituto de Inovação Educacional, 1992. (Colecção</p><p>Temas de Investigação)</p><p>CHARLOT, B. Da relação com o saber: elementos para uma teoria. Porto Alegre: Artes Médicas Sul,</p><p>2000.</p><p>D’AMBROSIO, U. Cultural framing of mathematics teaching and learning. In: BIEHLER, R. (Ed.).</p><p>Didactics of Mathematics as a Scientific Discipline, Dordrecht: Kluwer Academic, 2004. p. 443-445.</p><p>FREITAS, L. Crítica da organização do trabalho pedagógico e da didática. Campinas: Papirus,</p><p>1995. (Coleção Magistério: Formação e Trabalho Pedagógico)</p><p>MONTEIL, J. M. Dynamique sociale et systèmes de formation. Paris: Éditions Universitaires, 1985.</p><p>PIRES, M. N. M. Relação com o saber: alunos de um curso de licenciatura em matemática. 2003.</p><p>Dissertação (Mestrado em Educação) – Universidade Federal do Paraná, Curitiba.</p><p>PONTE, J. P. da. Concepções dos professores de Matemática e processos de formação. In: BROWN,</p><p>M. Educação Matemática (68-75). Lisboa: Instituto de Inovação Educacional, 1992. (Coleção Temas</p><p>de Investigação)</p><p>PROVA BRASIL. Avaliação Matemática. 2013. Disponível em: . Acesso em: 30 jul. 2015.</p><p>SOARES, J. F.; ANDRADE, R. J. Nível socioeconômico, qualidade e equidade das escolas de Belo</p><p>Horizonte. Ensaio: Avaliação e Políticas Públicas, Rio de Janeiro, v. 14, n. 50, p. 107-126, 2006.</p><p>ZAMPIRI, M.; SOUZA, A. R. O direito ao ensino fundamental em uma leitura dos resultados do IDEB e</p><p>da política educacional em Curitiba - PR. Ensaio: Avaliação e Políticas Públicas, Rio de Janeiro, v. 22,</p><p>n. 84, p. 755-776, 2014.</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 4 38</p><p>O ENEM E SUAS REPERCUSSÕES NO DISCURSO</p><p>PEDAGÓGICO DE PROFESSORES DE MATEMÁTICA</p><p>NO ENSINO MÉDIO</p><p>CAPÍTULO 4</p><p>Célio de Mendonça Clemente</p><p>Universidade Federal de Sergipe - UFS</p><p>celiomendonca.matematica@bol.com.br</p><p>Denize da Silva Souza</p><p>Universidade Federal de Sergipe – UFS</p><p>denize.souza@hotmail.com</p><p>RESUMO: Este artigo é parte de uma pesquisa</p><p>vinculada ao Mestrado acadêmico</p><p>em Ensino</p><p>de Ciências Naturais e Matemática da</p><p>Universidade Federal de Sergipe – PPGECIMA/</p><p>UFS, que teve como propósito investigar</p><p>sobre as práticas pedagógicas de professores</p><p>de Matemática com ênfase à concepção do</p><p>ENEM. Para tanto, nos propomos a fazer uma</p><p>discussão sob uma abordagem qualitativa, à</p><p>luz dos conceitos de Bernstein (1996; 1998)</p><p>e de documentos oficiais sobre o contexto do</p><p>ENEM, enquanto política educacional do Ensino</p><p>Médio que envolve o discurso pedagógico do</p><p>professor de Matemática e suas repercussões.</p><p>Os resultados apontam o ENEM como parte</p><p>relevante das reformas, propondo a construção</p><p>de um novo discurso pedagógico oficial, com</p><p>implicações para os professores do Ensino</p><p>Médio, principalmente de Matemática, os quais</p><p>ao se apoderar-se desse discurso, passarão a</p><p>construir o seu discurso de instrução.</p><p>PALAVRAS-CHAVE: Reforma; ENEM; Ensino</p><p>Médio; Discurso pedagógico; Matemática.</p><p>1 | INTRODUÇÃO</p><p>As reformas da educação brasileira</p><p>iniciadas na década de 1990 alavancaram-se</p><p>nas discussões e acordos internacionais em que</p><p>o Brasil tornou-se signatário em um processo</p><p>que acompanhou a internacionalização das</p><p>políticas educacionais. Tais fatos, ao mesmo</p><p>tempo em que satisfaziam as necessidades</p><p>de financiamento, também impôs novas</p><p>demandas que implicaram na implantação do</p><p>estado brasileiro como avaliador da educação.</p><p>Por outro lado, essas reformas inauguraram</p><p>um novo paradigma educacional a partir da Lei</p><p>de Diretrizes e Bases da Educação (LDBEN</p><p>de 1996), sendo reafirmadas para o Ensino</p><p>Médio pelas Diretrizes Curriculares Nacionais</p><p>(DCN), do Exame Nacional do Ensino Médio</p><p>(ENEM) e dos Parâmetros Curriculares para</p><p>o Ensino Médio (PCNEM) constituindo-se</p><p>em instrumentos que consolidaram a sua</p><p>universalização com relativa qualidade.</p><p>Em particular, o ENEM como instrumento</p><p>do estado avaliador e suas reformulações</p><p>aliadas às diretrizes curriculares desvelaram</p><p>a sua relevância a partir da reorganização das</p><p>áreas do conhecimento, do aumento do número</p><p>de itens da prova e da avaliação com ênfase nas</p><p>competências e habilidades. Tais reformulações,</p><p>imbricaram-se ao discurso pedagógico do</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 4 39</p><p>Ensino Médio e, em particular do professor de Matemática por transformar essa</p><p>disciplina em área do conhecimento. Essas implicações materializam-se no fato de</p><p>que a disciplina de Matemática ter ficado isolada, podendo dificultar o planejamento</p><p>de um projeto coletivo de educação nas escolas.</p><p>Desse modo, este texto apresenta um recorte da dissertação de mestrado do</p><p>primeiro autor, que buscou investigar sobre as práticas pedagógicas do professor de</p><p>Matemática com ênfase à concepção do ENEM, enquanto Matemática ser área de</p><p>conhecimento. A pesquisa vincula-se ao Programa de Pós-Graduação em Ensino de</p><p>Ciências Naturais e Matemática da Universidade Federal de Sergipe – PPGECIMA/</p><p>UFS. No recorte, nos propomos a fazer uma discussão a partir dos pressupostos de</p><p>Bernstein e as repercussões do ENEM junto ao discurso pedagógico do professor de</p><p>Matemática que atua no Ensino Médio.</p><p>Trata-se, portanto de um ensaio com apresentação de alguns aspectos</p><p>bibliográficos abrindo inicialmente, uma discussão sobre o ENEM como política</p><p>educacional do Ensino Médio, em seguida, sobre o discurso pedagógico do professor no</p><p>Ensino Médio, pautando-se nos pressupostos de Bernstein (1998). Por fim, teceremos</p><p>algumas considerações sobre o trabalho bibliográfico que norteou a referida pesquisa</p><p>de mestrado.</p><p>2 | O ENEM COMO POLÍTICA EDUCACIONAL DO ENSINO MÉDIO</p><p>O Enem enquanto política educacional faz parte de um conjunto de reformas</p><p>implementadas na educação básica brasileira na década de 1990, no sentido de</p><p>efetivá-la como direito. Tais reformas se deram a partir das demandas do processo de</p><p>globalização e pelo neoliberalismo que impuseram a necessidade de reorganização do</p><p>Ensino Médio. A globalização, segundo Nery (2012), considera-se como um sistema</p><p>financeiro internacional, apoiado no discurso de modernização e racionalização</p><p>do Estado, com interferência mínima no mercado, gerenciando apenas os setores</p><p>estratégicos e serviços exclusivos. Em consequência, entendemos por neoliberalismo,</p><p>“um constructo ideológico da globalização e, ocorre a partir da intervenção mais direta</p><p>dos organismos internacionais nos Estados-nação, dentre outras formas, por meio da</p><p>educação, objetivando alinhá-los à nova ordem econômica, política e social” (MAUÉS,</p><p>2003, p. 12).</p><p>Nesse contexto, a LDBEN N° 9394/1996 foi o marco de constituição de um</p><p>novo paradigma para a educação básica, fazendo com que, deixasse de ser “terra de</p><p>ninguém” por não ter, até então, uma função claramente definida (FELIPPE, 2000, p. 56).</p><p>Em um contexto macro, as reformas do Ensino Médio, tiveram base no movimento de</p><p>internacionalização das políticas educacionais e foram balizados pela necessidade de</p><p>financiamento de instituições internacionais como Banco Mundial (BM). A implantação</p><p>de políticas públicas específicas tornaram-se impositivos decorrentes das condições</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 4 40</p><p>para o financiamento.</p><p>Nessa perspectiva, as reformas educacionais também atenderam demandas</p><p>nacionais, pois, segundo os Parâmetros Curriculares Mais (PCN+),</p><p>[...] procurou atender a uma reconhecida necessidade de atualização da educação</p><p>brasileira, tanto para impulsionar uma democratização social e cultural mais efetiva</p><p>pela ampliação da parcela da juventude brasileira que completa a educação</p><p>básica, como para responder a desafios impostos por processos globais, que</p><p>têm excluído da vida econômica os trabalhadores não-qualificados, por conta da</p><p>formação exigida de todos os partícipes do sistema de produção e de serviços</p><p>(BRASIL, 2002, p. 08).</p><p>Uma das principais mudanças proposta pela reformulação ocorreu no Ensino</p><p>Médio a partir da LDBEN N° 9394/1996 e aponta para a retificação do seu caráter</p><p>estritamente propedêutico ou profissionalizante para consolidar-se como parte da</p><p>educação básica. Assumindo, portanto, o papel de preparar para o exercício da</p><p>cidadania, capacitar para o aprendizado necessário ao prosseguimento em estudos</p><p>posteriores e qualificação para o trabalho (BRASIL, 2002).</p><p>No contexto de reformulação, o estado brasileiro, além de provedor da educação</p><p>básica, passou a ser também avaliador. E sob esse mesmo enfoque, em 1998, foi</p><p>criado pelo Ministério da Educação (MEC), o ENEM com a finalidade de avaliar os</p><p>alunos concluintes e os egressos desse nível do ensino básico. Não é sem razão que,</p><p>ao mesmo tempo em que avalia os alunos, esse exame passou a nortear as práticas</p><p>de ensino e o uso de metodologias na educação básica e a apontar indicadores de</p><p>qualidade da educação (BRASIL, 2009).</p><p>A criação do ENEM ocorreu no sentido de atender esse viés e aponta para a</p><p>avaliação do desempenho do estudante, com a finalidade de avaliar as competências</p><p>e habilidades dos alunos. Esse objetivo do ENEM fundamentou mudanças e</p><p>aperfeiçoamentos pelos quais passou, visando atender às orientações dos PCN,</p><p>Orientações Curriculares e Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação Básica</p><p>(BRASIL, 2013). Todos estes documentos legais apontam para a avaliação com ênfase</p><p>na aferição de competências e habilidades, nas quais é possível transformar informação,</p><p>produzir conhecimentos e reorganizá-los em novos arranjos que possibilitam enfrentar</p><p>e resolver novos problemas (DIAS, 2009). Outros estudos confirmam que de acordo</p><p>com os dados de pesquisas e resultados da prova, o ENEM influencia nas atuais</p><p>mudanças do Ensino Médio (NUNES, 2011; MACÊDO, 2012).</p><p>A partir de 2009 ocorreu uma reformulação significativa no ENEM que ampliou os</p><p>seus objetivos, mas, também conduziu mudanças na sua forma, correção e utilização</p><p>dos seus resultados. O exame passou a ser, no todo ou em parte, o processo seletivo das</p><p>Instituições Federais de Ensino Superior, sendo consolidado pelo Sistema de Seleção</p><p>Unificado (SiSu)1. Esse viés de mudanças também objetivou a democratização</p><p>das</p><p>1 Sistema eletrônico, disponível no site do Ministério da Educação, por meio do qual o aluno</p><p>egresso do Ensino Médio se inscreve para concorrer a uma vaga em uma instituição de Ensino Superior</p><p>pública com base na sua nota do ENEM.</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 4 41</p><p>oportunidades de concorrência às vagas federais de Ensino Superior, a certificação</p><p>de jovens e adultos no ensino médio e o direcionamento da construção e revisão dos</p><p>currículos das escolas da etapa final da educação básica (BRASIL, 2009).</p><p>A Teoria de Resposta ao Item (TRI) passou a ser utilizada na correção do ENEM</p><p>como mecanismo de medição do traço latente do aluno, utilizando-se de recursos</p><p>estatísticos e probabilísticos e com base em informações de um banco de itens pré-</p><p>testados em um grupo determinado. Dessas informações, é efutada uma média para</p><p>as notas dos estudantes na prova do ENEM serem, sendo também considerado um</p><p>desvio padrão estabelecido (RABELO, 2013). Contudo, ampliaram-se o número de</p><p>questões, além da prova de redação, de modo que com a ampliação das competências</p><p>e habilidades da matriz de referência em cada área e a transformação da disciplina de</p><p>Matemática, como área do conhecimento, cada uma das quatro áreas passaram a ter</p><p>quarenta e cinco questões.</p><p>Essas mudanças no ENEM são relevantes pelas suas repercussões na estrutura</p><p>de suas provas e pelos interesses nos seus resultados. Por outro lado, houve</p><p>imbricações no trabalho docente pelo direcionamento dado à construção e revisão do</p><p>currículo do Ensino Médio, uma vez que, os itens das provas se articulam a uma matriz</p><p>de referência com conteúdos da educação básica, com ênfase na contextualização e</p><p>interdisciplinaridade.</p><p>Há uma década atrás, a interdiciplinaridade já era considerada palavra chave</p><p>para a organização das ações escolares. Segundo Dias (2009), por meio da</p><p>interdisciplinaridade, se busca o estabelecimento de uma intercomunicação efetiva entre</p><p>as disciplinas, enriquecendo a relação entre elas. Por outro lado, a contextualização</p><p>“significa enraizar uma referência em um texto, de onde fora extraída, e longe do qual</p><p>perde parte substancial do seu significado” (DIAS, 2009, p. 47).</p><p>A atual caracterização do ENEM, conformada pelas mudanças nas provas e</p><p>ampliação dos seus objetivos, embora guarde convergências com o modelo inicialmente</p><p>criado, apresenta novos e importantes elementos que os diferenciam acentuadamente</p><p>e, ante os novos discursos, ideologias, práticas e intenções decorrentes do atual modelo,</p><p>convencionou-se chamá-lo de NOVO ENEM (MACÊDO, 2012). Esses elementos novos</p><p>do ENEM corroboram com a necessidade de recomposição do discurso pedagógico</p><p>no Ensino Médio, notadamente na sua recontextualização e reprodução.</p><p>No que se refere à recontextualização do discurso pedagógico, a proposição</p><p>dos itens da prova do chamado NOVO ENEM que, potencializam enfaticamente a</p><p>avaliação de competências e habilidades na resolução de situações-problemas</p><p>instituiu a necessidade de reorganização do discurso pedagógico tanto no aspecto</p><p>regulador, quanto no instrucional, pois, estes mantém correlação a partir das regras</p><p>dos dispositivos pedagógicos (BERNSTEIN, 1996, 1998).</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 4 42</p><p>3 | BERNSTEIN E O DISCURSO PEDAGÓGICO DO PROFESSOR NO ENSINO</p><p>MÉDIO</p><p>Os constructos de Bernstein (1998) a respeito do pedagógico e de outros</p><p>conceitos têm origem na teoria da reprodução cultural, embora não esteja a ela restrita;</p><p>pois defende que essa seja geradora dos princípios de reprodução dos seus próprios</p><p>objetos. Logo, Bernstein procurou transpor as demarcações ideológicas da superfície</p><p>do texto, ampliando as discursões e análises para a sua construção, circulação,</p><p>contextualização, aquisição e mudança (BERNSTEIN, 1998; GALLIAN, 2008).</p><p>Para Gallian (2008, p. 241), “Bernstein apoia-se na concepção de que as relações</p><p>de poder e os princípios de controle da sociedade são traduzidos em princípios de</p><p>comunicação que posicionam os sujeitos”. Há, dessa forma, relações entre categorias</p><p>e conteúdos legítimos comunicados no contexto escolar que definem a comunicação</p><p>pedagógica a ser utilizada (BERNSTEIN, 1996). Essa comunicação ocorre por um</p><p>dispositivo que, para Gallian (2008, p. 242), é “um conjunto de regras que regulam</p><p>internamente a comunicação pedagógica e incidem sobre uma série de significados</p><p>passíveis de serem transmitidos pela escola”. Ou seja:</p><p>Dispositivo pedagógico examina o processo pelo qual uma disciplina é transformada</p><p>para compor o conhecimento escolar, o currículo, os conteúdos e as relações a serem</p><p>transmitidas. Este dispositivo se constitui de um conjunto de regras discursivas</p><p>hierarquicamente relacionadas, classificadas em distributivas (que se aplicam ao</p><p>campo intelectual do sistema educacional), recontextualizadoras e avaliativas.</p><p>Essas regras, que regulam a comunicação pedagógica, estão relacionadas a três</p><p>diferentes campos: o campo de produção do discurso, o campo recontextualizador</p><p>e o campo de reprodução do discurso (CARVALHO; REZENDE, 2013, p. 556).</p><p>O próprio dispositivo pedagógico que, abrange os campos da produção,</p><p>recontextualização e reprodução do discurso, sofre vieses relacionados à ideologia</p><p>e interfere na limitação ou difusão de consciência. Em uma análise mais concisa, o</p><p>discurso pedagógico é o próprio regulador da consciência (BERNSTEIN, 1998). E</p><p>assim se reconhece porque esse discurso, na escola, é resultado de discussões e de</p><p>um planejamento que, em tese, é mais elaborado e apontam para os objetivos e metas</p><p>da instituição e do sistema de educação.</p><p>É nesse sentido que Mainardes e Stremel (2010, p. 42) justificam que “o discurso</p><p>pedagógico implica na correlação de outros dois discursos: o instrucional e o regulador”.</p><p>Tais discursos são integrados e, enquanto que o primeiro liga-se às especificidades</p><p>dos conteúdos e dizem respeito ao que e como transmiti-lo; o segundo, diz respeito</p><p>à ideologia, enquanto discurso de transmissão de moral, valores e construção de</p><p>identidade.</p><p>Nesse âmbito, o discurso pedagógico passa por alterações e realocações a</p><p>partir de quando entra em jogo no processo. Essas transformações podem ocorrer na</p><p>recontextualização, isto é, na reorganização do discurso ou no processo de reprodução</p><p>que ocorre na prática pedagógica nas escolas. É no campo da recontextualização onde</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 4 43</p><p>nascem as posições e oposições em relação à teoria, pesquisa e práticas pedagógicas</p><p>(BERNSTEIN, 1996; MAINARDES E STREMEL, 2010).</p><p>Por outro lado, os discursos reproduzidos na legislação e nos documentos oficiais</p><p>são em si resultados de discussões travadas em diversos setores da sociedade e</p><p>embasadas em concepções políticas e econômicas diferenciadas. Tais discursos,</p><p>também são moldados no interior das escolas para adaptar-se a sua realidade. Isso</p><p>ocorre porque o professor é principal reprodutor do discurso oficial, mas, ao mesmo</p><p>tempo, o reinterpreta e o contrói a partir do discurso instrucional que é inerente à sua</p><p>função docente. Essa reinterpretação não é uma ruptura do discurso pedagógico, mas,</p><p>uma produção, em contexto próprio, sem retirar, contudo, a autonomia do Estado de</p><p>regular as políticas curriculares e sem abdicar da autonomia da autonomia pedagógica</p><p>escolar.</p><p>Os documentos oficiais referentes à educação representam o discurso</p><p>pedagógico oficial, mas, esses documentos são resultados de amplas discursões</p><p>no meio educacional e, dessa forma, também representa os interesses e opiniões</p><p>dos sistemas de educação e das escolas. Por exemplo, as Orientações Curriculares,</p><p>PCN e DCN corroboraram para a construção de um conceito de educação nacional,</p><p>principalmente no que concerne ao desenvolvimento do currículo. E isso centrou-se na</p><p>qualidade da educação, deram vazão à concepção de avaliação externa e tornaram-se</p><p>base de orientação para o ENEM. Isso ocorreu a partir da construção de um discurso</p><p>pedagógico centrado no desenvolvimento de competências e habilidades.</p><p>Esses conceitos apontam para o fato de que, ao enfatizar o desenvolvimento de</p><p>competências e habilidades, os documentos legais brasileiros, como parte da reforma</p><p>do ensino médio, já constitui uma reestruturação do discurso pedagógico na sua</p><p>produção, mas, principalmente na recontextualização e na sua reprodução.</p><p>A ênfase na recontextualização e na reprodução do discurso pedagógico tem</p><p>razão de ser em função de serem assumidos pelo Estado e assim, servem para</p><p>atender aos objetivos e finalidades das suas políticas públicas e modelos educativos</p><p>que adotam. Essa realidade denota que os agentes escolares precisam participar</p><p>dessa recontextualização do discurso pedagógico, ao mesmo tempo em que faz a</p><p>sua reinterpretação e reprodução (SILVA, 2014). Carvalho e Rezende (2013, p. 557)</p><p>corroboram com esse pensamento, afirmando que,</p><p>apoiados em habilidades e competências básicas, os Pcnem têm como objetivo</p><p>preparar o jovem estudante para a chegada à vida adulta e para o exercício pleno</p><p>da cidadania. [...] e constituem um projeto governamental de reforma curricular</p><p>aprovado pelo Conselho Nacional de Educação. O documento cumpre um duplo</p><p>papel de difundir os princípios da reforma pretendida e orientar os professores</p><p>na busca de novas abordagens e metodologias, tendo sido formulado não como</p><p>um receituário ou como uma lista completa e exaustiva de conteúdos ou tópicos a</p><p>serem abordados, mas visando à vida individual, social e profissional, atual e futura,</p><p>dos estudantes. Surgem com a proposta de direcionar e organizar o aprendizado</p><p>no Ensino Médio, a fim de gerar um conhecimento real, com significado próprio,</p><p>não apenas voltado para o acúmulo de informações.</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 4 44</p><p>Depreende-se dessa forma, que o arcabouço das reformas educacionais e</p><p>curriculares, esteadas na LDBEN N° 9394/96, confirmadas no discurso pedagógico</p><p>oficial das orientações, diretrizes e outros documentos relativos à educação apontam</p><p>para a melhoria da sua qualidade, tendo como parâmetro de avaliação, o ENEM com</p><p>ênfase nas competências e habilidades e dessa forma exemplificam a constituição</p><p>e os elementos do discurso pedagógico teorizado por Bernstein. E essa percepção</p><p>é oriunda do fato de que o discurso da reforma curricular foi construído a partir</p><p>de diversas discussões e interesses. Isso leva, por outro lado, à necessidade de</p><p>construção, recontextualização e reprodução do discurso e do conhecimento através</p><p>daqueles que fazem parte da educação no Ensino Médio.</p><p>A acomodação das disciplinas em áreas afins, a interdisciplinaridade e</p><p>contextualização dos conteúdos dos itens das provas do ENEM apresentam-se</p><p>como mudanças propostas pelas reformulações mais recentes que podem exigir</p><p>mudanças na postura do docente. Por exemplo, haver a necessidade dos professores</p><p>de Matemática trabalharem a recontextualização do discurso pedagógico oficial e,</p><p>principalmente, construírem o discurso pedagógico instrucional que diz respeito a</p><p>quais conteúdos disciplinares deverão trabalhar em sala de aula e como trabalhá-los</p><p>ante às implicações que o ENEM como parte do primeiro impôs à disciplina a partir</p><p>das mudanças na matriz de referência, na estrutura da prova e nos seus resultados.</p><p>4 | CONSIDERAÇÕES FINAIS</p><p>Os estudos de teóricos e dos documentos oficiais relativos às reformas curriculares</p><p>e da educação brasileira ocorridas no Ensino Médio, a partir da LDBEN N° 9394/96 e</p><p>confirmadas pelo discurso pedagógico oficial presente nas Orientações Curriculares,</p><p>nas DCN e nos PCNEM apontam para uma realidade de mudança pautada nos</p><p>discursos internacionais relativos à fomentação da educação como direito e na sua</p><p>oferta universal e com qualidade.</p><p>Em nível nacional, reconhece-se que o financiamento internacional da educação</p><p>impôs uma proposta de avanço a partir do estado como fomentador, mas, também</p><p>assumindo o papel de avaliador. A criação do ENEM no entorno da concepção de</p><p>avaliação externa necessária para avaliar os alunos concluintes e os egressos do</p><p>Ensino Médio e validar as políticas curriculares, sob esse aspecto consistiu em</p><p>uma ação necessária à confirmação, recontextualização e reprodução do discurso</p><p>pedagógico oficial das reformas educacionais que se processaram no Brasil a partir</p><p>da década de 1990.</p><p>A concepção da avaliação do ENEM alicerçada em avaliar competências e</p><p>habilidades a partir de itens contextualizados e interdiscipplinarizados, bem como, as</p><p>últimas reformulações ocorridas na formatação das suas provas e na ampliação das</p><p>suas finalidades e objetivos, acompanhadas de outras reformulações que alcançaram</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 4 45</p><p>às disciplinas do Ensino Médio constituem os objetos do discurso pedagógico das</p><p>reformas educacionais e representam um imperativo de mudanças deste.</p><p>As reformulações que redundaram no chamado NOVO ENEM, ratificaram por outro</p><p>lado, maiores implicações para a prática pedagógica do professor de Matemática. Tais</p><p>implicações não decorrem apenas do aumento do número de itens da prova relativos</p><p>a essa disciplina, mas, pelo fato desta haver se tornado uma área do conhecimento e</p><p>isso repercute no tratamento dos resultados da avaliação para cumprir os objetivos do</p><p>aluno ao participar do exame.</p><p>Essa realidade implica na necessidade do professor de Matemática aderir às</p><p>atividades de compreensão do discurso pedagógico das reformas porque a partir daí</p><p>poderá fazer a recontextualização, transformações e realocações do discurso, visando</p><p>atender aos objetivos da disciplina/área do conhecimento. Essa realocação, por outro</p><p>lado, não pode ser restrita apenas à definição do que e quais conteúdos trabalhar;</p><p>mas, deve repercutir no como trabalhar e quais práticas pedagógicas e metodologias</p><p>utilizar para realocar o discurso das reformulações do currículo sem perder de vista os</p><p>seus constructos e os mecanismos de avaliação utilizados.</p><p>A considerável variação no número de questões da prova de Matemática do</p><p>ENEM e a transformação dessa disciplina em área do conhecimento já impuseram</p><p>reflexões ao professor dessa disciplina no planejamento de suas aulas. Por outro lado,</p><p>a contextualização e interdiciplinarização dos conteúdos da prova, em profundidade,</p><p>envolvem mudanças na sua prática de ensino. Isso é posto porque a construção do</p><p>discurso pedagógico, sua recontextualização e reprodução envolvem todos os tipos</p><p>de saberes do professor.</p><p>É necessário, portanto, que o professor de Matemática a partir dos seus saberes</p><p>possa fazer a construção do discurso da Matemática escolar que não é o mesmo</p><p>aplicado à prática profissional da Matemática fora do ambiente escolar. Precisa ainda</p><p>compreender o que evocam as reformas curriculares no momento presente, uma vez</p><p>que tais reformas apontam para os objetivos e finalidades do ensino de Matemática,</p><p>para os tipos de atividades a serem desenvolvidas em sala de aula e para as formas</p><p>de avaliação. Tais compreensões podem orientar a formulação de um discurso da</p><p>Matemática escolar que constitui-se da própria recontextualização do discurso</p><p>pedagógico balizado pela eficiência e eficácia dos métodos e práticas pedagógicas.</p><p>Depreende-se enfim, que as mudanças inerentes às reformulações e às</p><p>repercussões junto aos professores de Matemática ainda se processam no interior das</p><p>unidades escolares e dos sistemas de educação e o professor precisa evocar os seus</p><p>saberes e os princípios norteadores das reformas curriculares, além de apoderar-se</p><p>do discurso pedagógico oficial no sentido de construir o seu discurso instrucional que</p><p>é o próprio discurso da Matemática escolar com a finalidade de projetar as atividades a</p><p>serem desenvolvidas em sala, sem perder de vista as mudanças na prática pedagógica</p><p>e nas metodologias, se necessárias.</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 4 46</p><p>REFERÊNCIAS</p><p>BERNSTEIN, B. A estruturação do discurso pedagógico: classe, códigos e controle. Vozes:</p><p>Petrópolis, 1996.</p><p>BERNSTEIN, B. Pedagogía, control simbólico e identidad: teoria, investigación</p><p>y crítica. Madrid:</p><p>Ediciones Morata, 1998.</p><p>BRASIL. Parâmetros curriculares nacionais: ensino médio. Ministério da Educação (MEC),</p><p>Secretaria da Educação Média e Tecnológica (SEMTEC). Brasília: MEC/SEMTEC, 1999.</p><p>BRASIL. PCN + ensino médio: orientações educacionais complementares aos parâmetros</p><p>curriculares nacionais. Ciências da Natureza, Matemática e Suas Tecnologias. Ministério da Educação</p><p>(MEC), Secretaria da Educação Média e Tecnológica (SEMTEC). Brasília: MEC/SEMTEC, 2002.</p><p>BRASIL. A redação no ENEM 2013: guia do participante. Ministério da Educação/ Diretoria de</p><p>Avaliação da Educação Básica/ Instituto de Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio</p><p>Teixeira. Brasília: MEC/DIAB/INEP, 2013.</p><p>CARVALHO, R. C. de; REZENDE, F. Políticas curriculares e qualidade do ensino de ciências no</p><p>discurso pedagógico de professores de nível médio. In: Ciênc. Educ.,Bauru, v. 19, n. 3, p. 555-571,</p><p>2013.</p><p>DIAS, M. da G. B. B.. O desenvolvimento das competências que nos permite conhecer. In: BRASIL,</p><p>Exame Nacional do Ensino Médio. Textos teóricos metodológicos. Brasília: MEC/INEP, 2009.</p><p>FELIPPE, B. T. Refletindo sobre o ensino médio brasileiro. Porto Alegre: Ritter dos Reis, 2000.</p><p>GALLIAN, C. V. A. A contribuição da teoria de Bernstein para a descrição e a análise das questões</p><p>ligadas à educação. In: Educativa, Goiânia, v . 11, n. 2, p. 239-255, jul./dez. 2008.</p><p>MACÊDO, J. D. F. de. (Novo) Exame Nacional do Ensino Médio: discurso, ideologia, práticas e</p><p>intenções. Dissertação de Mestrado em Educação. Universidade Federal de Alagoas – UFAL. Maceió:</p><p>UFAL/Centro de Educação/ Programa de Pós-Graduação em Educação Brasileira, 2012.</p><p>MAINARDES, J.; STREMEL, S. As pesquisas de Basil Bernstein e algumas de suas contribuições</p><p>paras as pesquisas sobre políticas educacionais e curriculares. In: Revista Teias, v. 11, n. 22, p. 31-</p><p>54, maio/agosto, 2010.</p><p>MAUÉS, O. Os organismos internacionais e as políticas públicas educacionais no Brasil. In:</p><p>GONÇALVES, Luiz Alberto Oliveira. Currículo e políticas públicas. Belo Horizonte: Autêntica, 2003.</p><p>NERY, S. A. de S. Depois do muro. Disponível em: http://sebastiaonery.com.br/coluna/. Acesso em:</p><p>15./jul./2015.</p><p>NUNES, L. B. Ambientalização e ensino médio: um estudo das provas do novo ENEM – 2009.</p><p>Dissertação de Mestrado em Educação. Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul –</p><p>PUC/RS. Porto Alegre: PUCRS/FACED/PPGEDU, 2011.</p><p>PASSOS, M. M.; OLIVEIRA, B. K.; SALVI, R. F. As Questões de “Matemática e Suas Teconologias” do</p><p>“Novo ENEM”: um olhar com base na Análise de Conteúdo. In: Educ. Matem. Pesq., São Paulo, v.</p><p>13, n. 2, p. 313-335, 2011.</p><p>RABELO, M. Avaliação educacional: fundamentos, metodologia e aplicações no contexto brasileiro.</p><p>Rio de Janeiro: SBM, 2013.</p><p>SILVA, G. S. O discurso pedagógico segundo a teoria de Basil Bernstein: o contexto de sala</p><p>de aula no ensino de química. Dissertação de Mestrado em Ensino de Ciências e Matemática.</p><p>Universidade Federal de Sergipe – UFS. São Cristóvão: UFS, 2014.</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 5 47</p><p>A MATEMÁTICA ESCOLAR REDUZIDA A FAZER</p><p>CONTAS: UMA REPRESENTAÇÃO DA MATEMÁTICA</p><p>ESCOLAR?</p><p>CAPÍTULO 5</p><p>Maria Inmaculada Chao Cabanas</p><p>Universidade Estácio de Sá</p><p>Rio de Janeiro – RJ</p><p>Tarso Bonilha Mazzotti</p><p>Universidade Federal do Rio de Janeiro</p><p>Universidade Estácio de Sá</p><p>Rio de Janeiro – RJ</p><p>RESUMO: Este trabalho apresenta uma das</p><p>questões de nossa pesquisa de doutorado e</p><p>tem como foco de investigação a matemática</p><p>escolar como representação social da</p><p>matemática. O recorte feito problematiza a</p><p>dependência entre o ensino da matemática</p><p>escolar e os exames nacionais, neste caso, a</p><p>Avaliação Nacional da Alfabetização (ANA).</p><p>Este exame é representativo por ser utilizado</p><p>como parâmetro na busca da qualidade</p><p>do ensino de matemática no país. Para</p><p>compreender a relação de dependência entre</p><p>ensino e exames é feita a análise das diretrizes</p><p>e resultados da sua aplicação presentes nos</p><p>documentos oficiais da ANA. O estudo inicial</p><p>aponta que a complexidade do processo</p><p>de ensino e aprendizagem em matemática</p><p>é desconsiderado quando subjugado às</p><p>limitações do instrumento. E, ao verificar-se o</p><p>que é valorizado no ensino da matemática, nos</p><p>anos iniciais, o cálculo predomina. Esta ênfase</p><p>no “fazer contas” mostra-se como uma possível</p><p>representação da matemática escolar.</p><p>PALAVRAS-CHAVE: Matemática escolar;</p><p>Exames; Representação da Matemática.</p><p>ABSTRACT: This paper presents one of the</p><p>questions of our doctoral research and focuses</p><p>on the investigation of school mathematics as</p><p>a social representation of mathematics. The cut</p><p>made problematizes the dependence between</p><p>the teaching of school mathematics and the</p><p>national exams, in this case, the National Literacy</p><p>Assessment (ANA). This exam is representative</p><p>because it is used as a parameter in the search</p><p>for the quality of teaching mathematics in the</p><p>country. To understand the relationship of</p><p>dependence between teaching and exams,</p><p>the analysis of the guidelines and results of its</p><p>application present in official ANA documents</p><p>is made. The initial study points out that the</p><p>complexity of the teaching and learning process</p><p>in mathematics is disregarded when subjugated</p><p>to the limitations of the instrument. And, when</p><p>we verify what is valued in the teaching of</p><p>mathematics, in the initial years, the calculation</p><p>predominates. This emphasis on “doing</p><p>accounts” is shown as a possible representation</p><p>of school mathematics.</p><p>KEYWORDS: School mathematics; Exams;</p><p>Representation of Mathematics.</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 5 48</p><p>1 | INTRODUÇÃO</p><p>O fracasso escolar dos alunos em matemática é recorrente e tem, ao que parece,</p><p>as mesmas razões: os estudantes não são capazes de resolver problemas. No entanto,</p><p>quando os resolvem por meios próprios são desconsiderados pelo professor e pelos</p><p>exames escolares e extra escolares. Vale ressaltar que estes mesmos exames servem</p><p>de parâmetro para políticas de formação e da “qualidade” do ensino da matemática</p><p>o que evidencia uma relação de dependência entre ensino de matemática e exames.</p><p>Neste estudo analisamos a Avaliação Nacional da Alfabetização (ANA) por ser</p><p>um exame nacional utilizado como referência para identificar o aprendizado desejável</p><p>de matemática nos três primeiros anos do ensino fundamental.</p><p>Um dos objetivos da pesquisa é de identificar esta dependência entre a qualidade</p><p>do ensino de matemática nos anos inicias e o que os exames consideram como</p><p>habilidades necessárias para o aprendizado da matemática. Estas habilidades que</p><p>se mostram simplificadas pelas adaptações aos itens do exame e impossibilidade</p><p>de avaliar a aprendizagem da forma direta que caracteriza uma avaliação em larga</p><p>escala, o que faz dessas avaliações limitadas para essa finalidade.</p><p>2 | A ESCOLHA DO MÉTODO</p><p>O processo metodológico de coleta está centrado nos documentos que representam</p><p>fonte de dados e informações: documentos oficiais como notas técnicas, explicativas,</p><p>leis e cadernos de apresentação dos procedimentos de aplicação e dos resultados dos</p><p>exames, além de sites de divulgação dos documentos oficiais. Os documentos escritos,</p><p>representam as falas dos grupos sociais, logo, os posicionamentos dos interlocutores.</p><p>O método adotado para a análise é o da Teoria da Argumentação. Esta escolha se</p><p>justifica porque a análise retórica permite apresentar os argumentos que estabilizam os</p><p>pontos de partida geralmente explicitados, bem como os implícitos que podem sugerir</p><p>as disputas e as divergências entre os atores sociais nos documentos selecionados.</p><p>Assim, por meio desta análise é possível revelar os valores, as crenças e o que se diz</p><p>desejável para os grupos. Perelman e Olbrechts-Tyteca (2005) afirmam que o discurso</p><p>é um ato do orador, e consitui-se objeto de exame por parte de quem ouve, podendo</p><p>ser analisado pelos raciocínios que expõe. As regulamentações, que determinam</p><p>os exames em larga escala, estabelecem os acordos mais gerais acerca do que é</p><p>admitido pelos auditórios, neste</p><p>caso, dos professores dos anos iniciais. Além do</p><p>mais, os documentos condensam o que é preferível ser, ter ou fazer o que justifica</p><p>a escolha destes como material de coleta de dados. Assim, os registros de todo o</p><p>tipo na modalidade escrita constituem material empírico de caráter intersubjetivo, os</p><p>quais sobrepujam algumas modalidades orais de coleta de dados. Deste modo, por</p><p>meio da análise retórica procuro identificar o que orienta a elaboração e apresentação</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 5 49</p><p>dos resultados dos exames bem como a influência destes na redução do ensino da</p><p>matemática à matriz que embasa a elaboração das avaliações.</p><p>3 | NO QUE SE SUSTENTAM AS AVALIAÇÕES EM LARGA ESCALA</p><p>Os discursos presentes nos documentos sobre a ANA, apresentam este</p><p>instrumento por meio da caracterização do tipo de avaliação e dos objetivos que a</p><p>orientam. O Documento Básico“ afirma que:</p><p>são, antes de tudo, um julgamento de valor e carregam concepções que refletem</p><p>as escolas sobre o que se considera importante ensinar/aprender em nossa</p><p>sociedade. As avaliações em larga escala, em especial, possibilitam a produção</p><p>de dados em nível nacional/regional/local, subsidiando as políticas públicas</p><p>para o desenvolvimento de estratégias de intervenção em possíveis dificuldade</p><p>encontradas nos diferentes contextos educacionais. (BRASIL, 2013, p.15)</p><p>Além disso, o documento reafirma a preocupação com a melhoria da qualidade do</p><p>ensino e redução das desigualdades, de avaliar o nível de alfabetização dos educandos</p><p>no 3º ano do ensino fundamental por meio de um diagnóstico amplo do processo</p><p>de alfabetização e, também, testar a aquisição de saberes das crianças em Língua</p><p>Portuguesa e Matemática ao longo desse ciclo de alfabetização (BRASIL, 2013, p.13).</p><p>Considera, ainda, que a utilização desse tipo de avaliação pode contribuir para um</p><p>melhor entendimento sobre os processos de aprendizagem e orientar a formulação ou</p><p>reformulação de políticas voltadas para esta etapa de ensino.</p><p>Os pressupostos que prescrevem esta avaliação enunciam a relevância deste</p><p>instrumento como indicador dos conhecimentos e saberes matemáticos dos estudantes</p><p>desse segmento além de servir de parâmetro para políticas de formação e da qualidade</p><p>da “alfabetização do ensino de matemática no 3º.ano do ensino fundamental.</p><p>A construção de um instrumento de larga escala tem como base uma matriz de</p><p>referência formulada pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais</p><p>Anísio Teixeira (INEP). A matriz elege e “aglutina” as características de aprendizagem</p><p>possíveis de serem percebidas de forma direta e, assim, retratar uma opção por</p><p>determinados saberes e informações representativos do “construto a ser examinado”.</p><p>No caso das matriz especifica da ANA essas “características de aprendizagem</p><p>diretamente perceptíveis” (as elegíveis) são um recorte do que seria a aprendizagem</p><p>de um determinado conhecimento.</p><p>Neste recorte, e com base no fato de que a aprendizagem não pode ser medida</p><p>de forma direta, conhecimentos deixam de ser considerados. O INEP justifica o recorte</p><p>nas limitações que caracterizam avaliações em larga escala (BRASIL, 2013, p.15).</p><p>As orientações que constam do “Documento Base” da ANA, reafirmam dois</p><p>aspectos relevantes que caracterizam esse reducionismo: (a) o fato da impossibilidade</p><p>da aprendizagem ser medida de maneira direta; e (b) as limitações dos instrumentos</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 5 50</p><p>de avaliação em larga escala considerando a avaliação de todos os saberes que</p><p>constituem um determinado conhecimento.</p><p>Embora o documento considere que aspectos relevantes da aprendizagem não</p><p>sejam passíveis de constituírem-se em itens de um exame, essa condição deixa de</p><p>ser considerada por professores, instituições, pais, autores de livros didáticos etc., em</p><p>função da própria influência que essa avaliação exerce nesses grupos.</p><p>Além disso, a análise dos resultados da avaliação comete o exagero equivocado</p><p>de privilegiar determinados aspectos, em detrimento de outros, que não são passíveis</p><p>de aferição, mas que complementam o conhecimento matemático avaliado. Esta</p><p>distorção é possível de ser identificada no documento que divulga o resultado da ANA</p><p>realizada em novembro de 2014 e que avaliou 2.45.132 estudantes do terceiro ano do</p><p>ensino fundamental em todo o País.</p><p>Neste documento (BRASIL, 2015), são apresentados os resultados condensados</p><p>no gráfico reproduzido a seguir.</p><p>Gráfico 1 – Resultado comparativo entre os níveis de proficiência nas avaliações, em</p><p>Matemática, realizadas em 2013 e 2014, segundo o INEP</p><p>Fonte: INEP</p><p>Os resultados dos testes em Matemática são apresentados numa escala de</p><p>Proficiência, composta por quatro níveis progressivos e cumulativos. De acordo com</p><p>este mesmo documento, pressupõe-se que quando um estudante está posicionado</p><p>num determinado nível da escala, além de ter desenvolvido as habilidades referentes</p><p>a este nível, provavelmente também desenvolverá as habilidades referentes aos</p><p>níveis posteriores. A descrição da escala em Matemática e seus respectivos níveis é</p><p>apresentada no quadro reproduzido, deste mesmo documento (Brasil, 2015).</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 5 51</p><p>Quadro 1- Descrição das habilidades matemáticas por nível de desempenho</p><p>Fonte: INEP</p><p>Os resultados refletem que os estudantes encontram-se predominantemente no</p><p>nível 2. Desta forma, e tomando como parâmetro as habilidades matemáticas descritas</p><p>por nível, o que é dito nos resultados parece evidenciar que os estudantes estão</p><p>desprovidos das habilidades básicas que têm como foco privilegiado os números e os</p><p>processos e algoritmos de sua manipulação para a resolução de problemas simples</p><p>de aplicação.</p><p>Embora a utilização de avaliações em larga escala possa trazer benefícios</p><p>para o processo de diagnóstico do ensino num país de educação de massa como</p><p>o nosso, estas avaliações também podem ser representativas no que diz respeito à</p><p>dependência deste mesmo ensino dos exames, em consequência da supervalorização</p><p>do instrumento. à dependência deste mesmo ensino dos exames, em consequência</p><p>da supervalorização do instrumento.</p><p>Considerada esta hipótese, nos deparamos com um ensino de matemática nos</p><p>anos inicias sendo orientado por descritores que compõem as matrizes da ANA e que</p><p>o torna dependente dos exames e reduzido a atividades de cálculo. Esse processo</p><p>desencadeia orientações nos currículos escolares, mais precisamente quando se</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 5 52</p><p>considera a necessidade de “alfabetizar na idade certa” – até o 3º ano do ensino</p><p>fundamental - como um compromisso formal assumido pelos governos Federal, do</p><p>Distrito Federal, dos Estados e dos Municípios, instituído pela Portaria no 867, de 4 de</p><p>julho de 2012.</p><p>4 | O ENSINO É EFICAZ QUANDO O ALUNO SABE CALCULAR O SOLICITADO: O</p><p>QUE SUSTENTA ESTE DISCURSO?</p><p>Ao afirmar que os alunos fracassam, valoriza-se um sistema de ensino de</p><p>matemática “eficaz” e de “qualidade” (VACCARO, 2010) centrado na aferição da</p><p>proficiência nos cálculos, o que justifica a implantação das avaliações em larga</p><p>escala, e ancoradas no campo econômico, político e social e contribui para melhor</p><p>compreender o que orienta o ensino escolar de matemática em nosso país. Desta</p><p>maneira, este ensino será tão “eficaz” e de “qualidade” quanto mais próximo estiver do</p><p>que as avaliações estabelecem como conteúdos a serem ensinados.</p><p>Por outro lado, os argumentos que parecem sustentar as avaliações e que servem</p><p>para a análise do resultado da proficiência dos alunos, apoiam-se em elementos</p><p>técnicos como a Teoria da Resposta ao Item (TRI) e o Índice de Desenvolvimento da</p><p>Escola Básica (IDEB). A inferência estatística (técnica) que sustenta a argumentação</p><p>(BATTERSBY, 2003) e traduz as informações numéricas apresentadas em documentos</p><p>e relatórios de análise dos resultados, é pouco acessível aos professores e também</p><p>pouco compreensível pelo público.</p><p>No entanto, estes resultados são amplamente utilizados</p><p>97</p><p>A LITERACIA FINANCEIRA: CENÁRIO E PERSPECTIVAS</p><p>Adriana Stefanello Somavilla</p><p>Tânia Stella Bassoi</p><p>DOI 10.22533/at.ed.21319140210</p><p>CAPÍTULO 11 .......................................................................................................... 109</p><p>EDUCAÇÃO ESTATÍSTICA: HISTÓRIA E MEMÓRIA</p><p>Ednei Leite de Araújo</p><p>DOI 10.22533/at.ed.21319140211</p><p>CAPÍTULO 12 .......................................................................................................... 120</p><p>EDUCAÇÃO MATEMÁTICA E APRENDER A APRENDER</p><p>Robson André Barata de Medeiros</p><p>Janeisi de Lima Meira</p><p>DOI 10.22533/at.ed.21319140212</p><p>CAPÍTULO 13 .......................................................................................................... 132</p><p>A ESCRITA DE CARTAS EM AULAS DE ESTATÍSTICA APLICADA À EDUCAÇÃO NO CURSO DE</p><p>PEDAGOGIA: ALGUMAS REFLEXÕES</p><p>Jónata Ferreira de Moura</p><p>DOI 10.22533/at.ed.21319140213</p><p>CAPÍTULO 14 .......................................................................................................... 141</p><p>MATEMÁTICA É UM BICHO DE SETE CABEÇAS!? UMA DISCUSSÃO SOBRE A FORMAÇÃO DO</p><p>PROFESSOR DOS ANOS INICIAIS</p><p>Laynara dos Reis Santos Zontini</p><p>Luciane Ferreira Mocrosky</p><p>DOI 10.22533/at.ed.21319140214</p><p>CAPÍTULO 15 .......................................................................................................... 152</p><p>A PERSPECTIVA DE UMA FORMADORA/ALFABETIZADORA ATUANTE NO PACTO NACIONAL</p><p>PELA ALFABETIZAÇÃO NA IDADE CERTA (PNAIC)</p><p>Andressa Florcena</p><p>DOI 10.22533/at.ed.21319140215</p><p>CAPÍTULO 16 .......................................................................................................... 161</p><p>O ESTUDO DE AULA (“LESSON STUDY”) COMO METODOLOGIA DE FORMAÇÃO CONTINUADA CAPAZ</p><p>DE REVELAR OS CONHECIMENTOS DE UMA PROFESSORA DO 2º ANO DO ENSINO FUNDAMENTAL</p><p>Marco Aurélio Jarreta Merichelli</p><p>DOI 10.22533/at.ed.21319140216</p><p>CAPÍTULO 17 .......................................................................................................... 172</p><p>SABERES DOCENTES SOBRE RESOLUÇÃO DE PROBLEMAS: IMPACTOS DE POLÍTICAS</p><p>PÚBLICAS DE FORMAÇÃO CONTINUADA DE PROFESSORES ALFABETIZADORES</p><p>Milena Schneider Pudelco</p><p>Emerson Rolkouski</p><p>DOI 10.22533/at.ed.21319140217</p><p>CAPÍTULO 18 .......................................................................................................... 183</p><p>AS TECNOLOGIAS DIGITAIS DE INFORMAÇÃO E COMUNICAÇÃO NA FORMAÇÃO DO PROFESSOR</p><p>DE MATEMÁTICA EM CURSOS NA MODALIDADE A DISTÂNCIA</p><p>Elivelton Henrique Gonçalves</p><p>Fabiana Fiorezi de Marco</p><p>DOI 10.22533/at.ed.21319140218</p><p>CAPÍTULO 19 .......................................................................................................... 194</p><p>CARACTERÍSTICAS DA FORMAÇÃO DO PROFESSOR BRASILEIRO QUE ENSINA MATEMÁTICA</p><p>NOS ANOS INICIAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL</p><p>Julio Robson Azevedo Gambarra</p><p>DOI 10.22533/at.ed.21319140219</p><p>CAPÍTULO 20 .......................................................................................................... 205</p><p>O DESAFIO DA FORMAÇÃO DE PROFESSORES DE MATEMÁTICA ENFRENTADOS PELO</p><p>MODELO UNIVERSITÁRIO E PELA RESIDÊNCIA DOCENTE</p><p>Rosemary Barbeito Pais</p><p>DOI 10.22533/at.ed.21319140220</p><p>CAPÍTULO 21 .......................................................................................................... 220</p><p>O TEMPO QUE NÃO ABRIGA A REFLEXÃO EM UM CURSO DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES A</p><p>DISTÂNCIA QUE ENSINAM MATEMÁTICA</p><p>Alberto Luiz Pereira da Costa</p><p>DOI 10.22533/at.ed.21319140221</p><p>CAPÍTULO 22 .......................................................................................................... 230</p><p>DESENVOLVIMENTO PROFISSIONAL DOCENTE: CONTRIBUIÇÕES DE ALGUMAS PESQUISAS</p><p>BRASILEIRAS</p><p>Adriana Fatima de Souza Miola</p><p>Patricia Sandalo Pereira</p><p>DOI 10.22533/at.ed.21319140222</p><p>CAPÍTULO 23 .......................................................................................................... 247</p><p>UMA INVESTIGAÇÃO SOBRE A CONDIÇÃO DOCENTE DE PEDAGOGOS NO ENSINO DE</p><p>MATEMÁTICA</p><p>Carlos André Bogéa Pereira</p><p>DOI 10.22533/at.ed.21319140223</p><p>CAPÍTULO 24 .......................................................................................................... 257</p><p>CAMINHOS TRILHADOS PARA UMA FORMAÇÃO EM MATEMÁTICA PARA INCLUSÃO DE</p><p>ESTUDANTES CEGOS NO ENSINO MÉDIO</p><p>Salete Maria Chalub Bandeira</p><p>DOI 10.22533/at.ed.21319140224</p><p>CAPÍTULO 25 .......................................................................................................... 269</p><p>DISCIPLINA DE ANÁLISE NOS CURSOS DE LICENCIATURA EM MATEMÁTICA NO BRASIL: UM</p><p>OLHAR PARA OS CONHECIMENTOS PEDAGÓGICOS DO CONTEÚDO</p><p>Luciano Duarte da Silva</p><p>Márcio Urel Rodigues</p><p>Nilton Cezar Ferreira</p><p>Ana Cristina Gomes de Jesus</p><p>Maxwell Gonçalves Araújo</p><p>Ediel Pereira de Macedo</p><p>DOI 10.22533/at.ed.21319140225</p><p>CAPÍTULO 26 .......................................................................................................... 281</p><p>TIPOS DE PARCERIAS CONSTITUÍDAS PELAS INSTITUIÇÕES PARTICIPANTES DO PIBID/</p><p>MATEMÁTICA NO BRASIL</p><p>Márcio Urel Rodrigues</p><p>Rosana Giaretta Sguerra Miskulin</p><p>Luciano Duarte da Silva</p><p>Nilton Cezar Ferreira</p><p>Acelmo de Jesus Brito</p><p>Ediel Pereira de Macedo</p><p>DOI 10.22533/at.ed.21319140226</p><p>CAPÍTULO 27 .......................................................................................................... 293</p><p>DESAFIOS NA CRIAÇÃO E APLICAÇÃO DE UMA SEQUÊNCIA DIDÁTICA – UMA INTRODUÇÃO AO</p><p>ENSINO DE ESTATÍSTICA NOS ANOS INICIAIS</p><p>Lídia Silva Lacerda da Rosa</p><p>Francisco Roberto Pinto Mattos</p><p>DOI 10.22533/at.ed.21319140227</p><p>CAPÍTULO 28 .......................................................................................................... 299</p><p>DIRETRIZES CURRICULARES DO ENSINO FUNDAMENTAL DO MUNICÍPIO DE VITÓRIA: UMA</p><p>PRODUÇÃO A MUITAS MÃOS</p><p>Carla Augusta de Carvalho</p><p>Christiane Milagre da Silva Rodrigues</p><p>DOI 10.22533/at.ed.21319140228</p><p>CAPÍTULO 29 .......................................................................................................... 310</p><p>PARÂMETROS CURRICULARES NACIONAIS E A BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR:</p><p>CONSENSOS E DISSENSOS</p><p>Daniela Jéssica Veroneze</p><p>Arnaldo Nogaro</p><p>DOI 10.22533/at.ed.21319140229</p><p>CAPÍTULO 30 .......................................................................................................... 323</p><p>JOSÉ ANASTÁCIO DA CUNHA E SUA OBRA OS PRINCIPIOS MATHEMATICOS</p><p>Ângela Maria dos Santos</p><p>Gabriel Loureiro de Lima</p><p>DOI 10.22533/at.ed.21319140230</p><p>CAPÍTULO 31 .......................................................................................................... 332</p><p>MATEMÁTICA ESCOLAR NO BRASIL OITOCENTISTA: UMA PESQUISA SOBRE LIVROS, AUTORES</p><p>E INSTITUIÇÕES ESCOLARES</p><p>Waléria de Jesus Barbosa Soares</p><p>DOI 10.22533/at.ed.213191402313</p><p>CAPÍTULO 32 .......................................................................................................... 342</p><p>O PENSAMENTO MATEMÁTICO AVANÇADO EM PESQUISAS</p><p>Paulo Ferreira do Carmo</p><p>Sonia Barbosa Camargo Igliori</p><p>DOI 10.22533/at.ed.21319140232</p><p>CAPÍTULO 33 .......................................................................................................... 355</p><p>REGISTRAR PRA QUÊ? PRA QUEM?</p><p>Rosana de Fátima Lima</p><p>DOI 10.22533/at.ed.21319140233</p><p>CAPÍTULO 34 .......................................................................................................... 364</p><p>PRÁTICAS MATEMÁTICAS NO CURSO DE GESTÃO DE COOPERATIVAS</p><p>Juliana Meregalli Schreiber</p><p>DOI 10.22533/at.ed.21319140234</p><p>CAPÍTULO 35 .......................................................................................................... 372</p><p>ENSINO E APRENDIZAGEM A PARTIR DO DESENVOLVIMENTO HISTÓRICO DA MATEMÁTICA</p><p>José Ronaldo Melo</p><p>Thaylon Souza de Oliveira</p><p>DOI 10.22533/at.ed.21319140235</p><p>CAPÍTULO 36 .......................................................................................................... 381</p><p>PROJETOS DE MODELAGEM NO ENSINO MÉDIO: USANDO A MATEMÁTICA PARA COMPREENDER</p><p>A REALIDADE E PARA SER CRÍTICO</p><p>Neuber Silva Ferreira</p><p>Regina Helena de Oliveira Lino Franchi</p><p>DOI 10.22533/at.ed.21319140236</p><p>CAPÍTULO 37 ..........................................................................................................</p><p>pelos meios de</p><p>comunicação e não se pode deixar de considerar que as análises nem sempre são</p><p>elaboradas por quem detém conhecimentos estatísticos e pedagógicos, e ainda de os</p><p>relatórios serem escritos com objetivos ideológicos.</p><p>Deste modo, a possibilidade de produzir conclusões superficiais a partir desses</p><p>resultados merece ser analisada, bem como o fato de simplificar sobremaneira o</p><p>processo avaliativo. Além disso, dependendo da autoridade de quem as utiliza pode</p><p>servir como técnica de persuasão para aceitar os resultados como crenças. E, no caso</p><p>da Matemática, sem que sejam fornecidas as razões adequadas para essas crenças.</p><p>Se o ensino de matemática “de qualidade” é determinado pelos exames, então ao</p><p>identificar as suas diretrizes aos conteúdos avaliados permite situar a representação</p><p>da disciplina no ensino em nosso país.</p><p>Estudos feitos por Mandarino (2006) a respeito da distribuição e análise dos</p><p>conteúdos que servem de base para o ensino de Matemática nos anos iniciais,</p><p>mostam a ênfase dada aos conteúdos do campo dos Números e Operações, num</p><p>ensino com foco “no saber procedimental” baseado em etapas e procedimentos de</p><p>cálculos além de muita preocupação com o cumprimento do programa que é o próprio</p><p>sumário dos livros didáticos. Este panorama nos coloca diante de um argumento de</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 5 53</p><p>autoridade que, de acordo com (Perelman e Olbrechts-Tyteca (2014), utiliza atos ou</p><p>juízos de uma pessoa ou de um grupo de pessoas como meio de prova a favor de uma</p><p>tese. Este argumento de autoridade que sustenta o ensino de matemática nos anos</p><p>iniciais, parece apoiar-se nos exames e seus respectivos documentos. Além disso, os</p><p>livros didáticos para esse segmento e referenciais que norteiam currículos escolares</p><p>incorporados a propostas curriculares de Secretarias de Educação, direcionam o</p><p>ensino de matemática para uma supervalorização de procedimentos de cálculo.</p><p>Os discursos que sustentam as diretrizes das avaliações condensam e expõem</p><p>o que se considera desejável ou preferível: a qualidade da educação, em geral e da</p><p>Matemática em particular, e nesta, o predomínio do cálculo. Estes discursos situam</p><p>o caráter seletivo da escolarização e cujo núcleo dessa representação é o cálculo.</p><p>Por outro lado, as crenças e valores gerais existentes na sociedade, e que são</p><p>compartilhados nos grupos de professores, de autores de livros, por exemplo, refletem</p><p>ideias que a sociedade tem e que estão enraizadas nesses grupos como também as</p><p>relações sociais em um determinado campo e em relação aos atores desse mesmo</p><p>campo.</p><p>Diante disto podemos afirmar que a matemática escolarizada é a definida por</p><p>Thompson (1992): o principal papel do seu ensino é tornar os alunos capazes de dominar</p><p>os números, os processos e os algoritmos de sua manipulação para responderem</p><p>problemas simples de aplicação. Está é a representação das matemáticas constituída</p><p>para atender os interesses e necessidades escolares, não os da disciplina.</p><p>Temos, então por hipótese que o problema do “dito fracasso escolar das</p><p>matemáticas” encontra-se no duplo destas disciplinas. Mazzotti (2013, p.20) diz ser</p><p>esse “duplo constituído de elementos figurativos” e um “sistema de significações”</p><p>que operam, fazem funcionar a representação social. Deste modo, aimda segundo o</p><p>mesmo autor, o caráter da representação social é dado por sua função de coordenar e</p><p>condicionar condutas das pessoas a partir da adaptação de conhecimentos e saberes</p><p>(ideologias) aos seus interesses e necessidades, os quais coincidem com o duplicado,</p><p>ou uma ciência ou uma ideologia.</p><p>Esse duplo, que é a representação social,</p><p>substitui a ciência [...] e a constitui (ou reconstitui) a partir das relações sociais</p><p>implicadas; de um lado, portanto, através dela uma ciência recebe seu duplo, uma</p><p>sombra sobre o corpo da sociedade, e, do outro, duplica-se no que está fora do</p><p>ciclo e no ciclo da transações dos interesses comuns da sociedade (MOSCOVICI,</p><p>2004, p.79. apud MAZZOTTI, 2013, p.19)</p><p>Desse modo, o que se considera desejável ou preferível fazer é o que sustenta</p><p>a matemática como cálculo. Logo, faz-se necessário buscar quais são os preferíveis</p><p>ou desejáveis (interesses e necessidades) nas escolas, nos currículos escolares, nas</p><p>diretrizes, no que se faz, para encontrar as razões que os atores sociais têm para</p><p>manter a representação da matemática como cálculo.</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 5 54</p><p>5 | CONSIDERAÇÕES FINAIS</p><p>A valorização dos conteúdos escolares que são passíveis de ser avaliados</p><p>pelos exames subjuga a complexidade do processo de ensino e de aprendizagem</p><p>em matemática. Essa dependência fica evidenciada na influência dos resultados</p><p>da ANA que, a partir dos descritores explícitos na matriz, determina os conteúdos</p><p>escolares considerados na alfabetização matemática de estudantes até o 3º ano</p><p>do ensino fundamental. Ao desconsiderar as limitações deste instrumento, embora</p><p>os documentos analisados apontem essa característica, o que se evidencia é a</p><p>dependência entre a qualidade do ensino da matemática e a valorização dos números</p><p>e algoritmos, além da manipulação desses algoritmos para a resolução de problemas</p><p>simples de aplicação.</p><p>Temos, então, um sistema de ensino dependente de um outro que o avalia e que</p><p>se diz capaz de mensurar as competências matemáticas dos estudantes. Por outro</p><p>lado, não se pode deixar de considerar que a matemática escolarizada, supostamente</p><p>orientada por essa dependência, reduz o desenvolvimento cognitivo dos estudantes</p><p>nessa disciplina à realização de procedimentos de cálculo, memorização pura e</p><p>simples como se este ensino tivesse como único propósito (necessidade) selecionar</p><p>(reduzir) o que é requerido pela sociedade em geral – “passar nos exames”.</p><p>Esta dependência entre qualidade de ensino e resultados de exames mostra</p><p>que estes determinam e expressam o aproveitamento dos alunos contribuindo para</p><p>reforçar uma postura do professor, que vem de longa data. Esta prática do professor</p><p>não valoriza o esforço do estudante na resolução do problema e sim na aplicação</p><p>de um algoritmo, de uma operação. E, embora o sistema de ensino de matemática,</p><p>coordenado por um sistema de seleção, traduzido em exames, se diga eficaz, os</p><p>alunos fracassam.</p><p>REFERÊNCIAS</p><p>BRASIL. Avaliação Nacional da Alfabetização (ANA): documento básico. Brasília: Instituto Nacional de</p><p>Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira, 2013.</p><p>BRASIL. Avaliação Nacional da Alfabetização 2014. Brasília-DF, 2015</p><p>BRASIL, Secretaria de Ensino Fundamental/MEC. Parâmetros Curriculares Nacionais: terceiro e</p><p>quarto ciclos do ensino fundamental – Matemática. Brasília: MEC/SEF, 1998.</p><p>BATTERSBY, M. The Rhetoric of Numbers: Statistical Inference as Argumentation. 2003. Disponível</p><p>em: http://scholar.uwindsor.ca/ossaarchive/OSSA5/papersandcommentaries/5/. Acesso em setembro</p><p>de 2014.</p><p>MANDARINO, M.C.F. Concepções de ensino da Matemática elementar que emergem da prática</p><p>docente. Rio de Janeiro, 2006, 273 p. Tese de doutorado. Departamento de Educação, Pontifícia</p><p>Universidade Católica do Rio de Janeiro.</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 5 55</p><p>MAZZOTTI, T. Ensino de Conceitos Científicos ou de suas Representações Sociais? Universidade</p><p>Estácio de Sá, 2013.</p><p>___________ . Doutrinas Pedagógicas, máquinas produtoras de litígios. Marilia: Poiesis</p><p>Editora.2008.</p><p>___________ . Análise Retórica: por que e como fazer? In: SOUSA, C.P.; LOUREIRO (orgs.).</p><p>Representações Sociais – estudos metodológicos em educação. Curitiba: Ed. PUCPR, 2011.</p><p>MOSCOVICI, S. Notes towards a description of social representations. European Journal of Social</p><p>Psychology, v.18, p. 211-250, 1988. Tradução de Glaucia Alves Vieira.</p><p>___________. Representações sociais: investigações em psicologia social. Editado em inglês por</p><p>Gerard Duveen. Traduzido do inglês por Pedrinho A. Guareschi. 9 ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2012.</p><p>NUNES, T; CARRAHER, D; SCHLEIMANN, A. Na vida dez, na escola zero. – 16ª.ed. - São Paulo:</p><p>Cortez, 2011.</p><p>PROGRAMAS de livros didáticos: histórico. Fundação Nacional de Desenvolvimento da Educação.</p><p>Disponível em: . Acesso em setembro 2014.</p><p>PERELMAN, C.; OLBRECHTS-TYTECA, L. Tratado da argumentação: a nova retórica. São Paulo:</p><p>Martins Fontes, 2014.</p><p>THOMPSON, A. G. Teachers’ beliefs and conceptions: a synthesis of the research. Handbook of</p><p>research in mathematics teaching and learning. D. A. Grows, pp127-146. New York: Macmillan, 1992.</p><p>VACCARO, M. L. Avaliação de Larga Escala e Proficiência Matemática. Dissertação de Mestrado,</p><p>2010. Programa de Pós Graduação em Ensino de Matemática. Universidade Federal do Rio de</p><p>Janeiro – UFRJ. Disponível em http://www.pg.im.ufrj.br/pemat/26%20Ledo%20Vaccaro.pdf. Acesso</p><p>em setembro 2014.</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 6 56</p><p>A APROPRIAÇÃO DO CONHECIMENTO MATEMÁTICO</p><p>PELO ALUNO: UMA DISCUSSÃO SOBRE O</p><p>PROCESSO DE TRANSFERÊNCIA</p><p>CAPÍTULO 6</p><p>Renato Francisco Merli</p><p>Mestre em Filosofia e Ensino de Ciências e</p><p>Educação Matemática</p><p>Universidade Tecnológica Federal do Paraná</p><p>Toledo - Paraná</p><p>Leonardo Severo</p><p>Especialista em Metodologia do Ensino de</p><p>Matemática</p><p>Marechal Cândido Rondon - Paraná</p><p>RESUMO: A relação entre o professor de</p><p>Matemática e o aluno é estabelecida a partir de</p><p>sentimentos vivenciados no ambiente familiar e</p><p>que são, por vezes, transferidos ao professor.</p><p>Pelo processo e transferência o aluno projeta no</p><p>professor experiências vividas anteriormente.</p><p>O objetivo principal desta pesquisa é avaliar e</p><p>verificar como se dá o processo de transferência</p><p>e a influência deste processo nos ambientes</p><p>de ensino e aprendizagem de Matemática.</p><p>Além disso, tem-se como hipótese o fato de</p><p>que o processo de transferência é de extrema</p><p>importância na apropriação do conhecimento</p><p>matemático pelo aluno. Para tanto, foram</p><p>selecionados dez alunos matriculados na rede</p><p>pública estadual da região oeste do Estado do</p><p>Paraná, que participaram de uma entrevista</p><p>semiestruturada. A partir da coleta de dados</p><p>foi possível perceber que o desejo do aluno</p><p>pelo conhecimento matemático é influenciado</p><p>pelo processo de transferência, o que, por</p><p>sua vez, pode influenciar a apropriação do</p><p>conhecimento matemático pelo aluno e,</p><p>consequentemente, a qualidade do processo</p><p>de ensino e aprendizagem de Matemática.</p><p>PALAVRAS-CHAVE: Desejo; Professor;</p><p>Processo de Ensino e Aprendizagem.</p><p>ABSTRACT: The relation between the teacher</p><p>of Mathematics and student is established from</p><p>feelings experienced in the familiar environment</p><p>and that are sometimes transferred to the</p><p>teacher. Through the process and transfer</p><p>the student projects previously experienced</p><p>experiences in the teacher. The main objective</p><p>of this research is to evaluate and verify how</p><p>the process of transference and the influence of</p><p>this process occurs in the teaching and learning</p><p>environments of Mathematics. In addition, it</p><p>is hypothesized that the transfer process is</p><p>extremely important in the appropriation of</p><p>mathematical knowledge by the student. Ten</p><p>students enrolled in the state public network of</p><p>the western region of the State of Parana were</p><p>selected for this purpose, which they participated</p><p>of a semi-structured interview. From the data</p><p>collection it was possible to perceive that the</p><p>student’s desire for mathematical knowledge</p><p>is influenced by the transfer process, which,</p><p>in turn, can influence the appropriation of the</p><p>mathematical knowledge by the student and,</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 6 57</p><p>consequently, the quality of the teaching process and learning of Mathematics.</p><p>KEYWORDS: Desire; Teacher; Process of Teaching and Learning.</p><p>1 | INTRODUÇÃO</p><p>O processo de ensino e aprendizagem dos conteúdos matemáticos é fonte de</p><p>inquietações de inúmeros pesquisadores da Educação e da Educação Matemática.</p><p>Quanto à apropriação do saber e postura do aluno no ambiente escolar podemos</p><p>citar, por exemplo, as pesquisadoras Kupfer (2001), Szymanski e Pezzini (2007) e</p><p>Szymanski e Rosa (2012). Em seus trabalhos é ressaltado que existe a presença de</p><p>diversos tipos de sujeitos no ambiente escolar, os quais estão passíveis de inúmeras</p><p>e distintas sensações e opiniões originárias de outros ambientes sociais a que o aluno</p><p>pertence, como por exemplo, o ambiente familiar.</p><p>Assim sendo, ao entrar no ambiente escolar, o aluno traz consigo experiências</p><p>vivenciadas no ambiente familiar. Essas experiências, por sua vez, podem ser</p><p>positivas ou negativas, permitindo-nos, assim, levantar os seguintes questionamentos:</p><p>as experiências vividas pelos alunos no ambiente familiar influenciam diretamente a</p><p>relação entre esse sujeito e a escola? E, a partir das relações estabelecidas em sala</p><p>de aula, é possível ao aluno canalizar seu desejo pelo conhecimento matemático?</p><p>Onde está “escondido” o desejo do aluno pela Matemática? Qual o papel exercido pelo</p><p>professor neste contexto?</p><p>Partindo destas questões e no intuito de compreender melhor o processo de</p><p>ensino e aprendizagem de Matemática e os fatores nele envolvidos, a presente</p><p>pesquisa tem como hipótese o fato de que o processo de transferência é de extrema</p><p>importância na apropriação do conhecimento matemático pelo aluno. Ainda, tem-se</p><p>como objetivo principal avaliar e verificar como se dá o processo de transferência e a</p><p>influência deste processo nos ambientes de ensino e aprendizagem de Matemática.</p><p>Compete destacar que parte dessa pesquisa foi apresentada no XII Encontro Nacional</p><p>de Educação Matemática em 2016.</p><p>Ainda, com o intuito de verificar e validar a hipótese levantada, os pesquisadores</p><p>entrevistaram alunos com idades entre 10 e 12 anos matriculados em uma escola</p><p>da rede pública de ensino do Oeste Paranaense. Aos entrevistados foi aplicada</p><p>uma entrevista semiestruturada, o que permitiu aos pesquisadores avaliar o papel</p><p>do professor de Matemática na canalização do desejo do aluno pelo conhecimento</p><p>matemático. Para tanto, nas próximas seções, serão apresentados os conceitos de</p><p>desejo e transferência expostos nas obras de Sigmund Freud e Jacques Lacan.</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 6 58</p><p>2 | O DESEJO E A APRENDIZAGEM DE MATEMÁTICA</p><p>No ambiente escolar são estabelecidos diversos tipos de relação. Há a relação</p><p>aluno/escola, aluno/professor, aluno/aluno e professor/escola. Pertencente a esse</p><p>ambiente, numa escala menor, temos o ambiente de ensino e aprendizagem de</p><p>Matemática. Nele, historicamente, encontramos relações conflituosas, em especial,</p><p>a relação aluno/ conhecimento matemático e aluno/ professor de Matemática. Essas</p><p>relações influenciam diretamente o desejo do aluno pelo conhecimento matemático e</p><p>determinarão a qualidade da apropriação do conhecimento pelo aluno.</p><p>Os sujeitos que frequentam o ambiente escolar estão em constante movimento</p><p>e externalizam, de uma maneira ou outra, a busca pela satisfação, como também</p><p>a satisfação encontrada. Como se sabe, a motilidade promove ações em nosso</p><p>organismo, o qual busca constantemente a satisfação. O nosso aparelho mental está,</p><p>portanto, buscando sanar suas próprias excitações. Assim sendo, “o acúmulo de</p><p>excitação é vivido como desprazer, e coloca o aparelho em ação com vistas a repetir</p><p>a vivência de satisfação (FREUD, 1969, p. 622). Então,</p><p>a esse tipo de corrente do interior do aparelho, partindo do desprazer e apontando</p><p>para o prazer, damos o nome de “desejo”. Afirmamos que só o desejo é capaz</p><p>de pôr o aparelho em movimento e que o curso de excitação dentro dele é</p><p>automaticamente regulado pelas sensações de prazer e desprazer (FREUD, 1969,</p><p>p. 622).</p><p>As relações estabelecidas entre sujeito e mundo externo tem como princípio o</p><p>desejo. Jacques Lacan (1901 – 1981) parte do principio de que estamos em constante</p><p>desejo. Contudo, o que desejamos está relacionado ao Outro, uma vez que o que</p><p>desejamos é um objeto e não um sujeito (LACAN, 1992). Desejaremos, portanto, um</p><p>objeto, o qual chamaremos de objeto do desejo,</p><p>[...], pois, em sua raiz e essência, é o desejo do Outro, e é aqui,</p><p>falando propriamente,</p><p>que está a mola do nascimento do amor, se amor é aquilo que se passa nesse</p><p>objeto em direção ao qual entendemos a mão pelo nosso próprio desejo e que, no</p><p>momento em que nosso desejo faz eclodir seu incêndio, nos deixa aparecer, por</p><p>um instante, essa resposta, essa outra mão que se estende para nós, bem como</p><p>seu desejo (LACAN, 1992, p. 180).</p><p>Em suma, “desejo é o sentimento muito forte do querer. É querer tanto, a ponto de</p><p>não medir esforços para conseguir o objeto desejado (SZYMANSKI; PEZZINI, 2007, p.</p><p>21). Como destacam Szymansky e Rosa (2012, p. 4),</p><p>é preciso ter em consideração que a educação, via de regra, vai contra o desejo, pois</p><p>o que mais se espera de um aluno é que ele seja o que o professor deseja: sábio e</p><p>dócil. Para isso existem regras, condutas esperadas, parâmetros curriculares, etc.</p><p>Os processos internos pelos quais o sujeito passa influenciam diretamente no</p><p>desejo do aluno pelo conhecimento matemático. Dentre esses processos podemos</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 6 59</p><p>destacar o processo de sublimação. De acordo com Kupfer (2001), toda pulsão sexual</p><p>é destinada a algum alvo. Quando a pulsão sexual muda seu objeto de desejo, ou alvo</p><p>sexual, e se orienta para outro alvo temos caracterizado o processo de sublimação. O</p><p>processo de sublimação permite que o desejo do aluno pelo conhecimento matemático</p><p>possa ser estimulado. O processo de sublimação dependerá inclusive da visão do</p><p>professor frente ao processo de ensino e aprendizagem. Quando é despertado o desejo</p><p>do aluno pelo conhecimento matemático a aprendizagem do aluno é beneficiada,</p><p>uma vez que, quanto mais variadas as experiências, maior será o desenvolvimento</p><p>do pensamento. Consequentemente, melhor será a qualidade da aprendizagem</p><p>(RAASCH, 1999).</p><p>Quando o desejo é despertado, juntamente com ele é despertada a curiosidade</p><p>intelectual, pois a decisão do aluno em estudar Matemática revelará sua postura</p><p>diante dessa área do conhecimento. O aluno deixa assim de ser apenas espectador</p><p>no processo de ensino e aprendizagem dos conteúdos matemáticos e passa a se</p><p>envolver mais na construção do próprio conhecimento. Dessa forma o aluno passa</p><p>a ser responsável por sua aprendizagem. Lorenzato (2006, p. 81-82), por exemplo,</p><p>destaca que,</p><p>[...] a descoberta geralmente vem como desfecho do processo de experimentação,</p><p>de procura, de pesquisa e se expressa por um sorriso que simboliza a alegria</p><p>de um desafio vencido, de um sucesso alcançado, de um novo conhecimento</p><p>adquirido; por isso. A descoberta causa, também, um forte reforço a autoimagem.</p><p>[...] a descoberta atua tanto na área cognitiva como na afetiva de quem a faz.</p><p>O sucesso do aluno na disciplina de Matemática dependerá fortemente do desejo</p><p>deste aluno em aprender Matemática. São inúmeros os fatores que contribuem nesse</p><p>processo, podendo-se destacar o processo de transferência, o qual será discutido</p><p>na próxima sessão. Este processo mostrará a relação estabelecida entre família e o</p><p>conhecimento matemático, relação esta que também influencia o desejo do aluno em</p><p>aprender Matemática.</p><p>Ao compreenderem-se os processos internos pelos quais o sujeito passa, a</p><p>relação estabelecida entre aluno e conhecimento matemático será beneficiada. O foco</p><p>do desejo do aluno passará a ser a disciplina de Matemática. Dessa forma, serão</p><p>estabelecidas novas relações nos ambientes de aprendizagem de Matemática, onde</p><p>o conhecimento matemático é foco do interesse de ambos (professor e aluno).</p><p>3 | O PROCESSO DE TRANSFERÊNCIA NOS AMBIENTES DE ENSINO E</p><p>APRENDIZAGEM DE MATEMÁTICA</p><p>A relação estabelecida entre aluno e professor de matemática influenciará a</p><p>relação estabelecida entre aluno e conhecimento matemático. Dessa forma, o aluno</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 6 60</p><p>destinará ou não seu desejo aos saberes matemáticos. Porém, a relação entre</p><p>professor e aluno dependerá, inclusive, da relação estabelecida entre pais e filhos</p><p>no ambiente familiar. No que diz respeito à educação, podemos destacar o processo</p><p>de transferência. Assim, os problemas de aprendizagem Matemática estão, em parte,</p><p>relacionados às transferências que os alunos fazem dos seus pais em relação aos</p><p>seus professores (FONSECA, 2011, p. 279).</p><p>No processo de transferência, o aluno transfere ao professor o papel que antes</p><p>destinava a seus pais. Como destacam Szymanski e Rosa (2012, p. 4),</p><p>[...] no campo da educação, existe a necessidade da mediação de um professor,</p><p>assim o processo de aprendizagem exige alguém que ensine e alguém que</p><p>aprenda. Essa aprendizagem também vai depender do lugar em que cada</p><p>professor é colocado por seu aluno.</p><p>O processo de transferência pode ser caracterizado a partir do desdobramento</p><p>Complexo de Édipo. As figuras paternas e maternas influenciam o desenvolvimento</p><p>da criança e consequentemente, as relações que elas (as crianças) estabelecem com</p><p>a sociedade, incluindo, dessa forma, as relações estabelecidas nos ambientes de</p><p>ensino e aprendizagem de Matemática e, consequentemente, a relação estabelecida</p><p>com o conhecimento matemático.</p><p>A lenda de Édipo Rei serve como embasamento para a definição daquilo que</p><p>se conhece por Complexo de Édipo. A lenda de Édipo Rei é baseada na mitologia</p><p>grega, especificamente na peça teatral redigida por Sófocles intitulada Édipo Rei.</p><p>Nela, Édipo, sem saber que Jocasta é sua mãe, casa-se com ela após assassinar</p><p>o próprio pai, Laio, sem saber do parentesco entre ambos. Depois de descobrir a</p><p>verdade, Édipo cega a si mesmo enquanto a mãe se suicida (FERRARI, s.d.). Assim,</p><p>no viés psicanalítico um pai, uma mãe e um filho representam uma estrutura edípica</p><p>(RAASCH, 1999). No decorrer da infância, a criança idealiza em seus pais a figura</p><p>de proteção, cuidado e carinho. Ao frequentar o ambiente escolar, a criança destina/</p><p>transfere ao professor aquela figura que antes resignava a seus pais, ou seja,</p><p>os professores, pela dissolução do complexo de Édipo, têm a possibilidade de</p><p>ocuparem imaginariamente o lugar de Lei, autoridade que antes era dirigida aos</p><p>pais, favorecendo a transferência, o desejo e o saber (SZYMANSKY; ROSA, 2012,</p><p>p. 5).</p><p>O professor passa a ser a figura referencial para o aluno e é nela que ele (o</p><p>aluno) irá se espelhar. Dessa maneira, “o professor é, tanto quanto os pais, um modelo</p><p>de identificação (SILVA, 2006, p. 167). Esse professor é reconhecido pelo aluno como</p><p>figura libertadora, a qual o auxiliará na obtenção de poder (conhecimento) diante da</p><p>sociedade em que vive. Sendo assim,</p><p>o professor é um dos primeiros substitutos dos pais. É ele que ensina desde a</p><p>forma de pintar e colar mais adequada, das primeiras letras até a construção de</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 6 61</p><p>frases para a elaboração de um texto mais complexo. É ele quem proporciona que</p><p>o aluno transforme um papel em branco em uma redação, em uma história (SILVA,</p><p>2006, p. 167).</p><p>É importante destacar que o processo de transferência é inconsciente. Como</p><p>destaca Silva (2006, p. 169), a</p><p>[...] transferência é algo que acontece inconscientemente, onde o desejo</p><p>inconsciente busca ligar-se a formas (professor) para esvaziá-la do seu valor</p><p>real, colocando ali o sentido que nos interessa. Instalada, o professor torna-se</p><p>depositário de algo que pertence ao aluno. Este, contudo, não é um lugar fácil de</p><p>suportar, pois o professor também é sujeito desejante com vida própria.</p><p>O sujeito desejante (aluno) transfere ao professor não somente experiências</p><p>positivas vividas no ambiente familiar. Ele transfere também aspectos negativos</p><p>vivenciados nas relações entre pais e filhos. Sendo assim, o aluno revive a relação</p><p>original entre pais e filhos transferindo para o professor todo o amor e/ou hostilidade</p><p>que teve que abrir mão" (SILVA, 2006, p. 168). Ao professor são transferidos, portanto,</p><p>todos os sentimentos que tem origem da relação estabelecida entre pais e filhos. Ainda,</p><p>“a posição da criança frente ao saber que o mundo escolar representa se articula à</p><p>forma como ela se encontra</p><p>ligada à sua estrutura familiar" (KHALIL, 2011, p.42).</p><p>Muitas vezes, "pelas vias do inconsciente, os jovens adolescentes sinalizam, por meio</p><p>da transferência, desejos recalcados em relação aos seus pais" (FONSECA, 2011, p.</p><p>275). De acordo com Dos Santos (2009, p. 49),</p><p>[...] o professor colhido pela transferência passa a fazer parte do inconsciente do</p><p>aluno, e é a partir desse lugar em que é colocado é que será escutado, ou seja,</p><p>tudo que o professor disser será escutado através dessa posição particular que</p><p>ocupa no inconsciente do sujeito.</p><p>A aprendizagem do aluno dependerá diretamente das relações estabelecidas</p><p>entre professor a aluno. A aprendizagem, dessa forma, está vinculada às relações</p><p>afetivas estabelecidas entre professor e aluno, os quais se conhecem e desconhecem</p><p>no processo educacional (SILVA, 2006). Revestido da figura à qual o aluno destina seu</p><p>desejo, o professor ou aquilo que ele representa fará com que o aluno se identifique</p><p>com o conhecimento matemático e busque sanar suas "necessidades" frente a essa</p><p>área do conhecimento.</p><p>O professor de Matemática deve aceitar o lugar no qual o aluno lhe colocou. Esse</p><p>é um dos passos para o sucesso do aluno no processo de ensino e aprendizagem dos</p><p>conteúdos matemáticos. Caso contrário, o aluno está fadado ao fracasso escolar. É</p><p>preciso destacar que “o professor, na transferência, carrega algo que é do aluno e é</p><p>por este revestido de uma importância especial, a qual lhe garantirá poder e autoridade</p><p>em sala de aula” (DOS SANTOS, 2009, p. 48).</p><p>A relação estabelecida entre aluno e conhecimento matemático, ao qual o aluno</p><p>destinará ou não seu desejo terá como princípio a relação estabelecida entre aluno e</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 6 62</p><p>professor de Matemática. O sucesso do aluno no processo de ensino e aprendizagem</p><p>dos conteúdos matemáticos está vinculado, dentre outras coisas, ao lugar em que o</p><p>aluno colocou seu professor de Matemática.</p><p>Ao se apropriar da figura pela qual foi revestido, o professor poderá construir e/ou</p><p>reconstruir as relações estabelecidas entre sujeito desejante (o aluno) e a Matemática.</p><p>Dessa forma, garantirá a qualidade da aprendizagem do aluno e reestruturará não só</p><p>a relação entre aluno e o conhecimento matemático, mas também todas as outras</p><p>relações estabelecidas nos ambientes de ensino e aprendizagem de Matemática e</p><p>que influenciam diretamente a qualidade da apropriação do conhecimento matemático</p><p>pelo aluno.</p><p>4 | MATERIAIS E MÉTODOS</p><p>Ao acometer-se a uma pesquisa o pesquisador busca resolver alguns conflitos</p><p>internos a partir de uma problemática vivenciada. Ao entrar em sala de aula nos</p><p>deparamos com os mais diversos tipos de sujeito. Temos no educandário alunos com</p><p>alto desempenho na disciplina de Matemática. Entretanto, há aqueles que possuem</p><p>aversão à disciplina. Mas afinal, as experiências vividas pelos alunos no ambiente</p><p>familiar influenciam diretamente a relação entre esse sujeito e a escola? E, a partir das</p><p>relações estabelecidas em sala de aula, é possível ao aluno canalizar seu desejo pelo</p><p>conhecimento matemático? Onde está "escondido" o desejo do aluno pela Matemática?</p><p>Qual o papel exercido pelo professor neste contexto? A partir destes questionamentos</p><p>foi possível delinear o caminho a ser seguido pelos pesquisadores e, por conseguinte,</p><p>estabelecer os parâmetros e métodos a serem utilizados.</p><p>A coleta de dados aconteceu em uma escola da rede de ensino pública estadual</p><p>da região Oeste Paranaense. A amostra foi selecionada pela professora de Matemática</p><p>regente, cabendo ao entrevistador apenas expor os perfis desejáveis à pesquisa.</p><p>Foram selecionados alunos com alto desempenho escolar, alunos com desempenho</p><p>escolar moderado e alunos que não veem a escola e/ou a Matemática como objetivo</p><p>em suas vidas. A amostra era composta por dez alunos, com idades entre 10 e 12</p><p>anos. A entrevista semiestruturada foi gravada em áudio e posteriormente transcrita. As</p><p>perguntas que foram usadas inicialmente encontram-se no Apêndice desta pesquisa.</p><p>Os sujeitos entrevistados foram nomeados por siglas A1, A2, A3, A4, etc.</p><p>Para a análise de dados, os pesquisadores utilizaram o método qualitativo-</p><p>quantitativo, uma vez que,</p><p>[...] os métodos qualitativos e quantitativos não se excluem [...] os métodos</p><p>qualitativos trazem como contribuição ao trabalho de pesquisa uma mistura de</p><p>procedimentos de cunho racional e intuitivo capazes de contribuir para a melhor</p><p>compreensão dos fenômenos (NEVES, 1996, p. 02).</p><p>Apropriando-se de ambos os métodos os entrevistadores puderam avaliar o</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 6 63</p><p>discurso dos sujeitos e, posteriormente, estabelecer parâmetros com as respostas</p><p>dadas. Esse fato pode ser observado na análise dos dados coletados. Os entrevistadores</p><p>puderam, portanto, avaliar tanto a essência do discurso dos sujeitos como quantificar</p><p>as respostas coletadas, garantindo uma melhor qualidade da pesquisa.</p><p>5 | DISCUSSÃO DOS RESULTADOS</p><p>A partir da coleta de dados e análise da entrevista dos sujeitos foi possível</p><p>aos pesquisadores validar/verificar a hipótese levantada. Então, percebe-se, no</p><p>próprio discurso dos entrevistados e conforme exposto na sequência, que o desejo</p><p>é fundamental no processo de ensino e aprendizagem de Matemática e determinará,</p><p>inclusive, a relação que o aluno estabelece com esta área do conhecimento. Além disso,</p><p>é possível perceber, com base na amostra coletada, que o professor de Matemática</p><p>exerce forte influência sobre o educandário, determinando assim, a relação entre</p><p>aluno e conhecimento matemático, o que, por sua vez, está intimamente relacionado</p><p>à apropriação do conhecimento pelo aluno.</p><p>Quando questionados, uma maioria significativa dos entrevistados relacionou</p><p>o desejo ao querer. No decorrer da entrevista, 80% (Figura 1) dos entrevistados</p><p>apresentou como resposta à pergunta ‘o que você entende por desejo?’, a relação</p><p>entre desejo e querer, como pode ser visto abaixo,</p><p>0</p><p>2</p><p>4</p><p>6</p><p>8</p><p>10</p><p>Querer Sonho</p><p>Para você, o que é desejo?</p><p>Figura 1 - O que é o Desejo?</p><p>Fonte: Severo (2015, p. 35)</p><p>O entrevistado A10 verbalizou que o "desejo é você querer muito alguma coisa".</p><p>Partindo deste mesmo entendimento, o entrevistado A2 também apontou que o desejo</p><p>está ligado ao querer, pois, conforme declarado por este, o ‘desejo é algo que você</p><p>quer, mas você não tem". Sendo assim, o desejo confunde-se e mistura-se, com base</p><p>nas entrevistas realizadas, com sentimento de querer. Sobre isso, Szymanski e Pezzini</p><p>(2007, p. 21) descrevem que o "desejo é o sentimento muito forte do querer. É querer</p><p>tanto, a ponto de não medir esforços para conseguir o objeto desejado".</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 6 64</p><p>No decorrer das entrevistas, além de outros fatores, foi possível observar, ainda,</p><p>que a afetividade em sala de aula é fundamental na construção do conhecimento, uma</p><p>vez que, conforme exposto pelo entrevistado A6 quando questionado sobre a escola</p><p>ideal, ela ‘seria bem grande, com vários laboratórios, com sala de arte. Não deveria</p><p>ter 50 alunos na sala para o professor ter mais contato com os alunos. Deveria ter</p><p>dois professores em sala pra poder ajudar melhor os alunos’. Assim sendo e, baseado</p><p>na resposta obtida, é possível observar que a relação estabelecida entre o aluno e o</p><p>conhecimento, em especial o conhecimento matemático, é influenciada pelas relações</p><p>afetivas estabelecidas no espaço escolar. Este fato é visto também na resposta dada</p><p>pelo aluno A2. Quando questionado sobre sua preferência por determinado professor,</p><p>esse declarou preferir ‘a professora de matemática porque ela é muito querida. Ela é</p><p>amorosa’. Seguindo a mesma linha de pensamento, o entrevistado A5, no decorrer da</p><p>entrevista, declarou ter uma boa relação afetiva com o corpo docente, tendo declarado</p><p>que se considera ‘brincalhão com os professores. A gente conversa e se dá bem.</p><p>Gosto de todos’. Assim sendo, é perceptível que as relações estabelecidas em sala</p><p>de aula, quando afetivas, influenciam também</p><p>o desejo do aluno pelo conhecimento,</p><p>inclusive o matemático.</p><p>Compete ao professor, portanto, avaliar sua postura diante do corpo discente,</p><p>uma vez que as relações estabelecidas em sala de aula influenciarão, dentre outras</p><p>coisas, o sucesso do aluno no processo de ensino e aprendizagem de Matemática.</p><p>Dessa forma, a qualidade da relação estabelecida entre professor e aluno fará com</p><p>que o educandário reavalie e reposicione-se frente ao próprio desenvolvimento, tendo</p><p>em vista que, “no campo das relações que se estabelecem entre professor e aluno</p><p>é que se criam as condições para o aprendizado, sejam quais forem os objetos de</p><p>desejo a serem trabalhados” (ALMEIDA, 1993, p. 40). Desse modo, é necessário ao</p><p>educador alterar, caso necessário, sua própria conduta nos ambientes de ensino e</p><p>aprendizagem de Matemática, afim de que o aluno torne-se protagonista da própria</p><p>aprendizagem.</p><p>Mas afinal, qual a relação existente entre a afetividade e desejo? Como observado</p><p>e com base nas informações coletadas, as relações afetivas determinarão a relação</p><p>entre sujeito desejante e a disciplina de Matemática. É necessário ao professor,</p><p>primordialmente, reconhecer a subjetividade do aluno, tendo em vista que este é</p><p>passível de sensações e opiniões e nem sempre reconhece os próprios desejos.</p><p>Assim sendo, o professor poderá restabelecer as relações em sala de aula, onde a</p><p>Matemática poderá tornar-se objeto ao qual o desejo do aluno se destina, ou seja,</p><p>a partir das relações estabelecidas entre professor e aluno, o desejo do aluno pelo</p><p>conhecimento matemático poderá ser canalizado para esta área do conhecimento e,</p><p>certamente, a apropriação do conhecimento pelo aluno será beneficiada.</p><p>Não distante a isto e fator determinante nas relações estabelecidas entre aluno</p><p>e professor no ambiente escolar está o processo de transferência. O processo de</p><p>transferência é um dos processos internos pelos quais o sujeito (aluno) passa. Neste</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 6 65</p><p>processo o aluno transfere ao professor o papel antes destinado aos pais e reproduz</p><p>no ambiente escolar as relações estabelecidas no núcleo familiar. Conforme visto</p><p>anteriormente, pelo processo de transferência o aluno pode transferir ao professor os</p><p>mais distintos sentimentos, os quais podem se revelar de maneira hostil ou amistosa.</p><p>Concernente a isto e conforme aponta Filloux (1997, p. 11),</p><p>a transferência representa um papel decisivo na relação professor-aluno e alerta</p><p>para o estabelecimento ou a aceitação na escola de uma transferência positiva do</p><p>aluno sobre o mestre.</p><p>No decorrer das entrevistas pôde ser observada a ocorrência do processo de</p><p>transferência. Os entrevistados, comumente, relacionaram a professora de Matemática</p><p>a alguma figura parental. Cerca de 80% dos entrevistados comparou a docente a</p><p>alguém de sua família, como mostra a Figura 2.</p><p>0</p><p>1</p><p>2</p><p>3</p><p>4</p><p>5</p><p>6</p><p>7</p><p>8</p><p>Mãe Tia Pessoa do bem</p><p>Como você vê a professora de</p><p>Matemática?</p><p>Figura 2 - Como você vê a professora de Matemática?</p><p>Fonte: Severo (2015, p. 39)</p><p>Portanto, no professor são depositados sentimentos e reproduzidas relações</p><p>oriundas do ambiente familiar a qual o aluno pertence. Partindo disso, os entrevistados</p><p>foram questionados sobre a relação estabelecida com a professora de Matemática.</p><p>Quando indagado, o entrevistado A7 relatou que ‘a relação é boa, conversamos</p><p>bastante. Ela cobra bastante. Eu vejo ela como uma outra mãe’. Baseado no discurso</p><p>do aluno A7 observa-se novamente a ocorrência do processo de transferência. Sendo</p><p>assim, novamente remonta-se ao problema norteador da pesquisa e infere-se que</p><p>as boas relações estabelecidas entre o entrevistado e a professora determinam</p><p>diretamente o relacionamento entre aluno e conhecimento matemático, culminando</p><p>assim na efetivação da aprendizagem o aluno.</p><p>Diante do mesmo questionamento, o entrevistado A2 disse que vê a professora</p><p>‘como uma pessoa que pode me ajudar a crescer no futuro’. Igualmente, o entrevistado</p><p>A10 declarou que a professora “é atenciosa e se preocupa com nossa aprendizagem”.</p><p>Ambos os entrevistados, como visto, mesmo que intrinsecamente, relacionarem a</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 6 66</p><p>professora aos sentimentos e proteção, cuidado, afeto e auxilio. Em consonância, o</p><p>entrevistado A9 disse, ao entrevistador, que ‘gosto dela, mas às vezes ela é chata, pega</p><p>um pouquinho pesado. Eu vejo ela como uma tia, às vezes legal, às vezes chata’. Este</p><p>fato, em sua essência, novamente relaciona-se ao processo de transferência, uma</p><p>vez que o aluno relacionou a professora a uma figura parental. Assim, ao observar os</p><p>discursos dos sujeitos é nítida a ocorrência do processo de transferência, sendo ao</p><p>professor delegadas funções que nem sempre este tem condições de lidar.</p><p>O processo de construção do conhecimento matemático é, dentre outros fatores,</p><p>resultado de inúmeros processos internos que o aluno vivencia. E o desejo do aluno</p><p>pelo conhecimento matemático é resultado desses processos. O desejo do aluno pela</p><p>Matemática vai depender, inclusive, das relações estabelecidas no ambiente escolar,</p><p>em especial a relação entre aluno e professor. Essa relação, por sua vez, é reflexo do</p><p>processo de transferência, o qual tem como base as experiências vividas no ambiente</p><p>familiar.</p><p>Logo, o professor, ao se apropriar do lugar em que o aluno o colocou, poderá</p><p>restabelecer as relações existentes no ambiente escolar para que, desta forma, possa</p><p>canalizar o desejo do aluno pelo conhecimento matemático. Isto refletirá, portanto, na</p><p>relação estabelecida entre aluno e Matemática e, por conseguinte, na qualidade da</p><p>apropriação dos saberes matemáticos pelo aluno.</p><p>6 | CONSIDERAÇÕES FINAIS</p><p>Ao entrar nos ambientes de ensino e aprendizagem de Matemática o professor</p><p>precisa enfrentar inúmeros desafios. O quase escasso ou, por vezes, inexistente</p><p>desejo do aluno pelo conhecimento é um deles. O professor encontra, nos ambientes</p><p>em que são explorados os conteúdos matemáticos, alunos com alto desempenho</p><p>escolar, alunos com desempenho escolar moderado e alunos que não veem a escola</p><p>e/ou a matemática escolar como objetivo em suas vidas.</p><p>A pesquisa objetivou avaliar e verificar como se dá o processo de transferência e</p><p>a influência deste processo nos ambientes de ensino e aprendizagem de Matemática.</p><p>Para isso, foi realizada uma entrevista semiestruturada com alunos com idades entre</p><p>10 (dez) e 12 (doze) anos matriculados em uma escola pública da rede estadual de</p><p>ensino da região oeste o Estado do Paraná. A análise dos dados coletados ocorreu de</p><p>forma qualitativo-quantitativa.</p><p>Durante a pesquisa foi possível perceber que a relação estabelecida entre aluno e</p><p>conhecimento matemático é resultado, dentre outros aspectos, do papel atribuído pelo</p><p>aluno ao professor e da postura deste diante no processo de ensino e aprendizagem.</p><p>Como visto, ao professor são transmitidos, por meio do processo de transferência,</p><p>sentimentos positivos ou negativos originários das relações estabelecidas no contexto</p><p>familiar. No professor são depositados sentimentos inconscientes experimentados na</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 6 67</p><p>fase pré-escolar e que, posteriormente, são projetados na relação entre professor e</p><p>aluno. Como pôde ser observado no decorrer das discussões realizadas, comumente o</p><p>aluno transfere ao professor de Matemática os sentimentos de proteção, cuidado, afeto</p><p>e carinho. Estes, por sua vez, são experimentados nas relações parentais às quais o</p><p>aluno é submetido. Desta forma, o processo de transferência pôde ser caracterizado.</p><p>O conhecimento matemático pode se tornar objeto de desejo do aluno. Esse desejo</p><p>é, por sua vez, resultado de n fatores psicológicos internos pelo qual o sujeito desejante</p><p>(o aluno) passa, em especial, o processo de transferência. Consequentemente, ao</p><p>tomar conhecimento desses processos e assumir o lugar em que o aluno o colocou, o</p><p>professor de Matemática pode restabelecer e reestruturar as relações que ocorrem no</p><p>processo de</p><p>ensino e aprendizagem de Matemática.</p><p>Logo, ao se restabelecerem as relações nos espaços em que são explorados os</p><p>saberes matemáticos o processo de construção do conhecimento será beneficiado.</p><p>Dessa forma, há uma melhora na qualidade da aprendizagem do aluno. Ainda, é</p><p>possível ao professor, assumindo o lugar em que o aluno o colocou canalizar o desejo</p><p>do aluno por esta área do conhecimento, verificando-se, portanto, que o processo de</p><p>transferência é de extrema importância na apropriação do conhecimento matemático</p><p>pelo aluno e refletirá diretamente na qualidade do processo de ensino e aprendizagem</p><p>de Matemática.</p><p>REFERÊNCIAS</p><p>ALMEIDA, Sandra Francesca Conte de. O lugar da afetividade e do desejo na reação ensinar-</p><p>aprender. Temas em psicologia, v. 1, n. 1, p. 31-44, 1993. Disponível em: . Acesso em: 10 set. 2018.</p><p>DOS SANTOS, Jácia Soares. A transferência no processo pedagógico: quando fenômenos</p><p>subjetivos interferem na relação de ensino-aprendizagem. 2009. 102 f. Dissertação (Mestrado em</p><p>Educação) – Faculdade de Educação. Universidade Federal de Minas Gerais. Belo Horizonte, 2009.</p><p>FERRARI, Juliana Spinelli. Complexo de Édipo. Brasil Escola. Disponível em . Acesso em: 10 set. 2018.</p><p>FILLOUX, Jean-Claude. Psicanálise e educação, pontos de referência. Estilos da clínica [online]. v.</p><p>2, n. 2, p. 8-17, 1997. Disponível em: . Acesso em: 10</p><p>set. 2018.</p><p>FONSECA, Laerte. Uma autópsia nas origens dos problemas de aprendizagem matemática sob as</p><p>lentes da transferência em Freud. Revista Psicopedagogia, v. 28, n. 87, p. 273-282, 2011. Disponível</p><p>em: . Acesso em: 10 set. 2018.</p><p>FREUD, Sigmund. A Interpretação dos Sonhos (II) e Sobre os Sonhos. Tradução de Jayme</p><p>Salomão. Rio de Janeiro: Imago, 1969.</p><p>KHALIL, Denise Nunes Alves. Interface Educação/ Psicanálise: Considerações sobre a motivação</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 6 68</p><p>e o fracasso escolar. 2011. 71p. Dissertação (Mestrado em Psicanálise) – Universidade Veiga de</p><p>Almeida, Rio de Janeiro.</p><p>KUPFER, Maria Cristina. Freud e a Educação. São Paulo: Scipione, 2001.</p><p>LACAN, Jacques. O seminário: A transferência. Tradução de Dulce Duque Estrada. Rio de Janeiro:</p><p>Jorge Zahar Editor, 1992.</p><p>LORENZATO, Sergio. Para Aprender Matemática. 2 ed. Campinas, SP: Autores Associados.</p><p>Campinas, 2006.</p><p>NEVES, José Luis. Pesquisa Qualitativa – Característica, Usos e Possibilidades. Caderno de</p><p>pesquisas em administração, São Paulo, v. 1, n. 3, 1996. Disponível em: . Acesso em: 10 set. 2018.</p><p>RAASCH, Leida. A motivação do aluno para a aprendizagem. Nova Venécia: Faculdade Capixaba</p><p>de Nova Venécia. 1999. Disponível em: . Acesso em: 10 set. 2018.</p><p>SEVERO, Leonardo. O Desejo como Pressuposto na Aprendizagem de Matemática. 2015.</p><p>Trabalho de Conclusão de Curso, Universidade Tecnológica Federal do Paraná, Toledo.</p><p>SILVA, Carla Sofia Rocha da. A Relação Dinâmica Transferencial entre professor-aluno no</p><p>ensino. Ciências e Cognição/Science and Cognition, v. 8, 2006. Disponível em: . Acesso em: 10 set. 2018.</p><p>SZYMANSKI, Maria Lidia Sica; PEZZINI, Clenilda Cazarin. O novo desafio dos educadores: como</p><p>enfrentar a falta do desejo de aprender. IN: Simpósio de Educação: formação de Professores no</p><p>contexto da Pedagogia histórico-crítica , 2007, Anais... Cascavel: Universidade Estadual do Oeste</p><p>do Paraná, 2007. Disponível em: . Acesso em: 10 set. 2018.</p><p>SZYMANSKI, Maria Lídia Sica; ROSA, Andrinea Cordova da. O desejo do aluno no processo de</p><p>ensino aprendizagem. IN: IX Seminário de Pesquisa em Educação da Região Sul, 2012. Anais...</p><p>Caxias do Sul: Universidade de Caxias do Sul, 2012, p. 01-15.</p><p>TAVARES, Hermano. Jogo patológico e suas relações com o espectro impulsivo-compulsivo.</p><p>2000. 184 f. Tese (Doutorado em Medicina) – Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo,</p><p>São Paulo. 2000.</p><p>APÊNDICE – ROTEIRO DA ENTREVISTA</p><p>1. Você gosta de vir à escola?</p><p>2. Para você, qual a função/utilidade da escola?</p><p>3. Qual a escola ideal para você?</p><p>4. Como seus pais veem a escola?</p><p>5. O que você entende por desejo?</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 6 69</p><p>6. Qual disciplina/conteúdo você sente mais vontade de aprender? Por quê?</p><p>7. Qual motivo leva você a não gostar ou não preferir as outras disciplinas/</p><p>conteúdos?</p><p>8. Como é a sua relação com os professores? Tem professor preferido? Por</p><p>quê?</p><p>9. Você gosta de matemática? Por quê?</p><p>10. Qual a sua relação com a matemática?</p><p>11. E com o professor de matemática? Como você o vê?</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 7 70</p><p>A PRODUÇÃO DE SIGNIFICADOS MATEMÁTICOS</p><p>EM PROCESSOS DE ENSINO E APRENDIZAGEM NA</p><p>CONSTRUÇÃO DOS NÚMEROS REAIS</p><p>CAPÍTULO 7</p><p>Mariana dos Santos Cezar</p><p>Instituto Federal do Espírito Santo</p><p>Nova Venécia, Espírito Santo</p><p>Rodolfo Chaves</p><p>Instituto Federal do Espírito Santo</p><p>Vitória, Espírito Santo</p><p>RESUMO: Neste artigo descrevemos nossa</p><p>pesquisa de mestrado que trata da produção</p><p>de significados matemáticos nos processos</p><p>de ensino e aprendizagem da construção dos</p><p>números reais. Com o objetivo de refletirmos</p><p>sobre o ensino de números reais na formação</p><p>inicial do professor de Matemática, adotamos</p><p>como estratégia a construção dos números</p><p>reais e a análise de significados matemáticos</p><p>produzidos por alunos de Licenciatura</p><p>em Matemática. Para tal, utilizamos como</p><p>fundamentação teórica o Modelo dos Campos</p><p>Semânticos e como método a pesquisa-ação.</p><p>Durante três meses, os alunos divididos em</p><p>turmas de iniciantes e concluintes participaram</p><p>da pesquisa e suas ações enunciativas</p><p>foram registradas em gravações de áudio e</p><p>questionários. No final, pesquisadores e sujeitos,</p><p>analisaram os registros e concluíram que</p><p>durante o processo de ensino e aprendizagem</p><p>os significados produzidos pelos alunos nem</p><p>sempre correspondem aos enunciados e</p><p>produzidos pelo professor e que a construção</p><p>dos números reais possibilita a compreensão</p><p>do conceito de números reais.</p><p>PALAVRAS-CHAVE: Números reais; Formação</p><p>inicial; Professor de matemática; Produção de</p><p>significados.</p><p>ABSTRACT: This article we describe our</p><p>masters research that deals with the production</p><p>of mathematical meanings in the teaching and</p><p>learning processes of the construction of real</p><p>numbers. In order to reflect on the teaching</p><p>of real numbers in the initial formation of the</p><p>Mathematics teacher, we adopted as strategy</p><p>the construction of real numbers and the</p><p>analysis of mathematical meanings produced</p><p>by students of Mathematics Degree. For this,</p><p>we use as theoretical foundation the Model of</p><p>Semantic Fields and as method-action research.</p><p>For three months, students divided into beginner</p><p>and finalist classes participated in the survey</p><p>and their enunciative actions were recorded</p><p>in audio recordings and questionnaires. In the</p><p>end, researchers and subjects analyzed the</p><p>records and concluded that during the process</p><p>of teaching and learning the meanings produced</p><p>by the students do not always correspond to the</p><p>statements and produced by the teacher and</p><p>that the construction of real numbers makes</p><p>possible the understanding of the concept of</p><p>real.</p><p>KEYWORDS: Real numbers; Initial formation;</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 7 71</p><p>Maths teacher; Production of meanings.</p><p>1 | INTRODUÇÃO</p><p>Durante nossa trajetória como professores de Matemática, atuando na Educação</p><p>Básica, no Ensino Superior e em formações continuadas de professores,</p><p>nos</p><p>deparamos com circularidades e incompreensões a respeito do ensino de números</p><p>reais. Advindas de alunos e professores muitas dúvidas têm emergido quanto à</p><p>definição dos números racionais, irracionais e reais. Comprovamos tal problemática</p><p>em encontros de formação continuada de professores de Matemática que destacaram</p><p>a dificuldade de ensinar a definição de número reais, tendo em vista que tal dificuldade,</p><p>segundo os professores, advém da não adequação dos conhecimentos adquiridos</p><p>em sua formação inicial de professor com o ensino na educação básica. Diante</p><p>dessa experiência nos propomos a pesquisar sobre o tema números reais e refletir</p><p>sobre a formação inicial do professor de Matemática.</p><p>Com esse propósito traçamos como objetivo geral refletir sobre o ensino de</p><p>números reais na formação inicial do professor de Matemática. Para isso, adotamos</p><p>como estratégia a construção dos números reais segundo Caraça (1989) com</p><p>fundamentação histórica na visão de Roque (2012). Para compreensão e análise</p><p>da produção de significados matemáticos utilizamos como fundamentação teórica</p><p>o Modelo dos Campos Semânticos (MCS) e como método a pesquisa-ação. Como</p><p>nosso foco foi a formação inicial do professor de Matemática, optamos por desenvolver</p><p>essa pesquisa com alunos da Licenciatura em Matemática de uma instituição pública</p><p>brasileira. A investigação se deu numa sala de aula de alunos do 1º período e com</p><p>um grupo de alunos concluintes que cursavam disciplinas finalistas. O processo de</p><p>desenvolvimento da pesquisa em campo durou três meses.</p><p>Com o intuito de desenvolvermos a pesquisa com o envolvimento dos sujeitos</p><p>e dos pesquisadores, de forma participativa, de maneira que as fases da pesquisa</p><p>pudessem ser construídas coletivamente, buscamos um método que subsidiasse essa</p><p>proposta. Por isso, adotamos a pesquisa-ação.</p><p>Para a construção dos números inserimos um pouco da História da Matemática,</p><p>destacamos alguns aspectos históricos sobre a evolução dos números reais e a</p><p>formulação de sua definição. Para tal, descrevemos o problema da medida que ocasionou</p><p>na construção do campo racional; o “surgimento” de segmentos incomensuráveis que</p><p>proporcionaram uma extensão do campo racional para o campo irracional; e os cortes</p><p>de Richard Dedekind, que segundo Caraça (1989), provê uma fundamentação mais</p><p>rigorosa para a definição de números reais. Destacamos também a importância de se</p><p>utilizar esses procedimentos na formação de professores de Matemática, visando uma</p><p>melhor compreensão dos porquês de tais definições.</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 7 72</p><p>Por fim, analisamos coletivamente os resultados obtidos durante o processo de</p><p>construção dos números reais. Para que esta análise fosse possível o desenvolvimento</p><p>da pesquisa foi gravado em áudio e outros registros foram realizados por meio de</p><p>questionários.</p><p>2 | FUNDAMENTOS TEÓRICOS</p><p>Neste estudo adotamos um modelo de conhecimento que nos possibilitou analisar</p><p>com mais propriedade o processo de produção de significados. Como referencial</p><p>teórico o Modelo dos Campos Semânticos foi concebido por Rômulo Campos Lins.</p><p>Com o intuito de delinearmos nossas perspectivas, descrevemos alguns conceitos do</p><p>MCS e suas relações essenciais para esta pesquisa.</p><p>Lins (2012) movido por suas inquietações relacionadas à sala de aula “[...] queria</p><p>dar conta de caracterizar o que os alunos estavam pensando quando ‘erravam’, mas</p><p>sem recorrer a esta ideia de erro” (LINS, 2012, p. 11). Nessa perspectiva direciona</p><p>seu olhar na busca da produção de significados; isto é, o que os alunos pensam e</p><p>falam quando resolvem algum problema, seja “certo” ou “errado”; qual a justificativa</p><p>para esta resolução. Questionar nossas verdades nos permite essa produção, e</p><p>essa produção de significados nos conduz a produção do conhecimento. Segundo</p><p>Lins (2012) a maneira como produzidos um conhecimento está relacionada à forma</p><p>como compreendemos uma enunciação. Mas, em que consiste o conhecimento? Lins</p><p>(2012) defende que um conhecimento consiste de uma crença-afirmação, junto com</p><p>uma justificação. O sujeito acredita em algo (crença) que se caracteriza com uma</p><p>afirmação que justifica sua crença-afirmação, e juntos (crença-afirmação e justificação)</p><p>produzem, segundo o referencial supracitado, o conhecimento.</p><p>Lins (2012) destaca ainda que nenhum conhecimento vem ao mundo</p><p>ingenuamente. “[...] Aquele que o produz, que o enuncia, já fala em uma direção (o</p><p>interlocutor) na qual o que ele diz, e com a justificação que tem, pode ser dito” (LINS,</p><p>2012, p. 13). Falamos na direção de um interlocutor e esperamos que o mesmo aceite</p><p>e reproduza o que dizemos, utilizando a justificação que acreditamos.</p><p>Nesse contexto podemos pensar que várias pessoas podem ler o mesmo texto e</p><p>produzir ou não diferentes significados. Por exemplo, na afirmação “número irracional</p><p>é todo número que não é racional”, muitos tomam como universo o conjunto dos</p><p>números reais e justificam compreender que, no domínio dos reais, o número não</p><p>racional é irracional. Por outro lado, alguém pode questionar se a (não racional) é um</p><p>número irracional, pois pela afirmação, “irracional é todo número que não é racional”,</p><p>esse questionamento é válido. Nesse caso, não estaria considerando apenas o domínio</p><p>dos reais, visto que, não foi estabelecido isso na afirmação. No exemplo descrito,</p><p>os sujeitos atribuíram diferentes significados ou até mesmo produziram diferentes</p><p>conhecimentos, isso se dá pela produção de significados.</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 7 73</p><p>Quando produzimos significados e emitimos enunciações estabelecemos uma</p><p>relação que a nosso olhar, e no contexto ao qual estão inseridas, se constitui como</p><p>verdadeira. Mas, existe uma diferença quando falamos em verdades. No MCS, a</p><p>verdade é atribuída ao conhecimento produzido, e o fato de ter sido enunciado na</p><p>direção de um interlocutor se torna verdadeiro, mas isso não autoriza dizer que o que</p><p>é afirmado seja verdade, no sentido de verdade “universal”.</p><p>Nesse contexto, Lins (1999) esclarece o fato de o sujeito dizer algo é a garantia</p><p>de poder dizer. Pensamos nessa situação tomando como exemplo os números</p><p>irracionais, como já descritos. Se falarmos que “número irracional é todo número que</p><p>não é racional”, para sujeitos que nem sequer pensam na existência de raízes de</p><p>números negativos, essa afirmação é verdadeira, portanto, legítima. No entanto, se</p><p>falarmos para sujeitos que possuem esse conhecimento, a palavra “todo” pode gerar</p><p>conflitos, como já destacado.</p><p>Nesse ponto de vista, “o aspecto central de toda aprendizagem – em verdade</p><p>o aspecto central de toda a cognição humana – é a produção de significados” (LINS,</p><p>1999, p. 86).</p><p>[...] significado é o conjunto de coisas que se diz a respeito de um objeto. Não o</p><p>conjunto do que se poderia dizer, e, sim, o que efetivamente se diz no interior de</p><p>uma atividade. Produzir significado é, então, falar a respeito de um objeto (LINS e</p><p>GIMENEZ, 1997, p. 145-146).</p><p>Logo, o MCS admite uma perspectiva diferente, a de que o conhecimento</p><p>construído pelo aluno pode não ser o mesmo construído e enunciado pelo professor;</p><p>no entanto, ambos são considerados válidos.</p><p>No processo de produção de significados é estabelecido um espaço comunicativo</p><p>ou espaços comunicativos, tomado (s) como processo (s) de interação onde os</p><p>interlocutores são compartilhados. A enunciação é produzida pelo o autor que fala na</p><p>direção de um leitor, constituído pelo o autor. Por sua vez, o leitor produz significado</p><p>para a enunciação e fala na direção de um autor, constituído pelo o leitor. De acordo</p><p>com esta perspectiva, durante todo o processo de comunicação são relacionados</p><p>três elementos fundamentais: autor, texto e leitor. Nesse sentido, Silva (2003, p.62)</p><p>enfatiza:</p><p>O autor é aquele que, no processo, produz a enunciação: um professor em uma</p><p>aula expositivo-explicativa, um artista plástico expondo seus trabalhos ou um</p><p>escritor apresentando sua obra. O leitor é aquele que, no processo,</p><p>se propõe a</p><p>produzir significados para o resíduo das enunciações como, por exemplo, o aluno</p><p>que, assistindo à aula, busca entender o que o professor diz, o crítico de arte ou o</p><p>leitor do livro. Já o texto, é entendido como qualquer resíduo de enunciação para o</p><p>qual o leitor produza algum significado.</p><p>Nesse viés, nas prerrogativas do espaço comunicativo descrito por Lins dentro</p><p>do MCS, é que Chaves (2004, p. 12) enfatiza:</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 7 74</p><p>[...] que nossos entendimentos das leituras que realizamos se processam de forma</p><p>que os autores chegam até nós (o leitor) como resíduos de enunciações, que se</p><p>constitui em texto a partir de nossa produção de significados, que novamente</p><p>resulta em resíduo de enunciação. Assim, pensamos que, quando entendemos</p><p>uma enunciação (não necessariamente da mesma forma que o autor propôs, mas</p><p>em nossa perspectiva, de acordo com nossa compreensão), estamos produzindo</p><p>significados e, ao enunciá-los, novos leitores produzirão significados que poderão</p><p>estar de acordo ou não com o nosso.</p><p>Em síntese, nesta pesquisa somos autores e leitores, os sujeitos da pesquisa</p><p>são autores e leitores. Na medida em que construímos os campos numéricos, como</p><p>autores, os sujeitos são os leitores, como participantes desta construção; os leitores</p><p>se tornam autores e nós nos tornamos leitores, e na medida em que mostramos os</p><p>resultados de nossas reflexões acerca dos significados matemáticos que os sujeitos</p><p>produziram, nós nos tornamos leitores e autores, e assim segue o processo, como se</p><p>estivéssemos em um ciclo; ora autores, ora leitores.</p><p>3 | FUNDAMENTOS METODOLÓGICOS</p><p>A pesquisa é caracterizada com uma abordagem qualitativa, nos moldes da</p><p>pesquisa-ação segundo Barbier (2012), Thiollent (2011). Essa opção metodológica se</p><p>deu devido ao nosso intuito de investigar o processo de produção de significados por</p><p>meio das enunciações dos sujeitos.</p><p>A pesquisa de campo foi desenvolvida com alunos da Licenciatura em Matemática</p><p>de uma instituição pública brasileira, sendo uma turma do 1º período (iniciantes) e</p><p>um grupo de alunos concluintes. O processo de desenvolvimento e investigação foi</p><p>dividido em 5 etapas: i) no primeiro encontro explicamos os procedimentos da pesquisa.</p><p>O tema, o porquê da escolha, os objetivos a serem alcançados e a importância da</p><p>participação dos grupos de alunos. Convidamo-los a participar da pesquisa e solicitamos</p><p>suas respectivas autorizações; ii) no segundo encontro iniciamos as construções.</p><p>Trabalhamos com questionários e gravações de áudio e juntos construímos o campo</p><p>racional; iii) no terceiro encontro construímos o campo irracional; iv) no quarto encontro</p><p>construímos o campo real; v) no quinto encontro realizamos uma plenária, análise aos</p><p>resultados.</p><p>O processo de investigação partiu de uma conversa com os sujeitos acerca</p><p>do tema em questão e do conhecimento prévio em relação às definições de números</p><p>reais, mais especificamente, dos racionais e irracionais. Após este primeiro momento</p><p>iniciamos o estudo da construção do campo racional onde foi questionado aos sujeitos</p><p>como eles definiam números racionais. Esse questionamento foi realizado antes e</p><p>depois da construção com o intuito de realizarmos uma analogia em suas respostas</p><p>no término do processo.</p><p>De modo análogo iniciamos a construção do campo irracional com a questão:</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 7 75</p><p>defina um número irracional. Após a construção do campo irracional propomos aos</p><p>sujeitos que definissem novamente os números irracionais. Tal solicitação gerou muitas</p><p>reflexões acerca da existência de uma definição para tal campo numérico, reflexões</p><p>estas que serão descritas mais adiante.</p><p>Por fim, sobre a construção dos campos numéricos, propomos que os sujeitos</p><p>definissem números reais. Nessa perspectiva todo o processo de construção dos</p><p>campos racional e irracional seria necessário para se compreender porque “união</p><p>dos racionais com os irracionais”. No final da construção do campo real, propomos</p><p>novamente aos sujeitos que definissem números reais.</p><p>Finalizamos o processo de investigação com a plenária que foi um momento de</p><p>reflexão, discussão e de apresentação (por meio de slides) das análises prévias do</p><p>material registrado. Nesse momento os sujeitos puderam também fazer suas análises</p><p>acerca do que foi desenvolvido e registrado ao longo da pesquisa.</p><p>4 | INVESTIGAÇÃO À ANÁLISE DOS DADOS</p><p>Para a investigação à análise dos dados pontuamos e descrevemos as</p><p>enunciações dos sujeitos que foram registradas. Em nossa análise consideramos que</p><p>quando uma pessoa produz significado para um resíduo de enunciação (no caso, as</p><p>enunciações dos pesquisadores, colegas de turma e a escrita do livro) nos propomos a</p><p>refletir sobre o que essas enunciações nos têm a dizer sobre o processo de construção</p><p>dos números reais desenvolvido. Ou seja, que objetos foram constituídos no interior de</p><p>uma atividade? O que foi possível analisarmos da produção de significados fazendo</p><p>uma analogia com o antes e o depois? Dessa forma, descrevemos alguns significados</p><p>que foram produzidos aos resíduos de enunciações dos sujeitos envolvidos. Como</p><p>a pesquisa foi desenvolvida com 32 sujeitos fica inviável descrevermos toda a</p><p>análise, logo destacaremos apenas alguns registros, mas que nos proporcionarão</p><p>compreendermos o processo. Lembrando que durante todo o processo de produção</p><p>os sujeitos foram envolvidos por meio de situações-problemas.</p><p>Na construção do campo racional sobre a questão: defina números racionais,</p><p>destacamos as respostas:</p><p>Antes:</p><p>Sujeito 1: “Número racional que pode ser representado por uma razão (ou</p><p>fração) entre dois números inteiros”.</p><p>Sujeito 2: “É o número que consigo extrair uma raiz e como resultado tenho um</p><p>número inteiro. Ex: = √ 9 = ± 3 ou fracionário (periódico)”.</p><p>Depois:</p><p>Sujeito 1: “É a divisão entre dois números inteiros, ou seja, a razão entre dois</p><p>números inteiros, sendo que o denominador nunca seja zero”.</p><p>Observamos que essa resposta ficou mais fundamentada após a construção</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 7 76</p><p>e algumas restrições foram evidenciadas, como por exemplo, o denominador ser</p><p>diferente de zero.</p><p>Sujeito 2: “São todos os números que são representados na forma , onde A e B</p><p>são números inteiros e sendo B ≠ 0”.</p><p>Observamos que essa resposta, comparada com a primeira, evidenciou a</p><p>construção de conhecimento no que diz respeito à formulação para expressar um</p><p>número racional.</p><p>Durante a construção desse campo outras reflexões foram realizadas de forma</p><p>a propiciar o envolvimento dos sujeitos nesse processo.</p><p>Em relação à definição dos números irracionais destacamos algumas respostas:</p><p>Antes:</p><p>Sujeito 1: “Número irracional é um número que representa uma grandeza</p><p>incomensurável, pois com os conjuntos até então criados, não é possível expressar a</p><p>medida desses segmentos”.</p><p>Sujeito 2: “Número irracional é um número que não pode ser escrito como</p><p>uma fração irredutível, pois seu resultado não é um número inteiro e nem uma fração</p><p>irredutível”.</p><p>Depois:</p><p>Sujeito 1: “São números que não podem ser escritos na forma com a e b</p><p>inteiros e b ≠ 0. Porque não há como mensurar ‘a’ tomando ‘b’ como unidade”.</p><p>Observamos nessa resposta que o sujeito relaciona a ideia de números</p><p>irracionais com medidas e unidades de medidas. Isso demonstra que o sujeito</p><p>construiu conhecimento acerca de segmentos incomensuráveis, ou seja, constituiu</p><p>um pensamento geométrico, o que complementa seu raciocínio inicial. Além disso,</p><p>demonstra que construiu o pensamento algébrico acerca da definição de números</p><p>racionais.</p><p>Sujeito 2: “Número irracional é todo número que não pode ser escrito na forma</p><p>m/n, onde n ≠ 0 e não pertence a nenhum campo numérico já definido (IN, Z e Q)”.</p><p>Observamos que o sujeito, inicialmente, descreve número irracional como</p><p>aquele que não possui o formato dos racionais. Após a construção do campo</p><p>irracional ele descreve a mesma ideia, porém relacionando</p><p>isso com a definição que</p><p>construímos para os números racionais. Com isso, o sujeito construiu um pensamento</p><p>mais algébrico.</p><p>No final da construção os sujeitos foram ouvidos e relataram que o processo</p><p>de construção dos números irracionais proporcionou a construção do conhecimento,</p><p>pois permitiu compreender a necessidade de sua constituição para a resolução de</p><p>problemas cotidianos, bem como, entender o processo de extensão numérica. Além</p><p>disso, evidenciamos a não existência de uma definição para caracterizar ou generalizar</p><p>o “formato” de um número irracional, assim como para os racionais.</p><p>Por fim, construímos o campo dos números reais. Solicitamos antes de iniciarmos</p><p>a construção, que os sujeitos definissem um número real. Algumas respostas:</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 7 77</p><p>Antes:</p><p>Sujeito 1: “É todo número pertencente ao conjunto dos reais, que são todos os</p><p>números, com exceção dos complexos”.</p><p>Sujeito 2: “É a união dos conjuntos naturais, inteiros, racionais e irracionais.</p><p>Porque com a união desses conjuntos temos a propriedade da continuidade”.</p><p>Depois:</p><p>Sujeito 1: “É a união dos conjuntos racional e irracional”.</p><p>Observamos que o sujeito reafirmou seu conhecimento inicial, destacando uma</p><p>definição que remete a já utilizada por ele.</p><p>Sujeito 2: “É a união dos conjuntos racionais e irracionais, porque necessitam</p><p>de uma expansão do campo racional”.</p><p>Observamos que o sujeito relaciona a definição de número real com a</p><p>necessidade de expandir o campo racional. Isso foi observado durante a construção</p><p>do campo real. Em relação à resposta inicial, o sujeito observa, na resposta após</p><p>construção, que não há necessidade de descrever também a união dos naturais e dos</p><p>inteiros, pois estes já fazem parte do conjunto dos racionais, com isso, observamos</p><p>que o sujeito produziu significados.</p><p>No final do processo de pesquisa perguntamos aos sujeitos o que eles</p><p>observaram sobre tal construção e os sujeitos evidenciaram a importância do processo</p><p>para a construção do conhecimento acerca da definição de número real.</p><p>5 | CONSIDERAÇÕES FINAIS</p><p>Nessa pesquisa também realizamos uma investigação a pesquisas na área</p><p>de Educação Matemática, que tratam do tema números reais, como por exemplo:</p><p>Pasquini (2007), Cezar (2011), Pommer (2012). Nessas investigações constatamos,</p><p>por meio das considerações dos autores, a existência de problemas nos processos de</p><p>ensino e aprendizagem acerca do tema, sendo evidenciados na educação básica e em</p><p>formações (inicial e continuada) do professor de Matemática. Tais leituras levaram-nos</p><p>a perceber que a construção dos números reais, bem como, a extensão dos campos</p><p>numéricos e as explicações para a constituição de definições para estes números,</p><p>não têm sido tratadas com maior relevância nos cursos de formação de professores</p><p>de Matemática. É evidenciado um ensino mais axiomático do que construtivo. Devido</p><p>a sua complexidade e utilidade na prática escolar ─ visto que, o ensino de números</p><p>reais é desenvolvido desde o Ensino Fundamental ─ defendemos que é primordial que</p><p>este tema seja tratado de forma mais incisiva, sistematizada e aprofundada em seus</p><p>aspectos conceituais e históricos, na formação inicial do professor de Matemática.</p><p>Em relação à análise dos resultados, constatamos que refletir a respeito dos</p><p>significados produzidos por diversos sujeitos não constitui uma tarefa fácil, uma vez</p><p>que, os significados produzidos pelos leitores podem não ser os mesmos emitidos</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 7 78</p><p>pelos autores. Dessa forma, o trabalho com o MCS representou um diferencial:</p><p>passamos a prestar mais atenção no que os sujeitos enunciam e a refletir a respeito</p><p>dos significados que eles produzem. Aprendemos que a sala de aula precisa ser um</p><p>espaço comunicativo, onde é fundamental que o professor “leia” o aluno e compreenda</p><p>que é a partir de suas enunciações e das enunciações dos alunos que a relação</p><p>dialógica de comunicação é estabelecida. O reflexo de tal processo impacta também</p><p>nossas posturas diante de nossos alunos, em nossas ações como professores, no</p><p>trato com a sala de aula, para minimizar distâncias entre nossas enunciações e a</p><p>produção de significados matemáticos produzidos por nossos alunos.</p><p>Em relação a construção dos números evidenciamos que o processo</p><p>de construção do campo racional proporcionou compreendermos que o que</p><p>consideramos como definição de números racionais: “Todo número racional pode</p><p>ser escrito na forma , com m e n inteiros e n ≠ 0”, é uma generalização algébrica que</p><p>permite representar qualquer número pertencente a este conjunto. Em contrapartida,</p><p>a construção do campo irracional proporcionou compreendermos que, não existe uma</p><p>generalização algébrica que permita expressar o “formato” de um número irracional.</p><p>Com isso chegamos, junto com os sujeitos da pesquisa, à conclusão de que para os</p><p>números irracionais não existe uma única definição.</p><p>O processo de construção do campo real proporcionou entendermos o porquê</p><p>da clássica afirmação “União dos racionais com os irracionais”. Compreendemos a</p><p>partir dos cortes de Dedekind ─ descrito na obra de Caraça (1989) ─ a ideia de união</p><p>desses conjuntos e, necessariamente que, o corte na reta real que não constituiu</p><p>um número racional é um número irracional. Tal método possibilitou à construção de</p><p>conhecimento acerca da definição de números reais. Isso foi constatado por meio das</p><p>enunciações dos sujeitos que descreveram a importância da construção dos números</p><p>para a formação do professor de Matemática.</p><p>Por fim, destacamos que a importância dessa pesquisa está pautada no que</p><p>ela representa para nós participantes e para a formação do professor de Matemática.</p><p>Entendemos que o processo de construção dos números reais representa mais do que</p><p>a compreensão de um método, concebe o alicerce para a construção de conhecimento</p><p>do professor de Matemática. Bem como, a pesquisa proporciona mais uma etapa em</p><p>busca da compreensão de produção de significados desenvolvido por nossos alunos,</p><p>para que possamos com mais propriedade compreender esse processo e por meio</p><p>dele intervir nos processos de ensino e aprendizagem.</p><p>REFERÊNCIAS</p><p>BARBIER, René. A Pesquisa-Ação. Tradução Lucie Didio. Nova Edição. Brasília: Liber Livro Editora,</p><p>2012.</p><p>CARAÇA, Bento de Jesus. Conceitos fundamentais da Matemática. 9. ed. Lisboa: Livraria Sá da</p><p>Costa Editora, 1989.</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 7 79</p><p>CEZAR, Mariana dos Santos. Concepções acerca do conceito de Números Reais: uma breve</p><p>reflexão sobre seu Ensino na Educação Básica. Monografia de Especialização em Ensino na</p><p>Educação Básica. Departamento de Educação e Ciências Humanas. UFES/CEUNES. São Mateus,</p><p>ES, 2011.</p><p>CEZAR, Mariana dos Santos. Produção de Significados Matemáticos na Construção dos</p><p>Números Reais. Dissertação de Mestrado. Programa de Pós-Graduação Em Educação em Ciências</p><p>e Matemática do Instituto Federal do Espírito Santo. Vitória, 2014.</p><p>CHAVES, Rodolfo. Por que anarquizar o ensino de Matemática intervindo em questões</p><p>socioambientais? Tese (Doutorado em Educação Matemática). Programa de Pós-Graduação</p><p>em Educação Matemática, Instituto de Geociências e Ciências Exatas de Rio Claro. Universidade</p><p>Estadual Paulista, 2004.</p><p>LINS, Romulo Campos; GIMENEZ, Joaquim. Perspectivas em aritmética e álgebra para o século</p><p>XXI. 3. ed. Campinas: Papirus, 1997.</p><p>LINS, Romulo Campos. Por que discutir teoria do conhecimento é relevante para a Educação</p><p>Matemática. In: Bicudo, Maria Aparecida Viggiani. (Org.). Pesquisa em Educação Matemática:</p><p>concepções e perspectivas. São Paulo: Editora da UNESP, 1999. p. 75 - 94.</p><p>LINS, Romulo Campos. O modelo dos campos semânticos: estabelecimentos e notas de teorizações.</p><p>In: ANGELO, Claudia Laus. (Org). Modelo dos Campos Semânticos e Educação Matemática: 20</p><p>anos de história. São Paulo: Midiograf, 2012, p. 11- 30.</p><p>PASQUINI, Regina Célia Guapo. Um Tratamento para os Números Reais via Medição de</p><p>Segmentos: uma proposta,</p><p>uma investigação. Tese de Doutorado. Instituto de Geociências e Ciências</p><p>Exatas. Universidade Estadual Paulista. Rio Claro, 2007.</p><p>POMMER, Wagner Marcelo. A construção de significados dos números irracionais no ensino</p><p>básico: uma proposta de abordagem envolvendo os eixos constituintes dos números reais. Tese de</p><p>doutorado. Programa de Pós-graduação em Educação. Faculdade de Educação da Universidade de</p><p>São Paulo. São Paulo, 2012.</p><p>ROQUE, Tatiana. História da Matemática: uma visão crítica, desfazendo mitos e lendas. Rio de</p><p>Janeiro: Zahar, 2012.</p><p>SILVA, Amarildo Melchiades. Sobre a Dinâmica da Produção de Significados para a Matemática.</p><p>Tese (Doutorado em Educação Matemática). Instituto de Geociências e Ciências Exatas, Universidade</p><p>Estadual Paulista. Rio Claro, 2003.</p><p>THIOLLENT, Michael. Metodologia da pesquisa-ação. 18. ed. São Paulo: Cortez, 2011.</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 8 80</p><p>COMO O SUJEITO COM SÍNDROME DE DOWN</p><p>APRENDE MATEMÁTICA?</p><p>CAPÍTULO 8</p><p>Christiane Milagre da Silva Rodrigues</p><p>Secretaria Municipal de Educação</p><p>Vitória - ES</p><p>RESUMO: O objetivo desta pesquisa foi</p><p>ampliar a compreensão do processo de ensino-</p><p>aprendizagem da Matemática para duas</p><p>estudantes com síndrome de Down inscritas</p><p>nos últimos anos do Ensino Fundamental,</p><p>assumindo características de estudo de caso</p><p>colaborativo. Procurou-se identificar e avaliar</p><p>seus conhecimentos lógico-matemáticos,</p><p>suas limitações e potencialidades. Buscou-</p><p>se estratégias para levar as estudantes à</p><p>aprendizagem desta disciplina, e estabeleceu-</p><p>se relações para a construção de conhecimentos</p><p>matemáticos que lhes permitisse compreender</p><p>e transformar o seu dia a dia. Para embasamento</p><p>teórico utilizamos Vigotski e D’Ambrósio.</p><p>A sondagem realizada demonstrou que as</p><p>estudantes não possuíam conhecimentos</p><p>numéricos elementares, não eram alfabetizadas</p><p>e interagiam pouco com professores e colegas.</p><p>Houve avanços, ainda que tímidos. O trabalho</p><p>apontou para formas de realizar um ensino</p><p>mais efetivo da Matemática para sujeitos da</p><p>Educação Especial, proporcionando à Escola</p><p>(re)construir uma prática pedagógica que</p><p>favoreça o desenvolvimento de habilidades</p><p>imprescindíveis à competência do estudante</p><p>com síndrome de Down.</p><p>PALAVRAS-CHAVE: Aprendizagem</p><p>Matemática; Educação Inclusiva; Síndrome de</p><p>Down.</p><p>ABSTRACT: The design of the teaching-learning</p><p>continuum of Mathematics for two children</p><p>with the idea of enrolling in the last years of</p><p>elementary school, assuming the details of the</p><p>collaborative case study. We sought to identify</p><p>and evaluate their logical-mathematical abilities,</p><p>their limitations and potentialities. It sought to</p><p>develop its own accounting operations, such as</p><p>the rules of participation for the construction of a</p><p>new investment plan, and its rules of relationship.</p><p>For theoretical background we use Vigotski and</p><p>D’Ambrósio. The survey showed that students</p><p>did not have elementary knowledge, were not</p><p>literate and interacted little with teachers and</p><p>colleagues. There were advances, although</p><p>shy. The work was created for more practical</p><p>teaching-learning purposes in the discipline of</p><p>Specialty Education, with emphasis on teaching</p><p>practice for teaching practice down.</p><p>KEYWORDS: Mathematical Learning; Inclusive</p><p>education; Down’s syndrome.</p><p>1 | INTRODUÇÃO</p><p>Analisando estudos produzidos na área</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 8 81</p><p>de interesse deste artigo, pudemos perceber que não é grande o número de trabalhos</p><p>voltados para a temática geral que envolve a pesquisa sobre o ensino para estudantes</p><p>com síndrome de Down. Quando o tema é o ensino de Matemática, o número de</p><p>trabalhos ainda é mais reduzido. (Ballaben et al, 1994; Fávero & Oliveira, 2004; Ariza</p><p>& Tudela, 2005; Bruno et al, 2006; Bukowitz & Slibernagel, 2006; Bourscheid, 2008;</p><p>Tudela, 2008; Kato & Boursheid, 2009, 2009a; Groenwald et al, 2010; Yokoyama,</p><p>2012; Silva, 2012; Souza, 2009).</p><p>Em 2013 foi realizada uma pesquisa para minha dissertação de Mestrado que</p><p>teve como objetivo ampliar a compreensão do processo de ensino e aprendizagem</p><p>da Matemática para estudantes com síndrome de Down inscritos nos últimos anos</p><p>do Ensino Fundamental, procurando identificar e avaliar seus conhecimentos lógico-</p><p>matemáticos, as limitações destes estudantes e suas potencialidades. O trabalho</p><p>assumiu as características de um estudo de caso colaborativo, tendo como sujeitos</p><p>centrais duas estudantes dos últimos anos do Ensino Fundamental de uma Escola</p><p>Pública Municipal de Serra - ES. Alice, à época, com 16 anos e cursando a 7ª série, e</p><p>Bárbara com 13 anos cursando o 6º ano.</p><p>Neste estudo foram utilizadas como técnica de coleta de dados a observação</p><p>direta, o diário de campo, a análise documental, as memórias analíticas e a gravação,</p><p>visando analisar, sistematizar, contextualizar e encontrar ligações e distanciamentos</p><p>entre os dados coletados, o cotidiano escolar e os aportes teóricos.</p><p>2 | A PESQUISA</p><p>Para a realização da pesquisa, foram entrevistadas simultaneamente as duas</p><p>responsáveis pela Gerência de Educação Especial do Município de Serra – ES, com</p><p>a finalidade de contextualizar o Município quanto à sua experiência com Educação</p><p>Especial, profissionais envolvidos, público atendido, serviços oferecidos e proposta</p><p>política, momento no qual selecionamos a Escola de Ensino Fundamental onde seria</p><p>desenvolvida a pesquisa, a fim de otimizar tempo e conseguir maior diversidade de</p><p>sujeitos.</p><p>Em contato com a Diretora da Escola apresentamos a proposta de trabalho e</p><p>definimos os sujeitos da pesquisa baseados no critério de que seriam estudantes do</p><p>Ensino Fundamental II que estudassem no mesmo turno. Solicitamos informações</p><p>relativas à Escola para que pudéssemos contextualizá-la. Foi-nos encaminhado o PPP</p><p>(Projeto Político Pedagógico) da Escola, e a partir deste documento caracterizamos a</p><p>mesma.</p><p>Para sondagem das reais necessidades, foi realizado um período exploratório</p><p>de 11 dias com observação de uma aula de cada disciplina das estudantes. Nessas</p><p>aulas foi observado seu comportamento e sua interação com os demais colegas, com</p><p>suas estagiárias e com o professor regente. Também foram observadas nos horários</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 8 82</p><p>de entrada, recreio e saída da Escola.</p><p>Na oportunidade, realizamos entrevista semi estruturada com as estudantes,</p><p>seus professores, estagiárias, coordenadora e pedagoga da Escola.</p><p>Após as entrevistas assistimos novamente a uma aula de cada disciplina para</p><p>observarmos se a reflexão produzida poderia ter trazido mudanças no posicionamento</p><p>desses profissionais quanto às estudantes.</p><p>Marcamos juntamente com a professora de Educação Especial uma reunião com</p><p>os responsáveis pelas estudantes Alice e Bárbara, a fim de esclarecer a pesquisa e</p><p>obter informações adicionais a respeito da vida extraescolar das mesmas, visando um</p><p>melhor conhecimento de suas limitações, hábitos e potencialidades.</p><p>As estudantes foram retiradas da sala de aula para realizar algumas atividades na</p><p>sala de Educação Especial para sondarmos o que as mesmas sabiam de Matemática.</p><p>Foram realizadas observações participativas em todas as aulas de Matemática</p><p>das duas estudantes, a saber, quatro aulas por semana nos meses de maio, junho,</p><p>julho, e agosto de 2013, quando foram exploradas atividades que visavam melhorar</p><p>seu desempenho na referida disciplina, independentemente do conteúdo relativo à</p><p>série ou ano cursada(o).</p><p>O sistema de avaliação das estudantes aconteceu no decorrer de todo o período</p><p>da pesquisa e teve por finalidade detectar a evolução de seu pensamento matemático.</p><p>Constituiu-se de três documentos compatíveis com a proposta avaliativa do professor</p><p>para os demais estudantes, valendo 10 pontos cada um: uma pasta individual em</p><p>que foram arquivadas as atividades desenvolvidas com a finalidade de observar o</p><p>desenvolvimento escolar destas estudantes, além de duas avaliações escritas sobre</p><p>os conteúdos estudados por elas.</p><p>3 | MINHAS PRIMEIRAS IMPRESSÕES</p><p>As estudantes pareciam</p><p>392</p><p>REFLEXÕES SOBRE A RELAÇÃO ENTRE A ETNOMATEMÁTICA E A MODELAGEM</p><p>Milton Rosa</p><p>Daniel Clark Orey</p><p>DOI 10.22533/at.ed.21319140237</p><p>SOBRE A ORGANIZADORA ................................................................................... 403</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 1 1</p><p>CAPÍTULO 1</p><p>ESTRUTURAS DE AVALIAÇÃO ESCOLAR PARA MAPEAR</p><p>HABILIDADES QUE TOMA COMO BASE AS TAXONOMIAS DE</p><p>BLOOM EM QUESTÕES DE MÚLTIPLA ESCOLHA</p><p>Henrique Araken Martins</p><p>UFABC - Universidade Federal de Santo André</p><p>Santo andré - São Paulo</p><p>RESUMO:Na educação, desde sempre existe</p><p>a necessidade de melhorar os resultados do</p><p>desempenho de aprendizado de nossos alunos.</p><p>Sendo assim, com grande frequência surgem</p><p>novas propostas com intenção de aperfeiçoar</p><p>o todo, ou parte do processo educativo. “As</p><p>estruturas de avaliação escolar para mapear</p><p>habilidades tomando como base a Taxonomia</p><p>de Bloom em questões de múltipla escolha”,</p><p>tem por objetivo: propor uma metodologia de</p><p>elaboração de questões seguindo os patamares</p><p>da hierarquia de aprendizado proposto por</p><p>Bloom; aplicação on-line de avaliações de</p><p>múltiplas escolhas; priorizar a devolutiva dos</p><p>resultados com a finalidade de mapear por</p><p>meio de um gráfico de cores as habilidades dos</p><p>alunos, das turmas, das séries, e da escola;</p><p>obter indicadores do ensino dos professores</p><p>e obter indicadores dos conteúdos envolvidos.</p><p>Na prática, foi desenvolvido uma planilha de</p><p>correção on-line que dinamizou o processo</p><p>de correção, fornecendo-nos indicadores de</p><p>processo instantâneos, permitindo-nos refletir,</p><p>discutir e propor intervenções do nosso ensino,</p><p>através dos resultados de aprendizado de</p><p>nossos alunos.</p><p>PALAVRAS-CHAVE: Planilhas de autocorreção,</p><p>Taxonomia de Bloom e Avaliação</p><p>ABSTRACT: In education, we always felt the</p><p>need to improve the outcome of the learning</p><p>process of our students. Often we hear about</p><p>new proposals, aimed at improving the whole</p><p>teaching process, or just part of it. Models of</p><p>school evaluation to map skills, based on Bloom’s</p><p>Taxionomy in multiple choice questions has the</p><p>following objectives: to propose a methodology</p><p>for the processing of the questions, based on</p><p>the different levels of the learning hierarchy</p><p>suggested by Bloom; the online application of</p><p>multiple choice evaluations; to prioritize the</p><p>feedback about results, in order to map the</p><p>skills of students, classes, and of a given school</p><p>through a color graph; to obtain indicators about</p><p>the teaching performance of the teacher, and</p><p>to the relevant contents that are involved. We</p><p>developed a worksheet for the online correction,</p><p>which can dinamize the proofing process and</p><p>result in instantaneous process indicators, thus</p><p>allowing us to reflect, discuss and suggest</p><p>interventions in our education system, based on</p><p>the performance of our students.</p><p>KEYWORDS: Self-Healing Grid, Bloom’s</p><p>Taxonomy and Evaluation</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 1 2</p><p>1 | INTRODUÇÃO</p><p>A recorrente busca de resultados em avaliações externas, nos faz refletir e</p><p>tentar correlacionar junto às avaliações internas meios de influenciar beneficamente</p><p>o aprendizado de nossos alunos. Hoje, as avaliações externas de larga escala</p><p>como: PISA, SAEB, Prova Brasil e o ENEM em nível Nacional e o SARESP em nível</p><p>Estadual (São Paulo), tornaram-se referências em devolutiva com um alto padrão de</p><p>confiabilidade. Essas avaliações, são desenvolvidas com a metodologia da Teoria de</p><p>Resposta ao Item (TRI). Porém, a periodicidade de sua realização pode ser, anual,</p><p>bienal ou até trienal, sendo que em muitas vezes, pode ser observado apenas a</p><p>amostra populacional. Devido a suas características de correção, suas devolutivas</p><p>são entregues em médio prazo, entregando indicadores, que direcionam intervenções</p><p>para o crescimento qualitativo da escola. Contudo, não temos sugestões propostas</p><p>para melhoria dos resultados dos 100% da população dos avaliados, e também, não</p><p>temos as defasagens individuais.</p><p>Nunca devemos esquecer, o aluno é o principal sujeito da escola, e deve ser o</p><p>foco de todos os programas e projetos que incentivam metas e resultados escolares.</p><p>Portanto, seria de suma importância equiparar as avaliações bimestrais com as</p><p>avaliações externas, construindo questões para as provas escolares que contenham</p><p>itens com normatizações parecidas de provas externas com as mesmas características</p><p>de TRI. Um outro problema, mesmo que consigamos equiparar as avaliações internas</p><p>com as externas. Como poderíamos obter indicadores da defasagem dos alunos de</p><p>acordo com a proficiência de conhecimento sugerido pelas avaliações externas?</p><p>As estruturas de avaliação escolar para mapear habilidades tomando como</p><p>base a Taxonomia de Bloom em questões de múltipla escolha, direcionam o</p><p>professor a ter formação para aproximar o resultados escolares de avaliações internas,</p><p>com a projeção dos resultados de futura avaliação externa, com o cuidado, de não</p><p>precisar abandonar ou substituir os conteúdos programados em sua disciplina na sua</p><p>unidade escolar.</p><p>2 | TEORIA DE RESPOSTA AO ITEM</p><p>A Teoria de Resposta ao Item (TRI,) é um modelo proposto para medidas</p><p>psicométricas obtidas através de testes e questionários. Foi proposto no início da</p><p>década de 1950 por Frederick Lord, que apresentou os modelos teóricos para estimar</p><p>os parâmetros dos itens. Lord utilizou testes dicotômicos e binários do tipo certo e</p><p>errado. No início da década de 1970, Samejiva, generalizou o modelo para itens</p><p>com respostas politômicas. Esse modelo contém muitos cálculos de estimação de</p><p>parâmetros, e seria impossível realizá-los sem o uso de computadores. Apenas na</p><p>década de 1980 com o avanço tecnológico da informática, a TRI teve um alcance maior</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 1 3</p><p>nas suas aplicações. No Brasil, a TRI começou a ser utilizada em 1995 na correção</p><p>das avaliações do SAEB, que faz uma correção avaliação populacional baseada em</p><p>testes probabilísticos e traz a oportunidade de comparação tanto no decorrer dos anos</p><p>como com a avaliação educacional ocorridas em outros países. A experiência obtida</p><p>no SAEB fez com que essas técnicas de correção da TRI fossem difundidas para</p><p>outras avaliações. Uma dessas avaliações é o ENEM (Exame Nacional do Ensino</p><p>Médio), considerada uma das maiores avaliações realizadas no mundo.</p><p>A Teoria de Resposta ao Item é um conjunto de modelos matemáticos que</p><p>procuram representar a probabilidade de um indivíduo dar uma resposta certa a</p><p>um item como função dos parâmetros do item e da habilidade (ou habilidades) do</p><p>respondente. Os resultados da TRI têm a grande importância de fornecer resultados</p><p>individualizados e resultados populacionais em torno dos itens propostos. As principais</p><p>características da TRI são:</p><p>i. foco da avaliação ser os itens e não a prova como um todo;</p><p>ii. a proficiência estimada pelos métodos estatístico e não a pontuação obtida</p><p>(score);</p><p>iii. indivíduos e itens são colocados em uma escala comum mesmo que submetidos</p><p>a provas diferentes.</p><p>Ou seja, uma das importâncias da TRI é poder comparar populações de diferentes</p><p>localidades, escolas, cidades e países. Os itens, normalmente são baseados em</p><p>habilidades fundamentais da vida humana, direcionadas à base de conhecimentos</p><p>para continuação dos estudos e resolução de problemas cotidianos.</p><p>As habilidades fundamentais presentes em avaliações externas, como do SAEB</p><p>e SARESP, após serem feitos todos os processos de correção e análise da TRI, são</p><p>classificadas em notas que representam níveis de complexidade de acordo com uma</p><p>régua de proficiência. Por meio destas notas, no SARESP, o avaliado é classificado</p><p>como: Abaixo do Básico, Básico, Adequado e Avançado.</p><p>Em um teste, a Teoria de Resposta ao Item busca avaliar a aptidão que o avaliado</p><p>possui para desenvolver o exercício, ou seja, o traço latente do indivíduo através de</p><p>um conjunto de questões. No Brasil, tomando como exemplo o ENEM e o SAEB, o</p><p>modelo matemático mais utilizado é o de três Parâmetros. Este modelo consegue</p><p>relacionar as variáveis</p><p>ser vistas por todos como membros da escola, embora</p><p>não fossem tratadas como iguais.</p><p>Alice me pareceu mais dependente da estagiária e também mais infantilizada em</p><p>comparação com Bárbara. Em contrapartida, interagia muito mais com os professores,</p><p>demais funcionários da escola e colegas.</p><p>Alice não estava alfabetizada, não conhecia números e nem cores e sua</p><p>participação na aula se limitava a responder à chamada. Tudo o que precisava a</p><p>estagiária lhe fornecia.</p><p>Quanto à observação das aulas, constatei que o comportamento das estudantes</p><p>não se diferenciava com a mudança de professor e/ou de disciplina. De maneira</p><p>geral elas não participavam das aulas, se limitando a realizar atividades aleatórias,</p><p>que não se relacionavam ao conteúdo ministrado, propostas pelas estagiárias.</p><p>Prestavam atenção ao que era explicado pelas estagiárias, e não pelos professores.</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 8 83</p><p>Os professores, quando queriam se comunicar com as estudantes (raras vezes), se</p><p>dirigiam às respectivas estagiárias.</p><p>Já com relação aos colegas de sala de aula, tanto Alice quanto Bárbara, eram</p><p>recebidas de forma carinhosa. Dentro de sala de aula havia pouca interação entre as</p><p>estudantes sujeitos da pesquisa e os outros estudantes, visto que estes precisavam</p><p>prestar atenção à aula e cumprir com suas atividades. Porém, quando as estagiárias</p><p>faltavam sempre havia algum colega que se prontificava voluntariamente a se sentar ao</p><p>lado delas e ajudar no que fosse preciso. Os colegas as viam e lidavam com elas como</p><p>se não estivessem no mesmo nível cognitivo deles, realizando atividades análogas as</p><p>que observavam que eram feitas pelos profissionais da Escola.</p><p>A partir dessas observações busquei definir estratégias para levá-las à construção</p><p>de conhecimentos matemáticos, como meio para compreender e transformar o seu dia</p><p>a dia, apoiando-me em uma abordagem sócio histórica (Vigotski) e na etnomatemática</p><p>(D’Ambrósio).</p><p>Vigotski, dentre outros conceitos, trabalha com o de mediação na relação homem/</p><p>mundo e com o papel fundamental do contexto cultural na construção do modo de</p><p>funcionamento psicológico dos indivíduos. A contingência histórica, a especificidade</p><p>cultural e a particularidade do percurso individual são componentes essenciais da</p><p>teoria vigotskiana.</p><p>Nas palavras de D’Ambrósio (1993, p. 5) a etnomatemática “é a arte ou técnica</p><p>de explicar, de conhecer, de entender nos diversos contextos culturais”. O autor admite</p><p>que toda atividade humana resulta de motivação proposta pela realidade na qual está</p><p>inserido o indivíduo através de situações ou problemas que essa realidade lhe propõe,</p><p>diretamente, através de sua própria percepção, ou indiretamente, mediante propostas</p><p>de outros.</p><p>Buscamos assim, um caminho teórico-metodológico imerso no cotidiano escolar,</p><p>em uma abordagem micro etnográfica, que requer a atenção a detalhes e o recorte</p><p>de episódios interativos, sendo voltada para minúcias indiciais. Esta abordagem se</p><p>insere na proposta da etnografia e implica segundo Góes (2000, p. 10), a descrição ou</p><p>reconstrução analítica do cenário e das regras de funcionamento de um grupo cultural.</p><p>Privilegia o como acontece. Desta forma, acredito que abordar essas estudantes em</p><p>seu contexto cultural, considerando suas particularidades, e, levando em consideração</p><p>a mediação necessária para sua aprendizagem, conforme preconizam os autores,</p><p>favorece o ensino-aprendizagem da Matemática.</p><p>Ao final da pesquisa, propus uma reunião com os responsáveis das estudantes</p><p>e com o corpo docente da Escola, com a finalidade de discutirmos os resultados</p><p>do trabalho desenvolvido, porém não foi possível devido à dinâmica da Unidade de</p><p>Ensino. Deixei na Escola, sob os cuidados da professora de Educação Especial e das</p><p>estagiárias das estudantes, jogos matemáticos, atividades escritas de Matemática,</p><p>orientações com possibilidades para continuar explorando essa disciplina com Alice</p><p>e Bárbara, e algumas atividades de conceitos que não haviam sido trabalhados, pois,</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 8 84</p><p>devido a limitação do tempo, privilegiara as primeiras noções numéricas.</p><p>Não posso dizer que ao terminar a pesquisa houve uma mudança por parte</p><p>da Escola e dos profissionais diretamente ligados às estudantes, mas também não</p><p>posso dizer que foi em vão o período que ali passei. De uma maneira ou de outra</p><p>as estudantes ficaram mais visíveis e puderam mostrar que faziam parte efetiva do</p><p>contexto escolar.</p><p>Para resumir a aprendizagem de Alice e de Bárbara, apresento esse resultado</p><p>separadamente, entendendo que o conhecimento não é estático e considerando o que</p><p>foi apercebido no período da observação participante.</p><p>4 | A APRENDIZAGEM DE ALICE</p><p>Alice oferecia muita resistência em estudar, em responder a questionamentos e</p><p>em realizar as atividades solicitadas. Não tinha noção de horários, nome de professores</p><p>ou disciplinas que cursava. Não prestava atenção à explicação do professor regente,</p><p>então decidi trabalhar eu mesma realizando as explicações e intervenções com ela</p><p>durante as aulas de Matemática.</p><p>Alice tinha boa coordenação motora para copiar figuras, recortar e realizar</p><p>colagens, mas muita dificuldade para entender os enunciados que ouvia dos exercícios.</p><p>Não reconhecia os algarismos, sua escrita e nem a quantidade representada. Sempre</p><p>que fazia uma pergunta Alice insistia em dizer “não sei”, mesmo demonstrando saber</p><p>a resposta. Vigotski (1997, p. 254) diz que a criança atrasada se distrai prontamente</p><p>da tarefa iniciada e sem finalizar, encontra satisfação na tarefa incompleta e inacabada</p><p>de solução. Mas, apesar de sua resistência em realizar os exercícios, quando prestava</p><p>atenção às explicações costumava fazê-los corretamente.</p><p>Ao retornar à Escola depois de um, dois e três meses respectivamente, do término</p><p>do período de observação, a estudante não apresentava nenhuma mudança quanto a</p><p>seus comportamentos e/ou novas aprendizagens.</p><p>Pode parecer que não aprendeu nada, mas pude perceber muitos avanços. Sua</p><p>aprendizagem não se enquadrava em nossos padrões ou no que seria esperado para</p><p>uma estudante de 7ª série, mas o tempo que passei a seu lado me fez perceber</p><p>como somos impotentes e despreparados e quanto o aprender vai além de decodificar</p><p>símbolos. O professor está, muitas vezes, esperando uma mágica que possa “fazer”</p><p>com que o estudante aprenda, e em particular o estudante com deficiência, mas isso</p><p>não existe. Nem tudo funciona, e o que funciona nem sempre funciona do mesmo jeito.</p><p>Absolutamente não se trata de redescobrir teorias, não se trata de refazer teorias.</p><p>Simplesmente se trata de utilizar adequadamente as teorias matemáticas já existentes</p><p>para a solução de problemas de base em nosso desenvolvimento. (D’AMBRÓSIO,</p><p>1986, p.21).</p><p>Não podemos esquecer de que segundo Vigotski (1997, p. 241) a circunstância</p><p>decisiva que nos é apresentada quando falamos de educação das crianças com</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 8 85</p><p>deficiência intelectual não é a importância quantitativa, mas a avaliação qualitativa do</p><p>significado do progresso em seu desenvolvimento, que são causadas por influência de</p><p>uma educação especialmente organizada. Esta avaliação qualitativa satisfaz todos os</p><p>problemas e a meu ver é a única que poderá responder a nossas perguntas.</p><p>Alice me mostrou que independente de sua deficiência tinha suas preferências</p><p>e era capaz de discernir quando alguma coisa lhe interessava, usando muitas vezes</p><p>sua deficiência para alcançar vantagens. Quanto à vida diária, pude perceber que</p><p>tinha muitos casos para contar. Convivia com muitas pessoas que acrescentavam</p><p>a cada dia informações e conhecimentos que usava para manter seus diálogos e</p><p>relacionamentos. Era uma estudante rebelde, indisciplinada e que não via que a Escola</p><p>poderia lhe proporcionar oportunidades para ter uma vida melhor, mais independente.</p><p>Mas isso não me surpreendia, pois no tempo em que a acompanhei ninguém da Escola</p><p>ou de sua família parecia pensar o contrário. Constatei</p><p>que Alice era uma estudante</p><p>como a maioria dos estudantes de sua sala, que também pouco se interessavam pelas</p><p>atividades escolares.</p><p>Efetivamente sua aprendizagem poderia ser potencializada se sua família</p><p>entendesse a importância da Escola enquanto local de aprendizagem e se esforçasse</p><p>para que pudesse frequentar os serviços de apoio pedagógico oferecidos na sala de</p><p>recursos; se a Escola se colocasse como instituição de ensino e não apenas como</p><p>meio de inserção social; se os professores vissem Alice como estudante e não como</p><p>deficiente.</p><p>Alice tem muito a aprender e independentemente de sua resistência ela aprenderá</p><p>se alguém se dispuser a ensinar e despertar na mesma esse desejo.</p><p>5 | A APRENDIZAGEM DE BÁRBARA</p><p>Bárbara estava sempre atenta ao que ocorria em sala de aula. Parava para</p><p>prestar atenção na hora que o professor estava fazendo chamada, ou chamando os</p><p>estudantes para olhar os cadernos. Este não levava em conta sua presença, e isto para</p><p>ela parecia ser decepcionante. Pedi que prestasse atenção à explicação do professor,</p><p>mas percebi que não conseguia acompanhá-la.</p><p>Após um, dois e três meses em que estive afastada da escola, acompanhei</p><p>a cada mês uma aula de Matemática de Bárbara, onde pude perceber que seus</p><p>conhecimentos matemáticos haviam se ampliado em algumas questões, porém em</p><p>outros aspectos percebi que a falta de atividades fizera com que Bárbara perdesse o</p><p>que antes já havia alcançado.</p><p>Quantas surpresas agradáveis Bárbara me proporcionou. É maravilhoso lembrar</p><p>do seu “ritual” toda vez que fazia contagens, de como seus conhecimentos quanto a</p><p>muitas coisas para além da Matemática foram ampliados. Talvez não seja suficiente</p><p>para aqueles que olham para estes relatos, mas também não eram suficientes para</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 8 86</p><p>ela. Tenho certeza que poderia ir muito mais longe.</p><p>Vigotski (1997, p. 142) diz que as quatro operações de aritmética que uma criança</p><p>deficiente domina é um processo muito mais criativo do que para uma criança sem</p><p>deficiência. O que para a criança “normal” seria dado quase como um “dom”, muitas</p><p>vezes sem abordagens especiais, para a criança com deficiência intelectual certas</p><p>tarefas seriam bem difíceis, demandando a superação de diversos obstáculos. O modo</p><p>como se chega aos resultados tem, aparentemente, um caráter criativo. E também</p><p>como ele, penso que o mais essencial no desenvolvimento de Bárbara foi justamente</p><p>a superação de inúmeras dificuldades para além dos conhecimentos matemáticos.</p><p>Se mostrou muito aplicada, interessada e disciplinada. Sabia exatamente</p><p>o que fazia na Escola e sempre que necessário não hesitava em reivindicar seus</p><p>direitos. Quanto à sua convivência com as demais pessoas, não se mostrava muito</p><p>receptiva. Talvez por ser a única criança na família sua relação com outras pessoas e</p><p>o conhecimento de coisas gerais do próprio cotidiano era bem limitado.</p><p>Aprendeu muito, mas poderia aprender ainda mais. Estava sempre disposta a</p><p>realizar as tarefas apresentadas e atenta ao que lhe era ensinado. Sua aprendizagem</p><p>poderia ser ainda maior se sua família a levasse à sala de recursos no contra turno.</p><p>Quanto à Escola e professores, independentemente de suas ações, não muito</p><p>favoráveis à aprendizagem de Bárbara, esta continuava aprendendo, pois apresentava</p><p>uma força de vontade incrível.</p><p>Vigotski (1997, p. 243, 244) nos lembra que devemos ensinar a criança com</p><p>deficiência mental não apenas para tocar, cheirar, ouvir e ver, mas para usar seus</p><p>cinco sentidos, para dominá-los e empregá-los racionalmente de acordo com seus fins.</p><p>Nessa perspectiva, Bárbara não apenas aprendeu alguns conceitos de Matemática,</p><p>mas descobriu, acima de tudo, como usá-los em seu benefício.</p><p>6 | AS ESTUDANTES</p><p>Vigotski (1997, p. 149) reforça que o ensino deve ser realizado, quando diz que</p><p>embora crianças com deficiência intelectual precisem estudar por mais tempo, embora</p><p>elas aprendam menos do que as crianças sem deficiência, embora, finalmente,</p><p>é-lhes ensinado de outra maneira, aplicando os métodos e procedimentos especiais,</p><p>adaptados às especificidades de seu estado, devem estudar o mesmo que todas as</p><p>outras crianças, receber a mesma preparação para a vida futura para que, em seguida,</p><p>possam participar dela, até certo ponto com os outros.</p><p>Sabemos que para que os objetivos específicos relacionados ao ensino sejam</p><p>cumpridos, “é necessário que professores do ensino comum e da Educação Especial</p><p>se envolvam, compartilhando um trabalho colaborativo e interdisciplinar, de modo a</p><p>consolidar a articulação entre os mesmos”. (MILANESI, 2012, p. 38). A autora ainda</p><p>nos afirma que “a inclusão escolar requer outras formas de organização da escola, com</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 8 87</p><p>compartilhamento de responsabilidades por todos os atores envolvidos no processo</p><p>educativo”. (MILANESI, 2012, p. 127).</p><p>Então, o que falta para que as marcas da diferença de Alice e Bárbara não as</p><p>impossibilitem de assumir a própria identidade de estudantes?</p><p>Sabemos que há muitas questões que perpassam esse processo no qual Alice</p><p>e Bárbara estão envolvidas. As políticas públicas muitas vezes são falhas e não há</p><p>formação consistente para professores, por exemplo. Reconhecemos que todas essas</p><p>relações interferem diretamente no interesse do professor pelo sujeito da Educação</p><p>Especial, que, na maioria das vezes, é pequeno.</p><p>Para saber se aprenderam Matemática, basta observar o que elas sabiam antes</p><p>que as observações colaborativas começassem. Então, baseados nas observações</p><p>realizadas, elas aprenderam Matemática. Porém, toda aprendizagem é um processo</p><p>criativo em que cada um aprende de uma maneira. E cada uma aprendeu a sua</p><p>maneira.</p><p>Conforme nos afirma Almeida (2010, p. 207), “em alguns momentos o pesquisador</p><p>precisa, mais do que falar, fazer, para mostrar que é possível”. E depois desse “fazer”,</p><p>o que podemos deixar de contribuição, a partir da experiência que tivemos ao ensinar</p><p>Matemática para essas estudantes com síndrome de Down, é que a escolarização de</p><p>pessoas com deficiência intelectual pode ser atrasada, mas não patológica. Apesar</p><p>de a deficiência intelectual requerer maior adaptação do currículo e de metodologias,</p><p>o que sabemos sobre o ensino para crianças sem deficiência nos ajuda a ensinar as</p><p>demais e vice-versa.</p><p>O que percebi durante as abordagens com Alice e Bárbara, é que o ensino de</p><p>Matemática tinha mais sentido quando planejava e definia objetivos e tarefas a serem</p><p>trabalhados, priorizava determinados conteúdos em função das respostas que elas</p><p>me davam, utilizava material manipulativo, contextualizava as atividades, reforçava</p><p>o que havia sido trabalhado anteriormente, as motivava, individualizava o ensino e</p><p>avaliava a partir do que tinha sido proposto. Mas nada disso deve ser muito diferente</p><p>do processo de ensino aprendizagem de todos os estudantes.</p><p>Percebi também, que seria de extrema importância que ao ingressarem na</p><p>escola os estudantes com deficiência tivessem uma avaliação de seus conhecimentos</p><p>prévios sobre as várias áreas de conhecimento e a partir disso fossem elaborados</p><p>planos educativos individuais. Isso com certeza mostraria aos professores por onde</p><p>deveriam começar, o que talvez seja sua maior dificuldade, e ao mesmo tempo daria</p><p>aos estudantes a oportunidade de mostrarem o que sabem e principalmente que</p><p>podem aprender muito mais.</p><p>7 | CONSIDERAÇÕES FINAIS</p><p>Após esses quatro meses de observação colaborativa, me surpreendi ao</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 8 88</p><p>perceber o quanto essas meninas aprenderam, mas, para além disso, o quanto</p><p>poderiam ter aprendido se fossem ensinadas desde sempre.</p><p>Concordo com Vigotski (1997, p. 36) quando diz que a escola deve não só</p><p>adaptar-se às insuficiências da criança, mas também lutar contra elas, superá-las. É</p><p>preciso observar a peculiaridade e singularidade dos meios utilizados na escola e seu</p><p>caráter criativo e buscar uma escola não de débeis mentais que se esforçam para que</p><p>não se adaptem</p><p>ao defeito, mas onde os estudantes tenham condições para superá-</p><p>lo.</p><p>E quanto à pergunta inicial sobre como o sujeito com síndrome de Down aprende</p><p>Matemática? Mais do que nunca tenho certeza de que a seu tempo, da mesma forma</p><p>que os outros...</p><p>REFERÊNCIAS</p><p>ALMEIDA, M. L. de. Pesquisa-ação e inclusão escolar: uma análise da produção acadêmica em</p><p>educação especial a partir das contribuições de Jürgen Habermas. Tese de Doutorado apresentada</p><p>ao Centro de Educação da Universidade Federal do Espírito Santo – UFES. 2010.</p><p>ARIZA, C. J. G. & TUDELA, J. M. O. Novas tecnologias e aprendizagem matemática em crianças com</p><p>síndrome de Down: generalização para autorizar. Universidade de Jaén. Espanha. 2005. Disponível</p><p>em: http://www.sav.us.es/pixelbit/pixelbit/articulos/n29/n29art/art2905.htm. Acesso em 01 de maio de</p><p>2013.</p><p>BALLABEN, M. C. G. et al. Construção do Pensamento Lógico por crianças com síndrome de Down.</p><p>In: Revista Brasileira de Educação Especial, 1994. Disponível em: http://educa.fcc.org.br/scielo.</p><p>php?script=sci_abstract&pid=S1413-65381994000100003&lng=es&nrm=iso. Acesso em 19 de março</p><p>de 2013.</p><p>BOURSCHEID, S. O ensino-aprendizagem da Matemática para aluno com síndrome de Down</p><p>em contexto de Inclusão: um estudo de caso. Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao</p><p>Departamento de Matemática UNIMAT do Campus Universitário de Sinop, Sinop, Mato Grosso,</p><p>2008. Disponível em: http://www.educadores.diaadia.pr.gov.br/arquivos/File/2010/artigos_teses/</p><p>MATEMATICA/monografia_sabrina_bourscheid.pdf. Acesso em 06 de março de 2013.</p><p>BUKOWITZ, N. de S. L. & SLIBERNAGEL, F. M. F. A ludicidade no ensino da Matemática para</p><p>sujeitos com síndrome de Down. Disponível em: http://www.sbem.com.br/files/ix_enem/Html/</p><p>comunicacaoCientifica.html. Acesso em 01 de maio de 2013.</p><p>BRUNO, A. N. et al. Análise de um tutorial inteligente em conceitos lógico-matemáticos em alunos</p><p>com Síndrome de Down. In: Revista Latino-Americana de Investigação em Educação Matemática.</p><p>México, v.9, n.2, Relime, julho, 2006. Disponível em: http://www.scielo.org.mx/scielo.php?script=sci_</p><p>arttext&pid=S1665-24362006000200003&lng=es&nrm=iso&tlng=es. Acesso em 01 de maio de 2013.</p><p>D’AMBRÓSIO, U. Da realidade à ação: reflexões sobre educação e matemática. São Paulo: Summus;</p><p>Campinas: Ed. Da Universidade Estadual de Campinas, 1986.</p><p>______. Etnomatemática: arte ou técnica de explicar e conhecer. 2ª edição. São Paulo: Editora Ática,</p><p>1993.</p><p>FÁVERO, M. H.; OLIVEIRA, D. de. A construção da lógica do sistema numérico por uma criança com</p><p>síndrome de Down. In: Educar, Curitiba, n. 23, p. 65-85, 2004. Editora UFPR. Disponível em: http://</p><p>educa.fcc.org.br/scielo.php?script=sci_issuetoc&pid=0104-406020040001&lng=es&nrm=iso. Acesso</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 8 89</p><p>em 06 de março de 2013.</p><p>GÓES, M. C. R. de. A abordagem microgenética na matriz histórico-cultural: Uma perspectiva para o</p><p>estudo da constituição da subjetividade. In: Cadernos CEDES, ano XX, nº 50, abril/2000.</p><p>GROENWALD, C. L. O. et al. Eixos convergentes na aprendizagem matemática de alunos com</p><p>síndrome de Down. In: Revemat: Revista Eletrônica de Educação Matemática. eISSN 1981-1322.</p><p>Florianópolis, v. 05, n. 1, p.25-37, 2010. Disponível em: https://periodicos.ufsc.br/index.php/revemat/</p><p>article/view/1981-1322.2010v5n1p25. Acesso em 08 de março de 2013.</p><p>KATO, A. A. G.; BOURSCHEID, S. Aluno com síndrome de Down: ensino aprendizagem da</p><p>Matemática em contexto de inclusão. In: Semana de Exatas. Anais 2009. p. 153-157. UNIR-</p><p>Universidade Federal de Rondônia. Disponível em: http://www.dmejp.unir.br/downloads/1324_anais_</p><p>da_ix_semana_de_matematica.pdf. Acesso em 20 de março de 2013.</p><p>______. O ensino-aprendizagem da Matemática para aluno com síndrome de Down. In: Semana de</p><p>Exatas. Anais 2009a. p. 16-26. UNIR- Universidade Federal de Rondônia. Disponível em: http://www.</p><p>dmejp.unir.br/downloads/1324_anais_da_ix_semana_de_matematica.pdf. Acesso em 20 de março de</p><p>2013.</p><p>MILANESI, J. B. Organização e funcionamento das salas de recursos multifuncionais em um</p><p>município paulista. Dissertação de Mestrado. São Carlos: UFSCar, 2012.</p><p>SILVA, A. de A. C. As práticas educativas inclusivas da aprendizagem da Matemática, numa sala</p><p>de aprendizagens funcionais. Dissertação de Mestrado em Necessidades Educativas Especiais do</p><p>Mestrado em Ciências da Educação, conferido pela Escola Superior de Educação Almeida Garrett,</p><p>Lisboa, 2012. Disponível em: http://recil.grupolusofona.pt/xmlui/bitstream/handle/10437/2328/</p><p>disserta%C3%A7%C3%A3o%20Anabela%20Albuq.%20Silva.pdf?sequence=1. Acesso em 19 de</p><p>março de 2013.</p><p>SOUZA, C. P. Feiras Catarinenses de Matemática: contribuições para inclusão escolar de um</p><p>grupo de alunos com déficit intelectual. Dissertação submetida ao Colegiado do Curso de Mestrado</p><p>em Educação Científica e Tecnológica da Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis,</p><p>SC, 2009. Disponível em: http://repositorio.ufsc.br/bitstream/handle/123456789/92436/275006.</p><p>pdf?sequence=1. Acesso em 08 de março de 2013.</p><p>TUDELA, M. J. O. Síndrome de Down: o conteúdo matemático mediado pelo computador. In: Revista</p><p>Latino-Americana de Educação Matemática - dezembro 2008 - edição 16, páginas 85-105. Disponível</p><p>em: http://www.fisem.org/web/union/revistas/16/Union_016_010.pdf. Acesso em 01 de maio de 2013.</p><p>VIGOTSKI, L.S. Obras Escogidas V fundamentos de defectología. Edición em lengua castellana. Visor</p><p>Dis. S.A., 1997.</p><p>YOKOYAMA, L. A. Uma abordagem multissensorial para o desenvolvimento do conceito de número</p><p>natural em indivíduos com síndrome de Down. Tese de Doutorado em Educação Matemática</p><p>da Universidade Bandeirante de São Paulo, São Paulo, 2012. Disponível em: http://www.</p><p>matematicainclusiva.net.br/pdf/uma_abordagem_multissensorial_para_o_desenvolvimento_do_</p><p>conceito_de_numero.pdf. Acesso em 06 de março de 2013.</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 9 90</p><p>A MATEMÁTICA COMO INSTRUMENTO PARA O</p><p>DESENVOLVIMENTO HUMANO E EMANCIPAÇÃO</p><p>SOCIAL</p><p>CAPÍTULO 9</p><p>Rafael Machado da Silva</p><p>Universidade Tecnológica Federal do Paraná -</p><p>UTFPR</p><p>Apucarana - Paraná</p><p>Daiane Aparecida Alves Gomes</p><p>Universidade Estadual de Londrina</p><p>Apucarana - Paraná</p><p>Maria A. Lima Piai</p><p>Universidade de São Paulo/USP</p><p>Apucarana - Paraná</p><p>RESUMO: O objetivo deste trabalho é</p><p>apresentar, a partir de uma abordagem</p><p>metodológica interdisciplinar, como as</p><p>habilidades matemáticas podem contribuir</p><p>para a inserção dos indivíduos no contexto</p><p>social. Dessa forma, a matemática é vista</p><p>de maneira integrada ao currículo escolar,</p><p>desenvolvendo habilidades lógicas (cognitivas)</p><p>que colaboram para o desenvolvimento social</p><p>e democrático. Partimos do pressuposto de</p><p>que quando o pensamento lógico matemático</p><p>não se desenvolve de maneira satisfatória há</p><p>uma sujeição maior aos riscos sociais, pois, a</p><p>capacidade do sujeito de relacionar diferentes</p><p>ideias também se apresenta deficitária, o que</p><p>impede o pleno gozo da cidadania bem como</p><p>estar ciente de seus direitos e deveres enquanto</p><p>sujeito social. Portanto, o presente trabalho</p><p>propõe o pensamento matemático como um</p><p>meio de ascensão social e emancipação da</p><p>pessoa humana, contribuindo para a diminuição</p><p>das desigualdades sociais, por meio do</p><p>desenvolvimento humano.</p><p>PALAVRAS-CHAVE: Matemática;</p><p>Emancipação Social; Interdisciplinaridade.</p><p>ABSTRACT: The goal of this paper is using an</p><p>interdisciplinary methodological approach to</p><p>show, how mathematical skills can contribute to</p><p>insert the people in a social context. This way, the</p><p>mathematics is seen integrated into the school</p><p>curriculum, developing logical skills (cognitive),</p><p>that collaborate for the social and democratic</p><p>developing. Based on the assumption that, when</p><p>the logical-mathematical think doesn’t develop</p><p>satisfactorily, there are more possibilities of the</p><p>social risks, because, the person capacity to</p><p>relate different ideas, also show deficit, what</p><p>prevent full enjoyment of the citizenship, as well</p><p>as being aware of their rights and duties, while</p><p>social subject. Therefore, this paper proposes</p><p>the mathematical think, how a way of social</p><p>ascension and enfranchisement of the human</p><p>person, contributing to the decrease of the social</p><p>inequalities through the human development.</p><p>KEYWORS: Mathematics, Social E</p><p>nfranchisement, Interdiciplinarity.</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 9 91</p><p>1 | INTRODUÇÃO</p><p>A matemática no ambiente escolar tem sido tratada, muitas vezes, como</p><p>uma disciplina isolada das demais, de maneira dissociada das outras áreas do</p><p>conhecimento, ou tratada como uma área do conhecimento que possui uma espécie de</p><p>autossuficiência. Entretanto, vale lembrar que os primeiros matemáticos se destacavam</p><p>nas áreas humanas e biológicas e que a matemática surge da necessidade de explicar</p><p>fenômenos, sejam esses físicos ou sociais.</p><p>Tratar da matemática como parte integrante do contexto social está presente nos</p><p>Parâmetros Curriculares Nacionais que exprimem a importância da interdisciplinaridade,</p><p>bem como a relação do saber escolar com o cotidiano do indivíduo. O conhecimento</p><p>escolar deve objetivar a formação dos cidadãos que possam relacionar os conteúdos</p><p>trabalhados na escola com os fenômenos sociais, produzindo significado para sua</p><p>aprendizagem, - aprende a ler na escola para fora dela poder ler o mundo.</p><p>O Homem é um ser social, como bem já articulava Aristóteles na Política, John</p><p>Dewey em Democracia e Educação e tantos outros, e para o pleno exercício de suas</p><p>ações em sociedade deve ser capaz de relacionar, mensurar e comparar fenômenos à</p><p>sua volta. Nesse contexto, para o desempenho pleno de sua cidadania o ser humano</p><p>necessita conciliar o saber oriundo das ciências humanas com o conhecimento lógico</p><p>matemático, Kamii Livinsgton colocam:</p><p>[...] se temos a nossa frente uma conta azul e outra vermelha e constatarmos que</p><p>elas são diferentes, esta diferença é um exemplo de pensamento lógico matemático</p><p>(...) a diferença é uma relação criada mentalmente pelo indivíduo que relaciona os</p><p>dois objetos. A diferença não está na conta vermelha nem na azul, e se o sujeito</p><p>não colocasse tais objetos em relação não existiria, para ele, essa diferença (1995,</p><p>p. 19).</p><p>Se uma pessoa não desenvolve o pensamento lógico matemático, estará</p><p>sujeita a um risco social maior, pois sua capacidade de relacionar diferentes ideias</p><p>será deficitária, abrindo espaço para a alienação e impedindo o pleno gozo de sua</p><p>cidadania, bem como estar ciente de seus direitos e deveres enquanto sujeito social.</p><p>Portanto, a proposta desse trabalho é apresentar o pensamento matemático como</p><p>um meio de ascensão social e emancipação da pessoa humana, contribuindo para a</p><p>diminuição das desigualdades sociais a partir do desenvolvimento humano.</p><p>2 | DESIGUALDADE SOCIAL</p><p>Göran, ao propor três tipos de desigualdade, em sua obra Os campos de</p><p>extermínio da desigualdade, diferencia-os claramente através de formas básicas: a</p><p>desigualdade vital, aquela que pode ser verificadas através da saúde e da longevidade</p><p>humana, sendo mais acentuada nos países e classes pobres e em menor medida nos</p><p>países ricos e nas classes ricas. Em outro momento define desigualdade existencial</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 9 92</p><p>como “a negação de (igual) reconhecimento e respeito, e é um forte gerador de</p><p>humilhações para os negros, (amer-) índios, mulheres em sociedades patriarcais,</p><p>imigrantes pobres, membros de castas inferiores e grupos étnicos estigmatizados”</p><p>(GÖRAN, 2010 p.146), reafirmando então a discriminação de determinados grupos</p><p>hierarquizando-os por meio de status.</p><p>Por fim, há a desigualdade material ou, como o autor costuma chamar, a</p><p>desigualdade de recursos. Na qual as pessoas têm menos acesso ao “capital social”,</p><p>que é representado pela dificuldade de alcance à educação, consequentemente a</p><p>uma carreira. Quer dizer, que as pessoas têm menos recursos do que as outras e esta</p><p>desigualdade pode se expressar por distribuição de renda e de riqueza.</p><p>O pensamento de Göran nos remete à seguinte lógica, um indivíduo que não</p><p>desfruta de uma educação que lhe proporcione discernimento entre diferentes objetos,</p><p>sejam esses matemáticos, sociais ou filosóficos, está fadado ao distanciamento e</p><p>exclusão social, ficando à margem dos acontecimentos, sob a influência do sistema</p><p>hierárquico e por estar em alto risco social está fadado à exploração, seja ela física</p><p>ou intelectual, visto que fazemos parte de uma sociedade capitalista e ainda, segundo</p><p>Marx e Friedrich Engels, o que define a classe proletária é o fato de não possuir</p><p>instrumentos de trabalho, máquinas, fábrica; portanto, possuem somente sua força de</p><p>trabalho. Entretanto, é este mesmo proletariado que exerce seu papel transformador</p><p>da sociedade capitalista (MARX; ENGELS, 1975, p. 34).</p><p>3 | DESENVOLVIMENTO HUMANO</p><p>O Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), transfere a</p><p>importância unilateral da renda em busca do alcance do desenvolvimento humano,</p><p>propondo destacar o ser humano como cerne de seus debates. “Renda é importante,</p><p>mas como um dos meios do desenvolvimento e não como seu fim. É uma mudança</p><p>de perspectiva: com o desenvolvimento humano, o foco é transferido do crescimento</p><p>econômico, ou renda, para o ser humano” (PNUD, 2016, p. 1).</p><p>Segundo o Atlas do Desenvolvimento Humano do Brasil o desenvolvimento</p><p>humano “é o processo de ampliação das liberdades das pessoas, com relação às</p><p>suas capacidades e as oportunidades a seu dispor, para que elas possam escolher a</p><p>vida que desejam ter” (2017, p.12). E esta ampliação das capacidades dos atores e</p><p>atrizes sociais, abarcam três dimensões. São elas: vida longa e saudável, acesso ao</p><p>conhecimento e padrão de vida digno. Para a real efetividade destas três vertentes, o</p><p>ser humano deve ter capacidade de oportunidades como: saúde, educação, acesso à</p><p>cultura, política, leis, economia, participação, etc. Deve-se prezar pelo bem estar e não</p><p>apenas pelo aspecto exclusivamente economômico dos cidadãos.</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 9 93</p><p>4 | LIBERDADE / DEMOCRACIA</p><p>Rousseau em defesa da democracia salientou a necessidade de conhecimento</p><p>para o povo, ou pelo menos para a maior parte deles. Para que a democracia aconteça</p><p>é importante que a maior parte possível da população, tenha conhecimento de governo,</p><p>é preciso que o povo seja magistrado, conhecedor e fiscalizador das leis (1966, p.102).</p><p>A partir dessa ideia de Rousseau perguntamos: Será que todos têm a</p><p>possibilidade de participar dos processos de governo? Todos têm plena capacidade de</p><p>uma participação efetiva? Nesse contexto, afirma-se a necessidade de uma educação</p><p>que permita aos indivíduos a capacidade de discernimento, ou seja, uma participação</p><p>efetiva na sociedade demanda conhecimento lógico matemático, trazendo mais uma</p><p>vez a necessidade de integração entre as ciências.</p><p>O ideal de democracia traz à tona também o ideal de liberdade, Kamii e Livinsgton</p><p>(1995, p. 241) destaca que as crianças devem sentir-se à vontade para rejeitar ideias,</p><p>porque somente quando elas tiverem essa liberdade estarão realmente livres para</p><p>criar seu próprio pensamento honestamente. As aulas de matemática raramente</p><p>abrem espaço para que os alunos possam questionar os resultados obtidos e, se não</p><p>há espaço para questionamento na escola, as crianças dificilmente irão exercer uma</p><p>atitude questionadora fora do ambiente escolar e, a perspectiva democracia, dessa</p><p>forma, não se sustenta.</p><p>Matthew Lipman (1990), filósofo estadunidense, salientou a importância da</p><p>atitude questionadora e do diálogo na sala de aula. Lipman entende a escola como</p><p>um espaço de exercício da cidadania. Sua proposta é transformar a sala de aula numa</p><p>comunidade de investigação, motivando os alunos a alcançar as respostas e reconstruí-</p><p>las, sempre que necessário. A sala de aula seria, então laboratório democrático.</p><p>Sen (2008) coloca que a liberdade está ligada diretamente a igualdade. A</p><p>liberdade de questionar nas aulas de matemática pode então proporcionar igualdade,</p><p>igualdade em um sentido amplo de igualdade de oportunidade e de ascensão</p><p>social</p><p>para todos, nesse sentido Skovsmose, colocam que,</p><p>De acordo com o argumento social, os estudantes têm que desenvolver não</p><p>apenas conhecimento pragmático sobre como usar a matemática e como construir</p><p>modelos (simples), mas também, primariamente, conhecimento sobre como usar a</p><p>construção do modelo, e esse conhecimento deve ser voltado para o entendimento</p><p>das funções sociais e aplicações “adultas” de modelos matemáticos (2001, p. 52).</p><p>Como exemplo da capacidade da educação matemática em proporcionar aos</p><p>indivíduos melhores condições de igualdade social, citamos o exemplo da utilização</p><p>de uma abordagem matemática diferenciada em um escola especial – no artigo</p><p>Práticas Pedagógicas de ensino de matemática: APAE e Lar de idosos (2015), onde</p><p>expressam, que o estudo da matemática é uma ferramenta para a interpretação do</p><p>cotidiano e relatam o quão importante ela é para a formação do cidadão, independente</p><p>de sua condição, pois quanto é bem trabalhada é ferramenta emancipadora.</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 9 94</p><p>5 | CRITICIDADE</p><p>Desenvolver senso crítico nos alunos é um discurso muito usado no ambiente</p><p>escolar, entretanto, como a matemática pode contribuir para esse desenvolvimento?</p><p>Usaremos como ponto de partida para discutir essa questão o conceito utilizado por</p><p>Borba e Skovsmose (2001) denominado Ideologia da Certeza, em que a matemática</p><p>é utilizada como ferramenta para validar fenômenos físicos e sociais.</p><p>A base dessa proposta pode ser resumida de acordo com os autores:</p><p>• A matemática é perfeita, pura e geral, no sentido de que a verdade de uma</p><p>declaração matemática não se fia em nenhuma investigação empírica. A</p><p>verdade matemática não pode ser influenciada por nenhum interesse social,</p><p>político ou ideológico.</p><p>• A matemática é relevante e confiável, porque pode ser aplicada a todos os</p><p>tipos de problemas reais. A aplicação da matemática não tem limite, já que</p><p>é sempre possível matematizar o problema (p. 130,131).</p><p>Se essa é a perspectiva que muitos usam e ensinam a matemática, como é</p><p>possível desenvolver a criticidade nos alunos? Será que realmente a matemática está</p><p>livre das influências político-sociais?</p><p>Claramente é possível verificar a necessidade de expansão do pensamento</p><p>dos estudantes a fim de que as ciências humanas possam questionar a “perfeição</p><p>matemática”, uma reflexão sobre quais tipos de ideologias estão por trás de dados</p><p>transmitidos à massa, como se chegou ao resultado divulgado, essas ideias precisam</p><p>ser expostas para que se possa quebrar o paradigma de que todas as respostas</p><p>matemáticas são corretas, e direcionar os educandos no processo de investigação</p><p>dos resultados, possibilitando uma visão mais ampla sobre os conceitos que versam</p><p>a realidade social.</p><p>6 | CONSIDERAÇÕES FINAIS</p><p>O indivíduo que desenvolve o senso crítico tem maiores condições de exercer</p><p>sua plena cidadania, transformando a própria realidade e o mundo a sua volta e, a</p><p>matemática é um dos agentes nesse processo, pois a partir dela se desenvolvem</p><p>conceitos que permitem ao indivíduo fazer relações e comparações, ela é fonte de</p><p>empoderamento e elo de integração entre as mais diversas áreas do conhecimento.</p><p>Sobre o entrelaçar de todos estes conceitos, junto às perspectivas matemáticas,</p><p>sociológicas e filosóficas, é possível fazer desse estudo uma proposta interdisciplinar</p><p>e contar com o apoio das múltiplas áreas do conhecimento para concluir que a</p><p>abordagem matemática também é responsável permanente para a emancipação</p><p>social do educando.</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 9 95</p><p>A educação é um instrumento importante para a superação das desigualdades e</p><p>emancipação humana. Com o intuito de superar as desigualdades sociais, sejam elas de</p><p>renda, classe, oportunidades ou desigualdades vitais, existenciais ou materiais, como</p><p>apresenta Göran, a educação é ainda a melhor forma de diluir essas desigualdades.</p><p>No artigo Práticas Pedagógicas de ensino de matemática: APAE e Lar de idosos,</p><p>Bordignon et. al. conclui que:</p><p>[...] o ensino da matemática é essencial para o desenvolvimento crítico da criança</p><p>e adulto na sociedade. Os professores têm papel fundamental em fazer despertar</p><p>nos alunos o interesse de aprender contribuindo para a inserção dos mesmos</p><p>na sociedade. O estudo da matemática, em especial das formas geométricas, é</p><p>uma ferramenta para a interpretação do nosso dia a dia, e para chegar a uma</p><p>aprendizagem satisfatória, é necessário tornar a matemática uma ciência útil,</p><p>prática e envolvente aplicada no cotidiano (2015, p.10).</p><p>E como agente transformador(a), de realidades sociais, cabe aos educadores(as)</p><p>e pesquisadores(as), a tarefa de fomentar o interesse e contribuir para a efetivação</p><p>das políticas públicas que favoreçam este processo ensino e aprendizagem. Candiotto</p><p>e Peres fazem uma discussão da libertação do homem para uma formação crítica e</p><p>a emancipação humana e citam o papel do professor (a), como impulsionador deste</p><p>ideais. Eles afirmam:</p><p>[...] a forma como o professor apresenta os conceitos matemáticos tem ligações</p><p>diretas com a formação dos educandos. No entanto, evidenciamos a necessidade</p><p>de compreender que a forma como conceituamos tem a ver com nossa visão de</p><p>homem, mundo e sociedade, ou seja, nossos métodos são antecedidos por nossa</p><p>postura (CANDIOTTO; PERES, 2012, p.14).</p><p>Por fim, a educação escolar é sempre intencional e direcionada e, para que</p><p>essa educação atenda de fato às necessidades de uma democracia, ela precisa ser</p><p>democrática, isto é, partir dos princípios democráticos. E para alcançar tais princípios,</p><p>as disciplinas escolares não podem ser vistas simplesmente de maneira técnica e</p><p>fragmentada, mas de forma a ser percebido o papel social que cada uma delas têm e,</p><p>de como cada uma delas contribuem e estão presentes nas diversas esferas da vida.</p><p>A matemática, como todas as outras, tem seu papel e sua importância no contexto do</p><p>desenvolvimento cognitivo e social.</p><p>O desenvolvimento das habilidades lógico-matemática que o ensino da</p><p>matemática proporciona expande-se para a compreensão de diversos fenômenos</p><p>naturais e sociais, colaborando para o desenvolvimento das capacidades humanas no</p><p>contexto social do cotidiano dos indivíduos.</p><p>As habilidades lógico-matemática tais como: inferir, padronizar, ordenar,</p><p>diferenciar, adicionar, subtrair, multiplicar, dividir, conceituar, generalizar hipóteses,</p><p>definir critérios e tantos outros, como pontuou Lipman (1990), colaboram, por exemplo,</p><p>no discernimento diante de problemas éticos, políticos, epistemológicos, etc., dando</p><p>condições de emancipação para o indivíduo e construindo de fato uma sociedade</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 9 96</p><p>democrática, pois fica difícil pensar uma democracia num ambiente social no qual os</p><p>indivíduos não desenvolvem suas habilidades cognitivas.</p><p>REFERÊNCIAS</p><p>ATLAS DO DESENVOLVIMENTO HUMANO DO BRASIL. Disponível em . Acesso em 03 de fevereiro de 2017.</p><p>BORDIGNON, Bruna S. et.al. Práticas pedagógicas de ensino de matemática: APAE e lar de idosos.</p><p>Revista de Educação do IDEAU. vol. 10, n. 21, jan/jul. 2015.</p><p>BRASIL. Ministério da Educação, Secretaria de Educação Média e Tecnológica. PCN+: Ensino Médio.</p><p>Orientações educacionais complementares aos Parâmetros Curriculares Nacionais para o ensino</p><p>médio. Brasília: 2002.</p><p>BORBA, Marcelo C.; SKOVSMOSE, Ole. A ideologia da certeza em educação matemática. In:</p><p>SKOVSMOSE, Ole. Educação matemática crítica: a questão da democracia. Campina: Papirus,</p><p>2001. p. 127-148. (Coleção perspectivas em Educação Matemática).</p><p>CANDIOTTO, William Casagrande; PERES, Elisandra de Souza. As perspectivas de emancipação</p><p>humana nas produções teóricas em educação matemática na década de 1980. IX ANPED Sul.</p><p>Seminário de Pesquisa em Educação da Região Sul, 2012.</p><p>GÖRAN, Therborn. Os campos de extermínio da desigualdade. Trad. Fernando Rugitsky. Novos</p><p>estudos. n. 87, jun. São Paulo: CEBRAP, 2010.</p><p>KAMMI, Constance; LIVINSGTON,</p><p>Sally Jones. Desvendando a aritmética: implicações da teoria de</p><p>Piaget. 6.ed. Campinas: Papiros, 1995.</p><p>LIPMAN. Matthew. A filosofia vai à escola. Trad. Maria Alice de Brzezinski Preste s e Lucia Maria Silvia</p><p>Kremer. São Paulo: Summus, 1990.</p><p>MARX, Karl; ELGELS, Friedrich. Manifesto do Partido Comunista. Madrid: Fundamentos, 1975. 2 V.</p><p>PNUD-PROGRAMA DAS NAÇÕES UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO. Disponível: em: http://</p><p>www.pnud.org.br/IDH/IDH.aspx?indiceAccordion=0&li=li_IDH. Acesso em 20 de fevereiro de 2016.</p><p>ROUSSEAU, Jean-Jacques. O contrato social: princípios de direito. Rio de Janeiro: Tecnoprint,</p><p>1966.</p><p>SEN, Amartya. Desigualdade reexaminada. Trad. de Ricardo Doninelli Mendes. 2. ed. Rio de</p><p>Janeiro: Record, 2008.</p><p>SKOVSMOSE, Ole. Educação matemática crítica: a questão da democracia. Campina: Papirus,</p><p>2001. (Coleção perspectivas em Educação Matemática).</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 10 97</p><p>CAPÍTULO 10</p><p>A LITERACIA FINANCEIRA: CENÁRIO E</p><p>PERSPECTIVAS</p><p>Adriana stefanello Somavilla</p><p>Instituto Federal do Paraná (IFPR)</p><p>Foz do Iguaçu – Paraná</p><p>Tânia Stella Bassoi</p><p>Universidade Estadual do Oeste do Paraná</p><p>(UNIOESTE)</p><p>Cascavel - Paraná</p><p>RESUMO: O nível de literacia financeira está</p><p>associado ao desenvolvimento de competências</p><p>financeiras básicas, essenciais ao cotidiano de</p><p>todo cidadão. Esse artigo se propõe a destacar</p><p>algumas ações, iniciativas e pesquisas</p><p>referentes ao tema educação financeira e</p><p>literacia financeira, resultantes da análise</p><p>documental e leituras realizadas pelas autoras</p><p>nessa perspectiva. Nesse sentido, a melhoria</p><p>na literacia financeira das pessoas exige uma</p><p>mudança de postura que pode ser alcançada</p><p>com os conhecimentos viabilizados por meio</p><p>da educação financeira e alguns aspectos</p><p>como o conhecimento, atitudes financeiras e</p><p>comportamento, são fatores determinantes para</p><p>que isso aconteça. Por fim, a disseminação da</p><p>literacia financeira é parte de uma educação</p><p>para a cidadania e o contexto escolar é o meio</p><p>ideal para uma formação financeira adequada.</p><p>PALAVRAS-CHAVE: Literacia financeira.</p><p>Educação financeira. Cidadania.</p><p>ABSTRACT:The level of financial literacy</p><p>is associated with the development of basic</p><p>financial competence, essential to the daily life</p><p>of every citizen. This article proposes to highlight</p><p>some actions, initiatives and researches</p><p>related to the subject of financial education and</p><p>financial literacy, resulting from the documentary</p><p>analysis and readings by the authors in this</p><p>perspective. In this sense, improving people’s</p><p>financial literacy requires a change of attitude</p><p>that can be achieved with the knowledge made</p><p>possible through financial education and some</p><p>aspects such as knowledge, financial attitudes</p><p>and behavior are determining factors for this</p><p>to happen. Finally, the dissertation of financial</p><p>literacy is part of an education for citizenship</p><p>and the school context is the ideal medium for</p><p>adequate financial training.</p><p>KEYWORDS: Financial Literacy. Financial</p><p>education. Citizenship.</p><p>1 | INTRODUÇÃO</p><p>Surge uma inquietação sobre a influência</p><p>da literacia financeira dos cidadãos. Em 2015 foi</p><p>feita uma abrangente pesquisa mundial sobre</p><p>literacia financeira pela S&P Global Financial</p><p>Literacy Survey. O estudo aponta que dois em</p><p>cada três adultos no mundo são analfabetos</p><p>financeiros e conclui que o analfabetismo</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 10 98</p><p>financeiro é distribuído de forma heterogênea, com variações entre grupos e países.</p><p>Um dos Organismos Internacionais que se interessam pelo tema é a Organização</p><p>para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) e recomenda que a</p><p>abordagem do tema educação financeira nas escolas seja feita no ciclo básico escolar.</p><p>Nessa direção, o tópico literacia financeira passou a integrar a avaliação do Programme</p><p>for International Student Assessment (PISA) desde 2012.</p><p>Na maioria dos países desenvolvidos a disciplina de Educação Financeira está</p><p>inclusa em grande parte dos currículos escolares. Savoia, Saito e Santana (2007)</p><p>observam que o Brasil está num estágio de desenvolvimento inferior em relação aos</p><p>Estados Unidos e Reino Unido, quanto à promoção da educação financeira. Indicam</p><p>ainda três diferenças entre o Brasil e os países citados: a compreensão dos fatores</p><p>históricos, culturais e a responsabilidade das instituições no processo da educação</p><p>financeira.</p><p>Nesse sentido, apesar de ser uma discussão mundial e de relevância social-</p><p>econômica, o tema finanças ainda é pouco abordado no ambiente escolar. Além disso,</p><p>na maioria das escolas públicas, a educação financeira não faz parte dos projetos</p><p>político-pedagógicos e quando trabalhado é por meio de projetos de extensão ou</p><p>atividades extracurriculares.</p><p>Tão preocupante quanto à ausência de uma formação financeira no contexto</p><p>escolar, está à situação de desconhecimento sobre tal assunto pela maioria dos</p><p>cidadãos brasileiros. (SOMAVILLA; SILVA; BASSOI, 2016, p.1)</p><p>Nesse cenário, as iniciativas no campo da educação financeira brasileira</p><p>colaboram para discussões sobre o tema. Um exemplo é o levantamento quantitativo</p><p>feito em 2010 pela Estratégia Nacional de Educação Financeira (ENEF). A elaboração</p><p>do "Mapa da Educação Financeira no Brasil" estimulou o debate, provocou reflexões e</p><p>como consequência delineou as futuras ações da ENEF. Nesse rumo, duas propostas</p><p>colaboram para uma análise dos componentes curriculares da Educação Básica no</p><p>Brasil: o projeto piloto nas escolas públicas do Governo Federal e a elaboração da</p><p>Base Nacional Comum Curricular (BNCC).</p><p>Assim, esse artigo destaca algumas ações que buscam melhorar o nível de</p><p>literacia financeira dos cidadãos e, nessa direção, reforça a importância da inserção</p><p>da temática educação financeira na Educação Básica. Além disso, a literacia financeira</p><p>faz parte de uma educação para a cidadania, visto que bons hábitos adquiridos desde</p><p>cedo podem contribuir para tomada de decisões adequadas quanto à gestão financeira</p><p>durante a vida toda.</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 10 99</p><p>2 | LITERACIA E LITERACIA FINANCEIRA</p><p>O termo literacia é pouco conhecido no Brasil e geralmente é associado à</p><p>escolarização. A expressão sugere letramento, porém sua extensão é ampla e</p><p>transcende a capacidade da leitura, escrita e cálculos matemáticos.</p><p>No artigo "El Desafío de la Alfabetización en el Mundo", a UNESCO utiliza o termo</p><p>"alfabetizações situadas" para destacar que a literacia está relacionada as influências</p><p>sociais.</p><p>O conceito de “alfabetizações situadas” enfatiza a influência do contexto social,</p><p>cultural e política sobre como as pessoas usam e adquirem os conceitos básicos</p><p>de matemática, leitura e escrita. (UNESCO, 2008, p. 17, tradução nossa)</p><p>Para a autora Paula Lopes (2011) dois aspectos são considerados quanto ao</p><p>termo literacia: "[...] constitui-se como uma condição básica para a reflexividade (a</p><p>literacia é "uma competência de base fundamental para a população adulta [...]")</p><p>e também "[...] como condição básica para a cidadania e a participação na esfera</p><p>pública, a base da democracia (Habermas)".</p><p>Com uma interpretação mais abrangente, D'Ambrósio (2002) destaca a literacia</p><p>como um dos três elementos que chama de trivium para a nova era: literacia, materacia</p><p>e tecnocracia.</p><p>LITERACIA: a capacidade de processar informação escrita e falada, o que inclui</p><p>leitura, escritura, cálculo, diálogo, ecálogo, mídia, Internet na vida quotidiana</p><p>[Instrumentos Comunicativos]. (D'AMBROSIO, 2002, p. 66-67)</p><p>Dessa forma, o termo literacia reflete cada época e vai se modificando com as</p><p>transformações da sociedade. Para SANTOS (2015), o termo literacia é mais que</p><p>um conceito e afirma que há mais de 3.200 anos a literacia é reconhecida como um</p><p>importante ativo econômico e social, como revela o papiro encontrado em Tebas,</p><p>datado de 1.210 a.C.</p><p>Nesse contexto, surge o termo literacia financeira. É um conceito contemporâneo</p><p>não universal e se molda às mudanças globais conforme contexto econômico, social</p><p>e político. Orton (2007)</p><p>presenta uma definição de literacia que consta no Referencial</p><p>de Educação Financeira de Portugal:</p><p>Capacidade de ler, analisar, gerir e comunicar sobre a condição financeira pessoal</p><p>e à forma como esta afeta o seu bem-estar material. Ela inclui a capacidade de</p><p>decidir entre escolhas financeiras, discutir assuntos financeiros e monetários sem</p><p>desconforto, planejar o futuro e responder de forma competente às situações</p><p>do dia-a-dia que envolvem decisões financeiras, incluindo acontecimentos na</p><p>economia em geral. (ORTON, 2007, p. 8, tradução nossa)</p><p>Nessa direção, é que surge uma inquietação mundial quanto ao nível de literacia</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 10 100</p><p>financeira dos cidadãos. Assim a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento</p><p>Econômico (OCDE) é uma organização internacional composta por 34 países e</p><p>promove políticas públicas voltadas para o desenvolvimento econômico e o bem estar</p><p>social ao redor do mundo.</p><p>A OCDE (2005) constatou que muitas pessoas, em diferentes países, não só carecem</p><p>do conhecimento e das competências necessários para lidar de modo adequado</p><p>com suas finanças pessoais, como também desconhecem sua necessidade de tais</p><p>conhecimentos, o que assinala a provável origem do problema. (BRASIL, 2011, p.</p><p>56)</p><p>Sua recomendação é que o tema educação financeira seja inserido no ciclo</p><p>básico escolar e reforça que isso contribuiria para que os cidadãos enfrentassem as</p><p>questões financeiras do cotidiano com mais competência desde cedo.</p><p>[...] o ambiente escolar é propício para a formação de um aluno-cidadão, mais</p><p>crítico, proativo e autônomo em relação às finanças, pois hábitos são moldados</p><p>a partir de nossos conceitos, que começam na família e se estendem a escola.</p><p>(SOMAVILLA; SILVA; BASSOI, 2016, p.10)</p><p>A OCDE afirma ainda que os governos estão cientes da necessidade de melhorar</p><p>a literacia financeira e que suas sugestões são um primeiro passo nesse sentido.</p><p>Nessa perspectiva, o tópico literacia financeira foi incluído na nova proposta de</p><p>avaliação do PISA a partir do ano de 2012. Participaram 29 mil jovens de 15 anos</p><p>respondendo questões sobre conhecimentos em finanças, englobando 18 países de</p><p>economias pertencentes a OCDE.</p><p>Nesse processo de avaliação comparada, foi utilizada uma escala de</p><p>conhecimentos, de 1 a 5, sendo que os alunos que atingiram o nível um, conseguiram</p><p>identificar produtos financeiros e interpretar informação básica no que toca a conceitos,</p><p>além de reconhecerem a diferença entre necessidade e desejo no que concerne</p><p>às decisões dos gastos diários. Já os alunos que atingiram o máximo (nível cinco),</p><p>conseguiram analisar produtos financeiros complexos e resolverem problemas não</p><p>rotineiros: potenciais vantagens de certas decisões financeiras. Os resultados da</p><p>primeira avaliação do PISA nessa área mostram que 94% dos alunos alcançam apenas</p><p>o nível um, 83% atingiram o nível dois, 60% o nível três, e para os níveis quatro e</p><p>cinco, 32% e 10% respectivamente.</p><p>Diante desses resultados, revelou-se preocupante o nível de literacia financeira</p><p>mundial. Esses jovens, provavelmente possuem poucos conhecimentos básicos</p><p>para tomar decisões sobre gastos diários, talvez nem entendam faturas ou mesmo</p><p>conseguiriam aplicar as operações numéricas básicas. Ressalta-se ainda que o formato</p><p>das questões aplicadas no PISA deveriam favorecer a interpretação e resolução das</p><p>mesmas, pois apresentaram situações e contextualizações ao cotidiano. Por exemplo,</p><p>a comparação do preço de legumes vendidos em caixa e ao quilo, percepção das</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 10 101</p><p>vantagens e desvantagens de comprar de uma ou outra forma, análise das condições</p><p>de um empréstimo adquirido, distinção do salário bruto do líquido no recibo do</p><p>vencimento mensal, etc.</p><p>Uma das conclusões da OCDE, ainda nesse primeiro estudo do PISA aponta uma</p><p>correlação positiva entre as competências de literacia financeira e as competências</p><p>de leitura e matemática. Ou seja, os jovens que alcançaram bons níveis em literacia</p><p>financeira foram bem avaliados também nas áreas tradicionalmente testadas nessa</p><p>avaliação internacional: matemática e leitura.</p><p>O Brasil não teve participação nesse levantamento, porém foi citado como um</p><p>dos 50 países que deve implantar uma política nacional de educação financeira nas</p><p>escolas.</p><p>Nesse cenário, em 2015 a S&P Global Financial Literacy Survey divulgou uma</p><p>das pesquisas mais abrangentes sobre literacia financeira mundial. Por meio de</p><p>entrevistas, em 2014, mais de 150.000 adultos (com mais de 15 anos) participaram do</p><p>estudo e 148 países foram envolvidos nessa investigação.</p><p>O estudo em questão afirma que de cada três adultos, somente um compreende</p><p>conceitos financeiros básicos. O roteiro de entrevista baseou-se em quatro conceitos</p><p>fundamentais na tomada de decisão financeira: o conhecimento das taxas de juro, juros</p><p>compostos, inflação e diversificação do risco. Segundo Klapper, Lusardi e Oudheusden</p><p>(2015), responsáveis pelo relatório sobre a Literacia Financeira ao redor do mundo, as</p><p>pessoas não estão preparadas para tomar decisões sobre gestão financeira.</p><p>Os resultados indicaram também que o analfabetismo financeiro é distribuído de</p><p>forma desigual, com variações entre grupos e países. No Brasil, 35% dos entrevistados</p><p>acertaram respostas de três dos quatro conceitos fundamentais propostos. Portanto,</p><p>de 143 países analisados, o Brasil está na 67º posição.</p><p>Segundo os autores, há uma relação entre conhecimento financeiro e serviços</p><p>financeiros. Independente do nível de renda as pessoas que utilizam serviços</p><p>bancários ou cartão de crédito, por exemplo, tem melhores habilidades financeiras do</p><p>que as que não têm acesso. Assim, defendem que quanto maior a literacia financeira,</p><p>maior a inclusão financeira, ou seja, quando há a utilização do cartão de crédito ou</p><p>operação de conta bancária, há um aprimoramento das competências financeiras dos</p><p>consumidores.</p><p>3 | EDUCAÇÃO FINANCEIRA: PANORAMA, INICIATIVAS E PERSPECTIVAS</p><p>Os debates sobre o analfabetismo financeiro no Brasil tiveram início no ano de</p><p>2007, pelo Comitê de regulação e Fiscalização dos Mercados Financeiros de capitais</p><p>(COREMEC). A partir desses encontros e por meio dos programas de educação, ações</p><p>e iniciativas foram sendo traçadas para melhorar esse cenário.</p><p>Nessa direção, em 2008 foi realizada uma pesquisa nacional com o objetivo de</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 10 102</p><p>analisar o grau de educação financeira dos brasileiros. Foram entrevistadas 1.809</p><p>pessoas em seis capitais do país: Porto Alegre, São Paulo, Rio de Janeiro, Brasília e</p><p>Salvador. O estudo apontou a similaridade com os resultados de outras pesquisas no</p><p>mundo:</p><p>Apesar da conclusão comum e em linha com as pesquisas internacionais, realizadas</p><p>do Reino Unido, Japão, Austrália e EUA, dentre outros países, o levantamento</p><p>realizado pelo Data Popular apontou detalhes específicos da sociedade brasileira</p><p>que merecem reflexão por parte de formuladores de políticas públicas e pelo</p><p>próprio mercado.(BRASIL, 2011, p. 4)</p><p>Os resultados foram categorizados em: despesas de famílias (o papel da mulher no</p><p>orçamento, principais gastos na família, inclusão de cadastros negativos, organização</p><p>financeira, empréstimo de nome, hábito de poupar, o consumo do brasileiro, juros e</p><p>parcelas, pagamento de contas); a relação com os bancos (questões de imagem, a</p><p>escolha da instituição, o uso do banco); produtos financeiros (o talão de cheque, o</p><p>cartão de débito, o cartão de loja, o cartão de crédito, linhas de crédito/empréstimos,</p><p>seguros, previdência privada) e investimentos (conhecimento, perfil de quem investe,</p><p>conta de poupança, bolsa de valores, hábitos de investimento, expectativa em relação</p><p>ao futuro).</p><p>Diante desse estudo realizado pelo Instituto Data Popular (2008), houve destaque</p><p>para os números em relação à organização doméstica das famílias brasileiras:</p><p>[...] 36% dos pesquisados declaram ter perfil de tipo gastador, 54% não</p><p>conseguiram honrar</p><p>suas dívidas pelo menos uma vez na vida, e apenas 31%</p><p>poupam regularmente para aposentadoria. Observa-se também que parte</p><p>crescente da renda familiar tem sido destinada ao consumo, o que torna as atuais</p><p>taxas de poupança demasiadamente baixas. (BRASIL, 2011, p. 160)</p><p>Diante desse cenário, com a intenção de melhorar o nível de literacia financeira</p><p>dos brasileiros, foi instituída a Estratégia Nacional de Educação Financeira (ENEF).</p><p>Ela é considerada uma mobilização multissetorial em torno de ações de educação</p><p>financeira no Brasil. A partir de sua criação, as instituições de ensino foram incentivadas</p><p>a inserir o assunto no ambiente escolar. Portanto, ao desenvolver o tema com os</p><p>alunos, a família e comunidade seriam beneficiadas com o efeito multiplicador desse</p><p>conhecimento financeiro.</p><p>Nesse mesmo ano foi criado o Comitê Nacional de Educação Financeira</p><p>(CONEF), que tem por objetivo coordenar a execução e definir planos, programas</p><p>e ações da ENEF. Presidido pelo Banco Central do Brasil, o CONEF considera que</p><p>a escola é o espaço ideal na promoção da educação financeira. Sugere ainda que o</p><p>tema transversal e que dialogue com as outras disciplinas do ensino fundamental e</p><p>médio.</p><p>Uma das primeiras iniciativas nesse campo foi o projeto piloto que o programa</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 10 103</p><p>de Governo Federal instituiu em 891 escolas públicas de ensino médio no Brasil (São</p><p>Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Ceará, Tocantins e Distrito Federal). Foram</p><p>envolvidos no projeto aproximadamente 27 mil estudantes e 1200 professores, entre</p><p>agosto de 2010 e dezembro de 2011. Nesse programa, a educação financeira foi tratada</p><p>como um tema transversal no currículo escolar dos jovens, sendo abordada em 72</p><p>situações didáticas nas aulas de português, matemática, história, ciências, geografia,</p><p>entre outras. Foi feita ainda uma avaliação antes e depois da aplicação dos materiais,</p><p>constando de questionários aos alunos, aos professores e aos pais ou responsáveis.</p><p>Para os alunos, os instrumentos foram desenvolvidos para fornecer medidas sobre:</p><p>Educação financeira, Autonomia financeira e Intenção de poupar.</p><p>Segundo o Banco Internacional para Reconstrução e Desenvolvimento (BIRD),</p><p>também conhecido como Banco Mundial, os benefícios desse projeto foram apontados</p><p>no relatório The impact of high school financial education – experimental evidence</p><p>from Brasil. Assim, os alunos participantes lidaram melhor com o uso do dinheiro para</p><p>compras ou poupança, em comparação aos estudantes que não tiveram acesso à</p><p>iniciativa. Outra mudança significativa apontada no documento foi em relação aos</p><p>familiares: os filhos foram incluídos tanto nas decisões financeiras da família quanto</p><p>nas discussões relacionadas ao orçamento doméstico.</p><p>Nesse rumo, foi disponibilizado em 2010 o Relatório Analítico da ENEF que</p><p>apresenta uma análise das iniciativas existentes e as oportunidades na disseminação</p><p>do tema em todo o País. Esse relatório intitulado Mapa da Educação Financeira no</p><p>Brasil, foi dividido duas partes: iniciativas e o levantamento estatístico com aspectos</p><p>relacionados às instituições e a análise descritiva do conjunto de iniciativas, com</p><p>reflexões e oportunidades para ampliar o acesso da população e maior qualificação</p><p>dos projetos.</p><p>Por conseguinte foi firmado o convênio entre a Associação de Educação</p><p>Financeira do Brasil (AEF-Brasil) e o CONEF em 2012, vigente até dezembro de 2016.</p><p>A AEF-Brasil é uma organização sem fins lucrativos e tem por objetivo promover a</p><p>Educação Financeira no Brasil. Assim, ela é supervisionada pelo CONEF e colabora</p><p>com a ENEF na coordenação e execução dos projetos nas escolas.</p><p>Dessa forma, com base nas diretrizes da ENEF, essas instituições uniram-se</p><p>num esforço conjunto de ações que promovem a educação financeira e a iniciam-se</p><p>ações que promovam a educação financeira e a tomada de decisões conscientes por</p><p>parte da população. A Semana Nacional de Educação Financeira e o selo ENEF são</p><p>exemplos de ações que ocorrem desde 2014 e contribuem para que as discussões</p><p>e propostas elevem o nível de literacia financeira do brasileiro. O selo ENEF é um</p><p>edital que seleciona iniciativas gratuitas que cooperam na disseminação de ações de</p><p>educação financeira e previdenciária alinhadas a ENEF.</p><p>Nesse aspecto, em 2004, muito embora o termo literacia financeira não fosse</p><p>conhecido, houve uma proposta de inserção da disciplina Educação Financeira, no</p><p>Projeto de lei Nº 3.401-A:</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 10 104</p><p>O ilustre Deputado Lobbe Neto propõe a criação da disciplina Educação financeira</p><p>a ser introduzida nos currículos das últimas quatro séries do ensino fundamental</p><p>e no ensino médio. Argumenta o ilustre proponente, sobre a responsabilidade</p><p>da educação básica na formação do aluno para o exercício da cidadania em</p><p>consonância com as demandas da sociedade. (BRASIL, 2004, p. 2-3)</p><p>O relator desse projeto, Deputado Nilson Pinto, respondeu o pedido enfatizando</p><p>a procedência dos argumentos do projeto e a concordância com o mesmo. Porém,</p><p>como justificativa cita o artigo 26, da Lei de Diretrizes e Bases (LDB):</p><p>Art. 26. Os currículos do ensino fundamental e médio devem ter uma base nacional</p><p>comum, a ser complementada, em cada sistema de ensino e estabelecimento</p><p>escolar, por uma parte diversificada, exigida pelas características regionais e</p><p>locais da sociedade, da cultura, da economia e da clientela. (BRASIL, 1996)</p><p>Após análises e alterações, esse projeto de lei foi aprovado pela Comissão</p><p>de Educação e Cultura, e pela Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania</p><p>somente no dia 15 de julho de 2009, ou seja, cinco anos após sua proposição. Assim,</p><p>o tópico educação financeira foi incluído na disciplina de Matemática das séries finais</p><p>do ensino fundamental. Já no ensino médio, foi inserido um capítulo sobre noções de</p><p>matemática financeira. Dessa forma, a decisão em relação ao projeto de lei anterior</p><p>não seguiu a proposta inicial, que recomendava a criação da disciplina de Educação</p><p>Financeira.</p><p>Atualmente está sendo elaborada a Base Nacional Comum Curricular (BNCC)</p><p>para a Educação Básica. Esse processo é uma indicação da Lei de Diretrizes e Bases</p><p>(LDB) e segue a orientação das Diretrizes Curriculares Nacionais de 1998 e também</p><p>de 2012. A sua construção integra o Plano Nacional de Educação (PNE) que define as</p><p>metas para os próximos dez anos.</p><p>A ideia da inserção da temática educação financeira na Educação Básica tem o</p><p>apoio do Ministério de Educação, conforme destaque em seu portal, que salienta que</p><p>o assunto está entre os temas da atualidade sugeridos para compor a BNCC.</p><p>No documento de apresentação da BNCC consta que sua proposta tem o</p><p>sentido estratégico nas ações dos educadores e também dos gestores de educação</p><p>do Brasil. Nessa linha, a versão inicial é o documento base que vai definir e reformular</p><p>o currículo mínimo para as 190 mil escolas de educação básica do país, com o objetivo</p><p>de padronizar pelo menos 60% do currículo dessas escolas. Para o ex-ministro da</p><p>Educação Renato Janine, dois caminhos serão abertos com a BNCC: a mudança</p><p>na formação inicial e continuada dos professores e a reformulação significativa do</p><p>material didático.</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 10 105</p><p>Em entrevista ao Portal Agência Brasil, o atual Ministro da Educação Mendonça</p><p>Filho afirma que a BNCC não está paralisada.</p><p>A expectativa era que o documento, que fixa conteúdos mínimos que os estudantes</p><p>devem aprender a cada etapa da educação básica, da educação infantil ao ensino</p><p>médio, ficasse pronto até junho deste ano. Mas as duas entidades pediram para</p><p>debater a proposta, que está sendo discutida desde o ano passado em seminários</p><p>estaduais, para aproximar o texto das necessidades da sociedade. (GONÇALVES,</p><p>2016, p. 1)</p><p>Nessa perspectiva, já existe um Documento de Orientações para Educação</p><p>Financeira nas Escolas (Plano Diretor da ENEF, 2010), que afirma que a Educação</p><p>Financeira prepara as futuras gerações para</p><p>desenvolver nelas as competências</p><p>e habilidades necessárias para lidar com as decisões financeiras que tomarão ao</p><p>longo de suas vidas. Esse documento foi elaborado com a participação do Ministério</p><p>da Educação (MEC), da União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação</p><p>(UNDIME), Conselho Nacional de Secretários de Educação (CONSED) e outras</p><p>instituições educacionais e financeiras ao longo de um ano, coordenado pela Comissão</p><p>de Valores Mobiliários (CVM).</p><p>Portanto, para significativa parcela da sociedade, a educação financeira revela-</p><p>se um instrumento necessário para preparar essas pessoas para os desafios</p><p>do complexo mundo financeiro que hoje se apresenta. Diante da diversidade</p><p>de ofertas inerentes ao estágio atual dos mercados e da crescente inclusão de</p><p>pessoas com maior capacidade financeira, é necessário um esforço para que</p><p>essas pessoas ampliem cada vez mais suas informações sobre gestão do dinheiro,</p><p>de modo a permitir planejamento e tomada de decisões adequados às suas reais</p><p>necessidades. (SANTOS, 2009, p. 2)</p><p>Por fim, várias ações e iniciativas fazem parte do processo ação-reflexão-ação e</p><p>visam contribuir para que as futuras gerações sejam conduzidas adequadamente em</p><p>suas decisões financeiras.</p><p>4 | TRAJETÓRIA METODOLÓGICA</p><p>Esse artigo apresenta parte da investigação da pesquisa de mestrado</p><p>desenvolvida pelas autoras. Ao optar pela pesquisa qualitativa segundo uma abordagem</p><p>fenomenológica, o primeiro passo ao olhar para o contexto da pesquisa foi buscar</p><p>leituras e documentos relacionados à disciplina de matemática financeira nos cursos</p><p>de Licenciaturas em Matemática e educação financeira para a Educação Básica.</p><p>Como é um tema que a literatura e os decretos lei avalizam como necessários</p><p>à formação cidadã a partir do fundamental II e ensino médio, emerge a questão de</p><p>pesquisa que busca compreender o que se revela sobre a instauração da disciplina</p><p>de Matemática Financeira nos cursos de Licenciatura em Matemática dos Institutos</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 10 106</p><p>Federais de Educação, Ciência e Tecnologia da região Sul do Brasil.</p><p>Ao considerar o fenômeno, os sujeitos reconhecidos que emergiram quando</p><p>fizemos a pergunta "Quem?" foram os docentes integrantes do Núcleo Docente</p><p>Estruturante com formação inicial em Matemática dos cursos de Licenciatura em</p><p>Matemática desses Institutos Federais.</p><p>Por fim, na obtenção de dados significativos para o estudo, além da pesquisa</p><p>exploratória e documental do que se refere à matemática financeira na formação inicial</p><p>de professores de matemática e educação financeira na Educação Básica, estão sendo</p><p>feitas entrevistas com os sujeitos identificados e após a coleta, a análise será norteada</p><p>pelos passos: a descrição fenomenológica, que deve retratar e expressar a experiência</p><p>consciente do sujeito, a redução fenomenológica ou epoche, que consiste na crítica</p><p>reflexiva dos conteúdos da descrição e por último a interpretação fenomenológica.</p><p>5 | CONSIDERAÇÕES FINAIS</p><p>Os debates e discussões sobre a literacia financeira brasileira e mundial destacam</p><p>o papel da escola contemporânea na disseminação do conhecimento financeiro.</p><p>Nesse processo de mudança constante estão envolvidos o contexto sócio, econômico,</p><p>cultural e educacional. Assim, esse artigo apresenta algumas iniciativas, reflexões e</p><p>pesquisas que reforçam a importância da inserção da disciplina de educação financeira</p><p>na Educação Básica.</p><p>O apoio do MEC para a inserção do tema educação financeira na Educação</p><p>Básica é um avanço, quando afirma que a educação financeira é um dos temas da</p><p>atualidade sugeridos para compor a BNCC externando seu posicionamento frente à</p><p>inserção do assunto na Educação Básica.</p><p>Uma formação financeira adequada é um requisito na promoção de uma qualidade</p><p>de vida desejável para as pessoas. Assim, alguns aspectos como o conhecimento,</p><p>atitudes financeiras e comportamento, são fatores determinantes para elevar o nível</p><p>de literacia financeira.</p><p>Por fim, na perspectiva de uma educação integral, a escola precisa promover</p><p>o ensino de saberes e competências para que seus alunos exerçam melhor sua</p><p>cidadania com autonomia. Nessa direção, cidadãos instruídos em literacia financeira,</p><p>estarão melhores preparados para enfrentar os desafios financeiros de seu cotidiano.</p><p>REFERÊNCIAS</p><p>BRASIL. Câmara dos Deputados. Projeto de Lei Federal nº 3.401-B, DE</p><p>2004. Disponível em: . Acesso em: 9 fev. 2016.</p><p>BRASIL. Estratégia Nacional de Educação Financeira - Portal Vida e Dinheiro. Plano Diretor da Enef.</p><p>2011. Disponível em: . Acesso em: 21</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 10 107</p><p>maio 2014.</p><p>BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional 9.394/96. Disponível em: . Acesso em: 20 dez. 2013.</p><p>BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Básica. Secretaria de Educação</p><p>Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão. Conselho Nacional da Educação. Diretrizes</p><p>Curriculares Nacionais Gerais da Educação Básica/ Ministério da Educação. Secretária de</p><p>Educação Básica. Diretoria de Currículos e Educação Integral. � Brasília: MEC, SEB, DICEI, 2013.</p><p>542p.</p><p>D’AMBROSIO, Ubiratan. Etnomatemática: elo entre tradições e modernidade. Belo Horizonte:</p><p>Autêntica, 2002.</p><p>ENEF. Mapa da Educação Financeira no Brasil. Relatório Analítico da ENEF. Disponível em:</p><p>.Acesso em: 29 jun. 2016.</p><p>KLAPPER, Leora; LUSARDI, Annamaria; OUDHEUSDEN, Peter van. Financial Literacy Around</p><p>the World: insights from the standard & poor’s ratings services global financial literacy survey. 2015.</p><p>Disponível em . Acesso</p><p>em: 06 jun. 2016.</p><p>LOPES, Paula Cristina. Literacia(s) e literacia mediática. CIED e-Working paper n.º 110/2011, p.</p><p>1-37. 2011. Disponível em: .</p><p>Acesso em: 16 jun. 2016.</p><p>OCDE/OECD – Organisation for Economic and Co-Operation Development. Improving Financial</p><p>Literacy. Analysis of Issues and Policies. Paris. 2005. Disponível em: http://www.oecd.org/finance/</p><p>financial-education/37087833.pdf. Acesso em: 07 jul. 2016.</p><p>Orton, Larry. Financial literacy: Lessons from international experience. Canadá: Canadian Policy</p><p>Research Networks Inc. 2007. Disponível em: . Acesso em: 9 de jun. 2016.</p><p>PORTUGAL. Referencial de Educação Financeira para a educação pré-escolar, ensino básico,</p><p>ensino secundário e educação e formação de adultos. Disponível em: . Acesso em: 2 março 2016</p><p>SANTOS, António José da Conceição. Literacia Financeira - O caso dos alunos dos cursos da</p><p>área financeira da Escola Superior de Ciências Empresariais (ESCE) do Instituto Politécnico de</p><p>Setúbal (IPS). 2015. 80 f. Dissertação (Mestrado em Contabilidade e Finanças). Escola Superior de</p><p>Ciências Empresariais, Instituto Politécnico de Setúbal, Portugal. 2015. Disponível em: . Acesso em: 20 fev. 2016</p><p>SANTOS, Liana Ribeiro dos. Educação Financeira na Agenda da Responsabilidade Social</p><p>Empresarial. Banco Central do Brasil, 2009 (Boletim de Responsabilidade Social e Ambiental do</p><p>Sistema Financeiro). Disponível em:</p><p>Acesso em: 17 fev. 2016.</p><p>SAVOIA, José Roberto Ferreira; SAITO, André Taue; SANTANA, Flávia de Angelis. Paradigmas</p><p>da educação financeira no Brasil. Rev. Adm.</p><p>Pública [online]. 2007, vol. 41, n. 6, pp. 1121-1141.</p><p>Disponível em: .</p><p>Acesso em: 22 março 2015.</p><p>SOMAVILLA, Adriana Stefanello ; SILVA, Carla Renata Garcia Xavier da; BASSOI, Tânia Stella.</p><p>A Literacia Financeira em discussão In: XII Encontro Nacional de Educação Matemática (ENEM),</p><p>2016, São Paulo. Anais do 12º Encontro Nacional de Matemática. São Paulo: Programa de Pós-</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 10 108</p><p>graduação em Ensino de Ciências e Matemática da Universidade Cruzeira do Sul, 2016. v.12. p.1</p><p>- 12. Disponível em: Acesso em: 10 agosto 2016.</p><p>UNESCO (2008), El Desafío Mundial de la Alfabetización: Perfil de Alfabetización de Jóvenes</p><p>y Adultos a Mediados del Decenio de las Naciones Unidas de la Alfabetización 2003-2012, Paris,</p><p>UNESCO. Disponível em: . Acesso</p><p>em: 16 maio 2016.</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 11 109</p><p>CAPÍTULO 11</p><p>EDUCAÇÃO ESTATÍSTICA: HISTÓRIA E MEMÓRIA</p><p>Ednei Leite de Araújo</p><p>Diretoria executiva da Rede Marista de Colégios</p><p>Curitiba, Paraná.</p><p>RESUMO: Este trabalho apresenta alguns</p><p>resultados de uma pesquisa de mestrado</p><p>realizada no Programa de Pós-graduação em</p><p>Educação em Ciências e em Matemática da</p><p>Universidade Federal do Paraná cujo objetivo</p><p>principal consiste em apresentar concepções</p><p>de Educação Estatística segundo alguns</p><p>pesquisadores da Educação Matemática,</p><p>integrantes do GT 12 da SBEM (Ensino de</p><p>Probabilidade e Estatística). Logo, o problema</p><p>de pesquisa consiste em investigar quais</p><p>concepções sobre Educação Estatística</p><p>permeiam práticas e pesquisas desses</p><p>pesquisadores. Apresentamos aqui, trechos do</p><p>diálogo realizado com a primeira colaboradora</p><p>desse estudo, a professora Cileda de Queiroz</p><p>e Silva Coutinho e aspectos históricos</p><p>importantes da trajetória das pesquisas</p><p>em Educação Estatística por meio de sua</p><p>memória, explicitando tópicos importantes</p><p>como Letramento e Alfabetização em</p><p>Estatística, Educação Estatística e Educação</p><p>Matemática, História do GT12 e formação do</p><p>professor que ensina Estatística. A entrevista</p><p>aqui apresentada, bem como todas as outras</p><p>entrevistas realizadas na pesquisa seguiram os</p><p>procedimentos metodológicos da História Oral.</p><p>PALAVRAS-CHAVE: Educação Estatística;</p><p>Alfabetização Estatística; História Oral</p><p>ABSTRACT: This paper presents some</p><p>results of a master’s research carried out in</p><p>the Postgraduate Program in Science and</p><p>Mathematics Education of the Federal University</p><p>of Paraná, whose main objective is to present</p><p>conceptions of Statistical Education according</p><p>to some researchers of Mathematics Education,</p><p>members of GT 12 of SBEM (Teaching of</p><p>Probability and Statistics). Therefore, the</p><p>research problem consists in investigating</p><p>which conceptions about Statistical Education</p><p>permeate practices and researches of these</p><p>researchers. We present here, excerpts from the</p><p>dialogue with the first collaborator of this study,</p><p>Professor Cileda de Queiroz e Silva Coutinho</p><p>and important historical aspects of the research</p><p>trajectory in Statistical Education through his</p><p>memory, explaining important topics such as</p><p>literacy and literacy in Statistics, Education</p><p>Statistics and mathematics education, History</p><p>of GT 12 and teacher training that teaches</p><p>Statistics. The interview presented here, as well</p><p>as all other interviews conducted in the research,</p><p>followed the methodological procedures of Oral</p><p>History.</p><p>KEYWORDS: Statistical Education; Statistical</p><p>Literacy; Oral History</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 11 110</p><p>1 | INTRODUÇÃO</p><p>O meu interesse pela Educação Estatística surgiu durante a Licenciatura em</p><p>Matemática. Primeiro, porque durante os 4 anos de graduação, as ideias da Estatística</p><p>são apresentadas em apenas 2 disciplinas de 60 horas cada, ministradas por alguém</p><p>do departamento de Estatística e também porque, ao participar de diversos projetos</p><p>como o PIBID, comecei a perceber que, na maioria das vezes, os professores não</p><p>dominam ou possuem certo receio com relação aos conteúdos estatísticos. Em</p><p>todos estes projetos dos quais fiz parte, procurei apresentar para os participantes</p><p>- professores da Educação Básica - onde as pesquisas estavam, ou seja, portais</p><p>com banco de teses, dissertações e artigos em Educação Matemática, explicitando</p><p>a possibilidade de aplicação das metodologias destas pesquisas na sala de aula, no</p><p>sentido de diversificar sua prática de ensino e buscar novas metodologias para ensinar</p><p>Matemática e Estatística.</p><p>A Estatística possui forte presença no cotidiano, seja para interpretar uma</p><p>notícia ou validar alguma decisão e, nesses estudos realizados em paralelo com a</p><p>licenciatura, constatei que, em grande parte das aulas observadas nas disciplinas de</p><p>Prática de Docência I e II, ela era deixada de lado ou era abordada como se fosse um</p><p>conteúdo matemático. Alguns professores falavam da Estatística como se estivessem</p><p>ensinando um conceito algébrico, com todas aquelas fórmulas e rigor matemático.</p><p>Assim, após ingressar no mestrado, desejei realizar mais estudos voltados para</p><p>a Educação Estatística e formalizar essas observações por meio da investigação do</p><p>que alguns pesquisadores em Educação Estatística pensam sobre a Alfabetização</p><p>Estatística. Claro que outros elementos surgiram ao longo dos diálogos e foram</p><p>considerados e estudados na pesquisa de mestrado.</p><p>As entrevistas foram realizadas no IASE 2015 (International Association For</p><p>Statistical Education). A 9ª Conferência Satélite IASE 2015 foi realizada no Rio</p><p>de Janeiro, de 22 a 24 julho de 2015, pouco antes do 60º Congresso Mundial da</p><p>Estatística, 26-31 julho, também no Rio. O evento acontece a cada dois anos e reúne</p><p>diversos pesquisadores de todo o mundo e do país para a difusão de conhecimentos</p><p>e experiências na temática da Educação Estatística. O evento congrega especialistas,</p><p>acadêmicos, profissionais e pesquisadores para discutirem pontos de vista e</p><p>abordagens relacionadas aos avanços da Educação Estatística.</p><p>2 | PROCEDIMENTOS DA PESQUISA</p><p>Com o objetivo de captar na fala de pesquisadores cadastrados no GT12 da</p><p>SBEM, as concepções sobre Alfabetização Estatística, foram realizadas seis entrevistas</p><p>durante o evento, utilizando os procedimentos de pesquisa da História Oral Temática,</p><p>com base no referencial teórico do Grupo GHOEM (Grupo de Pesquisa "História Oral</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 11 111</p><p>e Educação Matemática" da UNESP de Rio Claro).</p><p>De acordo com Meihy, a História Oral pode ser definida como</p><p>Um recurso moderno usado para a elaboração de documentos, arquivamento e</p><p>estudos referentes à vida social de pessoas. Ela é sempre uma história do tempo</p><p>presente e também conhecida por história viva (MEIHY, 2011, p.13).</p><p>Nesta perspectiva, os procedimentos de pesquisa da História Oral fazem parte</p><p>desse trabalho uma vez que nosso objetivo consiste em evidenciar a história viva de</p><p>cada colaborador no que diz respeito à Educação Estatística e, dentro dessa história,</p><p>conhecer o que cada um concebe por Alfabetização Estatística e como esse conceito</p><p>é abordado nas pesquisas e práticas por eles realizadas.</p><p>Os procedimentos de pesquisa da História Oral possibilitam a compreensão de</p><p>certo fenômeno por meio da oralidade, construindo narrativas a partir de situações</p><p>de entrevista. De fato, as entrevistas estão presentes no desenvolvimento de</p><p>pesquisa qualitativa há muito tempo. Porém, a entrevista realizada de acordo com</p><p>os procedimentos da História Oral possui fundamentos historiográficos, constituindo</p><p>fontes históricas com a intenção de captar fatos e ideias que não foram ditas antes e/</p><p>ou que sempre foram ditas, mas não estão registradas.</p><p>De acordo com Garnica (2003), um dos pesquisadores atuantes do GHOEM, a</p><p>História Oral se encontra com a Educação Matemática para organizar um fundante</p><p>metodológico visando ao levantamento</p><p>nessas situações desejando saber na individualidade o traço</p><p>latente de cada habilidade do indivíduo tentando explicar os devidos erros e acertos.</p><p>Assim, a TRI estuda o comportamento do aluno frente a cada item que ele respondeu.</p><p>Vejamos o três parâmetros:</p><p>• Acerto ao acaso – é a probabilidade de acerto de modo aleatório, conhecido</p><p>também como “acerto no chute”. Normalmente ocorre quando o aluno de baixo traço</p><p>latente acerta item classificado como difícil. A TRI estima a probabilidade desse fato</p><p>ter ocorrido.</p><p>• Dificuldade do item - Pode ser definido como o nível mínimo de proficiência</p><p>que um candidato deve obter para ter grande chance de acertar um item. De modo</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 1 4</p><p>específico, deseja-se saber o valor de aptidão para que a probabilidade de acerto</p><p>deste ítem seja de no mínimo 50%.</p><p>• Discriminação do item - É concebido como a capacidade do item de diferenciar</p><p>indivíduos com habilidades e proficiências distintas.</p><p>Para elaboração de uma nova proposta de avaliação, analisamos os resultados</p><p>fornecidos no relatório pedagógico de matemática dos SARESPs realizados nos anos de</p><p>2008 à 2013. Neles foram observados que os exercícios (itens) com características de</p><p>reconhecimento se inseriram nos níveis Abaixo do Básico/Básico, e os exercícios com</p><p>características de compreensão, em sua maioria, se inseriram nos níveis Adequado/</p><p>Avançado. Verificamos, via Internet, e via visitação em escolas, que as avaliações</p><p>aplicadas, em sua maioria, as questões tinham características de resolução mecânica</p><p>com muitos termos e aspectos “livrísticos”.</p><p>A habilidade de reconhecer e a habilidade de compreender, obedecem uma</p><p>hierarquia de complexidade para o aprendizado. Esta hierarquia, foi proposta em</p><p>meados de 1950, sendo conhecida como as Taxonomias de Bloom.</p><p>3 | TAXONOMIA DE BLOOM</p><p>A Taxonomia de Bloom, proposta por: Benjamin Samuel Bloom (1913-1999),</p><p>nascido em Lasfordf, Pennsylvania, foi um psicólogo educacional americano que</p><p>se preocupou em analisar conceitos psicométricos na classificação de objetivos</p><p>educacionais. Ele também dirigiu uma equipe de pesquisa que realizou uma grande</p><p>investigação sobre o desenvolvimento de talentos excepcionais. Em 1956, Bloom</p><p>editou o primeiro volume de Taxonomia de objetivos educacionais: a classificação dos</p><p>objetivos educacionais, que delineou uma classificação dos objetivos de aprendizagem</p><p>que veio a ser conhecido como a Taxonomia de Bloom e continua a ser um elemento</p><p>fundamental e essencial dentro da comunidade educativa.</p><p>A classificação hierárquica de domínio psicométricos dependentes entre si,</p><p>divididas em três grandes grupos:</p><p>• O cognitivo, abrangendo a aprendizagem intelectual;</p><p>• O afetivo, abrangendo os aspectos de sensibilização e gradação de valores;</p><p>• O psicomotor, abrangendo as habilidades de execução de tarefas que en-</p><p>volvem o aparelho motor.</p><p>A Taxonomia de Bloom, justifica pedagogicamente o acontecimento estatístico</p><p>e probabilístico ocorridos nos relatórios analisados. As estruturas de avaliação</p><p>escolar para mapear habilidades tomando como base a Taxonomia de Bloom</p><p>em questões de múltipla escolha, se restringe apenas às informações do domínio</p><p>cognitivo, observando a hierarquia taxonômica de complexidade em aprendizagem</p><p>intelectual. Segundo a Taxonomia de Bloom, os objetivos educacionais no domínio</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 1 5</p><p>cognitivo, são classificados em uma hierarquia de seis níveis: Conhecer/lembrar,</p><p>Compreender/Entender, Aplicar, Analisar, Sintetizar e Criar.</p><p>Esses seis níveis são ilustrados nas seguintes etapas de demonstração</p><p>de aquisição e devolução cognitiva.</p><p>Vejamos uma breve explicação de cada patamar da Taxonomia de Bloom.</p><p>1. Lembrar / Conhecer: Habilidade de lembrar informações e conteúdos</p><p>previamente abordados como fatos, datas, palavras, teorias, métodos, classificações,</p><p>lugares, regras, critérios, procedimentos etc. Esta habilidade pode envolver lembrar</p><p>uma significativa quantidade de informação ou fatos específicos. O objetivo principal</p><p>desta categoria é trazer à consciência, esses conhecimentos.</p><p>Na construção de questões, deve-se atentar para utilizar os seguintes verbos</p><p>na caracterização de questões de reconhecer. São eles: enumerar, definir, descrever,</p><p>identificar, denominar, listar, nomear, combinar, realçar, apontar, relembrar, recordar,</p><p>relacionar, reproduzir, solucionar, declarar, distinguir, rotular, memorizar, ordenar e</p><p>reconhecer.</p><p>2. Entender: Habilidade de compreender e dar significado ao conteúdo. Essa</p><p>habilidade pode ser demonstrada por meio da tradução do conteúdo compreendido</p><p>para uma nova forma (oral, escrita, diagramas etc.) ou contexto. Nessa categoria,</p><p>encontra-se a capacidade de entender a informação ou fato, de captar seu significado</p><p>e de utilizá-la em contextos diferentes. Os verbos utilizados para esta habilidade</p><p>são: alterar, construir, converter, decodificar, defender, definir, descrever, comparar,</p><p>distinguir, discriminar, estimar, explicar, generalizar, dar exemplos, ilustrar, inferir,</p><p>reformular, prever, reescrever, resolver, resumir, classificar, discutir, identificar,</p><p>interpretar, reconhecer, redefinir, selecionar, situar e traduzir.</p><p>3.Aplicar: Habilidade de usar informações, métodos e conteúdos aprendidos em</p><p>novas situações concretas. Isso pode incluir aplicações de regras, métodos, modelos,</p><p>conceitos, princípios, leis e teorias. Como dito antes, deparamo-nos com exercícios</p><p>de duas características: Nas disciplinas que tem foco maior em cálculo (Matemática e</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 1 6</p><p>Física), os exercícios ficam com as características de resolução com processo mecânico,</p><p>pois, em muitos casos apenas substituímos valores em fórmulas e desenvolvemos o</p><p>cálculo, por outro lado, nas disciplinas com foco em leitura e interpretação, a aplicação</p><p>seria transladar todo o conhecimento obtido em situações de contextos diversos.</p><p>Verbos: aplicar, alterar, programar, demonstrar, desenvolver, descobrir, dramatizar,</p><p>empregar, ilustrar, interpretar, manipular, modificar, operacionalizar, organizar, prever,</p><p>preparar, produzir, relatar, resolver, transferir, usar, construir, esboçar, escolher,</p><p>escrever, operar e praticar. Vimos também que vários verbos repetem-se em duas ou</p><p>mais escalas hierárquicas, até o estudo atual concluímos que o contexto do exercício</p><p>e a disciplina influencia em seu grau de complexidade.</p><p>4. Analisar: Habilidade de subdividir o conteúdo em partes menores com a</p><p>finalidade de entender a estrutura final. Essa habilidade pode incluir a identificação</p><p>das partes, análise de relacionamento entre as partes e reconhecimento dos princípios</p><p>organizacionais envolvidos. Identificar partes e suas inter-relações. Nesse ponto é</p><p>necessário não apenas ter compreendido o conteúdo, mas também a estrutura do</p><p>objeto de estudo.</p><p>Poderíamos aqui falar de Subcategorias: Análise de elementos; Análise de</p><p>relacionamentos; e Análise de princípios organizacionais. Os verbos relacionados a</p><p>esta habilidade são: analisar, reduzir, classificar, comparar, contrastar, determinar,</p><p>deduzir, diagramar, distinguir, diferenciar, identificar, ilustrar, apontar, inferir, relacionar,</p><p>selecionar, separar, subdividir, calcular, discriminar, examinar, experimentar, testar,</p><p>esquematizar e questionar.</p><p>5. Sintetizar: Habilidade de agregar e juntar partes com a finalidade de criar</p><p>um novo todo. Essa habilidade envolve a produção de uma comunicação única</p><p>(tema ou discurso), um plano de operações (propostas de pesquisas) ou um conjunto</p><p>de relações abstratas (esquema para classificar informações). Combinar partes</p><p>não organizadas para formar um “todo”. Poderíamos aqui falar das Subcategorias:</p><p>Produção de uma comunicação original; Produção de um plano ou propostas de um</p><p>conjunto de operações; Derivação de um conjunto de relacionamentos abstratos. Os</p><p>verbos relacionados a esta habilidade são: categorizar, combinar, compilar, compor,</p><p>conceber,</p><p>de fontes que permitam a reconstrução de</p><p>cenários a partir das vozes que refletem memórias dos entrevistados. Assim, nas</p><p>entrevistas, o papel do pesquisador é ouvir, aceitar e respeitar as memórias dos</p><p>colaboradores que aceitaram serem entrevistados, ou seja, o personagem principal</p><p>não é o entrevistador. Logo, essa foi a postura adotada durante a realização das</p><p>entrevistas com os colaboradores desse estudo.</p><p>Basicamente, o processo da História Oral passa por três momentos. O primeiro</p><p>momento é o da gravação, que tem fortes relações com equipamento, com qualidade,</p><p>com disposição. Numa entrevista, o colaborador pode ficar inibido em consequência</p><p>do dispositivo de gravação. Alguns pesquisadores usam gravador e outros usam</p><p>vídeo. Conforme o tipo de equipamento, a pessoa pode sentir-se constrangida. Assim,</p><p>durante as entrevistas que realizei, foi utilizado um gravador portátil e discreto, deixado</p><p>num lugar propício que não chamasse muito a atenção do entrevistado.</p><p>O segundo momento consiste em transformar em texto a fala daquilo que foi</p><p>gravado. Essa parte é chamada de transcrição e ela obedece uma técnica que varia</p><p>conforme os objetivos da pesquisa. É o relato oral escrito de acordo com as entonações,</p><p>pausas e vícios de linguagem, aproximando o texto, o máximo possível, do registro</p><p>oral.</p><p>O terceiro momento é o da textualização. A textualização é a transformação do</p><p>texto da transcrição em um texto para ser lido. Não é mais um texto técnico do áudio</p><p>que reproduz isso, mas ele é um texto com características literárias e acadêmicas,</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 11 112</p><p>para ser divulgado e lido, que apresenta o discurso em uma narrativa mais coerente,</p><p>apropriando-se da fala do entrevistado.</p><p>O processo de legitimação, de acordo com Garnica (2003), acontece em paralelo</p><p>com a textualização, quando o texto retorna aos colaboradores para conferência e</p><p>posterior cessão de direitos. Nesta etapa, o colaborador pode realizar alterações</p><p>no texto antes da cessão de direitos, sugerindo supressões ou inserindo alguma</p><p>informação que não foi explicitada no momento da entrevista.</p><p>3 | A ESCOLHA DOS ENTREVISTADOS</p><p>A escolha dos pesquisadores se deu após uma revisão de literatura sobre o</p><p>estado da arte das pesquisas em Educação Estatística. Essa pesquisa preliminar foi</p><p>realizada por meio de uma busca de teses e dissertações realizada no site da Capes,</p><p>utilizando as seguintes palavras chaves: Educação Estatística; Ensino de Estatística;</p><p>Ensino de probabilidade e Estatística; Educação Estocástica. Tal busca foi baseada</p><p>nos trabalhos de Cazorla, Kataoka e Silva (2010) e (2015), que apresentam a trajetória</p><p>das pesquisas em Educação Estatística até 2010, no caso do primeiro trabalho e entre</p><p>Janeiro de 2010 a Dezembro de 2014, no segundo trabalho. O estudo mais recente</p><p>destaca 46 pesquisadores que ou são membros do GT12 da SBEM e/ou são membros</p><p>da comissão científica de Educação Estatística do SIPEMAT 2015 e/ou teve a produção</p><p>científica analisada no estudo documental sobre essa temática realizado por Cazorla,</p><p>Kataoka e Silva (2010).</p><p>Nesse estudo, analisamos apenas a produção científica dos pesquisadores</p><p>cadastrados no GT12, cuja lista foi obtida em 10 de julho de 2015 na página da SBEM.</p><p>Pesquisador Título Instituição UF Pós*</p><p>Número de</p><p>projetos**</p><p>Admur Severino Pamplona Doutor UFMT MT Não 0</p><p>Adriana Zequim Mestre UNIAN SP Não 0</p><p>Ailton Paulo de Oliveira Júnior Doutror UFTM MG Sim 3</p><p>Andre Oliveira Souza Mestre IFES ES Não 0</p><p>Carlos Bifi Doutor FATEC SP Não 0</p><p>Carlos Monteiro Doutor UFPE PE Sim 3</p><p>Celi A. E. Lopes Doutor UNICSUL SP Sim 4</p><p>Celso Campos Doutor</p><p>PUC, CS,</p><p>UNIP</p><p>SP Sim 0</p><p>Cileda de Queiroz Silva</p><p>Coutinho</p><p>Doutor PUC SP Sim 4</p><p>Claudette Maria Medeiros</p><p>Vendramini</p><p>Doutor USF SP Sim 1</p><p>Claudia Borim da Silva Doutor USJT SP Não 3</p><p>Cristiane de Arimatéa Rocha Mestre UFPE PE Não 2</p><p>Cristiano Muniz Doutor UNB DF Não 0</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 11 113</p><p>Dione Lucchesi de Carvalho Doutor UNICAMP SP Sim 0</p><p>Diva Novaes Doutor IFSP SP Sim 0</p><p>Fabiano Souza Mestre UFF RJ Não 1</p><p>Gilda Guimarães Doutor UFPE PE Sim 4</p><p>Harryson Júnio Lessa</p><p>Gonçalves</p><p>Doutor UNESP SP Não 0</p><p>Helio Radke Bittencourt Doutor PUC-RS RS Não 0</p><p>Humberto Bortolossi Doutor UFF RJ Sim 0</p><p>Irene Cazorla Doutor UESC BA Sim 1</p><p>Jefferson Biajone Mestre FATEC SP Não 0</p><p>José Ivanildo Felisberto de</p><p>Carvalho</p><p>Mestre UFPE PE Não 2</p><p>Keli Conti Doutor FAAT SP Não 1</p><p>Lisbeth Cordani Doutor USP SP Sim 0</p><p>Lori Viali Doutor</p><p>UFRGS e</p><p>PUC-RS</p><p>RS Sim 2</p><p>Luzinete Mendonça Mestre UNISO SP Não 0</p><p>Marcos Pinho Doutorando Não 0</p><p>Maria Helena Palma de Oliveira Doutor UNIAN SP Sim 3</p><p>Maria Lucia Lorenzetti</p><p>Wodewotzki</p><p>Doutor</p><p>UNESP-Rio</p><p>Claro</p><p>SP Sim 0</p><p>Maria Patrícia Freitas de Lemos Doutor UFPI PI Não 0</p><p>Marinez Cargnin Stieler Doutor UNEMAT MT Não 0</p><p>Mauren Porciúncula Doutor FURG RS Sim 2</p><p>Mauro Cesar Gonçalves Mestre FMS SP Não 0</p><p>Paulo Afonso Lopes Doutor IME RJ Sim 0</p><p>Regina Thaise Mestre UNIAN SP Não 0</p><p>Rodrigo Rios Mestrando SP Não 0</p><p>Rute Borba Doutor UFPE PE Sim 3</p><p>Saddo Ag Almouloud Doutor PUC-SP SP Sim 1</p><p>Sandra Magina Doutor UESC BA Sim 3</p><p>Suzi Sama Doutor FURG RS Sim 4</p><p>Verônica Gitirana Doutor UFPE PE Sim 1</p><p>Verônica Kataoka Doutor UESC BA Sim 10</p><p>*docente de programa de pós-graduação, orientador de dissertações e teses.</p><p>**número de projetos em Educação Estatística descritos na Plataforma Lattes, em andamento e/ou concluídos.</p><p>UFMT = Universidade Federal do Mato Grosso; USP = Universidade de São Paulo; UNIAN = Universidade</p><p>Anhanguera; UFTM = Universidade Federal do Triângulo Mineiro; IFES = Instituto Federal de Educação, Ciência</p><p>e Tecnologia do Espírito Santo; UFPE = Universidade Federal de Pernambuco; UNICSUL = Universidade</p><p>Cruzeiro do Sul; PUC = Pontifícia Universidade Católica; CS = Faculdades Integradas Campos Salles; UNIP =</p><p>Universidade Paulista; USF = Universidade São Francisco; USJT = Universidade São Judas; UNB = Universidade</p><p>de Brasília; UNICAMP = Universidade Estadual de Campinas; IFSP = Instituto Federal de Educação, Ciência e</p><p>Tecnologia de São Paulo; UFF = Universidade Federal Fluminense; UNESP = Universidade Estadual Paulista;</p><p>UESC = Universidade Estadual de Santa Cruz; FATEC = Faculdade de Tecnologia; FAAT = faculdades Atibaia;</p><p>UFRGS= Universidade Federal do Rio Grande do Sul; UNISO = Universidade de Sorocaba; UFPI = Universidade</p><p>Federal do Piauí; UNEMAT = Universidade do Estado de Mato Grosso; FURG = Universidade Federal do Rio</p><p>Grande; FMS = Faculdade Mário Schenberg; IME = Instituto Militar de Engenharia; UESB = Universidade</p><p>Estadual do Sudoeste da Bahia.</p><p>Outro estudo documental que norteou a escolha dos colaboradores dessa</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 11 114</p><p>pesquisa, é apresentado em Santos (2013), que destaca a professora Cileda Coutinho</p><p>como a principal orientadora de teses e dissertações na área da Educação Estatística,</p><p>com um total de 29 orientações concluídas. Então, enviei um convite via e-mail e ela</p><p>aceitou colaborar com o estudo. Como a 9ª Conferência Satélite IASE congregaria</p><p>grande parte dos pesquisadores em Educação Estatística, combinamos a realização da</p><p>entrevista lá. E ela foi a primeira entrevistada, fornecendo no diálogo nomes de outros</p><p>pesquisadores que estavam no evento e que poderiam contribuir com a pesquisa, de</p><p>acordo com o critério de rede, citado em (Garnica, 2003) em que os próprios depoentes</p><p>indicam outros para serem entrevistados. Esse foi o critério utilizado na seleção dos</p><p>colaboradores.</p><p>O que traremos a seguir, são trechos do diálogo com a primeira colaboradora</p><p>desse trabalho, a professora Cileda, que corroboram com observações realizadas</p><p>anteriormente e com a revisão da literatura da pesquisa.</p><p>4 | EDUCAÇÃO ESTATÍSTICA NO BRASIL E EDUCAÇÃO MATEMÁTICA</p><p>Antes mesmo da criação de um grupo de trabalho (GT 12), a preocupação com</p><p>o Ensino de Estatística no Brasil já se tornava evidente. O recorte do diálogo a seguir,</p><p>retrata esse fato. Nele, Cileda menciona fatos da década de 90.</p><p>"Tem um aluno do Dario Fiorentini, que</p><p>atualmente está fazendo o doutorado,</p><p>ele está fazendo um estado da arte da Educação Estatística no Brasil. Pelo</p><p>que ele levantou, a primeira dissertação de mestrado foi a minha, foi em 94".</p><p>“Eu resolvi fazer o doutorado, fui para França porque no Brasil na época</p><p>não tinha quem ancorasse esse trabalho e eu posso dizer que praticamente</p><p>eu e a Celi começamos a Educação Estatística, junto com Lisbeth Cordani.</p><p>Em grupos diferentes que depois a gente acabou se encontrando, como por</p><p>exemplo, Celi vai para um congresso, para conversar com o Michel Henry com</p><p>quem ela falaria de Educação Estatística e ele a mandou vir falar comigo no</p><p>Brasil.</p><p>Nessa mesma época, a comunidade científica reunida na conferência internacional</p><p>"Experiências e expectativas do Ensino de Estatística - Desafios para o século XXI,</p><p>percebeu que era preciso criar um grupo de estudos voltado para a temática do ensino</p><p>de Estatística.</p><p>O evento foi realizado de 20 a 23 de setembro de 1999, em Florianópolis, na</p><p>Universidade Federal de Santa Catarina, através de uma parceria entre a UFSC</p><p>(através do Departamento de Informática e Estatística), o PRESTA (Programa de</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 11 115</p><p>Pesquisa e Ensino em Estatística Aplicada) e o IASE (Associação Internacional para</p><p>Educação em Estatística). A comissão organizadora foi composta por membros de 5</p><p>países (Brasil, Austrália, Espanha, Itália e Bélgica).</p><p>A conferência surgiu em decorrência da Estatística passar a ser utilizada em</p><p>diversas áreas, não sendo tratada somente como uma disciplina independente, mas</p><p>como ferramenta fundamental na tomada de decisões e na interpretação de diversos</p><p>fenômenos. Este fato ocasionou uma procura maior pela formação em Estatística, que</p><p>se tornou presente nos currículos de quase todos os cursos de graduação da maioria</p><p>das universidades brasileiras, sendo necessário atualizar a partir de então tanto o</p><p>sistema público quanto o privado em suas diretrizes curriculares.</p><p>Em consequência destes fatos, foram desenvolvidas diversas experiências</p><p>relacionadas ao ensino de Estatística, fazendo desta um novo campo de estudo e</p><p>investigação voltado para a didática da Estatística.</p><p>A partir de então, a conferência foi moldada com base em dois objetivos</p><p>principais. O primeiro deles visando a estabelecer um espaço de discussão de</p><p>diferentes experiências relacionadas ao ensino de Estatística, estimulando a troca de</p><p>conhecimentos e uma reflexão crítica por parte dos docentes e pesquisadores sobre</p><p>o futuro deste novo campo de pesquisa no próximo século que viria. Outro aspecto</p><p>norteador, visava a criar um ponto de encontro entre os pesquisadores da Estatística,</p><p>da Educação Matemática e do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais</p><p>Anísio Teixeira, responsáveis por grupos de pesquisa relacionados a temática, visando</p><p>uma propagação dos temas atuais de pesquisa neste novo campo, entre outros temas.</p><p>Essa característica da Educação Estatística no Brasil é identificada a seguir:</p><p>“Tem um grupo no Brasil que discute Educação Estatística e que nasceu</p><p>dentro da Educação Matemática. Então, ele empresta metodologias e teorias</p><p>da Educação Matemática e no Brasil ele "bebe" das duas fontes. Faz uso dos</p><p>resultados que o IASE traz para nós, pois você tem estatísticos e psicólogos,</p><p>teorizando e da Educação Matemática, que você tem didatas teorizando</p><p>oriundos geralmente da matemática ou da pedagogia”.</p><p>“Se eu vou trabalhar com ensino e aprendizagem da Estatística no ensino</p><p>superior, então a minha conversa maior é com o IASE. Mas se eu vou</p><p>trabalhar na escola básica, quem dá aula na escola básica? É o professor</p><p>de matemática. Se eu vou trabalhar com ele na licenciatura, na formação</p><p>inicial, não é o estatístico que vai dar aula na licenciatura de matemática é um</p><p>licenciado em matemática ou um bacharel em matemática."</p><p>“Para nós da Educação Estatística, acaba sendo até mais desafiador por que</p><p>você tem que fazer casar essas duas áreas."</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 11 116</p><p>Assim como aconteceu com a Educação Matemática, a Educação Estatística</p><p>tem se constituído como um campo científico e de atividade profissional, assim como</p><p>abordam Meneghetti (2012), Costa (2007) e a colaboradora ao afirmar que</p><p>“Celi foi banca do meu primeiro orientando depois que eu tive doutorado.</p><p>Então, o grupo sempre se articula muito, e aí temos percebido nas conversas,</p><p>que os resultados de pesquisa convergem”.</p><p>Sobre o que eu havia observado anteriormente, durante a licenciatura, a professora</p><p>Cileda deixa claro em sua fala que observou praticamente os mesmos itens em suas</p><p>pesquisas, analisando diversos posicionamentos de professores da Educação Básica</p><p>em relação à Estatística. A seguir, destacamos um trecho do diálogo que apresenta a</p><p>questão da “matematização” da Estatística e outras concepções da colaboradora.</p><p>"Numa pesquisa que eu mesma fiz, um questionário que eu passei e orientandos</p><p>meus fizeram, constatamos que o professor não se sente à vontade com o</p><p>tema. Quando ele teve, foi com o olhar matemático. Na graduação, tem uma</p><p>cadeira de probabilidade e Estatística. Esse tema não consta especificamente</p><p>nas diretrizes curriculares da licenciatura, nem na de matemática nem nas</p><p>outras. O que que as instituições fazem? Pegam a carga horária, trazem para</p><p>uma disciplina de 32 ou 64 créditos. E é raro você ver mais que isso, e aí você</p><p>desenvolve como mesmo o pensar do professor? Desse futuro professor?"</p><p>“Por que que eu vou dar foco para Estatística se eu não dou igual para</p><p>geometria ou para a álgebra? Se a Estatística é matemática não tem por que</p><p>fazer essa diferença da aula, mas a gente sabe que tem, que precisa, que é</p><p>importante, pois você não pensa estatisticamente do mesmo jeito que você</p><p>pensa outras coisas".</p><p>"Por que eu vou abrir um espaço especial para Estatística e não abro para</p><p>álgebra? Porque Estatística é ciência."</p><p>“Para eu pensar num problema de geometria que vai articular com álgebra</p><p>com grandezas e medidas, porque a matemática é toda articulada, tem alguma</p><p>coisa a ver o pensamento estatístico que eu coloco aí?"</p><p>"E aí entra o aspecto do que eu chamo de letramento. Você chamou de</p><p>Alfabetização e eu chamo de letramento. Pelo menos nas primeiras leituras</p><p>que eu fiz sobre isso, me levaram a tradução do Literacy. Eu comparei na</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 11 117</p><p>mesma época com a produção do INAF e para eles você tem a alfabetização</p><p>desde a mais simples (cinco níveis) até chegar no sujeito alfabetizado. Que</p><p>é o que? Não é só ler e escrever. Ele tem que compreender o contexto, ele</p><p>tem que fazer inferência e isso, na tradução do Literacy, da Magda Soares,</p><p>é letramento. Alfabetização é o ler e escrever. É saber assinar o seu nome.</p><p>O letramento então, você sabe usar. Você escreveu o teu nome na língua,</p><p>mas você sabe usar aquilo também para se comunicar. E os textos do Iddo</p><p>Gal são fantásticos sobre letramento estatístico. Ele vai dizer que tem níveis,</p><p>que eu posso ser letrado estatisticamente para simplesmente conseguir ler,</p><p>entender o que é um jornal e eu posso ser letrado para saber também me</p><p>comunicar minimamente ou para utilizar as propriedades, saber trabalhar com</p><p>aquilo. O Gal propõe três níveis letramento com base no Shamos. O Shamos</p><p>fala de letramento científico e não de letramento estatístico ou matemático,</p><p>ou que seja, e o Gal vem e faz a adaptação disso. Por isso que eu diferencio</p><p>alfabetização de letramento. Para mim é uma forma de distinguir esse nível</p><p>mais rústico "assinar o próprio nome" e conseguir efetivamente ir além."</p><p>"No Brasil existem dois grupos. Um que fala que tem níveis e o outro que</p><p>fala que não. Você tem é elementos de letramento, que podem ou não estar</p><p>presentes. E eu posso falar letramento, Literacia ou alfabetização, desde que</p><p>eu assuma o que eu entendo por aquilo. A Celi Lopes gosta do Literacia e eu</p><p>gosto do letramento, pois o termo letramento me diz mais, mas aí eu peço</p><p>para os meus alunos e eu mesmo quando escrevo, identifico</p><p>no começo o que</p><p>entendo por letramento. Para que as pessoas que utilizam outras "etiquetas",</p><p>por que isso nada mais é do que uma "etiqueta", se você usar outra etiqueta,</p><p>você tem que ter um parâmetro para comparar”.</p><p>5 | CONSIDERAÇÕES FINAIS</p><p>O ensino de Estatística no Brasil surgiu inicialmente no ensino superior e veio</p><p>para a Educação Básica visando a necessidade de possibilitar que todo cidadão</p><p>tenha capacidade de utilizar a Estatística em seu cotidiano. As transformações foram</p><p>acontecendo pouco a pouco e, pela sua proximidade com a Matemática, começou a</p><p>ser ensinada dentro dela - por se tratar de dados quantitativos - por professores, em</p><p>sua maioria, licenciados em Matemática.</p><p>Realizar cada entrevista, de modo particular o diálogo com a professora Cileda,</p><p>possibilitou a constatação de que a Educação Estatística, ao longo desses anos, tem</p><p>avançado com o objetivo de possibilitar que todo cidadão, tanto os adultos quanto as</p><p>crianças, possam exercer um papel crítico, reflexivo e participativo, seja na tomada de</p><p>decisões individuais ou coletivas por meio do pensamento estatístico envolvidos em</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 11 118</p><p>diversas situações do cotidiano.</p><p>Os integrantes do GT12 têm se esforçado no sentido de promover encontros</p><p>e incentivar o desenvolvimento de trabalhos colaborativos na escrita de números</p><p>temáticos de Educação Estatística em periódicos e na proposta de cursos e oficinas</p><p>para profissionais da Educação Básica, fazendo com que tais pesquisas interfiram na</p><p>sala de aula. Em relação às perspectivas dessa área, a professora Cileda mencionou</p><p>que</p><p>"A gente tem um caminho grande. Eu estou bem contente, porque eu acho</p><p>que na educação Estatística tem muita gente nova entrando, tem muito fôlego</p><p>novo entrando. Então acho que isso também vai oxigenar."</p><p>"Eu acho que tem que ter mais livros para a licenciatura que discutam conteúdo,</p><p>mas que discutam a Educação Estatística. A gente tem que começar a olhar</p><p>mais. Já tem sido discutido, mas tem que chegar nessa discussão com o</p><p>professor. Em suma, conhecimento específico e conhecimento didático de</p><p>conteúdo para ajudar o professor que dá aula de Estatística na licenciatura.</p><p>Temos que investir em materiais didáticos e paradidáticos que ajudem esse</p><p>professor que não tem no livro didático comprado pelo governo os elementos</p><p>que ele precisa, mas ele pode ter um livro que vai ajudá-lo a fazer Estatística,</p><p>probabilidade, definir um projeto ou um jogo. Isso que é uma coisa que a gente</p><p>tem que pensar com carinho."</p><p>REFERÊNCIAS</p><p>ARAÚJO, E. L. CONCEPÇÕES DE EDUCAÇÃO ESTATÍSTICA: NARRATIVAS DE PROFESSORES</p><p>MEMBROS DO GT-12 DA SBEM. Curitiba, Paraná, 2017. Dissertação (mestrado) - Programa de Pós-</p><p>Graduação em Ensino de Ciências e Educação Matemática da Universidade Federal do Paraná.</p><p>CAZORLA, I.M.; KATAOKA, V.Y; & Silva, C.B. da (2010). Trajetória e Perspectivas da Educação</p><p>Estatística no Brasil: um olhar a partir do GT-12. In: C. E. Lopes, C.Q.S. Coutinho e S. A.</p><p>Almouloud (orgs). Estudos e Reflexões em Educação Estatística. São Paulo: Mercado das Letras.</p><p>CAZORLA, I.M.; KATAOKA, V.Y; & Silva, C.B. da. Trajetória e Perspectivas da Educação</p><p>Estatística no Brasil, 2010 - 2014: um olhar a partir do GT-12. Revista Educação Matemática e</p><p>Pesquisa. Número Especial do III Fórum de Discussão: Parâmetros Balizadores da Pesquisa em</p><p>Educação Matemática no Brasil. v. 17, n. 3 (2015). São Paulo.</p><p>COSTA, A. A educação Estatística na formação do professor de matemática. Itatiba, São</p><p>Paulo, 2007. Dissertação (mestrado) = Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Educação da</p><p>Universidade São Francisco.</p><p>GARNICA, A. V. M. História Oral e Educação Matemática: do inventário à regulação. ZETETIKÉ.</p><p>Campinas: FE/CEMPEM. v.11, n.19, p. 9-55. 2003.</p><p>MEIHY, J. C. S. B., RIBEIRO, S. L. S. Guia Prático de História Oral Para Empresas,</p><p>Universidades, Comunidades, Famílias. São Paulo: Contexto, 2011.</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 11 119</p><p>MENEGHETTI, R., BATISTELA, R., BICUDO, M. A Pesquisa sobre o Ensino de Probabilidade e</p><p>Estatística no Brasil: um exercício de metacompreensão. Bolema:</p><p>Mathematics Education Bulletin = Bolema: Boletim de Educação Matemática, Brasil, 24, jan. 2012.</p><p>Disponível em:</p><p>. Acesso em:</p><p>02 fev. 2015.</p><p>SANTOS, R. M. Ensino de Probabilidade e Estatística: o Mapeamento da Pesquisa no Brasil.</p><p>XVII EBRAPEM: Impactos Sociais das Pesquisas em Educação Matemática. IFES/UFES. Vitória �</p><p>ES. 2013.</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 12 120</p><p>EDUCAÇÃO MATEMÁTICA E APRENDER A</p><p>APRENDER</p><p>CAPÍTULO 12</p><p>Robson André Barata de Medeiros</p><p>Universidade Federal do Pará</p><p>Faculdade de Desenvolvimento e Educação do</p><p>Campo</p><p>Abaetetuba-Pará</p><p>Janeisi de Lima Meira</p><p>Universidade Federal do Tocantins</p><p>Curso de Licenciatura em Matemática</p><p>Arraias-Tocantins</p><p>RESUMO: O presente artigo discute a</p><p>respeito da relação da Educação Matemática</p><p>contemporânea e de suas tendências que estão</p><p>associadas a vertentes escolanovistas no âmbito</p><p>da educação, que assume o construtivismo</p><p>como a principal vertente, além do ecletismo sob</p><p>o lema “aprender a aprender”, que apresenta</p><p>fortes ligações com a ideologia pós-modernistas</p><p>em suas concepções. A Educação Matemática</p><p>também embarcou neste modismo reacionário,</p><p>liberal disfarçado de progressista, seduzindo</p><p>até militantes de esquerda para esta vertente de</p><p>cunho neoliberal burguês, cujo objetivo é negar</p><p>o conhecimento clássico e mais desenvolvido à</p><p>classe trabalhadora, mantendo-a “no seu lugar”</p><p>e com suas mazelas, propagando discursos</p><p>que valorizam a sua cotidianidade alienada e</p><p>seus conhecimentos imediatistas que assegura</p><p>único e simplesmente a sua sobrevivência,</p><p>de modo que não proporciona a humanização</p><p>e a possível transformação desta sociedade</p><p>para uma sociedade mais desenvolvida e sem</p><p>classes.</p><p>PALAVRAS-CHAVE: Educação Matemática;</p><p>Construtivismo, Escolanovismo; Liberalismo;</p><p>Marxismo.</p><p>ABSTRACT: This article discusses the relation</p><p>of contemporary Mathematics Education</p><p>and its tendencies that are associated with</p><p>Escolanovistas slopes in the field of education,</p><p>that assumes constructivism as the main strand,</p><p>besides the eclecticism under the motto “learn</p><p>to learn”, that presents strong connections with</p><p>postmodernist ideology in their conceptions.</p><p>Mathematics Education also took on this</p><p>reactionary, liberal discourse disguised as</p><p>progressive, seducing even left-wing activists to</p><p>this bourgeois neoliberal streak, whose aim is to</p><p>deny classical and more developed knowledge</p><p>to the working class, keeping it “in its place” and</p><p>with their ills, propagating discourses that value</p><p>their alienated everyday life and their immediate</p><p>knowledge that ensures only their survival, so</p><p>that it does not provide the humanization and</p><p>the possible transformation of this society to a</p><p>more developed and classless society.</p><p>KEYWORDS: Mathematical Education;</p><p>Constructivism, Escolanovismo; Liberalism;</p><p>Marxism.</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 12 121</p><p>1 | INTRODUÇÃO</p><p>Este artigo objetiva discutir algumas influências do pós-modernismo na Educação</p><p>Matemática, sabendo que é uma vertente burguesa de influência liberal que apresenta</p><p>suas manifestações na educação contemporânea de diversas formas, mas com os</p><p>mesmos fins, qual seja: negar o conhecimento acumulado pela humanidade em sua</p><p>forma mais desenvolvida à classe trabalhadora buscando mantê-la nas mesmas</p><p>condições de alienação.</p><p>A Educação Matemática, também embarcou nas seduções pós-modernistas, por</p><p>intermédio de intelectuais a serviço da burguesia em favor da manutenção da atual</p><p>ordem econômica e social, ainda que ingenuamente. Isso tem se manifestado por</p><p>meio das suas várias tendências.</p><p>2 | METODOLOGIA</p><p>Nesta pesquisa, de cunho qualitativo, assumimos o método dialético como</p><p>instrumento de análise, cuja intenção foi analisar a realidade hegemônica da produção</p><p>em Educação Matemática. Para tanto, fizemos um estudo</p><p>a respeito da influência e</p><p>presença da ideologia pós-modernista, sob sua vertente assentada no construtivismo e</p><p>da pedagogia do aprender a aprender que atende aos preceitos neoliberal-burguês que</p><p>estão presentes na Educação Matemática. Assim, tomamos como material de análise</p><p>as interpretações do Manifesto dos Pioneiros da Educação, documento produzido no</p><p>início da década de 30, do século passado, cuja inspiração se deu no pragmatismo de</p><p>John Dewey. E também analisamos algumas publicações da Educação Matemática</p><p>presente em algumas das suas tendências.</p><p>Em oposição ao ideário hegemônico dessas tendências propomos uma</p><p>Educação Matemática pautada em uma pedagogia marxista, isto é, na Pedagogia</p><p>Histórico-Crítica (PHC), que advoga pela socialização, por meio da transmissão, os</p><p>conhecimentos clássicos (entendido como aqueles conhecimentos que de melhor</p><p>a humanidade já produziu e continuam sendo os mais desenvolvidos, mesmo após</p><p>anos de sua construção) para todos os integrantes da classe trabalhadora, tendo</p><p>o professor como a figura principal na transmissão desse conhecimento dentro do</p><p>ambiente escolar. Conhecimentos estes que promovem a humanização do homem e</p><p>sua autonomia e liberdade de pensamento que está para além de sua cotidianidade,</p><p>ou seja, desenvolvendo o homem e tornando-o consciente de sua condição e de que</p><p>é possível a transformação social.</p><p>3 | PÓS-MODERNISMO, ESCOLANIVISMO, PIONEIROS</p><p>As ideais pós-modernistas penetraram na educação brasileira por meio da</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 12 122</p><p>pedagogia do “Aprender a Aprender” (DUARTE, 2006), que tem fortes alicerces no</p><p>escolanovismo e no pragmatismo de John Dewey (1859 – 1952). No Brasil, oficialmente,</p><p>esta pedagogia se consolidou por meio do “Manifesto dos Pioneiros da educação</p><p>nova” em 1932, tendo como alguns de seus signatários: Anísio Teixeira e Lourenço</p><p>Filho. Algumas características essências do pós-modernismo, segundo Chauí (apud</p><p>ARCE, 2001, 256), são:</p><p>- A negação de que haja uma esfera da objetividade. Essa é considerada um mito</p><p>da razão, e em seu lugar surge a figura da subjetividade narcisista desejante;</p><p>- negação de que a razão possa captar núcleos de universalidade no real. A</p><p>realidade é constituída por diferenças e alteridades, e a universalidade é um mito</p><p>totalitário da razão;</p><p>- negação de que o poder se realize a distância do social, através de instituições</p><p>que lhe são próprias e fundadas tanto na lógica da dominação quanto na busca da</p><p>liberdade. Em seu lugar existem micropoderes invisíveis e capilares que disciplinam</p><p>o social (ARCE, 2001, p. 256).</p><p>O manifesto tinha como uma de suas principais concepções de educação</p><p>o pragmatismo da vida cotidiana como modelo e a orientação às disciplinas, eram</p><p>inspiradas por um ideal de modernização da educação nacional amparada em princípios</p><p>científicos contrários aos princípios literários recorrentes à época. No entanto, todo</p><p>esse ideal expressava, na verdade, os princípios liberais em ascensão daquela época.</p><p>Abordaremos o “Manifesto dos Pioneiros”, que é o principal documento de</p><p>introdução do escolanovismo na educação brasileira, mostrando que corrobora</p><p>com os modelos que se expressam à imagem da vida, uma vez que já lhe refletia a</p><p>complexidade (AZEVEDO et al, 2010).</p><p>Este aspecto está fortemente presente na educação atual e não deixa a Educação</p><p>Matemática de fora, a mesma ainda sofre a influências desta concepção pautada na</p><p>imagem da vida, sob a alegação que daria sentido ao conteúdo escolar. Essa foi uma</p><p>das defesas dos pioneiros além da desvalorização dos conteúdos. A bandeira de</p><p>luta destes primeiros escolanovista era a de hostilidade ao ensino que denominaram</p><p>“tradicional”, então “vêm se mantendo desde o início das hostilidades contra a escola</p><p>tradicional” (idem, p. 36).</p><p>Um dos principais argumentos dos pioneiros ao ensino era de que “(...) a educação</p><p>nova não pode deixar de ser uma reação categórica, intencional e sistemática contra</p><p>a velha estrutura do serviço educacional, artificial e verbalista, montada para uma</p><p>concepção vencida (idem, p. 40). Para os pioneiros, o ensino tradicional era algo</p><p>totalmente sem sentido para quem estaria sendo ensinado, o que daria sentido à</p><p>educação, portanto, daquilo que se ensinava seria a vida cotidiana de cada um. Quanto</p><p>aos interesses, agora não seriam mais da classe dominante. A educação estaria para</p><p>além destes interesses, todos teriam mesmas oportunidades. Como afirma o manifesto:</p><p>“A educação nova, alargando sua finalidade para além dos limites das classes (...) se</p><p>abrem as mesmas oportunidades de educação (idem, p. 40).</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 12 123</p><p>Contraditoriamente se propõe uma escola única com mesmas oportunidades,</p><p>no entanto, a sociedade é capitalista, logo, não é possível socializar a todos o que é</p><p>produzido.</p><p>Sendo o conhecimento um dos produtos do capitalismo, obviamente que não</p><p>se terá interesse em socializa-lo com todas as classes. Dada a pseudo criticidade</p><p>atribuída ao movimento escolanovista, que se estendeu até a atualidade, existem</p><p>também aqueles intelectuais que defendem que o conhecimento sistematizado não</p><p>deva mais ser ensinado nas escolas, pois alienaria a classe trabalhadora por ser “de</p><p>origem burguesa”.</p><p>É fato que estes conhecimentos estão nas “mãos” da burguesia, contudo, pertence</p><p>à humanidade e devem ser socializados a todas as classes, mas no capitalismo isso</p><p>se torna impossível. O conhecimento mais elaborado é fundamental para humanizar</p><p>o homem, somos humanizados por meio da apropriação das objetivações construídas</p><p>pela humanidade e, por conseguinte nos tornarmos conscientes para podermos</p><p>compreender a realidade concreta por meio da análise assentada em teorias abstratas,</p><p>de modo que alcancemos uma síntese.</p><p>Não somos como os animais, que a própria biologicidade os determinam,</p><p>não necessitando se apropriar de objetivações. As objetivações promoverão o</p><p>desenvolvimento do homem, desenvolvendo suas funções psicológicas superiores,</p><p>funções estas que permitem que o ser humano possa ir para além do imediatismo.</p><p>Para os pioneiros a educação auxiliaria no nosso desenvolvimento natural a partir das</p><p>etapas condicionadas biologicamente, assim já estaríamos determinados só esperando</p><p>que fôssemos desenvolvidos naturalmente, isto é, “ela tem, por objeto, organizar e</p><p>desenvolver os meios de ação durável”, com o fim de “dirigir o desenvolvimento natural</p><p>e integral do ser humano em cada uma das etapas de seu crescimento” (idem, p. 40).</p><p>Para a Pedagogia Histórico-Critica, de base marxista, o desenvolvimento do</p><p>aluno não é natural, mas auxiliado pelos conteúdos escolares, isto é, os conteúdos</p><p>“clássicos”, pois, “a partir dos conteúdos clássicos, produz as máximas possibilidades</p><p>de desenvolvimento das funções psicológicas culturalmente desenvolvidas nos</p><p>indivíduos” (SANTOS et al, 2015, p. 73).</p><p>As classes trabalhadoras para esta pedagogia deve se apropriar dos clássicos</p><p>para que também possam desenvolver-se plenamente. Mas, “A educação nova que,</p><p>certamente pragmática, se propõe ao fim de servir não aos interesses de classes, mas</p><p>aos interesses do indivíduo” (AZEVEDO, 2010, p. 40-41), não tem essa preocupação.</p><p>A escola nova não tem a preocupação de classes, pois alegava que o ensino</p><p>tradicional, “conteudista”, seria um ensino burguês, contudo promove uma educação</p><p>nos interesses individuais. Perguntamos: Teria algo mais liberal que isso? Na qual cada</p><p>um por meio de seus esforços seria o responsável pelos seus fracassos e conquistas.</p><p>Na verdade a nova educação era velha, pois era voltada aos interesses da burguesia</p><p>ao se pautar no liberalismo.</p><p>Arce (2001) no esclarece apontando que:</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 12 124</p><p>O neoliberalismo (...) teoria esta que não limitou-se à economia e cujo argumento</p><p>central residia na incapacidade do ser humano de conhecer tudo e todos, bem como</p><p>na valorização da particularização no ato de conhecer (...) o conhecimento seria</p><p>um atributo individual (...)</p><p>ao analisar sucessos particulares de empreendedores</p><p>isolados, pois o individualismo provindo de seu conceito de como o conhecimento</p><p>é adquirido pelo homem é a sua bandeira (ARCE, 2001, p. 252).</p><p>É obvio que estas são ideais do neoliberalismo, que não seriam diferentes do</p><p>liberalismo. Além da defesa das questões individuais – não que sejamos contra, pelo</p><p>contrário, somos totalmente a favor de que a individualidade de cada um se desenvolva</p><p>nas suas máximas capacidades intelectuais, mesmo sabendo da impossibilidade</p><p>nesta sociedade – todavia, também percebemos que o liberalismo nega a capacidade</p><p>do indivíduo abarcar a totalidade, o que impossibilitaria a compreensão da realidade</p><p>concreta e sua possível transformação.</p><p>A educação seria voltada para a simples adaptação e não para o desenvolvimento</p><p>e humanização do homem e a sua transformação social, “dentro desse preceito, a</p><p>educação é eleita como chave mágica para a erradicação da pobreza, pois, investindo-</p><p>se no indivíduo, dando lhe a instrução, ele poderá ser capaz de buscar seu lugar ao</p><p>sol” (ARCE, 2001, p. 254).</p><p>Em virtude disso, a educação na atualidade está pautada nestes preceitos de</p><p>adaptação à sociedade e defesa dos interesses individuais e de certos grupos. Parte</p><p>desses grupos advoga o relativismo epistemológico, com alguns mais extremistas</p><p>negando a realidade concreta e a objetividade, dando supervalorização ao cotidiano e</p><p>ao subjetivismo. Com isso acreditam que o conhecimento escolar não teria significado,</p><p>por ser abstrato, desconexo da realidade dos alunos, assim o que daria significado</p><p>seria a subjetividade do aluno, a partir de suas experiências empíricas ou ainda se tais</p><p>conhecimentos fossem úteis no seu cotidiano.</p><p>Essa ideologia defende que o aluno construiria seus próprios conhecimentos</p><p>com o auxílio de um animador, o professor. O conteúdo para determinadas vertentes</p><p>seria algo opressor por ser de origem europeia, enciclopédico e portanto: colonizador,</p><p>alienante, branco, machista, burguês, racista, homofóbico, misógino, inclusive a razão</p><p>e a ciência seriam os grandes vilões da humanidade.</p><p>4 | A EDUCAÇÃO MATEMÁTICA É “APRENDER A APRENDER”</p><p>A Educação Matemática não está livre destes preceitos, quase todas suas</p><p>tendências pedagógicas são absolutamente escolanovistas (aprender a aprender) e</p><p>logo construtivistas, neoliberais e pós-modernas. Porém precisaríamos de mais espaço</p><p>para identificar estes preceitos em cada uma das tendências da Educação Matemática,</p><p>como: a Etnomatemática, Didática da Matemática, Modelagem Matemática, Historia</p><p>da Matemática, entre outras.</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 12 125</p><p>O conteúdo matemático para estas tendências seriam necessários para</p><p>desenvolver habilidades e competências, para serem úteis no cotidiano (vida), os</p><p>seus significados estariam nas práticas cotidianas, o relativismo epistemológico está</p><p>presente em todas estas tendências e a matemática escolar não seria a melhor, pois</p><p>deve-se respeitar as práticas matemáticas de cada grupo.</p><p>A identificação da educação matemática como uma área prioritária na educação</p><p>ocorre na transição do século XIX para o século XX. Os passos que abrem essa</p><p>nova área de pesquisa são devidos a John Dewey (1859-1952), ao propor em 1895,</p><p>em seu livro Psicologia do número, uma reação contra o formalismo e uma relação</p><p>não tensa, mas cooperativa, entre aluno e professor, e uma integração entre todas</p><p>as disciplinas (MIGUEL; GARNICA; UBIRATAN, 2004, p. 71).</p><p>Na citação percebemos os primeiros passos que orientaram a Educação</p><p>Matemática, isto é, a forte influência do escolanovismo. Outros aspectos desta vertente</p><p>foi reforçada com Felix Klein, conforme aponta os autores.</p><p>Mas o passo mais importante no estabelecimento da educação matemática como</p><p>uma disciplina é devido à contribuição do eminente matemático alemão Felix Klein</p><p>(1849-1925), que publicou, em 1908, um livro seminal, Matemática elementar de</p><p>um ponto de vista avançado. Klein defende uma apresentação nas escolas que se</p><p>a tenha mais a bases psicológicas que sistemáticas. Diz que o professor deve, por</p><p>assim dizer, ser um diplomata, levando em conta o processo psíquico do aluno,</p><p>para poder agarrar seu interesse O pós-guerra representou uma efervescência</p><p>da educação matemática em todo o mundo. Propostas de renovação curricular</p><p>ganharam visibilidade em vários países da Europa e dos Estados Unidos. Floresce</p><p>o desenvolvimento curricular. Psicólogos como Jean Piaget, Robert M. Gagné,</p><p>Jerome Bruner, e B. F. Skinner dão a base teórica de aprendizagem de suporte</p><p>para as propostas (MIGUEL; GARNICA; UBIRATAN, 2004, p. 71-72).</p><p>Estes aspectos coloca o aluno como centro no processo educativo, o professor</p><p>apenas um “diplomata” alguém que acompanha e media a aprendizagem, de modo</p><p>que o fator psicológico se sobrepõe ao sistemático, tendo como principal influência o</p><p>psicólogo suíço construtivista Jean Piaget.</p><p>Outro aspecto que percebemos na Educação Matemática foi o relativismo cultural</p><p>e epistêmico representado por meio do multiculturalismo, não que outras variações</p><p>cultural não esteja presente, mas esta é uma das vertentes pós-modernistas, que tem</p><p>por objetivo desviar o principal foco e problema do capitalismo: que é a luta de classes.</p><p>Com isso, faz surgir outras multiplicidades de questões, como: étnicas, de gênero,</p><p>religiosas e sexuais, etc. Neste sentido, numa perspectiva etno:</p><p>Cada etnia constrói a sua Etnociência no seu processo de leitura do mundo. É a</p><p>construção do conhecimento para a explicação do fenômeno, e, logicamente, cada</p><p>uma dessas leituras é feita de forma bem diferente. Atualmente, o termo Etnociência</p><p>propõe a redescoberta da ciência de outras etnias, que não a nossa cuja ciência</p><p>advém da cultura ocidental. Etno, então, refere-se ao sistema de conhecimentos e</p><p>cognições típicas de uma dada cultura (ESQUINCALHA, 2016, p. 01).</p><p>Para essa vertente pós-modernista a ciência não existe, mas o que existem são</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 12 126</p><p>ciências, no plural, o que nos conduz ao relativismo cultura e epistêmico, onde tudo</p><p>seria mero ponto de vista e não algo mais certo ou mais desenvolvido sistematicamente</p><p>do que o outro. Quanto à matemática:</p><p>É um componente cultural muito importante, solicitado no desenvolvimento da</p><p>inteligência humana. Por outro lado, se pretendemos, por esta componente, conduzir</p><p>uma criança a abstrair conceitos, isto terá que ser feito numa pedagogia adequada</p><p>para essa finalidade. Creio que a mais adequada é partindo do saber-fazer do</p><p>estudante, chegar com ele na construção do conceito abstrato (ESQUINCALHA,</p><p>2016, p. 14).</p><p>A ciência serve para desenvolver a inteligência, essa que se manifesta</p><p>naturalmente e gradativamente pelo organismo segundo Piaget, deste modo, o</p><p>aluno irá construir conceitos abstratos a partir do que já sabe fazer, ou seja, de sua</p><p>cotidianidade. Isso com a intenção de mostrar que todos já sabem ciência e “valorizar”</p><p>os conhecimentos de cada grupo, pois a ciência escolar seria quase que uma espécie</p><p>de colonizador e opressor.</p><p>Estudando a História das Ciências podemos observar uma total desvalorização</p><p>das culturas e produções não ocidentais, onde a equivalência entre as sentenças:</p><p>ciência e ocidente é a única verdade aceitável. Desta maneira, toda e qualquer</p><p>produção não eurocentrista, ou influenciada por esta, pode no máximo, estar num</p><p>processo de evolução para o status de Ciência. Infelizmente, por muitos séculos esta</p><p>foi a idéia que reinou no meio científico, desconsiderando as produções orientais,</p><p>e dos grupos nativos das terras colonizadas, produções estas que são datadas</p><p>de antes mesmo do estabelecimento do Império Centro-Europeu (ESQUINCALHA,</p><p>2016, p. 02).</p><p>Este mesmo discurso se percebe no programa etnomatemática, de que as</p><p>matemáticas existentes estariam no mesmo patamar de desenvolvimento que a</p><p>matemática difundida e também criada pelos “europeus”, que seria nada mais que um</p><p>ponto de vista diferente de certa cultura européia e não a forma mais desenvolvida</p><p>deste conhecimento, o que soa para os etnos como uma blasfêmia.</p><p>D’Ambrósio (1985) fala da posição eurocêntrica tomada pelos Historiadores da</p><p>Matemática, que ao se depararem com formas de matematizar diferentes da</p><p>ocidental, classificam-nas como um estágio primitivo na evolução das idéias da</p><p>Matemática (ESQUINCALHA, 2016, p. 09).</p><p>A Etnomatemática se mostra como a presença do multiculturalismo na Educação</p><p>Matemática. Esta vertente pós-moderna contribui também para a luta de vários</p><p>grupos entre si. Assim, desarticula a classe trabalhadora e valoriza o conhecimento</p><p>do cotidiano alienado dos trabalhadores, contribuindo para sua permanência em</p><p>estado de precariedade material e intelectual. Segundo Marx (2009), nenhum grupo</p><p>irá se emancipar sozinho ou emancipará a humanidade, os grupos somente serão</p><p>emancipados quando a humanidade se emancipar e isso deve acontecer unicamente</p><p>por meio da revolução decorrente da união da classe trabalhadora.</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 12 127</p><p>Vejamos no caso da História da Matemática o que viria prevalecer de forma geral</p><p>nessa tendência, não precisaremos apontar a presença da ideologia pós-modernista</p><p>em todos os textos desta tendência, pois há uma essência predominante que pode ser</p><p>observada na passagem abaixo.</p><p>No modelo didático de investigação histórica utilizado na formação dos professores,</p><p>as atividades foram norteadas por um diálogo conjuntivo entre as idéias matemáticas</p><p>desenvolvidas e organizadas historicamente e a perspectiva investigatória que</p><p>caracteriza a construção do conhecimento. É nessa aliança integrativa que as</p><p>atividades investigatórias imprimiram maior significado à matemática escolar,</p><p>baseando-se em um processo ativo-reflexivo dado à investigação como um meio</p><p>de construção da Matemática. Nesse sentido, os estudantes devem participar da</p><p>construção do seu próprio conhecimento de forma mais ativa, reflexiva e crítica</p><p>possível, relacionando cada saber construído com as necessidades históricas,</p><p>sociais e culturais existentes nele. Nesse processo efetivo, é necessário que o</p><p>professor assuma a posição de orientador das atividades de modo a viabilizar uma</p><p>interação dialogal em que os estudantes construam seu conhecimento investigando</p><p>os processos matemáticos presentes no desenvolvimento histórico da matemática,</p><p>transpondo-os para a situação construção cotidiana atual do seu conhecimento</p><p>e socializando hipóteses, resultados e conclusões acerca das suas experiências</p><p>(MENDES, 2010, p. 02)</p><p>Com base na citação percebemos como são bem evidentes os objetivos na</p><p>História da Matemática como tendência da Educação Matemática, percebemos que</p><p>a essência é construtivista, com a “valorização” do conhecimento do aluno, do qual</p><p>partirá ou que dará significado à matemática escolar, a partir do seu conhecimento já</p><p>existente o aluno irá construir o novo conhecimento com base em suas experiências</p><p>cotidianas. Também se prioriza a aplicação em experiências práticas.</p><p>O procedimento didático adotado para esse exercício cognitivo deve priorizar</p><p>as experiências práticas e/ou teóricas vivenciadas pelos estudantes e orientadas</p><p>pelo professor, a fim de formular conceitos e/ou propriedades e interpretar essas</p><p>formulações, visando aplicá-las na solução de problemas práticos que assim o</p><p>exijam. É importante prever uma ação didática centrada na experiência direta,</p><p>com situações naturais ou provenientes do conteúdo histórico, pois a redescoberta</p><p>propõe o emprego de princípios aprendidos atuando em novas situações, visto que</p><p>a base cognitiva é centrada no conhecimento já construído pelo aluno e o processo</p><p>de aprendizagem é determinado pelas condições em que se aprende (idem, p. 02)</p><p>O que dá sentido à matemática escolar seria mesmo o cotidiano do estudante,</p><p>a partir dele a matemática escolar passa a ter sentido, além do mais deve ser</p><p>prática utilitária, deve resolver problemas práticos ou para reforçar as etapas de</p><p>desenvolvimento. Tudo isso também teria outro objetivo que seria ter aulas mais</p><p>agradáveis e com mais prazer, esquecendo-se que o caminho de construção da</p><p>ciência não é um caminho fácil, mas árduo, longo e exige esforço não só do professor</p><p>como também do aluno, a ciência, portanto, é algo sério. Contudo, Mendes (2010, p.</p><p>05), afirma que: “É prudente pensar nessas atividades, considerando a possibilidade</p><p>de uso dos aspectos mais criativos dos livros didáticos de matemática visando dar ao</p><p>estudante o prazer de exercitar essa formalização com bastante significado”.</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 12 128</p><p>Fica evidente as características escolanovistas, construtivistas e do aprender</p><p>a aprender (que compõe o universo pós-modernista na educação) e na História</p><p>da Matemática, se aproximando também das outras tendências que defendem o</p><p>desenvolvimento de habilidades e competências pelo aluno. Assim, o conhecimento</p><p>escolar serviria para alcançarmos as competências, não sendo a sua apropriação</p><p>o principal objetivo da escola. Então nos perguntamos: para que ele serve? Na</p><p>verdade a escola, portanto, o conhecimento ensinado ali seria um meio para atingir</p><p>os objetivos de aprender a aprender. Deste modo, “Esse tipo de investigação histórica</p><p>pode contribuir para o desenvolvimento de habilidades para a pesquisa, organização,</p><p>análise e apresentação oral e escrita de trabalhos acadêmicos, além da capacidade</p><p>de aprender a aprender” (MENDES, 2010, p. 08).</p><p>Desse modo, a ênfase no ensino deve ser dada pelo papel heurístico, que</p><p>desempenha e favorece a possibilidade de levantar conjecturas. Ao dar ênfase na</p><p>heurística, isto é, no método em que o aluno, por esforço próprio, aprende determinado</p><p>conteúdo, descaracteriza a figura do professor como agente de transformação,</p><p>de transmissão do conhecimento, delegando apenas o papel de organizador do</p><p>processo de ensino e de aprendizagem. Com esse posicionamento, de organizador</p><p>da aprendizagem, o professor permitiria ao aluno construir espontaneamente</p><p>procedimentos e conceitos matemáticos e ainda pressuporia autonomia dos significados</p><p>dado à matemática.</p><p>Na literatura de Educação Matemática encontram-se pesquisadores que advogam</p><p>esse mesmo posicionamento que também está presente nos documentos oficiais, por</p><p>exemplo, em Almouloud (2007).</p><p>Os Parâmetros Curriculares Nacionais (1998) para o ensino fundamental (PCN-</p><p>EF) enfatizam a importância da demonstração em matemática, procurando dar</p><p>orientações para o estudo de teoremas pelos alunos com posterior demonstração</p><p>formal, privilegiando as conjecturas e as relações que as vinculam com o discurso</p><p>teórico, bem como, no que diz respeito aos sistemas de representação plana</p><p>das figuras espaciais e as principais funções do desenho. A demonstração</p><p>em matemática é uma das competências indicadas nos PCN para o ensino</p><p>fundamental e para o ensino médio como parte integrante do currículo da escola</p><p>básica (ALMOULOUD, 2007, p. 02).</p><p>Observa-se na citação do autor, em relação ao que os PCN colocam quanto às</p><p>demonstrações em matemática, que é uma das competências indicadas pelo documento.</p><p>Ainda segundo Almouloud (2007), poucos autores trabalham a demonstração na</p><p>perspectiva sugerida pelos PCN. Um dos poucos exemplos encontra-se em Boero</p><p>(1996), conforme descreve aquele autor:</p><p>Boero (1996), discute o processo mental subjacente à produção de afirmações e</p><p>provas por alunos de 8ª série. Na pesquisa deste autor, o problema consiste em</p><p>verificar que a maioria dos alunos neste nível de escolaridade pode produzir teoremas</p><p>(conjecturas e provas) se eles forem colocados sob condições de implementar um</p><p>processo com as seguintes características: produção da conjectura, o estudante</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 12 129</p><p>progressivamente trabalha sua hipótese por meio de uma atividade argumentativa</p><p>intensa misturada funcionalmente com a justificação da plausibilidade de suas</p><p>escolhas; durante o estágio seguinte da prova, o estudante organiza, por meio</p><p>de relações construídas de maneira coerente,algumas justificativas</p><p>(“argumentos”)</p><p>produzidas durante a construção da afirmação de acordo com uma corrente lógica</p><p>(ALMOULOUD, 2007, p. 02).</p><p>Nessa proposta, o aluno seria “ativo”, pois produz conjecturas, levanta hipóteses,</p><p>desenvolve argumentos, enfim, constrói seu próprio conhecimento. Em contrapartida,</p><p>segundo Saviani (1997), “o ato de dar aula é inseparável da produção desse ato e de</p><p>seu consumo. A aula é, pois, produzida e consumida ao mesmo tempo (produzida pelo</p><p>professor e consumida pelo aluno)” (SAVIANI, 1997, p. 17). Deste modo, para o autor,</p><p>a aula é produção do professor e não do aluno, e este último será ativo e autônomo</p><p>quando se apropriar de tal saber, que passará a dominá-lo, devido tê-lo consumido.</p><p>Quanto à postura ou função do professor, Almouloud (2007) baseado em</p><p>Balacheff (1982), afirma que “o professor desempenha um papel chave tanto como</p><p>um animador acidental ou como um facilitador necessário” (ibidem). Neste sentido,</p><p>o autor é fiel à concepção construtivista, pois o professor é aquele que não ensina,</p><p>devido isso não proporcionar a formação de sujeitos ativos e criativos. O professor,</p><p>nesta concepção, é um mero motivador, facilitador ou ainda, apenas um orientador do</p><p>processo de aprendizagem.</p><p>Com isso defendem uma multiplicidade de vertentes, um ecletismo tão</p><p>característico do pós-modernismo e da sua vertente na educação, que é o aprender a</p><p>aprender com uma de suas facetas, o construtivismo, onde todas as teorias conversam,</p><p>vivem harmoniosamente. Contudo, entendemos que se trata de uma variação do</p><p>mesmo tema, o construtivismo, dessa forma, todas essas facetas são construtivistas.</p><p>Percebe-se que nesse ecletismo não encontramos nenhuma vertente marxista. Neste</p><p>sentido, MIGUEL; GARNICA; UBIRATAN (2004), afirmam que:</p><p>Nesse caso específico, julgo que a variedade de procedimentos metodológicos</p><p>que vêm caracterizando essa produção específica é bastante salutar, estando bem</p><p>distante de caracterizar-se como ausência de coerência interna: essa convivência</p><p>entre várias abordagens parece ser reflexo da pluralidade de perspectivas com as</p><p>quais, na prática, nos deparamos. Penso que essa multiplicidade de enfoques</p><p>metodológicos permite compreender a gama de concepções que atravessam</p><p>tanto o discurso educacional quanto as práticas usadas para aplicá-lo ou pensá-</p><p>lo (também porque é essencial trabalharmos pela concepção de uma educação</p><p>matemática que não desvincule prática e teoria). Exatamente por conta dessa</p><p>necessidade de vinculação, a variedade de enfoques metodológicos é bem vinda:</p><p>ela representa a diversidade dinâmica que a pesquisa não poderia negligenciar</p><p>(...). Há um arsenal de modos “qualitativos” de fazer e fundamentar esse fazer: a</p><p>fenomenologia, as intervenções da didática francesa, a história oral, a psicanálise,</p><p>as linhagens mais próximas à antropologia e à etnografia, os estudos de caso, os</p><p>grupos de controle, as análises interpretativas (a hermenêutica, a semiótica) (p.</p><p>90-91).</p><p>Então, verifica-se na citação acima uma variedade de metodologias, o que é</p><p>mais uma características do escolanovismo e do aprender a aprender, isto é, a grande</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 12 130</p><p>valorização da forma em detrimento do conteúdo, pois a forma pode levar o aluno a</p><p>atingir o que o escolanivismo pretende, ou seja, desenvolver as suas inteligências</p><p>naturalmente, construir seus conhecimentos naturalmente, e assim, desenvolvem</p><p>habilidades e competências para se adaptarem na sociedade que está em “constante</p><p>transformação”, que exige cada vez mais que se aprenda rapidamente o que o mercado</p><p>precisa.</p><p>Para o construtivismo o conteúdo passou a ser um meio para se atingir a</p><p>autonomia e ação do aluno e não o fim. Todavia, isso somente será possível pela</p><p>apropriação por meio da transmissão feita pelo professor que o aluno poderá ser livre</p><p>e autônomo para pensar (SAVIANI, 1997), fora esta hipótese o resto é alienação.</p><p>A Pedagogia Histórico-Crítica (SAVIANI, 1997), de vertente marxista, luta por</p><p>um ensino pautado na valorização do conhecimento mais desenvolvido e que seja</p><p>o centro deste processo. Assim, a sua socialização à classe trabalhadora implica no</p><p>acesso ao que de melhor a humanidade já produziu em termos de conhecimentos,</p><p>reconhecendo que esse conhecimento produzido e acumulado historicamente não</p><p>é de um povo, raça ou gênero, mas de todos e que nos possibilita superar visões</p><p>imediatas de nosso cotidiano alienado e compreender de fato a realidade concreta,</p><p>indo além das realidades construídas por pura experiência de vida, por meio de pura</p><p>opinião (doxa), pois só podemos transformar a realidade se a conhecermos. Contudo,</p><p>se existem várias realidades, ai fica impossível de identificá-las e fazer a transformação.</p><p>Esse ilusionismo que está velado pela existência de várias realidades é o que deseja a</p><p>ordem social vigente, de cunho liberal-burguês, haja vista que para esta vertente o que</p><p>importa é que todos se adaptem as exigências do mercado e aprendam a aprender</p><p>constantemente.</p><p>CONSIDERAÇÕES FINAIS</p><p>“A pedagogia verdadeiramente científica e progressista deve ser capaz de analisar</p><p>a atividade educadora com os métodos do materialismo histórico” (SUCHODOLSKI,</p><p>2010, p. 54).</p><p>Esta pedagogia esta pautada na defesa do conhecimento sistematizado</p><p>e mais desenvolvido pertencente a todos os humanos, isto é, que seja valorizado</p><p>suas dimensões científica, artística, ética, social e filosófica, não desmerecendo o</p><p>cotidiano, o qual não possibilita o desenvolvimento pleno do homem, pois proporciona</p><p>somente atividades ligadas ao imediatismo e de sobrevivência, lógico que sobreviver</p><p>é importante, mas para transformar temos que conhecer a realidade concreta, além de</p><p>desenvolver nossas capacidades psicológicas superiores e criar novas necessidades</p><p>para além da sobrevivência e do cotidiano alienado, o que só é possível por meio</p><p>do conhecimento mais elaborado. Neste sentido, o que se almeja com o ensino da</p><p>Matemática é que “Na escola, os estudantes devem ter a possibilidade de aprender</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 12 131</p><p>Matemática” (CATANANTE et al, 2014, p. 53).</p><p>As tendências atuais da Educação Matemática, por mais que não tenhamos</p><p>mostrado todas as obras e todas as tendências possuem em sua totalidade uma</p><p>essência que está conivente com a vertente pós-modernista na educação que é o</p><p>aprender a aprender de fundamentação escolanovista, cuja mitologia está pautada no</p><p>construtivismo.</p><p>REFERÊNCIAS</p><p>ALMOULOUD, Saddo Ag. Fundamentos da Didática da Matemática. Curitiba. PR: Editora UFPR,</p><p>2007.</p><p>ARCE, Alessandra. Compre o kit neoliberal para a educação infantil e ganhe grátis os dez</p><p>passos para se tornar um professor reflexivo. Educação & Sociedade, ano XXII, nº 74, Abril, 2001.</p><p>AZEVEDO, Fernando et al. Manifestos dos pioneiros da Educação Nova (1932) e dos educadores</p><p>1959. Recife. Editora Massangana, 2010.</p><p>CATANANTE, Ingrid et al. E. Os limites do cotidiano no ensino da matemática para formação de</p><p>conceitos científicos. Poiésis, Tubarão. Volume Especial, p. 45 - 63, Jan/Jun, 2014.</p><p>DUARTE, N. Vigotski e o “Aprender a Aprender”: Aproximações Neoliberais e Pós-modernistas da</p><p>Teoria Vigotskiana. Campina: Autores Associados, 2006.</p><p>ESQUINCALHA, A. Etnomatemática: um estudo da evolução das idéias. https://www.google.</p><p>com.br/#q=etnomatematica, acessado em: 29/03/2016</p><p>.</p><p>MARX, Karl. Para a questão judaica. São Paulo. Expressão Popular, 2009.</p><p>MENDES, I. A investigação histórica na formação de professores de Matemática. X Encontro</p><p>Nacional de Educação Matemática :Educação Matemática, Cultura e Diversidade. Salvador –BA, 7 a 9</p><p>de Julho de 2010.</p><p>MIGUEL, A; GARNICA, A; UBIRATAN. D, S. A educação matemática: breve histórico, ações</p><p>implementadas e questões sobre sua disciplinarização. Revista Brasileira de Educação, Nº. 27,</p><p>Set /Out /Nov /Dez 2004.</p><p>SANTOS, Cláudio et al. O popular e o erudito na educação escolar. Germinal: Marxismo e Educação</p><p>em Debate, Salvador, v. 7, n. 1, p. 68-77, jun, 2015.</p><p>SAVIANI, Demerval. Pedagogia histórico</p><p>crítica: primeiras aproximações. Campina: Autores</p><p>Associados, 1997.</p><p>SUCHODOLSKI, Bogdan. Teoria marxista da educação. IN: MAFRA, Jason. Bogdan Suchodolski.</p><p>Recife. Editora Massangana, 2010, pp. 51-88.</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 13 132</p><p>A ESCRITA DE CARTAS EM AULAS DE ESTATÍSTICA</p><p>APLICADA À EDUCAÇÃO NO CURSO DE</p><p>PEDAGOGIA: ALGUMAS REFLEXÕES</p><p>CAPÍTULO 13</p><p>Jónata Ferreira de Moura</p><p>Universidade Federal do Maranhão</p><p>Centro de Ciências Sociais, Saúde e Tecnologia</p><p>Imperatriz/MA</p><p>RESUMO:Entendendo que a escrita acadêmica</p><p>não pode se limitar ao texto dissertativo, e tendo</p><p>consciência que outros gêneros textuais podem</p><p>ser utilizados por acadêmicos para produzir</p><p>conhecimento, o presente artigo trata de uma</p><p>atividade (escrita de cartas) desenvolvida com</p><p>estudantes do curso de Pedagogia do CCSST/</p><p>UFMA no primeiro semestre de 2013. O objetivo</p><p>do uso da escrita de cartas durante a disciplina</p><p>de Estatística Aplicada à Educação foi colocar</p><p>os estudantes em situação de produção escrita,</p><p>e desse modo entender como eles encaravam</p><p>a disciplina e como se relacionavam com seus</p><p>pares utilizando a missiva como dispositivo de</p><p>proximidade.</p><p>PALAVRAS-CHAVE: Cartas Pessoais; Ensino</p><p>de Estatística; Ensino Superior.</p><p>1 | INTRODUÇÃO</p><p>Ao longo da história da humanidade e</p><p>mesmo com todo o avanço tecnológico, a</p><p>prática de escrever cartas ainda se mantém</p><p>firme para muitas pessoas. Não podemos nos</p><p>iludir de que, a presença da tecnologia chegou</p><p>a todos os lugares do Brasil. E também, é</p><p>por meio das cartas que muitos descobrem o</p><p>fascínio da escrita. Em grande parte, querendo</p><p>escrever para entes queridos que habitam</p><p>lugares distantes.</p><p>A missiva possibilita o prazer da escrita,</p><p>a lembrança de gestos, dos sentimentos e da</p><p>intimidade. Quando se ler uma carta o leitor</p><p>pode imaginar todos os processos pelos quais</p><p>o escritor foi criando para produzi-la, em muitas</p><p>situações a carta leva o cheiro que era comum</p><p>para ambos e que agora só fica na lembrança</p><p>de cada um.</p><p>Ao realizar uma discussão sobre o gênero</p><p>textual carta, Teixeira (2011, p. 2149 destaque</p><p>do original), amparada em Bezerra, avalia que:</p><p>De acordo com Bezerra (2005), o gênero</p><p>textual carta pode abranger um grande leque</p><p>de discussões acerca de sua aplicabilidade</p><p>no cotidiano. Ainda segundo a autora (2005),</p><p>os diferentes tipos de carta são subgêneros</p><p>do gênero maior “carta” e têm funções</p><p>comunicativas variadas.</p><p>Pensando no papel que a missiva assume</p><p>no cotidiano e também no ambiente acadêmico,</p><p>“[...] verificamos que a prática de escrita de cartas</p><p>tem um objetivo comunicativo, algumas vezes</p><p>adquire um estilo formal, outros informais, como</p><p>as correspondências pessoais [...]” (TEIXEIRA,</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 13 133</p><p>2011, p. 2149). No nosso caso, a prática de uso das cartas atendeu às necessidades</p><p>de um grupo de estudantes do curso de Pedagogia do Centro de Ciências Sociais,</p><p>Saúde e Tecnologia da Universidade Federal do Maranhão (CCSST/UFMA) que</p><p>estava em situação de ensino e de aprendizagem na disciplina de Estatística Aplicada</p><p>à Educação.</p><p>O objetivo do uso da escrita de cartas durante uma disciplina, supostamente</p><p>envolvida unicamente com números, foi colocar os estudantes em situação de</p><p>produção escrita, e desse modo entender como eles encaravam a disciplina e como se</p><p>relacionavam com seus pares utilizando a missiva como dispositivo de proximidade.</p><p>Abaixo descrevo o desenvolvimento do proposto aos estudantes incluindo o</p><p>contexto e os envolvidos, narrando as reflexões que pude realizar após a leitura das</p><p>cartas.</p><p>2 | A ESCRITA DE CARTAS POR ESTUDANTES DO CURSO DE PEDAGOGIA: A</p><p>DISCIPLINA DE ESTATÍSTICA APLICADA À EDUCAÇÃO EM QUESTÃO</p><p>Assim como em muitas Instituições de Ensino Superior, o curso de Pedagogia</p><p>do CCSST/UFMA, desde sua criação e até os dias atuais, possui uma disciplina que,</p><p>supostamente daria condições para os acadêmicos lerem os mapas estatísticos e</p><p>entenderem a radiografia educacional brasileira.</p><p>Esta disciplina não entrou por acaso no currículo do curso, pois analisando a</p><p>presença do conhecimento estatístico na formação do normalista a partir da década</p><p>de 1930, Valente (2007, p. 357 destaque do original), revela que:</p><p>Houve um tempo em que a ‘febre estatística’ contaminou o ideário de formação</p><p>dos professores primários [...] A necessidade do ensino de Estatística representou</p><p>uma das heranças deixadas pela República Nova. O saber estatístico presente no</p><p>currículo de formação dos professores primários tinha como objetivo-maior levar</p><p>os formandos a outros tipos de atividade para além da carreira docente. Formar</p><p>pessoal com competência para preencher os mapas estatísticos – a radiografia do</p><p>país, da educação no Brasil – trabalhar em repartições da administração do ensino,</p><p>constituiu um imperativo daquela época.</p><p>Desde o final da década 80 do século passado que a disciplina vem sendo vista,</p><p>por muitos, como um apêndice no currículo do curso de formação de professores da</p><p>educação infantil e anos iniciais do ensino fundamental. Ou ainda, como uma disciplina</p><p>em que, unicamente, se revisam conteúdos matemáticos aprendidos na educação</p><p>básica.</p><p>Tentando desconstruir algumas ideias pré-concebidas sobre a disciplina Estatística</p><p>Aplicada à Educação, propus para os alunos do III período (2013) do curso a escrita</p><p>de cartas que fossem endereçadas para os alunos do V período, os quais já havia</p><p>experienciado situações diversas com a Estatística e eram também alunos do autor</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 13 134</p><p>desse artigo na disciplina de Fundamentos e Metodologia de Ensino da Matemática.</p><p>Com o propósito acima imaginei que os estudantes pudessem se envolver e até</p><p>mesmo aprender a escrever cartas, para quem ainda não tivesse tido a oportunidade</p><p>de fazê-lo. Propondo, então, uma situação que pudesse desencadear uma experiência.</p><p>Não com as mesmas ideias de experiência que se escuta em muitos lugares, mas</p><p>pensando experiência como aquilo que nos passa, nos acontece, nos toca e nos</p><p>transforma (LARROSA, 2002).</p><p>Para viver uma experiência a pessoa necessita está aberta a vivê-la, a senti-la</p><p>e até mesmo a aprender com ela que parar para pensar no que se vive ou no que se</p><p>passou é necessário para encontrar sentido no experienciado. Se não há sentido no</p><p>que foi realizado não há experiência, mas apenas uma tarefa cumprida.</p><p>A proposta oferecida aos acadêmicos não envolvia uma tarefa para alcançar</p><p>uma nota. Na verdade, nem nota foi atribuída à proposta realizada. Minha ideia foi</p><p>para que eles experienciassem a escrita e troca de cartas, podendo também produzir</p><p>um documento no qual eu pudesse avaliar minha prática docente.</p><p>Os estudantes, que na maioria são trabalhadores, têm entre 18 a 24 anos de idade</p><p>e são do curso noturno. Buscam no curso superior a possibilidade de ascensão social</p><p>e outros, melhores salários, tendo assim objetivos diversos. Nem todos pretendem</p><p>trabalhar na docência, tampouco com crianças pequenas.</p><p>Os alunos do III período escreveram suas cartas para um destinatário que só</p><p>saberiam quem era quando o mesmo respondesse suas cartas. Desse modo, a</p><p>primeira missiva era para um desconhecido; eu é quem iria entregar os envelopes</p><p>para dos alunos do V período e depois que eles lessem, me entregariam suas cartas</p><p>respostas. Após esse momento cada remetente teria seu correspondente e assim</p><p>estabeleceriam um diálogo de parceria, ajuda, esclarecimentos e até mesmo de</p><p>desabafo, como houve.</p><p>Sobre as missivas, Teixeira (2011, p. 2152), nos alerta sobre sua estrutura, grau</p><p>de formalidade, grafia e finalidade:</p><p>A estrutura base das cartas pode ser apresentada da seguinte forma: data,</p><p>saudação, corpo, despedida e assinatura. De acordo com o grau de formalidade</p><p>da carta podemos encontrar ainda o endereçamento e a referência do assunto.</p><p>Encontramos na escrita da carta o uso da linguagem formal e informal, este</p><p>uso dependerá da situação comunicacional da mesma. Nas cartas pessoais e</p><p>familiares, em geral, a linguagem informal</p><p>é a mais utilizada, no entanto, nas cartas</p><p>comerciais, deve-se fazer uso da linguagem formal, pois, em geral, escrevemos</p><p>para pessoas que não conhecemos. Observamos também a preocupação com o</p><p>léxico, a grafia e a estrutura gramatical no uso das cartas comerciais, o que não</p><p>apresenta tanta rigidez na elaboração do texto das cartas pessoais.</p><p>Sobre a estrutura básica de uma carta, observamos que muitos estudantes</p><p>entendiam como funcionava. Grande maioria utilizava-a bem. Há também missivas</p><p>que mostravam o quanto os estudantes tinham receio em estudar a disciplina e</p><p>também revelam, indiretamente, um dos principais motivos de cursarem Pedagogia:</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 13 135</p><p>dificuldades com disciplinas das ciências exatas.</p><p>Texto1</p><p>Fonte: Carta de Nathália. Aluna do III período de Pedagogia (UFMA/CCSST), 2013.</p><p>Acadêmicos como Nathália tem sido o público principal que o curso de Pedagogia</p><p>recebeu há anos e ainda recebe. Muitos vivenciaram um ensino de matemática na</p><p>educação básica que os distanciaram desta área do conhecimento e ainda marcaram-</p><p>no sofridamente. Outro indicativo é a existência de muitos estudantes que só aderiram</p><p>à docência devido sua pontuação no Sistema de Seleção Unificado (SISU). Por não</p><p>alcançarem a pontuação necessária ao curso que era sua primeira opção, decidem</p><p>ingressar na Pedagogia, mesmo sem este ser o curso que queriam estudar. Minha</p><p>pesquisa de doutorado, que está em andamento, tem revelado fortemente esses</p><p>elementos.</p><p>Alunos que não faziam uso da estrutura básica, penso que nunca escreveram</p><p>uma carta, ou nem mesmo tiveram contato com esse gênero textual na escola básica,</p><p>como foi comentado entre eles. Muitos nasceram num tempo em que o uso das cartas</p><p>ficou com suas avós. Atualmente os acadêmicos utilizam correios eletrônicos, redes</p><p>sociais e/ou aplicativos de telefonia móvel.</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 13 136</p><p>Texto 2</p><p>Fonte: Treco da carta de Andrew. Aluno do III período de Pedagogia (UFMA/CCSST), 2013.</p><p>Pelas missivas os estudantes contam o que estão estudando na disciplina, falam</p><p>sobre seu cotidiano, suas expectativas sobre o futuro e sobre o curso. Em outros</p><p>momentos desabafam sobre o cansaço do trabalho e dos estudos. Penso que em</p><p>muitos casos a carta foi o único dispositivo que alguns tenham para falar de si, de suas</p><p>expectativas e também do que tem vivido durante um curto espaço de tempo.</p><p>Além da proposta de falar da disciplina alguns estudantes foram dando outros</p><p>sentidos para o uso da carta. Penso que muitos deles vivenciaram esta atividade como</p><p>sendo uma verdadeira experiência. A qual é sempre de foro íntimo, mas que pode ser</p><p>uma representatividade de um coletivo ainda desconhecido. Sobre essa discussão,</p><p>Ferrarotti (2010, p. 45 destaques do original) expressa que:</p><p>O homem – acrescentaremos: o homem inventado pela revolução burguesa</p><p>– é o universal singular. Pela sua práxis sintética, singularizada nos seus atos</p><p>a universalidade de uma estrutura social. Pela sua atividade destotalizadora/</p><p>retotalizadora, individualiza a generalidade de uma história social coletiva. Eis-nos</p><p>no âmago do paradoxo epistemológico que nos propõe o método biográfico. [...]</p><p>Se nós somos, se todo o indivíduo é a reapropriação singular do universal social</p><p>e histórico que o rodeia, podemos conhecer o social a partir da especificidade</p><p>irredutível de uma práxis individual.</p><p>Penso que as palavras acima nos colocam em suspense, para entender que</p><p>as disciplinas acadêmicas não podem privilegiar somente o cognitivo, há outros</p><p>elementos, como há indícios na carta do Andrew, que é também preciso ser observado</p><p>e colocado em discussão durante as disciplinas de um curso superior. Afinal de contas</p><p>realizamos um diálogo quando ministrando disciplinas. Todo o processo é dialógico e</p><p>não monológico.</p><p>Nesta perspectiva entendemos que as relações estabelecidas pelos professores</p><p>de uma disciplina com seus alunos são dialógicas e interacionais. Por isso entendo que</p><p>a disciplina já pode ser uma experiência, pelo menos ela está carregada de elementos</p><p>que podem fazer aos envolvidos a experienciarem. Claro que o contrário também</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 13 137</p><p>pode acontecer. Contudo acredito na tese de que</p><p>Se entendermos a experiência como um acontecimento novo que nos faz pensar</p><p>sobre seu sentido; se a entendemos como aquilo que nos ocorre, que nos deixa</p><p>marcas, que tem um efeito pessoal; se a entendemos como aquilo que vivemos</p><p>intensamente, de tal maneira que construímos uma forma de ser e estar diante das</p><p>situações, uma consciência do significado daquilo que vivemos; se entendemos</p><p>a experiência dessas maneiras, isto é, como algo que em ocasiões temos, mas</p><p>também como algo que fazemos, pode-se dizer que, exige certa disposição de</p><p>ânimo para perguntar e pensar sobre aquilo que vivemos, podemos captar algo</p><p>da natureza de um modo não indiferente de estar no mundo e de viver; um modo</p><p>que não simplesmente deixe que as coisas passem, mas que se une ao modo de</p><p>pensar diante daquilo que nos passa. (CONTRERAS, 2013, p. 129 grifos do original</p><p>e tradução minha).</p><p>Observando o diálogo entre Jonas e Joana, a carta também foi utilizada como</p><p>instrumento para ampliar amizades. Logo porque muitos estudantes não eram</p><p>originários desta turma, havia aqueles que já estavam quase terminando o curso, mas</p><p>não haviam cursado a disciplina e agora precisaram.</p><p>Texto 3</p><p>Fonte: Carta de Jonas. Aluno do V período de Pedagogia (UFMA/CCSST), 2013.</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 13 138</p><p>Joana ler a carta que recebeu de Jonas e constrói sua argumentação, lembrando</p><p>que deveria ter dito em sua primeira carta quem era, qual disciplina fazia, qual período</p><p>cursava de Pedagogia e outras coisas mais. Na carta seguinte, respondendo a Jonas</p><p>ela se retrata escrevendo:</p><p>Texto 4</p><p>Fonte: Carta de Joana. Aluna do III período de Pedagogia (UFMA/CCSST), 2013.</p><p>Joana comenta de um dos livros que utilizei para ministra as aulas (COSTA,</p><p>2005) da disciplina. Esta obra apresenta a estatística de uma maneira bem humorada,</p><p>combinando o conhecimento estatístico com leves toques de humor, fazendo perguntas</p><p>interessantes sobre os temas e apresentando situações que levam o leitor a pensar</p><p>sobre o poder que a estatística foi dando às pessoas que se apropriaram dela ao longo</p><p>dos tempos.</p><p>Penso que a escolha de materiais a serem utilizados nas aulas precisa ser muito</p><p>bem pensada. Materiais que sejam úteis somente porque o professor já o utiliza há anos</p><p>e sabe bem a ideia do autor, não seja a melhor saída. Entendo que temos de buscar</p><p>materiais que possam favorecer a proximidade dos estudantes com a disciplina, dar-</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 13 139</p><p>lhe o suporte para o desenvolvimento da ementa a ser trabalhada e ainda condições</p><p>para ele ir além do que possa ser pensado para uma carga horária mínima possível.</p><p>Houve também estudantes que não receberam cartas respostas de colegas do</p><p>V período. Visto que não havia obrigatoriedade em estabelecer um diálogo. Eu propus</p><p>a atividade para a turma do III período, que abraçou e escreveu suas cartas para</p><p>seus colegas do V período. Estes adotavam seus pares escrevendo e estabelecendo</p><p>o diálogo que quisessem, sem obrigação. Foram poucos os acadêmicos que não</p><p>foram correspondidos, mesmo assim, percebi um sentimento de decepção por parte</p><p>destes que não tiveram a mesma emoção dos outros que abriam os envelopes e se</p><p>deleitavam com a leitura de uma missiva.</p><p>Texto 5</p><p>Fonte: Carta de Ellen. Aluna do III período de Pedagogia (UFMA/CCSST), 2013.</p><p>Talvez essa fosse uma situação não esperada, mas que aconteceu e deixou</p><p>um alerta para mim: todo planejamento precisa ser refeito e reestruturado. A partir do</p><p>que aparece, das respostas dos estudantes e do trajeto que as relações interpessoais</p><p>foram seguindo, replanejar é fundamental.</p><p>3 | CONCLUSÃO</p><p>Propor aos estudantes uma situação de produção escrita fez com que eu tivesse</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 13 140</p><p>um parâmetro sobre suas ideias acerca da disciplina e também da minha prática</p><p>docente. Fez-me perceber o quanto os alunos do curso estão distantes dos seus pares,</p><p>mesmo estudando no mesmo local, entretanto a missiva foi útil como dispositivo de</p><p>proximidade.</p><p>Um elemento que a prática da escrita de cartas apresentou a mim foi à necessidade</p><p>que os estudantes têm de conversar. Falar sobre si para outras pessoas, expressando</p><p>suas angústias, a correria do dia a dia e as inquietações com a dinâmica do curso.</p><p>Outro indício de achado que a experiência pôde me mostrar é a cultura de aula</p><p>de estatística de alunos da educação básica. Quando estes estudantes conseguem</p><p>ter contato com essa área do conhecimento durante sua estada na educação básica</p><p>parece que a ênfase é dada à estatística descritiva em detrimento à estatística</p><p>inferencial. O que talvez tenha reforçado a ideia de que a Estatística seja um conteúdo</p><p>da Matemática, o contrário do que defende Cobb e Moore (1997 apud LOPES, 2012).</p><p>REFERÊNCIAS</p><p>CONTRERAS, José Domingo. El saber de la experiencia en la formación inicial del profesorado.</p><p>Revista Interuniversitaria de Formación del Profesorado, 78 (27,3), p. 125-136, 2013.</p><p>COSTA, Sérgio Francisco. Introdução ilustrada à estatística. 4. ed. São Paulo: Harbra, 2005.</p><p>LARROSA, Jorge. Notas sobre a experiência e o saber de experiência. Revista Brasileira de</p><p>Educação, São Paulo, n. 19, p. 20-28, jan./fev./mar./abr. 2002. Disponível em: http://www.scielo.br/</p><p>pdf/rbedu/n19/n19a02.pdf. Acessado: 20 de mar. de 2013.</p><p>LOPES, Celi Espasandin. A educação estocástica na infância. Revista Eletrônica de Educação.</p><p>São Carlos: UFSCar, v. 6, n.º 1, p.160-174, mai. 2012. Disponível em http://www.reveduc.ufscar.br.</p><p>Acessado em: 20 de nov. de 2015.</p><p>TEIXEIRA, Cassia Regina. O ensino do gênero textual carta nas aulas de língua materna. Anais do</p><p>XV Congresso Nacional de Linguística e Filologia. Cadernos do CNLF, v. XV, n.º 5, t. 3. Rio de</p><p>Janeiro: CiFEFiL, p. 2149-2160, 2011.</p><p>VALENTE, Wagner. Rodrigues. No tempo em que normalistas precisavam saber estatística. Revista</p><p>Brasileira de História da Matemática. RBHM. Especial nº 1 – Festschrift Ubiratan D’Ambrosio. p.</p><p>357-368, dez. 2007. Disponível em: http://www.rbhm.org.br/issues/RBHM%20-%20Festschrift/29%20</p><p>-%20Valente%20-%20final.pdf. Acesso em: 22 de nov. de 2015.</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 14 141</p><p>CAPÍTULO 14</p><p>MATEMÁTICA É UM BICHO DE SETE CABEÇAS!?</p><p>UMA DISCUSSÃO SOBRE A FORMAÇÃO DO</p><p>PROFESSOR DOS ANOS INICIAIS</p><p>Laynara dos Reis Santos Zontini</p><p>Instituto Federal do Paraná campus Irati</p><p>Irati - Paraná.</p><p>Luciane Ferreira Mocrosky</p><p>Universidade Tecnológica Federal do Paraná</p><p>campus Curitiba</p><p>Curitiba - Paraná</p><p>RESUMO: Neste artigo discutimos modos de a</p><p>matemática estar presente no cotidiano docente,</p><p>explicitados na fala de professores dos anos</p><p>iniciais. Analisamos 20 tarefas produzidas para o</p><p>último encontro de formação do Pró-letramento</p><p>matemática, em Curitiba, com o objetivo de</p><p>revelar, no movimento de formação continuada,</p><p>o que para estes docentes vem sustentando</p><p>o ensino da matemática nos anos iniciais.</p><p>Pautamo-nos numa investigação qualitativa, na</p><p>abordagem fenomenológica e buscamos, neste</p><p>texto, explicitar especificamente as discussões</p><p>sobre a presença da matemática como um</p><p>bicho de sete cabeças, que por ter tantas</p><p>cabeças, permanece desconhecido a medida</p><p>em que quando uma face se mostra visível</p><p>outras escapam do olhar.</p><p>PALAVRAS-CHAVE: Formação de Professores</p><p>que ensinam Matemática; Educação Matemática;</p><p>Anos iniciais; Formação continuada.</p><p>ABSTRACT: In this article, we discuss ways</p><p>in which mathematics is present in everyday</p><p>teaching, explicit in the speech of teachers</p><p>of the early years. We analyzed 20 tasks</p><p>produced for the last meeting of formation of</p><p>the mathematical Pro-literacy, in Curitiba, with</p><p>the objective of revealing, in the movement of</p><p>continuous formation, what these teachers have</p><p>been supporting the teaching of mathematics</p><p>in the initial years. We focus on a qualitative</p><p>investigation in the phenomenological approach</p><p>and in this text we seek specifically to explain the</p><p>discussions about the presence of mathematics</p><p>as a seven-headed animal that, because it has</p><p>so many heads, remains unknown to the extent</p><p>that when a face becomes visible others escape</p><p>the look.</p><p>KEYWORDS: Teacher training that teaches</p><p>Mathematics; Mathematical Education; Initial</p><p>years; Continuing education.</p><p>1 | INTRODUÇÃO</p><p>A experiência vivida como professoras de</p><p>matemática e como formadoras de professores</p><p>despertaram o interesse para o ensino nos</p><p>anos iniciais. Muitas são as críticas feitas à esta</p><p>etapa escolar e nesse cenário, no estar junto</p><p>com professores, percebemos uma fragilidade</p><p>no ensino da matemática pelos sentimentos de</p><p>erros e culpas. Tais críticas têm sido elaboradas</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 14 142</p><p>por professores e explicitadas no cotidiano das escolas, revelando perplexidades e</p><p>apontando dificuldades no ensino dos conteúdos escolares. Os professores dos anos</p><p>iniciais estão cientes das críticas e suas falas revelam angústia e frustração, como</p><p>aponta o trabalho de Araújo (2003), Orlovski (2014) e Zontini (2014).</p><p>Entretanto, mesmo com a fragilidade que vem se revelando em pesquisas e no</p><p>discurso cotidiano de docentes, esse ensino permanece e se mantém vivo, ou seja,</p><p>ensinando. Com a intenção de conhecer modos deste ensino se manter, sustentando</p><p>o trabalho com a matemática nos anos iniciais, seguimos investigando o tema,</p><p>orientadas pela interrogação: "Que ideias sustentam o ensino da matemática nos anos</p><p>iniciais?" Com essa questão adentramos o campo da pesquisa que revela um caminho</p><p>investigativo em que o traço principal está no caráter qualitativo das compreensões</p><p>dos docentes que atuam nos anos iniciais, entendendo que estas são sempre as</p><p>possíveis a cada um.</p><p>A busca por ideias que sustentam o ensino da matemática é uma busca por</p><p>compreensões articuladas na historicidade do professor que ensina matemática nos</p><p>anos iniciais. Entendemos que as noções que estão presentes nessa etapa escolar</p><p>amalgamam e amparam o ensino da matemática nos demais trajetos escolares</p><p>formativos. Tais noções são as ideias que diferenciam essa fase das demais etapas</p><p>da educação básica, para além do conteúdo de ensino.</p><p>A pergunta nos levou a buscar pelo dito daqueles que ensinam matemática nos</p><p>anos iniciais e isso nos foi possível pelo contato com professores tutores do programa</p><p>Pró-letramento em 2013.</p><p>O Pró-letramento foi uma política pública educacional que visava à melhoria</p><p>da qualidade da educação. Sua implementação, de 2005 até 2013, está relacionada</p><p>ao fracasso escolar, sendo percebido pelo baixo desempenho do país em provas e</p><p>avaliações nacionais do ensino.</p><p>De acordo com Lucio (2010), a "criação" do Pró-letramento não é a primeira ação</p><p>que visa à formação continuada de professores e diversas propostas têm sido criadas</p><p>e desenvolvidas na última década nessa área. O Pró-letramento foi um programa</p><p>semipresencial, com uma parte importante da sua ação à distância. O diferencial desse</p><p>programa em relação a formações ofertadas anteriormente pelo governo federal é que</p><p>além da preocupação com o letramento em português, houve a preocupação específica</p><p>com o letramento em matemática, que se manteve na ação sequente chamada Pacto</p><p>pela Alfabetização na Idade Certa. Assim, houve uma divisão do programa em duas</p><p>etapas: Português e Matemática; e sua realização foi organizada pelo princípio do</p><p>revezamento, de modo a permitir que o professor aprofundasse seus conhecimentos</p><p>nas duas áreas.</p><p>Neste texto, trazemos discussões possibilitadas ao ouvir docentes, que ao</p><p>explicitarem entendimentos sobre seu modo de ser professor, falaram de suas práticas</p><p>de ensinar matemática às crianças, destacando o medo que povoa o cotidiano do</p><p>professor dos anos iniciais.</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 14 143</p><p>2 | PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS</p><p>Para ouvir os professores, adotamos</p><p>construir, criar, desenhar, elaborar, estabelecer, explicar, formular, generalizar,</p><p>inventar, modificar, organizar, originar, planejar, propor, reorganizar, relacionar, revisar,</p><p>reescrever, resumir, sistematizar, escrever, desenvolver, estruturar, montar e projetar.</p><p>6. Criar: Habilidade de julgar o valor do material (proposta, pesquisa, projeto)</p><p>para um propósito específico. O julgamento é baseado em critérios bem definidos que</p><p>podem ser externos (relevância) ou internos (organização) e podem ser fornecidos</p><p>ou conjuntamente identificados. Julgar o valor do conhecimento. Subcategorias:</p><p>Avaliação em termos de evidências internas; Julgamento em termos de critérios</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 1 7</p><p>externos. Verbos: Avaliar, averiguar, escolher, comparar, concluir, contrastar, criticar,</p><p>decidir, defender, discriminar, explicar, interpretar, justificar, relatar, resolver, resumir,</p><p>apoiar, validar, escrever um resumo sobre, detectar, estimar, julgar e selecionar.</p><p>Conhecendo um pouco da Teoria de Resposta ao Item correlacionando com as</p><p>Taxonomias de Bloom, temos um pouco de base para propor uma avaliação interna,</p><p>com proximidade de avaliação externa. Temos que definir um tipo de avaliação que</p><p>mais se adeque.</p><p>A avaliação, serve para mensurar o aprendizado do aluno em nossas escolas. A</p><p>principal finalidade de estruturar uma avaliação escolar, é tornar a avaliação como uma</p><p>ferramenta que possibilita o cumprimento dos objetivos de aprendizagem, visando:</p><p>o programa curricular da instituição; o aluno; gestão de resultados em avaliações</p><p>externas; e a proficiência na sequência dos estudos.</p><p>Devemos assim, abandonar a ideia de que a avaliação escolar é o final do processo,</p><p>utilizar da avaliação escolar em todos os segmentos do processo. O planejamento</p><p>do processo, já precisa ser feito tendo a completa noção do que será avaliado. O</p><p>desenvolvimento do processo, necessariamente é obrigatório convergir às habilidades</p><p>e competências propostas. A avaliação, deve ser mais um momento de aprendizado,</p><p>aproveitando a atenção diferenciada do avaliado, construir questões formativa. A</p><p>devolutiva, é uma etapa muito importante, temos que analisar os indicadores dos</p><p>resultados e intervir de modo que os avaliados tenham ganho no aprendizado.</p><p>4 | DESENVOLVIMENTO</p><p>A instituição escolar e os professores normalmente utilizam de diversos tipos</p><p>de avaliação. Vejamos alguns conceitos de avaliações que seriam pertinentes para a</p><p>proposta:</p><p>Avaliação Diagnóstica - É a avaliação de entrada, que tem por objetivo verificar e</p><p>aferir o nível de conhecimento e de dificuldades que um indivíduo e/ou uma população</p><p>possui em determinado tema ou fase. Os resultados da avaliação diagnóstica nos</p><p>permitem traçar estratégias direcionadas ao aprendizado e no aprofundamento dos</p><p>conhecimentos do indivíduo, de determinado grupo ou da população total.</p><p>Avaliação Discursiva - É a avaliação em que o aluno demonstra suas ideias</p><p>através de textos ou cálculos. Sua correção normalmente não é tão rápida, pois,</p><p>dificilmente será feita de modo computadorizado.</p><p>Avaliação Objetiva - É a avaliação constituída por questões de múltipla escolha</p><p>(QME), São úteis para avaliar uma grande extensão de conhecimentos e habilidades.</p><p>Tem a grande vantagem de poder computadorizar as respostas, obtendo a correção</p><p>dos testes de modo dinâmico e rápido. Para construir questões de múltipla escolha</p><p>(QME) deve-se tomar cuidado com suas normatizações e orientações, principalmente</p><p>na elaboração dos distratores.. Existe um ponto de atenção neste tipo de avaliação: o</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 1 8</p><p>avaliado pode obter pontuação com acerto aleatório, ou seja, acertar a questão sem</p><p>ao menos ter lido a mesma.</p><p>Avaliação Contínua - É a avaliação de todo o processo. Ocorre diariamente</p><p>observando principalmente as atitudes do estudante, sua participação oral, escrita, em</p><p>grupo, etc. Neste tipo de avaliação, o registro do professor é fundamental para o êxito</p><p>e validade do resultado.</p><p>Avaliação Formativa - Muito parecida com a avaliação diagnóstica, com a</p><p>diferença de ter todo o seu processo contínuo. Se compromete com o desenvolvimento</p><p>das capacidades dos alunos, expressando-se na profundidade de saberes constituídos.</p><p>A avaliação formativa, prioritariamente, deve nos trazer indicadores da aprendizagem</p><p>do aluno e do ensino oferecido, permitindo conhecer bem os saberes, as atitudes, a</p><p>capacidade e o estágio de desenvolvimento dos alunos, proporcionando indicações</p><p>claras do que se deve fazer para prosseguir.</p><p>4.1 Estruturas de Avaliação</p><p>No processo educativo, trabalham-se todos esse tipos de avaliações citadas</p><p>acima, mas, para gestão de resultados e obtenção de indicadores de modo rápido. A</p><p>melhor proposta de avaliação é utilizar a avaliação objetiva. Construindo questões de</p><p>múltipla escolha (QME) que satisfaça todas as necessidades.</p><p>Em uma avaliação com o formato de devolutiva da TRI, os aspectos precisam ser</p><p>bem definidos para que não haja discordâncias nos indicadores obtidos, principalmente</p><p>se a discordância for causada devido a influência de itens elaboradas de modo errôneo.</p><p>Em TRI, os aspectos devem ser bem definidos tomando como base os princípios de</p><p>competências e habilidades presentes em documentos legais que regulam os diversos</p><p>níveis de educação no Brasil. Assim, se torna obrigatório elaborar questões que</p><p>permitam avaliar.</p><p>De grosso modo, cada questão deve conter:</p><p>• Texto-base - Nesta parte podemos contextualizar uma questão tomando o</p><p>cuidado para não apenas utilizar o texto-base como um pretexto para solu-</p><p>ção ou uma textualização para retirada de informações. Então, para contex-</p><p>tualizar um item, podemos inserir na questão: figura, tabela, gráfico, texto,</p><p>etc. A escolha do texto base é fundamental na elaboração de um item. Pre-</p><p>ferencialmente é recomendável utilizar textos, gráficos, etc., de fontes pri-</p><p>márias, sendo curto, integral e de fácil compreensão. Lembrando que é de</p><p>suma importância adequar a linguagem ao nível dos estudantes. São permi-</p><p>tidos recortes de um texto, retirar imagens, figuras e gráficos de canais de</p><p>comunicação e fazer adaptações, tendo a obrigatoriedade de manter a idéia</p><p>central, indicar se houve adaptações e citar fonte de referência no modelo</p><p>exigido pelas normas.</p><p>• Enunciado - É o comando, ou seja, a explicitação do desafio para que se</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 1 9</p><p>evidencie o desenvolvimento da competência avaliada. O comando poderá</p><p>ser formulado como uma pergunta direta ou uma frase incompleta.</p><p>• Alternativas - Uma única das alternativa deverá ser o Gabarito ou também</p><p>conhecido como chave de resposta, sendo inequivocamente correta. As ou-</p><p>tras alternativas serão incorretas chamadas de distratores. Obrigatoriamen-</p><p>te os distratores são plausíveis ao enunciado, e de modo algum poderá</p><p>representar um absurdo extremo ou induzir o aluno ao erro, pois um distrator</p><p>com essas características destoará dos outros distratores prejudicando o</p><p>item.</p><p>Foi proposto elaborar questões de aspecto formativo observando Habilidades e</p><p>Competências em torno de nove questões relacionadas aos conteúdos desenvolvidos</p><p>no Bimestre de cada uma das quatro disciplinas da área, procurando mensurar o</p><p>que o aluno assimilou no Bimestre. Nesta proposta de avaliação, utilizamos trinta</p><p>e seis questões. Cada disciplina atendeu todo o conteúdo programado no Bimestre</p><p>agrupado em três temas/assunto trabalhados. De cada tema o professor forneceu três</p><p>questões com níveis e grau de complexidade distintos, sendo a primeira questão de</p><p>reconhecimento, a segunda com aspecto mecânico e a última de compreensão. Dessa</p><p>forma, pudemos comparar os resultados observando um gráfico de cores, construído</p><p>com a dependência hierárquica de conhecimentos relacionados na Taxonomia de</p><p>Bloom.</p><p>As informações de complexidade contidas em cada nível são descritas a seguir.</p><p>Nível I Identificação / Observação – Uma questão mais simples possível,</p><p>contextualizada de modo teórico,</p><p>os modos de proceder da pesquisa</p><p>qualitativa fenomenológica (BICUDO, 2011). Assim, os dados desta pesquisa foram</p><p>produzidos no encontro com professores, em momento de formação continuada, onde</p><p>ouvimos professores que atuavam como tutores do Pró-letramento em Matemática do</p><p>Paraná, durante a formação no período de 26 a 28 de agosto de 2013. Nesse encontro</p><p>de três dias, participaram 72 professores que deveriam apresentar seus relatos de</p><p>experiências como formadores do Pró-letramento Matemática, conforme protocolo</p><p>preestabelecido pela coordenação do programa. Reunidos por município, muitas vezes</p><p>apresentando em conjunto a tarefa que lhes cabia, obtivemos 20 apresentações não</p><p>repetidas, com filmagem permitida pelos sujeitos, que foram transcritas e analisadas à</p><p>luz da interrogação: Que ideias sustentam o ensino da matemática nos anos iniciais,</p><p>para os tutores, no movimento de formação do Pró-letramento em Matemática?</p><p>Para preservar a identidade dos sujeitos, optamos por chamá-los de professor</p><p>1, professor 2, e assim sucessivamente, indicado como P1, P2 até P23, pois, apesar</p><p>de serem 20 gravações, em alguns momentos a apresentação foi realizada por mais</p><p>de uma pessoa, por isso são 23 professores - tutores que se expressaram nessas</p><p>gravações.</p><p>Transcritos os textos, procedemos as análises ideográfica e nomotética. A</p><p>primeira tratou das ideias individuas nos discursos e a segunda considerou a passagem</p><p>do individual dirigindo-se para as generalizações. Dessas análises, "modos de estar</p><p>professor-matemática-ensino" destacou-se como um núcleo de ideias que revelou,</p><p>entre outras coisas, o medo do desconhecido impulsionando o ensino da matemática.</p><p>Na sequência, vamos expor nossas compreensões dos aspectos já apontados, valendo-</p><p>nos de recortes das falas dos professores em momento de formação continuada.</p><p>3 | PROFESSOR, MATEMÁTICA E ENSINO: MODOS DE SER PROFESSOR</p><p>Os tutores, formadores de docentes dos anos iniciais, no encontro final do Pró-</p><p>letramento, falaram de suas experiências se formando e formando o outro. As falas</p><p>trazem consigo complexidades que envolvem o professor, a matemática e o seu</p><p>ensino, expressas em 16 dos 20 depoimentos, e apontam como uma ideia central nos</p><p>discursos modos de o professor estar com a matemática e o seu ensino.</p><p>Em seus depoimentos, muitas vezes, fazem relatos das experiências dos</p><p>docentes que com eles estudam na formação continuada, chamados de cursistas,</p><p>mas em alguns momentos reforçam a fala com suas próprias experiências de ensinar</p><p>crianças ou de formar professores dos anos iniciais. De qualquer maneira, mesmo</p><p>quando falam da experiência do outro tratam-na como se fosse deles, pelo que vivem</p><p>em formação. Essa experiência como formador, entrelaça sua prática e a experiência</p><p>do outro, de modo que no dito pelo tutor nem sempre é possível ver claramente</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 14 144</p><p>quem viveu o dito. Muitas vezes, assume para si o vivido pelo outro por fazer parte</p><p>do movimento do seu próprio formar. Todavia temos sempre a fala "de" e "sobre"</p><p>um professor que ensina matemática na realidade dos anos iniciais, como pode ser</p><p>depreendido pelo explicitado por P1:</p><p>P1: Eu acho que as professoras têm um certo receio.... a matemática. A criança</p><p>mesmo tem um receio da matemática. Então o professor quando vai ensinar, ela já vai</p><p>até meio tensa na sala de aula. Acho que um pouco assusta a matemática, mas isso</p><p>é comum né.</p><p>No momento dessa fala é percebida a concordância gestual das demais tutoras</p><p>com o "assusta" e com o fato de ser comum a matemática assustar. São falas</p><p>que revelam que a matemática faz parte da vida estudantil e se arrasta até a vida</p><p>profissional. É certo que ela ganha contorno diferenciado quando se optou por ser</p><p>professor, principalmente por ser um professor que ensina matemática, o que não</p><p>atenua o temor. Pelo contrário, firma-se aqui um rótulo de que as pessoas têm medo</p><p>e que esse temor é um sentimento socialmente aceito.</p><p>De acordo com Silveira (2002), a comunidade escolar, com o aval do senso</p><p>comum, justifica as dificuldades com a matemática com a afirmativa "matemática é</p><p>difícil”. Para o autor, existe um pré-construído, que se mantém ao longo do tempo, que</p><p>diz "matemática é difícil" e por consequência "matemática é para poucos" (SILVEIRA,</p><p>2002, p.1).</p><p>Essa afirmativa sobre a dificuldade alimenta e justifica o medo da matemática</p><p>dito pelos professores, fixado pelo senso comum. Antes de iniciar o curso de formação</p><p>continuada, algumas tutoras sinalizam que as cursistas já se mostravam afetadas por</p><p>esse sentimento. As falas também reforçam o que se percebe nos cursistas e, ao serem</p><p>questionados sobre o porquê de procurarem a formação continuada em matemática</p><p>responderam sobre o não gostar, sobre os receios de fazer essa formação.</p><p>P15: Porque eu não gosto de matemática, foi praticamente o que todas</p><p>responderam.</p><p>P06: Então elas vieram assim meio apreensivas, meio com medo e depois elas</p><p>foram se soltando [...]</p><p>O "não gostar" é anterior ao curso, é prévio ao professor e mantém o ensino da</p><p>matemática envolvido por sentimentos negativos ligados ao medo, a uma dificuldade</p><p>que gera angústia. Isso desequilibra, fragiliza o ensino da matemática nos anos iniciais.</p><p>Essa fragilidade é retomada por uma culpa que acompanha um dito do senso comum:</p><p>"o professor dos anos iniciais não gosta de matemática" (P5).</p><p>Silveira (2002) retoma alguns fatos históricos que indicam a origem deste medo.</p><p>O autor cita a relação dos antigos egípcios com a matemática, sobre o domínio que os</p><p>sacerdotes tinham sobre os escravos por conseguirem prever acontecimentos usando</p><p>a matemática. Nessa época,</p><p>aparece a presença do não-dito, o que não aparece no discurso dos sacerdotes,</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 14 145</p><p>ou seja, o ocultamento de informações para a comunidade, que com isso obtinham</p><p>mais prestígio, demonstrando assim o caráter ideológico que a matemática começa</p><p>a apresentar, confirmando o discurso que diz que "a matemática é para poucos"</p><p>(SILVEIRA, 2002, p.02).</p><p>Assim, os professores falam dos sentimentos que os acompanham desde</p><p>que entraram na escola, destacando o medo, mais propriamente a angústia de ser</p><p>professor pelo medo de não dar conta de ensinar matemática. Com isso, o professor</p><p>acaba levando ao aluno sentimentos que ele teve, enquanto aluno, afirmando também</p><p>que o próprio estudante tem receio da matemática, como atesta P23:</p><p>P23: [...] as crianças dizem não gostam de matemática porque os nossos</p><p>professores também não gostam [...]</p><p>Se o aluno não gosta por perceber que o seu professor não gosta, o modo de</p><p>o professor estar-com a matemática em sua vida escolar é trazido para o ensino,</p><p>confirmando o dito pelos professores de que quando o docente aprende a gostar da</p><p>matemática ele favorece esse gosto pelo aluno.</p><p>A tutora P22 explicita o entendimento de um ciclo, comentando que isso que o</p><p>professor não sabe é carregado ao longo da vida e acaba sendo levado para a sala de</p><p>aula. Essa bagagem é preenchida pelos conteúdos que o professor sabe, pelo que lhe</p><p>falta saber, pelos sentimentos conflituosos ligados ao medo e a necessidade de lidar</p><p>com a matemática. Tudo o que é "carregado" reflete no que o professor vai ensinar</p><p>para o seu aluno, no modo como vai ensinar e nas dúvidas que permanecerão para o</p><p>professor e para os alunos.</p><p>P22: [...] então a gente acaba carregando isso, carregando, carregando e</p><p>trazendo conosco pra dentro da sala de aula enquanto professores [...]</p><p>A tutora P22 trata disso como um ciclo vicioso: "de ter passado por um monte</p><p>de professores que não tinham esse conhecimento enquanto nós éramos alunos</p><p>e enquanto nós iniciamos como professores". Assim, reafirma a importância da</p><p>formação continuada para romper esse ciclo. Por conta disso nos perguntamos: como</p><p>pode a criança, no início de sua trajetória escolar, ter receio da matemática?</p><p>Para Souza (2010) o que justifica o medo é o modo como essa disciplina é tratada na</p><p>escola:</p><p>a concepção</p><p>ou de um fato cotidiano. O aluno teria somente a</p><p>necessidade de ter prestado atenção na explicação do professor, ou simplesmente</p><p>conhecer brevemente sobre do que o assunto tratava. Em linguagem técnica, essa</p><p>questão se insere no primeiro patamar da Taxonomia de Bloom: Lembrar.</p><p>Nível II Resolução / Desenvolvimento – Uma questão que aborda principalmente</p><p>o processo mecânico. O aluno deve saber como desenvolver o cálculo ou desenvolver</p><p>as ideias presentes em seu contexto, mesmo que seja de modo direto. Seria o segundo</p><p>e o terceiro patamar da taxonomia de Bloom: Entender e Aplicar.</p><p>Nível III Compreensão / Aplicação – Uma questão teoricamente mais complexa,</p><p>podendo ser uma situação problema ou uma atividade retirada de Avaliação Externa,</p><p>ou de Vestibulares. O aluno precisa reconhecer a parte teórica e desenvolver</p><p>conhecimentos para resolver a atividade. Ou seja, atinge até o patamar 5 da Taxonomia</p><p>de Bloom. Com essas normatizações conseguimos comparar alunos de turmas, e</p><p>séries diferentes. Para facilitar na comparação, relacionamos essas três questões,</p><p>construindo um gráfico de cores, que nos traz várias informações que nos direcionam</p><p>a comentar e intervir no processo. Apresentando a configuração completa da planilha</p><p>de respostas, temos a tabulação por pergunta. Observemos a imagem na página a</p><p>seguir:</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 1 10</p><p>De acordo com a nossa metodologia de predeterminar o grau de complexidade de</p><p>cada habilidade para analisar uma competência, tendo as Taxonomias de Bloom como</p><p>alicerces da avaliação, espera-se certo comportamento na análise dos resultados.</p><p>Lembrando, temos três habilidades que compõem o conjunto de uma competência,</p><p>dadas em respectivamente três questões. Essas três questões chamaremos de: Q1</p><p>a questão de identificação, Q2 a questão de processo mecânico e Q3 a questão de</p><p>compreensão. Teoricamente o grau de complexidade dentre as três questões seriam:</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 1 11</p><p>Q1 Q2 > Q3.</p><p>Caso este evento não ocorra, a constatação será passível de estudos e</p><p>interrogações. Como exemplo, pesquisar se os exercícios foram mal elaborados, ou</p><p>colocados em ordem trocada.</p><p>4.2 Correção e Construção de Indicadores</p><p>Na aplicação de avaliação, executando de modo tradicional, precisaríamos</p><p>imprimir a avaliação, uma para cada aluno. Depois corrigir uma à uma, mesmo que</p><p>tenhamos algum artifício para auxiliar na correção o processo é demorado. Para</p><p>construir indicadores, seria quase improvável sem a ajuda de outras pessoas e com</p><p>muita certeza pode reservar alguns dias para a finalização.</p><p>Assim, a primeira intenção foi diminuir o tempo de finalização da avaliação,</p><p>dinamizando o processo de correção. Num primeiro momento, foi efetuado um</p><p>estudo de uma forma de correção automática com o uso da tecnologia. Fora feito</p><p>uma avaliação on-line no Formulário Google e uma planilha de correção no Excel,</p><p>do pacote Office da Microsoft. Nossa primeira intenção foi dinamizar o processo de</p><p>correção. Pois,demanda muito tempo para devolver os resultados onde temos mais</p><p>de trezentos avaliados. A planilha de correção, evoluiu sendo transferida para uma</p><p>planilha Google on-line. Sistematizando todo o processo de correção, onde hoje é</p><p>possível obter resultados em tempo real, com todos os indicadores, incluindo um</p><p>gráfico de cores. A interpretação desse gráfico fornece o mapeamento individual e</p><p>coletivo, permitindo-nos analisar agrupamentos e comparar salas e séries distintas.</p><p>A partir das respostas às questões de um mesmo grupo, sendo que cada grupo</p><p>possui 3 questões sobre o mesmo assunto, dividido nos três níveis de dificuldade,</p><p>podemos construir o gráfico de cores. As cores são definidas pela seguinte regra:</p><p>A aplicação de Avaliações com resultados quase que instantâneos nos trouxe</p><p>um dinamismo no tempo de correção. Porém, percebemos que poderíamos explorar</p><p>ainda mais os recursos que já manuseamos. Começamos a analisar as alternativas,</p><p>observando o percentual de distribuição entre as respostas por questão. Com isso</p><p>obtivemos ganho no momento da correção, e na devolutiva da Avaliação aos alunos.</p><p>Conseguimos identificar rapidamente a alternativa que a maioria optou. Caso ela fosse</p><p>a errada, tínhamos discussões de grande valia com os alunos e principalmente com a</p><p>equipe de elaboração das questões.</p><p>Observe como exemplo: o conjunto de três exercícios, respectivamente em seus</p><p>devidos níveis de complexidade:</p><p>2</p><p>4</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 1 12</p><p>Tema: Geometria analítica - Estudo de pontos e retas (3ª Série E.M.-</p><p>Matemática)</p><p>1. Criado por René Descartes, o plano cartesiano consiste em dois eixos</p><p>perpendiculares, sendo o horizontal chamado de eixo das abscissas e o vertical de eixo</p><p>das ordenadas.Observando o gráfico abaixo, as coordenadas dos pontos presentes</p><p>no 3º Quadrante e no 4º Quadrante são respectivamente:</p><p>a) (3 , 9) e (-8 , -2) b ) (2 , -4) e (-4 , 2) c) (-2 , -8) e (2 , -4) d) (-4 , 2) e (9, 3)</p><p>2. Assinale a alternativa em que respectivamente fornece o resultado da Distância</p><p>entre os pontos A(5,9) e B(-1,1).</p><p>a. 4 b. 6 c. 8 d. 10</p><p>3. (ENEM - 2013) A Secretaria de Saúde de um município avalia um programa</p><p>que disponibiliza, para cada aluno de uma escola municipal, uma bicicleta, que deve</p><p>ser usada no trajeto de ida e volta, entre sua casa e a escola. Na fase de implantação</p><p>do programa, o aluno que morava mais distante da escola realizou sempre o mesmo</p><p>trajeto, representado na figura, na escala 1 : 25 000, por um período de cinco dias.</p><p>4 km b) 8 km c) 16 km d ) 40 km</p><p>Denominamos cada conjunto, como competência. Tendo em vista, o fato, que</p><p>o avaliado possui a habilidade de identificar, desenvolver e compreender um tema, é</p><p>constatado sua competência no assunto.</p><p>Neste momento, nosso objetivo não se restringe à nota do aluno, e à quantas</p><p>questões ele acertou por disciplina. Conseguimos retirar mais informações da avaliação.</p><p>Como esta Avaliação é Formativa, atende as normas de construção de itens da TRI</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 1 13</p><p>e está agrupada obedecendo as Hierarquias de aprendizado de Bloom. obtém-se a</p><p>mensuração completa que o avaliado assimilou na avaliação.</p><p>Com essas normatizações conseguimos comparar alunos de turmas, e séries</p><p>diferentes. Para facilitar na comparação, relacionamos essas três questões, construindo</p><p>um gráfico de cores, que nos traz várias informações que nos direcionam a comentar e</p><p>intervir no processo. Apresentando a configuração completa da planilha de respostas,</p><p>temos a tabulação por pergunta. Observemos a imagem na página a seguir:</p><p>A nova configuração foi representada com tabulações por questões e o gráfico</p><p>de cores. Observando o gráfico podemos, num primeiro momento, tirar algumas</p><p>conclusões. Por exemplo, se fizermos a leitura verticalmente, estaremos analisando a</p><p>assimilação de conteúdos, consequentemente, o desempenho do professor.</p><p>5 | DISCUSSÃO</p><p>Sabemos que em novas teorias e metodologias propostas, não bastam apenas</p><p>análises e discussões, deve-se haver progresso, caso contrário, não se justifica a sua</p><p>inserção na rede educacional. Nossa intenção foi constatar evolução no produto final,</p><p>ou seja, nos resultados das avaliações externas.</p><p>Quanto maior a discussão, mais informações temos sobre o aluno e sobre o</p><p>processo educacional, consequentemente construiremos mais proposta de intervenção</p><p>que otimizariam futuras avaliações, beneficiando o aprendizado de nossos alunos.</p><p>Observando o gráfico de cores no capítulo anterior podemos ter algumas</p><p>conjecturas:</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 1 14</p><p>• Vemos que a sala teve baixo desempenho nos conteúdos indicados por C2,</p><p>C3 e C10, respectivamente nas disciplinas de Matemática e Física. A devo-</p><p>lutiva das questões envolvidas</p><p>devem ser mais acentuadas. Se analisarmos</p><p>Horizontalmente, veremos o desempenho individual dos alunos:</p><p>• Os avaliados que atingiram “0”e “1”competência, demonstraram grande</p><p>possibilidade de ter colocado as alternativas de modo aleatório.</p><p>• Os avaliados que não obtiveram nenhuma cor vermelha em seus resul-</p><p>tados, Identificaram todos os conteúdos ministrados no referido Bimestre.</p><p>Neste caso, precisamos verificar como é sua atenção em sala, pois, eles te-</p><p>riam grande chance de gabaritar provas deste nível. Muitas outras hipóteses</p><p>poderiam ser formadas se olharmos este gráfico com mais atenção.</p><p>Quando, “As estruturas de avaliação escolar para mapear habilidades</p><p>tomando como base a Taxonomia de Bloom em questões de múltipla escolha”, foi</p><p>apresentado e defendido em banca para obtenção do título de Mestre, a interrogação</p><p>era “O gráfico de cores realmente traz informações pertinentes ao mapeamento de</p><p>aprendizado?”</p><p>Além da Taxonomia de Bloom, também foi realizado um teste estatístico</p><p>analisando o conjunto das três questões em quatro disciplinas envolvidas em quatro</p><p>provas diferentes.</p><p>sendo constatado que, o gráfico de cores realmente nos trás informações pertinentes</p><p>que se aproximam muito da realidade dos conteúdos assimilados pelo aluno, em união</p><p>com nosso objetivo de atingir metas externas. Em relação à construção da avaliação,</p><p>sua correção computadorizada e as regras de formação das cores, nossos estudos</p><p>mostraram que toda a estrutura pedagógica tem bases em estudos psicométricos; os</p><p>itens devem ser construídos com todas as normas especificadas para sua formatação</p><p>abrangendo os conteúdos do bimestre. Vimos também o comportamento dos alunos</p><p>nos resultados das avaliações, onde percebemos que no decorrer das aplicações,</p><p>estatisticamente, o resultado converge para o padrão esperado. Desse modo, temos</p><p>mutuamente as duas frentes pedagógica e estatística se validando.</p><p>Um breve comentário dos fatos estudados, iniciando pelos alunos e finalizando</p><p>com os objetivos da gestão escolar.</p><p>Alunos - Na devolutiva de cada avaliação, a maioria dos alunos, demonstra muito</p><p>interesse e empolgação para escutar os comentários pertinentes ao seu resultado</p><p>discriminados no gráfico, principalmente o aluno de melhor rendimento. Ele consegue</p><p>identificar suas dificuldades e / ou os eventuais desvios ocorridos que o impossibilitaram</p><p>de obter um rendimento melhor.</p><p>Professores - Após as provas, os professores têm o mapeamento da sala,</p><p>sabendo até quem colocou as respostas de modo aleatório. O mapeamento da sala</p><p>é importante também para o professor saber o grau de complexidade que os alunos</p><p>atingiram e qual conteúdo deve ser repassado. Os professores, também começam</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 1 15</p><p>a perceber as diferenças dos três níveis de complexidade das questões ao longo do</p><p>processo, evitando falhas na elaboração das mesmas como foi verificado em algumas</p><p>avaliações.</p><p>Coordenadores - O coordenador pedagógico tem o mapeamento de todo</p><p>o conteúdo transmitido; observando o gráfico verticalmente é possível verificar o</p><p>desempenho do professor, e monitorar o programa bimestral.</p><p>Gestão - A equipe de gestão se preocupa com o todo, avaliações internas e</p><p>avaliações externas. Essa estrutura de avaliação interna influenciou diretamente nos</p><p>resultados de avaliações externas. Temos resultados de avaliação externa (SARESP)</p><p>dos últimos anos (2011 à 2017) nas disciplinas de Português e Matemática. A escola</p><p>obteve crescimento em todos os anos.</p><p>concluímos que todo o esforço desenvolvido para modificarmos os paradigmas</p><p>de avaliação utilizando a Taxonomia de Bloom e os gráficos de cores foram decisivos</p><p>para a melhoria do desempenho da escola estudada nas avaliações externas.</p><p>REFERÊNCIAS</p><p>[BC] BONJORNO, Regina Azenha; CLINTON, Marcio Física fundamental - Novo: volume único, 2 o</p><p>grauSão Paulo: FTD,2009.</p><p>[Ho] HOFFMANN, Jussara Maria Lerch; Avaliação: mito e desafio: uma perspectiva construtivista,</p><p>Porto Alegre: Editora Mediação, 1991.</p><p>[Im] IMBERNÓN, Francisco; Formação Docente e profissional: formar-se para a mudança e a</p><p>incerteza. - 5. ed., São Paulo: Cortez,2005.</p><p>[Lu] Luckesi, Cipriano Carlos; Avaliação da Aprendizagem escolar: estudos e proposições, São</p><p>Paulo: Cortez,2005.</p><p>[MS] MEIER, Marcos; GARCIA, Sandra; Mediação da aprendizagem: contribuições de Fuerstein e</p><p>de Vygotsky, Curitiba: Edição do Autor,2011.</p><p>[Pe] PERRENOUD, Phelippe. Avaliação da excelência à regulação das aprendizagens entre duas</p><p>lógicas, Porto Alegre: Artes Médicas, 1999</p><p>[Ra] RABELO, Mauro. Avaliação educacional: fundamentos, metodologias e aplicações no</p><p>contexto brasileiro, Rio de Janeiro, RJ : Sociedade Brasileira de Matemática, 2013</p><p>[Sa] SANT’ANNA, Ilza Martins. Por que Avaliar? : como avaliar? : critérios e instrumentos,</p><p>Petrópolis, RJ : Vozes, 1995</p><p>[1] Ciências da natureza, matemática e suas tecnologias / Secretaria da Educação Básica Brasília:</p><p>Ministério da Educação, Secretaria da Educação Básica,2008.</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 2 16</p><p>AS AVALIAÇÕES EXTERNAS DE MATEMÁTICA NOS</p><p>ANOS FINAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL: OS</p><p>RESULTADOS DAS ESCOLAS DA ZONA DA MATA</p><p>MINEIRA</p><p>CAPÍTULO 2</p><p>Matheus Enrique da Cunha Pimenta Brasiel</p><p>Universidade Federal de Viçosa</p><p>maencupibra@gmail.com</p><p>Cristiane Aparecida Baquim</p><p>Universidade Federal de Viçosa</p><p>cristiane.baquim@ufv.br</p><p>RESUMO: Este trabalho apresenta dados de</p><p>um estudo que foi desenvolvido na Universidade</p><p>Federal de Viçosa, no qual foram analisados</p><p>os resultados das avaliações externas de</p><p>Matemática das escolas públicas que oferecem</p><p>os anos finais do Ensino Fundamental II,</p><p>nas cidades da microrregião de Ubá, Minas</p><p>Gerais. Tal pesquisa foi realizada por meio</p><p>de um estudo comparativo de natureza quali-</p><p>quantitativa a partir dos resultados obtidos</p><p>no SAEB/Prova Brasil e no SIMAVE/Proeb,</p><p>utilizando os softwares estatísticos SPSS</p><p>e o EXCEL, complementado pela análise</p><p>inferencial dos dados coletados. Os dados</p><p>indicaram que, apesar de a microrregião</p><p>estar ajustada aos condicionantes impostos</p><p>pelo "Estado avaliador", a realidade de cada</p><p>escola deve ser dimensionada com base na</p><p>observação dos impactos dos resultados das</p><p>avaliações na dinâmica institucional, pois os</p><p>diferentes contextos não são considerados</p><p>pelas avaliações externas analisadas. Além</p><p>disso, notou-se que a microrregião alcançou</p><p>resultados satisfatórios nessas avaliações,</p><p>demonstrando que se adequou, mesmo que</p><p>com medidas artificiais, ao que é recomendado</p><p>pelo Estado.</p><p>PALAVRAS-CHAVE: Avaliações externas de</p><p>Matemática; Microrregião de Ubá-MG; SIMAVE/</p><p>PROVA BRASIL; Estado avaliador.</p><p>ABSTRACT: This chapter presents the data of</p><p>a study developed in the Federal University of</p><p>Viçosa, during which the results of the external</p><p>evaluations of Mathematics of the public</p><p>schools that offer the last grades of the Ensino</p><p>Fundamental II were analyzed, these schools</p><p>are in the mircro-region of Ubá, Minas Gerais,</p><p>Brazil. This research was accomplished by</p><p>comparing and analyzing in quali-quantitative</p><p>way the results from the SAEB/Prova Brasil</p><p>and from the SIMAVE/Proeb, using the statics</p><p>softwares SPSS and EXCEL, in addition to</p><p>the inferential analysis of the collected data.</p><p>These data indicated that, although this micro-</p><p>region is adjusted to the conditions imposed</p><p>by "evaluator State", the reality of each school</p><p>must be measured based on the observation</p><p>of the evaluation institutional dynamic results</p><p>impacts, because the different contexts are</p><p>not considered by the analyzed external</p><p>evaluations. Moreover, we have noticed that</p><p>this micro-region reached satisfactory results on</p><p>these evaluations, showing that it has adjusted</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 2 17</p><p>to what is recommended by the State, even if with artificial measures.</p><p>KEYWORDS: External evaluations of Mathematics; Micro-region of Ubá-MG; SIMAVE/</p><p>PROVA BRASIL; Evaluator State.</p><p>1 | CONSIDERAÇÕES INICIAIS</p><p>As primeiras experiências em avaliação externa</p><p>do Estado brasileiro começaram</p><p>a surgir nos anos de 1990, com a criação do Sistema de Avaliação da Educação</p><p>Básica (SAEB). Assim, a implementação do SAEB no Brasil teve “objetivo principal de</p><p>contribuir para a melhoria da qualidade da educação brasileira e para a universalização</p><p>do acesso à escola, oferecendo subsídios concretos para a formulação, reformulação</p><p>e o monitoramento das políticas públicas voltadas para a educação básica” (INEP,</p><p>2015).</p><p>Na Constituição Federal (BRASIL, 1988), a avaliação educacional é tratada</p><p>associada à qualidade da educação, como no art. 206, onde a “garantia de padrão de</p><p>qualidade” figura como um dos princípios basilares do ensino. No art. 209, a avaliação</p><p>da qualidade pelo poder público aparece como condição do ensino. Ao tratar do</p><p>Plano Nacional de Educação, o art. 214 indica como um dos resultados pretendidos a</p><p>“melhoria da qualidade do ensino”.</p><p>Conforme Afonso (2009), nas últimas décadas, os países capitalistas</p><p>ocidentais têm implementado as políticas de avaliação, de prestação de contas e de</p><p>responsabilização (accountability), que</p><p>foram ganhando certa imunidade às concepções político-ideológicas dos</p><p>governos, disseminando e homogeneizando muitos dos seus efeitos, como se</p><p>essas mesmas políticas ganhassem o seu verdadeiro sentido situando-se acima das</p><p>realidades culturais, políticas, econômicas e educacionais nacionais (AFONSO, 2009,</p><p>p. 17).</p><p>Esta tendência homogeneizadora, por sua própria natureza ideológica, tem</p><p>legitimado as próprias ações avaliativas, aumentando a sua eficácia legitimadora</p><p>de tal forma que fica “difícil desocultar os interesses, demandas e funções que lhe</p><p>subjazem” (Op. cit.).</p><p>No Brasil, as avaliações externas têm introduzido elementos capazes de direcionar</p><p>as políticas públicas para a educação, provocando também uma mudança de rumos</p><p>na prática pedagógica. Conforme uma lógica produtivista, acentuou-se a compreensão</p><p>de que a qualidade da educação pode ser melhorada se as escolas forem levadas a</p><p>comparar os resultados estatísticos entre si. Essa premissa de ranqueamento tem</p><p>gerado interpretações enviesadas sobre a utilização dos índices, de quais conteúdos</p><p>devem ser privilegiados, assim como o surgimento de adequações artificiais para</p><p>cumprir objetivos impostos aos sistemas de ensino pelo “Estado avaliador” (OLIVEIRA,</p><p>2011).</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 2 18</p><p>Dessa forma, nesse trabalho, buscou-se discutir sobre o tema “Avaliações</p><p>Externas”, apresentando dados de uma pesquisa que foi desenvolvida no âmbito da</p><p>Universidade Federal de Viçosa, na qual foi realizada uma análise dos resultados das</p><p>avaliações externas de Matemática das escolas públicas que oferecem os anos finais</p><p>do Ensino Fundamental II (6o ao 9o anos), nas cidades que compõem a microrregião</p><p>de Ubá (MRUbá), Zona da Mata de Minas Gerais. Para tanto, foi realizado um estudo</p><p>comparativo e analítico dos resultados obtidos por essas escolas no SAEB/Prova</p><p>Brasil (referentes às edições dos anos de 2007, 2009 e 2011) e no SIMAVE/Proeb</p><p>(referentes às edições dos anos 2010, 2011 e 2012).</p><p>A microrregião de Ubá, geograficamente, é composta por 17 municípios e teve</p><p>sua população estimada, em 2010, pelo IBGE, em 269.650 habitantes, distribuída em</p><p>uma área total de 3.593,648 km. Ubá é um importante município de Minas Gerais e</p><p>boa parte do seu PIB é representada pelo setor de serviços, mas a indústria também</p><p>desempenha um importante papel na sua economia, principalmente, na fabricação</p><p>de móveis e nas indústrias de confecções. Na indústria moveleira, Ubá se destaca</p><p>compondo o maior pólo moveleiro de Minas Gerais e o segundo maior do Brasil.</p><p>Figura 1: Mapa do estado de Minas Gerais, com destaque para a Microrregião de Ubá-MG</p><p>Fonte:https://pt.wikipedia.org/wiki/Mesorregi%C3%A3o_da_Zona_da_Mata#/media/File:MinasGerais_Micro_Uba.</p><p>svg Wikipedia>. Acesso em 15 fev. 2015.</p><p>Desse modo, verifica-se a importância do estudo da avaliação externa nessa</p><p>região, visto que as avaliações têm apontado as prioridades educacionais para a equipe</p><p>pedagógica das escolas, influenciando na definição de ações e também para subsidiar</p><p>políticas públicas para uma educação eficaz, nos marcos do gerencialismo. Assim,</p><p>observa-se a relevância da análise da dinâmica interna dessas relações, buscando</p><p>contribuir para a discussão dessa temática.</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 2 19</p><p>2 | REVISÃO DE LITERATURA</p><p>De acordo com Afonso (2010), a expressão "Avaliação Educacional" abarca,</p><p>genérica e indistintamente, diferentes formas ou modalidades de avaliação utilizadas</p><p>em educação. Assim, em sentido lato, ou seja, quando usada sem qualquer outra</p><p>especificação, a avaliação educacional tanto pode referir-se à avaliação de</p><p>aprendizagens, à avaliação de escolas, à avaliação de currículos e programas,</p><p>à avaliação de projetos, à avaliação de sistemas educativos, à avaliação de</p><p>profissionais (gestores, professores e educadores), ou, ainda, à avaliação de políticas</p><p>públicas.</p><p>Apesar desse uso abrangente, a expressão avaliação educacional aparece</p><p>muitas vezes com um sentido restrito, referindo-se à avaliação de aprendizagens</p><p>ou seus sinônimos, isto é, avaliação pedagógica, avaliação do rendimento ou do</p><p>desempenho escolar ou avaliação dos alunos. Trata-se, portanto, de uma expressão</p><p>polissêmica, sendo por isso conveniente ter em conta os contextos da sua utilização</p><p>e da sua tradução.</p><p>O campo da avaliação educacional é, assim, muito vasto e heterogêneo,</p><p>pressupondo distintas funções e dimensões, explícitas ou implícitas, de natureza</p><p>social, pedagógica, ética, técnica, científica, simbólica, cultural, política, de controle</p><p>e de legitimação, e envolvendo também diferentes instituições (governamentais ou</p><p>não), grupos e atores educativos, bem como distintos quadros de análise, paradigmas</p><p>e metodologias. (AFONSO, 2010).</p><p>A avaliação interna é de responsabilidade do docente e visa avaliar diretamente</p><p>a aprendizagem do aluno, com o foco na ação. Já a avaliação externa, no Brasil,</p><p>é planejada e realizada, geralmente, por profissionais externos à escola, tendo o</p><p>desempenho dos alunos como foco de interesse. Esse tipo de avaliação pode ter</p><p>como objeto, dentre outros:</p><p>- Escolas, como unidades que compõem redes mais amplas - municipais, estaduais</p><p>ou federais.</p><p>- Programas e políticas educacionais, que podem ter os mesmos níveis de alcance</p><p>já citados.</p><p>- Sistemas de ensino, considerando o desempenho dos alunos que estudam nas</p><p>escolas vinculadas a esses mesmos sistemas.</p><p>- Cursos superiores, por ocasião de sua implantação e/ou de recredenciamentos</p><p>periódicos (FREITAS, 2009, p. 54).</p><p>Dessa forma, a avaliação externa supõe que a escola será analisada por agentes</p><p>externos a ela, cumprindo com sua principal finalidade de</p><p>informar aos gestores das várias instâncias do sistema educacional e da escola,</p><p>professores e a sociedade em geral em que medida as políticas educacionais</p><p>estão sendo desenvolvidas. Essas políticas devem esclarecer, sobretudo, se o</p><p>processo educativo está alcançando os objetivos desejados, subsidiando, assim,</p><p>a formulação, a manutenção ou a revisão de políticas públicas definidas para a</p><p>educação (Op. cit.).</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 2 20</p><p>De um modo geral, mesmo que dispondo de objetivos diferenciados, as avaliações</p><p>externas compõem-se de algumas etapas:</p><p>(i) elaboração do projeto de avaliação; (ii) construção de instrumentos padronizados</p><p>(testes e questionários); (iii) validação estatística dos instrumentos; (iv) constituição</p><p>e treinamento das equipes de trabalho; (v) execução e monitoramento simultâneos</p><p>da avaliação em diferentes instituições pelo território nacional; (vi) processamento</p><p>dos dados e disseminação de resultados; e (vii) repercussão dos resultados na</p><p>sociedade (OLIVEIRA, 2011, p. 110).</p><p>As avaliações externas estão presentes nos mais diferentes níveis e contextos.</p><p>No contexto meso, temos a avaliação do PISA (Programa Internacional de Avaliação</p><p>de Estudantes). Já no contexto macro, temos</p><p>o Sistema Nacional de Avaliação da</p><p>Educação Básica (SAEB), Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM), além dos</p><p>Sistemas próprios dos Estados Brasileiros, como são os casos do Sistema de Avaliação</p><p>de Rendimento Escolar do Estado de São Paulo (SARESP) e em Minas Gerais com o</p><p>Sistema Mineiro de Avaliação da Educação (SIMAVE), que foi criado em 2000, e vem</p><p>sendo aplicado anualmente em escolas das redes estadual e municipal do Estado.</p><p>Assim, através dos desempenhos obtidos pelas escolas nestas avaliações, são</p><p>direcionadas as políticas públicas estaduais para a Educação, como em Minas Gerais,</p><p>com as avaliações do SIMAVE, as quais analisamos alguns resultados nesse trabalho.</p><p>3 | METODOLOGIA</p><p>Esta pesquisa caracterizou-se por um estudo comparado e analítico-descritivo</p><p>dos dados produzidos a partir de avaliações externas de Matemática, aplicadas a</p><p>alunos do 9º ano do Ensino Fundamental, nas escolas públicas da microrregião de</p><p>Ubá/MG. Para tanto, este trabalho constou, de modo bem geral, com as seguintes</p><p>etapas para sua operacionalização: coleta de dados, a partir de uma amostra escolhida</p><p>da população; análise descritiva com resumo dos dados coletados; escolha de um</p><p>possível modelo explicativo para o comportamento do objeto de estudo, a fim de fazer,</p><p>em uma etapa posterior, a análise qualitativa/inferencial dos dados.</p><p>Uma importante ferramenta que auxiliou na realização desta pesquisa foi a</p><p>estatística, que é uma parte da Matemática aplicada que fornece métodos para a</p><p>coleta, organização, descrição, análise e interpretação de dados e para a utilização</p><p>na tomada de decisões (CRESPO, 1995). Neste sentido, concordamos com Medeiros</p><p>(2007) quando afirma que "a estatística é uma valiosa ferramenta nas tentativas</p><p>humanas de interpretação da realidade, principalmente para o exame de fenômenos</p><p>de massa", como é o caso das avaliações externas aplicadas pelos governos para</p><p>aferir a qualidade dos sistemas de ensino.</p><p>Considerando essas caracterizações, a presente pesquisa teve um caráter tanto</p><p>quantitativo quanto qualitativo. A pesquisa quantitativa lida com grande número de</p><p>indivíduos, recorrendo a métodos estatísticos para a análise desses dados coletados.</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 2 21</p><p>Deve ser representativa de um determinado universo de modo que seus dados</p><p>possam ser generalizados e projetados para aquele universo. Mostra-se apropriada</p><p>quando existe a possibilidade de medidas quantificáveis de variáveis e inferências a</p><p>partir de amostras numéricas, ou busca padrões numéricos relacionados a conceitos</p><p>cotidianos. Já a pesquisa qualitativa, também chamada naturalística, tem como foco</p><p>entender e interpretar dados e discursos (D'AMBRÓSIO, 2006). Ela apresenta um</p><p>caráter exploratório, isto é, estimula os pesquisadores a pensarem livremente sobre</p><p>algum tema, objeto ou conceito, mostrando aspectos subjetivos e atingindo motivações</p><p>não explícitas, ou mesmo conscientes, de maneira espontânea. É utilizada quando se</p><p>busca percepções e entendimento sobre a natureza geral de uma questão, abrindo</p><p>espaço para a interpretação.</p><p>Metodologicamente, partiu-se de uma pesquisa bibliográfica acerca do tema,</p><p>tendo em vista que ela se realiza a partir do registro disponível, decorrente de pesquisas</p><p>anteriores, em documentos impressos, como livros, artigos e teses (SEVERINO, 2007).</p><p>Neste trabalho, propõe-se a comparação dos resultados do SIMAVE/Proeb/</p><p>Matemática ao longo dos anos de 2010, 2011 e 2012 nas escolas públicas da</p><p>microrregião de Ubá - MG. Foram analisados também os resultados da Prova Brasil</p><p>de Matemática (2007, 2009 e 2011). Esta análise foi realizada com as 30 escolas que</p><p>oferecem os anos finais do Ensino Fundamental II e que participaram de todas as</p><p>avaliações nos anos analisados, inseridas no contexto das 17 cidades da microrregião</p><p>analisada. Os dados quantitativos foram coletados nos sites oficiais da Secretaria de</p><p>Estado da Educação de Minas Gerais (SEE/MG) e do Instituto Nacional de Estudos e</p><p>Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP).</p><p>Assim, devido ao grande número de escolas envolvidas nesta pesquisa, foram</p><p>utilizados dois softwares para auxiliar na organização dos dados. Trata-se do SPSS</p><p>(Statistical Package for Social Sciences), que é um software do tipo científico útil para</p><p>fazer testes estatísticos e pode também elaborar contagens de frequência, ordenar</p><p>dados, reorganizar a informação e como um mecanismo de entrada dos dados.</p><p>Utilizou-se também o editor de planilhas Microsoft Office Excel, que é um aplicativo</p><p>de criação de planilhas eletrônicas, no qual em seus recursos incluem uma interface</p><p>intuitiva e ferramentas de cálculo e de construção de gráficos.</p><p>Organizados os dados, iniciou-se a análise inferencial desse banco, cujo intuito</p><p>foi o de comparar os resultados alcançados pelas escolas e cidades estudadas. Além</p><p>dessas análises estatísticas, para a coleta de dados qualitativos utilizou-se, como</p><p>instrumento metodológico principal, a entrevista semiestruturada com os/as diretores/</p><p>as e coordenadores/as pedagógicos/as de algumas instituições de ensino da MRUbá,</p><p>a fim de conhecer suas perspectivas acerca das avaliações externas as quais essas</p><p>escolas públicas são submetidas.</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 2 22</p><p>4 | RESULTADOS E DISCUSSÕES</p><p>Esta pesquisa, aqui relatada nesse trabalho, ocorreu de março de 2014 a fevereiro</p><p>de 2015 e analisou os dados dos municípios e das 30 escolas públicas que ofertam</p><p>os anos finais do Ensino Fundamental II na microrregião de Ubá – MG. A pesquisa foi</p><p>de natureza quali-quantitativa, realizada com o auxílio do software estatístico SPSS</p><p>e do EXCEL, complementada pela análise inferencial dos dados e das Matrizes de</p><p>Referência.</p><p>A Matriz de Referência para Avaliação é o elemento base de origem dos testes</p><p>utilizados no SAEB e no SIMAVE e garante legitimidade e transparência à avaliação.</p><p>Ela é formada por um conjunto de descritores que, agrupados em tópicos/temas,</p><p>apresentam as habilidades consideradas básicas e possíveis de serem aferidas por</p><p>meio do instrumento utilizado em avaliações em larga escala (CAEd/UFJF, 2009).</p><p>As avaliações estudadas e analisadas nesta pesquisa pautam-se nas mesmas</p><p>matrizes de referência e utilizam a mesma metodologia de análise das respostas</p><p>das avaliações – a Teoria de Resposta ao Item (TRI) – cujo enfoque das análises</p><p>desvincula-se das provas, permitindo comparar as habilidades e os conhecimentos de</p><p>examinados submetidos a provas diferentes.</p><p>Desse modo, como as avaliações do SAEB/Prova Brasil e do SIMAVE/Proeb</p><p>possuem a mesma escala e matriz, ano/série avaliada e participação simultânea</p><p>das escolas nestas, compreende-se que é possível fazer uma comparação das</p><p>proficiências obtidas pela MRUbá, nos anos finais do Ensino Fundamental II, em ambas</p><p>as avaliações, podendo-se observar semelhanças entre os fenômenos analisados.</p><p>Na tabela 1 a seguir, encontra-se os padrões de desempenho em Matemática</p><p>que são utilizados no SIMAVE, quando a pesquisa foi realizada.</p><p>Ano Baixo Intermediário Recomendável</p><p>5º Ano Ensino</p><p>Fundamental até 175 175 a 225 acima de 225</p><p>9º Ano Ensino</p><p>Fundamental até 225 225 a 300 acima de 300</p><p>3º Ano Ensino Médio até 300 300 a 375 acima de 375</p><p>Tabela 1: Padrões de desempenho em Matemática utilizados pelo SIMAVE</p><p>Fonte: CAEd/UFJF, 2012.</p><p>Essa pesquisa, iniciou-se com a coleta de dados nos sites oficiais do Governo.</p><p>Após os dados serem tabulados, constatou-se que 100% das escolas participaram</p><p>das três edições analisadas da prova do Proeb/SIMAVE, porém quando se observa</p><p>a participação das escolas nas três edições analisadas da Prova Brasil, encontramos</p><p>dados bem diferentes. Observando a tabela 2 a seguir, nota-se que, com o passar dos</p><p>anos, a participação nas avaliações da Prova Brasil vem diminuindo.</p><p>Matemática: Ciência e Aplicações Capítulo 2 23</p><p>Edição da Prova Brasil Porcentagem de participação</p><p>2007 90,5%</p><p>2009 80,95%</p><p>2011 78,97%</p><p>Tabela 2: Participação das escolas da MRUbá na Prova Brasil (2007, 2009, 2011)</p>
  • Ferramentas Tecnológicas no Ensino de Matemática
  • Screenshot_2024-10-14-00-03-37-470_com google android apps docs
  • Tópicos em Combinatória
  • QUESTIONÁRIO I Pintura I
  • Mapa da aprovação - Aula 3
  • CONTEÚDO ARTES - 6 ANO
  • AULA - GESTÃO DO TEMPO
  • Ângulos em Figuras Geométricas
  • Cad Estudante História Vol 1
  • Cad Estudanrte Matemática Vol 1
  • Resumo Aula 1 - Como funcionam os anúncios online - O guia definitivo
  • d Questão 9/10 LIVE Fisiologia 1:07:04 -> Leia o texto: corporal. A homeostase Para esse é a forma tipo de que controle o corpo temos encontra os f...
  • (Instituto QUADRIX - 2012) No esporte de alta performance existem alguns estados emocionais de competição denominados flow feeling e winning feelin...
  • (Adaptado de Instituto Quadrix – 2013) No esporte competitivo as emoções podem influenciar o desempenho do atleta. Neste contexto, existem estados ...
  • A tomada de decisão é um processo importante, pois entender como os praticantes tomam suas decisões, pode fornecer informações valiosas para o cont...
  • O indivíduo com a síndrome do Burnout, pode pelo elevado nível de estresse ou insatisfação, agir de forma que procure fugir de maneira psicológica ...
  • A prevenção e o controle do estresse são fundamentais para evitar situações desagradáveis. Dessa maneira, algumas estratégias são tomadas para esse...
  • (Adaptado UECE - CEV - 2018) - Os modelos de ensino do esporte centrados no aluno, Modelo de Educação Desportiva – MED – e o Modelo de Ensino do Jo...
  • Como é feito o monitoramento da temperatura em uma subestação?a) Com termômetros manuaisb) Com sensores automáticosc) Não é necessário monitora...
  • Qual a função dos reatores em uma subestação elétrica?a) Reduzir a tensãob) Controlar a corrente e melhorar a estabilidade do sistemac) Aumenta...
  • O que é uma subestação compacta?a) Uma subestação de pequeno porteb) Uma subestação que ocupa menor espaçoc) Uma subestação temporária
  • Qual é a principal fonte de energia que alimenta as subestações?a) Energia solarb) Energia hidráulicac) Energia proveniente de diversas fontes,...
  • Quais são os principais tipos de subestações elétricas?a) Subestações de distribuição e transmissãob) Subestações de geração e armazenamentoc) ...
  • Qual é o protocolo a ser seguido em caso de acidentes em subestações?a) Ignorar o acidenteb) Notificar imediatamente a equipe de emergênciac) E...
  • resumo matemática Aplicada em Agronomia
  • resumo matemática Aplicada em Agronomia part 24

Conteúdos escolhidos para você

4 pág.

Grátis

Matemática Ciências e Aplicações V2-370-372 _ Passei Direto
4 pág.

Grátis

Matemática Ciências e Aplicações V2-364-366 _ Passei Direto

UNIASSELVI

1 pág.
matemática ciência e aplicações
290 pág.
Matemática - Ciência e Aplicações - Vol.1 (aluno)
2 pág.
Matemática Ciências e Aplicações V3-550-551

Perguntas dessa disciplina

Grátis

O que é a teoria dos grafos e quais são suas aplicações em ciência da computação e redes? A teoria dos grafos é um ramo da matemática que estuda g...

Grátis

Sobres as afirmacoes acima, é correto o que se encontra em:I e II, apenas.II e III, apenas.I, apenas.II, apenas.III, apenas.I. Passou-se a se...
A educação da matemática é uma área do conhecimento que tem como finalidade a pesquisar novas teorias matemáticas, b trabalhar com aplicações da ma...

CEUCLAR

Aprendizagem da Matemática – parte I Questão 3 No segundo milênio a. C. começaram a surgir novas indagações relacionadas ao conhecime...
Data Science não pode ser considerada uma ferramenta completamente técnica, pois emprega técnicas e teorias de campos como matemática e estatística...
Matemática: Ciência e Aplicações - Matemática (2025)
Top Articles
Latest Posts
Recommended Articles
Article information

Author: Laurine Ryan

Last Updated:

Views: 5936

Rating: 4.7 / 5 (57 voted)

Reviews: 88% of readers found this page helpful

Author information

Name: Laurine Ryan

Birthday: 1994-12-23

Address: Suite 751 871 Lissette Throughway, West Kittie, NH 41603

Phone: +2366831109631

Job: Sales Producer

Hobby: Creative writing, Motor sports, Do it yourself, Skateboarding, Coffee roasting, Calligraphy, Stand-up comedy

Introduction: My name is Laurine Ryan, I am a adorable, fair, graceful, spotless, gorgeous, homely, cooperative person who loves writing and wants to share my knowledge and understanding with you.